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208 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Peço ao sr. ministro da marinha que me mande os documentos que pedi, para que se possa examinar, imparcialmente, a conducta das nossas auctoridades em Africa e a quem cabem as responsabilidades.

S. ex.a, que governou no ultramar, sabe muito bem que a maior parto dos desastres por que temos passado são o resultado da inépcia, e talvez da pouca honestidade, não digo de todos, mas de muitos dos funccionarios que para ali exportamos, quer militares, civis ou magistrados.

Não continuemos n’esta paz octaviana, aggravando as nossas circumstancias com mais sacrificios, porque já não e a primeira expedição que se organisa para a Africa para justificar e cobrir tantos erros de administração colonial.

Para o sr. ministro ter a confirmação do que digo, ainda que s. ex.a não faça muito caso do que dizem os jornaes, basta ler-lhe um trecho de um jornal que não é suspeito para o governo.

Esse jornal diz:

«É espantosa a verba que annualmente sc despende com os officiaes reformados, elevando-se á bonita cifra de réis 515:958$0000 réis!

«Só os generaes reformados são cento sessenta e oito!

«Em pouco tempo, e continuando-se a garantir os postos de accesso aos militares que são nomeados governadores para as nossas colonias, e aonde têem feito as mais desastradas e ineptas administrações, a cifra dos reformados será, ainda muito mais elevada.

«E por estes e outros processos que se esbanjam os dinheiros públicos.»

Sabe s. ex.a qual é o jornal que escreve isto? E o Correio da manhã.

Tenho dito.

O sr. Ministro da Marinha (Neves Ferreira): — Sr. presidente, o digno par esqueceu-se certamente de que tinha pedido pelo ministerio da marinha, alem de outros documentos, precisamente a correspondencia entre o governador de Lourenço Marques e o governador geral de Moçambique. Ora, esta correspondencia é que eu disse a s. ex.a que podia mandar vir, mas que tinha demora em chegar a Lisboa.

(Interrupção do sr. conde de Thomar, que se não percebeu.)

A correspondencia que já tinha vindo de Moçambique, essa, está desde já á disposição do digno par; mas quanto á outra é preciso dar tempo a que venha.

Tambem o digno par diz que eu não tenho fé no que dizem os jornaes; não é isso, perdoe-me s. ex.a, que eu o outro dia lhe respondi. O que eu quero dizer é que, não se podendo acceitar como facto averiguado o que diz um jornal, e não se póde mandar proceder só em virtude de uma simples noticia, manda-se pelas repartições do ministerio informar ácerca da veracidade da noticia, e só depois, conforme as informações, se manda proceder, se ha fundamento.

Sobre os factos apontados por s. ex.a, de abusos de auctoridade contra indigenas, eu não acho provável que os haja de gravidade.

Não é muito natural que as auctoridades do ultramar (e muito menos todas) deixem de cumprir o seu dever.

Os funccionarios do ultramar são como os da metropole. De certo que póde lá haver bom e mau, assim como cá, porque os funccionarios do ultramar quasi todos são saídos do serviço do reino e das repartições de cá, e quanto aos magistrados sáem da universidade, como os do reino. Portanto, os funccionarios do ultramar, _ se lá forem maus, é porque já o eram cá.

Ora, acresce que não se podendo mandar vir funccionarios do estrangeiro, servimo-nos dos que temos, os quaes são punidos quando exorbitam ou prevaricam.

S. ex.a estranhou muito que nas províncias ultramarinas não se faça o recrutamento como se faz na metropole, havendo lá eleições, e eu observo a s. ex.a que em Portugal até 1855 se fazia o recrutamento a cordel, e não era porque se não fizessem eleições.

Emfim, o que eu.repito a s. ex.a, é que o governo manda informar sobre se têem ou não fundamento as noticias dos jornaes.

Não pode fazer mais nada, nem é aqui nem no Terreiro do Paço que se administra o ultramar.

Os funccionarios do ultramar é que administram as respectivas províncias emquanto o governo não os demitte, e se não os demitte é por que tem confiança n’elles.

Tenho dito.

O sr. Conde d’Avila: — Pedi a palavra, sr. presidente, para communicar a v. ex.a e á camara que o digno par sr. barão de Almeida Santos não tem comparecido ás sessões por motivo justificado.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de resposta ao discurso da corôa

O sr. Presidente: — Vae passar-se á ordem do dia, e ficam inscriptos para antes da ordem do dia na proxima sessão os seguintes dignos pares:

(Leu.)

Continua em discussão o projecto de resposta ao discurso da corôa, e tem a palavra o digno par sr. Costa Lobo.

O sr. Costa Lobo (continuando o discurso interrompido na sessão anterior): — Disse que hesitara em tomar parte n’esta discussão, porque o seu desanimo lhe fazia muita força para guardar o silencio.

Tambem sabia que os males do paiz não se curam com palavras vãs, mas com bom conselho e com boas obras: mas não com aquellas obras, que o governo praticava, as quaes poderiam levar o paiz a operar elle mesmo por uma fórma violenta, o que seguramente não prosperaria a sua condição.

Como, porém, se tinha associado a um protesto publico contra a rebeldia do governo á constituição do estado, ainda que elle fôra o mais somenos dos que tinham lavrado esse protesto, entendia que não devia deixar passar esta occasião sem ainda mais uma vez o authenticar. Nem o demoviam d’este seu intento as ameaças do governo: elle estava fallando perante uma camara e não perante uma camarilha, perante um parlamento o não perante um conselho aulico.

Precisava, primeiro, anteparar-se com a declaração do que, no que ía dizer, elle se havia do referir unica e exclusivamente á acção do septemvirato, que nos governa, sem a minima allusão ao chefe do estado.

É certo, que desde o momento que se suspende a constituição, não se suspendem sómente as immunidades do poder legislativo, mas as immunidades de todos os mais poderes, que não são mais que uma creação da constituição, isto é, da vontade nacional. Mas parecia-lhe que não era n’esta camara, e sobretudo da parte de um dos menos qualificados dos seus membros, e que occupava uma posição solitaria e isolada, não lhe parecia que fosse um indivíduo n’estas condições, que podesse usar do estricto rigor do direito.

Quando elle lêra o discurso da corôa (a doença não lhe permitira ouvil-o), julgara na primeira impressão, que elle fôra escripto em tom de zombaria, impressão creada logo no principio da leitura pela amphibologia de uma phrase, que parecia dizer, que á prosperidade e independencia dos representantes da nação estão vinculados os destinos da monarchia. Reflectindo, porém, percebera que essa vinculação se referia á nação, mas separada dos seus representantes.

E assim tinha agora a observar, que estava profundamente convencido de que a prosperidade da nação estava