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SESSÃO N.° 21 DE 6 DE FEVEREIRO DE 1907 199

mente originaes; esse Governo deixa passar o mez de outubro, o mez de novembro, o mez de dezembro, o mez de janeiro, sem pensar, sem se preoccupar com a discussão da lei orçamental!

São decorridos mais de quatro mezes de trabalhos parlamentares, e por isso me volto para o Sr. Presidente do Conselho a perguntar-lhe no que é que de util empregou o seu tempo; se foi para se illudir a si proprio que regulou o direito de associação; se foi para se illudir a si proprio que supprimiu a garantia administrativa; se foi para se illudir a si proprio que pensou em dotar o pai z com essa malfadada reforma de contabilidade, que está dormindo um somno, por emquanto provisorio, mas que eu desejaria fosse eterno, no seio da commissão de fazenda; se foi para fazer votar pelas Camaras essa reforma scclerada da imprensa, que provocou um movimento unanime da opinião publica.

É assim que o Sr. Presidente do Conselho utiliza o seu tempo e realiza o seu programma, quando em obediencia a esse programma de parcimoniosa economia, a esse programma que desfraldava aos quatro ventos como sendo o estandarte por elle empunhado para a defesa dos interesses publicos, quando em obediencia a esse programma o seu dever primordial, a sua obrigação era pôr de parte essas bugiarias de projectos que nem honram o seu nome nem podem introduzir a mais pequena parcella de melhoria na legislação portugueza!

O Ministerio, que temos deante de nós, é passivo de uma dupla responsabilidade, porque desaproveitou, malbaratou o seu tempo, e mais de quatro mezes depois de iniciados os trabalhos parlamentares apresenta-se n'esta Camara a pedir o que? A pedir que lhe votem uma auctorização, graças á qual ha de viver d'aqui até junho com as tabellas emendadas pela commissão de fazenda da Camara dos Senhores Deputados !

Isto é um dos momentos mais frisantes de desprestigio parlamentar que eu conheço na minha já longa vida publica.

Sempre com o respeito que devo ter pela opinião alheia, logo direi á Camara qual me parece ser a verdadeira chave d'este segredo politico parlamentar.

Mas, antes de mais nada, permitta-me V. Exa. e permitta-me o Sr. Presidente do Conselho que eu me reporte ás respostas que S. Exa. deu ao Digno Par Sr. Hintze Ribeiro, respostas essas que n'este momento entram opportunamente na minha exposição.

O Sr. Hintze Ribeiro perguntou ao chefe do Governo se S. Exa. considerava indispensavel a votação d'este projecto de lei.

O Sr. Presidente do Conselho respondeu que sim.

Resta simplesmente saber porquê.

Então para que as Camaras Legislativas Portuguezas pratiquem o acto insolito, absolutamente raro de, num determinado anno economico, approvarem uma lei de meios para quasi cinco mezes; quando o orçamento está ainda em estudo na commissão de fazenda da Camara Electiva, basta que o Governo diga, ou em relatorio ou ao Digno Par que o interpelou, que considera isso necessario?

Considera necessario, porquê?

Onde está a demonstração d'essa necessidade? Onde está a prova d'essa urgencia? Então é sufficiente a allegação de que é preciso que se citem as tabellas de 1904-1900 alteradas pela commissão de fazenda da outra Camara, para que o Parlamento se curve á approvação d'esta medida?

Não basta que o Sr. Presidente do Conselho diga que o projecto é necessario ; é preciso sabermos porquê.

Peço pois a S. Exa. que me diga em que se funda para affirmar que o projecto é necessario.

Declarou tambem o Sr. Conselheiro João Franco que era seu proposito não deixar encerrar o Parlamento sem fazer discutir conjuntamente os dois orçamentos de 1906-1907 e de 1907-1908.

Sr. Presidente: eu nem por sombras quero pôr em duvida a benemerencia das intenções do Sr. Presidente do Conselho, mas tambem não desejo que S. Exa. vá para casa com a impressão de que os Parlamentos Portuguezes são dotados de um espirito por tal forma infantil, que possam suppor que os factos que estão para vir se hão de mostrar em harmonia com as intenções de S. Exa.

Isso não.

Sr. Presidente: eu entendo que o orçamento de 1907-1908, apesar das boas intenções e boa vontade do Sr. Presidente do Conselho, se alguma vez passar deante dos nossos olhos, ha de ser sob a forma de lei de meios, como a que está presente.

Considero a juncção dos dois orçamentos uma inconstitucionalidade.

A Carta Constitucional ordena que logo no começo da sessão legislativa o Governo apresente ás Côrtes o orçamento das receitas e despesas geraes para o anno economico immediato.

É, pois, attribuicão do poder legislativo, em cada anno, apreciar essas receitas e essas despesas.

Nenhum Governo, Parlamento algum tem o direito de ligar os orçamentos correspondentes a dois annos economicos, o que pode trazer a impossibilidade de, n'um futuro mais ou menos immediato, destrinçarmos a responsabilidade politica de varias situações.

Sendo assim, reputando a juncção dos dois orçamentos verdadeiramente inconstitucional, e sabendo 'que, não só dentro do espirito, mas dentro da letra da nossa Carta se encontra a prohibição completa de tal medida, eu, Sr. Presidente, aguardo o orçamento de 1907-1908, e quanto ao de 1906-1907, parece-me que o melhor é não pensar mais n'elle.

Emfim, eu, a este respeito, lembro-me de que: de bonnes intentions l'enfer est pavé.

O Sr. Presidente do Conselho faz-me a justiça de suppor que eu não me louvo inteiramente nas suas intenções.

Mas, Sr. Presidente, se tudo é interessante sob o aspecto propriamente constitucional, mais interessante e mais curioso se me afigura o facto de se realizar hoje, n'esta assembleia legislativa, a approvação d'este projecto.

Se o aspecto da questão é interessante sob o ponto de vista constitucional, mais interessante é debaixo do ponto de vista politico.

A votação d'este projecto hoje, e n'este momento, representa uma enxadada a mais no prestigio parlamentar.

Este facto, reportando-me ao programma politico do Sr. Presidente do Conselho, é o desmentido formal das suas promessas feitas na opposição.

Apreciemos, pois, o facto, sob o ponto de vista politico da actualidade.

É a esta apreciação que vou proceder em phrases resumidas, para não abusar da paciencia de V. Exa.

Para tal apreciação terei de reportar-me a factos de administração portugueza, que já ficam á distancia de alguns annos.

Tratava-se da questão dos tabacos. O Ministerio progressista, da presidencia do Sr. José Luciano, persistia e teimava em se orientar n'um sentido, que derivava da adopção de dois maus principios. Eram elles a ligação da concessão do monopolio com a projectada operação financeira da conversão, e era o segundo a concessão do monopolio dos tabacos- directamente feita a uma firma qualquer.

V. Exa., Sr. Presidente, sabe muitissimo bem que tanto n'esta Camara, como na outra, houve um movimento de protesto e de opposição energica e violenta contra a orientação politica e administrativa que esse Governo tinha adoptado.

N'esta casa eu, e um collega meu, que muito sinto não ver presente, o Digno Par Sr. Baracho, tivemos ocçasião de estigmatizar no Parlamento o proposito em que o Governo teimava.