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216 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

e para se chegar a este resultado a camara nomeia uma commissão, que é composta, alem do sr. presidente, de mais dois membros tirados um das fileiras ministeriaes e outro da opposição, exactamente para redigir o discurso de forma que possa ser votado por um e outro lado da camara.

O fim d’isto qual foi?

O não se discutir o projecto de resposta ao discurso da corôa, que era geralmente considerado como um comprimento ao chefe do estado, e o não perder-se tempo com tuna discussão inutil.

D’esta vez foi-se até ao meio, nomeou-se para a commissão, alem do sr. presidente, um membros da opposição e outro da maioria e depois na conformidade d’estas tradições redigiu-se um projecto de uma maneira anodina que podesse ser votado tanto por um todo como pelo outro. No que, porém, não se seguiram os tramites foi na sua discussão, porque se tem discutido de mais, até á saciedade.

Um dos dignos pares que fallou ha dois dias n’esta casa muito bem e com muita correcção, fazendo n’esta camara o seu primeiro discurso, sendo elle aliás já bem conhecido pelos seus discursos na- outra casa do parlamento, o sr. Baptista de Sousa, pareceu surprehender-se e indignar-se por que entendia que a opinião do governo era de que esta questão era inutil.

Ora, sr. presidente, eu concordo completamente com a idéa.

Esta discussão tem sido, e é, uma discussão inutil, sem resultados nenhuns praticos, porque se tem tratado de tudo desde a apotheose politica do marechal Saldanha até á dissolução das associações industrial e commercial, o conflicto com o Brazil, o modo como se resolveu a questão com a Allemanha, etc, etc.

Reconheço que todas estas questões são importantissimas; o que não e possivel, porem, e discutir com resultados praticos tantas questões importantissimas ao mesmo tempo, ,o tantas cousas que são completamente disparatadas umas das outras.

O digno par disso que eram importantes as questões a que se referiu, e acrescentou que a camara dos pares não tinha outras questões a discutir, emquanto não viessem alguns projectos de lei da outra camara.

Mas, sr. presidente, que utilidade pratica ha em que se discutam todos esses assumptos importantes na mesma occasião?

Não seria melhor discutil-os cada um por sua vez?

Era, de certo, e para isso bastava que os membros da mimara que quizessem tratar d’esses assumptos annunciassem interpellações aos srs. ministros que têem estado presentes, e certamente que s. ex.as não deixariam de vir aqui responder a essas interpellações.

Então discutia-se por cada vez um objecto só, unico, e podia chegar-se a algum resultado pratico. De outro modo, repito, a discussão é inutil.

Sr. presidente, um dos pontos mais importantes que alguns dignos pares aqui têem discutido é o que diz respeito á constitucionalidade de, em côrtes ordinarias, poder ser relevado o governo da responsabilidade em que incorreu pela dissolução e adiamento das côrtes.

A este respeito vejamos o que diz o artigo 144.° da constituição.

(Leu.)

Eu pergunto se ha alguma cousa que mais contrarie as disposições do artigo que acabo de 1er, e que se refere aos limites e attribuições dos poderes politicos, do que um dos poderes politicos, o poder executivo, usurpar as funcções do poder legislativo e fazer leis, o que tem succedido por parte de governos de todos os partidos?

Eu aqui faço historia apenas; aponto o facto, não o analyso, não condemno nem absolvo o que é da responsabilidade dos differentes partidos e pela minha parte não posso declinar a que me compete.

Limito-me’ a apresentar o facto. 0 facto é que muitas vezes os governos de todos os partidos politicos têem usurpado as funcções do poder legislativo, fazendo leis, o que é exactamente o mais inconstitucional possivel, visto que o artigo 144.° da carta diz:

«E só constitucional o que diz respeito aos limites e attribuições respectivas dos poderes politicos e aos direitos politicos e individuaes dos cidadãos.*

Eu pergunto se ha, se póde haver nada mais inconstitucional do que um dos poderes politicos usurpar as funcções de outro poder politico? E não só fazer leis para um caso urgente, para uma crise repentina, mas para tempos normaes e sobre assumptos differentes?

Pergunto se ha nada mais inconstitucional?

Pergunto se se ha de reputar mais inconstitucional o governo dissolver as camaras e adial-as do que usurpar as attribuições do poder legislativo e fazer leis por propria conta?

Onde a lei não distingue, ninguem póde distinguir, e o principio que aqui póde ter perfeita applicação.

E agora lerei o resto do artigo:

«Tudo o que não é constitucional (quer dizer, tudo o que não implica com os direitos dos cidadãos e com os limites e attribuições dos poderes politicos) póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas legislaturas ordinarias.»

Logo, a contrario sensu, as legislaturas ordinarias não podem relevar os governos da responsabilidade cm que incorrerem pelo acto inconstitucional de terem usurpado as attribuições do poder legislativo. No entretanto, se isto é verdade, tambem por outro lado é verdade que de facto, na pratica entre nós do systema representativo, têem sido sempre as côrtes ordinarias que têem relevado os governos d’essa responsabilidade.

Segundo a letra da carta não podiam fazel-o, mas uma pratica de tantos annos, desde que entre nós está estabelecido o systema representativo, creio que não póde ser desprezada.

Portanto, se, apesar do artigo 144.°, as côrtes ordinarias podem relevar os governos d’este inconstitucionalismo de primeira ordem — usurpar as attribuições do poder legislativo, — da mesma fórma podem relevar o actual governo da responsabilidade de ter dissolvido e adiado as côrtes.

Este é o ponto mais importante que tem sido tratado pelos differentes oradores que me precederam.

Disse o digno par a quem me estou referindo:

«De mais a mais os actos que o governo praticou, dissolvendo as côrtes e adiando-as, são irremediaveis.»

Oh! Sr. presidente, pois não são tambem irremediaveis os actos dos governos quando estes usurpam attribuições do poder legislativo; aquelles em que o poder executivo, sem auctorisação, gasta dezenas e centenas de contos de réis; e pratica em dictadura muitos outros actos que, uma vez feitos, não tem remedio?

Não comprehendo.

Portanto, isto não póde ser um argumento em abono de que as côrtes ordinarias não podem tambem relevar o governo da responsabilidade em que incorreu pela dissolução do parlamento.

Ha tambem um ponto do discurso do digno par o sr. Costa Lobo que é uma accusação muito injusta feita ao governo.

E o ponto em que s. ex.a tratou da interrupção das nossas relações diplomaticas com o Brazil. Foi uma accusação de grande injustiça. Como se essa interrupção de relações não fosse a consequencia de factos que se deram no Rio de Janeiro anteriores ao conhecimento do governo, e depois na republica Argentina, factos de que o governo não póde ter a responsabidade, emquanto os não conheceu!

Mas ha, mais do que tudo, um outro facto importante: