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206 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

8.° Copia de um relatorio do governador geral de Moçambique (a que se referem os jornaes de Lourenço Marques) acêrca do regimen do alcool na mesma provincia».

O Sr. Conde de Villa Real: — Tenho a participar a V. Exa. e á Camara que, por motivo justificado, não tenho podido assistir ás sessões d'esta Camara.

O Sr. Avellar Machado: — Mando para a mesa requerimentos dos guarda-marinhas do quadro auxiliar Antonio Venancio e José Coelho, e do segundo tenente do mesmo, quadro Thomaz de Aguiar Ritto, que pedem determinadas modificações na lei reguladora da reforma por equiparação.

O Sr. Eduardo de Serpa: — Sr. Presidente : pedi a palavra para chamar a attenção do nobre Ministro da Guerra sobre um assumpto que me parece dever merecer alguma consideração.

Desde algum tempo a esta parte teem-se levantado repetidos conflictos entre os generaes commandantes de algumas divisões militares e os juizes de direito, acêrca da competencia para o julgamento dos respectivos reus que, sendo militares, são chamados a responder por crimes commettidos antes do assentamento da praça.

Os processos n'estas circumstancias são enviados aos commandantes das divisões, que os devolvem aos juizes de direito; e d'ahi o conflicto, que em linguagem juridica se chama negativo.

Tenho presente uma nota de doze d'esses conflictos, a contar de janeiro de 1902 até ha poucos dias, dos quaes tres foram levantados na primeira divisão militar, um na terceira, seis na quarta, e duas na sexta; e o Supremo Tribunal de Justiça, a quem compete; pelo artigo 328.°, n.° 1.°, do Codigo de Justiça Militar vigente de 10 de janeiro de 1895, a revisão de taes conflictos, os resolveu uniformemente no sentido de pertencer aos tribunaes militares o julgamento dos reus nas indicadas circumstancias.

O Supremo Tribunal tem-se fundado nas disposições dos artigos 291.° e 292.° do Codigo de Justiça Militar, que dizem o seguinte:

«Art. 291.° Os conselhos de guerra são competentes para conhecer dos crimes de qualquer natureza, excepto dos de contrabando e descaminho, commettidos por militares ou outras pessoas pertencentes ao exercito, com as limitações e distincções expressamente estabelecidas n'este codigo.

Art. 292.° Estão sujeitos á jurisdicção dos mesmos tribunaes em tempo de paz, emquanto permanecerem na effectividade do serviço ou estiverem em alguma commissão especial do serviço, que as leis e regulamentos lhes incumbem:

1.° Os officiaes e praças de pret, combatentes ou não combatentes;

2.° Os officiaes e praças de pret, combatentes ou não combatentes, em serviço nas guardas municipaes e na guarda fiscal».

Este estado de desconcerto e de desaccordo, que ha entre es tribunaes militares e tribunaes civis, deve e pode acabar facilmente, adoptando-se uma providencia adequada.

Já não me refiro a um certo desprestigio que advem aos tribunaes de estarem constantemente n'estas contradições; quero tambem alludir ao prejuizo individual.

O militar sobre quem recae a imputação de um crime nas circumstancias indicadas, tem de esperar que se decidam estes conflictos ; e por mais breve, por mais prompta, por mais rapida que seja a sua resolução, não pode prescindir-se, para ella se proferir, de certas formulas, a que não é permittido faltar, formulas que são garantia da justiça e inherentes a todos os tribunaes.

D'aqui resulta a demora no julgamento dos delinquentes: se elles estão afiançados, tanto para elles, como para a administração da justiça a demora é um mal; se estão na cadeia tanto peor.

No Codigo de Justiça da Marinha Militar de 1 de setembro de 1899 estabeleceu-se a seguinte disposição:

Artigo 274.° Não estão sujeites á jurisdicção do Conselho de Guerra de Marinha, embora em actividadade de serviço.

1.° Os accusados de crimes commettidos antes do assentamento de praça.

Consigna-se, portanto, de uma forma clara e expressa a jurisdicção e competencia dos tribunaes civis para o julgamento dos officiaes e praças da armada por crimes anteriores ao seu assentamento de praça.

Reconheço que são valiosos alguns dos argumentos produzidos por parte da auctoridade militar, tambem perfilhados por distinctos jurisconsultos, quanto a pertencer o julgamento dos crimes, de que venho de occupar-me, aos tribunaes civis, tratando-se de officiaes e praças do exercito de terra.

Mas não posso acceitar o argumento deduzido d'aquella disposição do castigo da armada, a que um illustre jurisconsulto, funccionario superior do Supremo Conselho de Guerra e Marinha, se soccorre para fazer a critica aos julgados do Supremo Tribunal de Justiça a respeito dos conflictos referidos.

Direi que esse argumento é contra producente, tratando-se de jury constituido.

Não pode transplantar-se de um para outro codigo uma disposição que n'um d'elles é expressa, e omissa no outro. Harmonizem-se as disposições dos dois codigos. Isso, sim. Mas por uma providencia legislativa.

Não quebro lanças para que se continue a julgar como tem julgado o Supremo Tribunal de Justiça.

O meu fim e intuito, tomando a palavra, foi apenas chamar sobre o assumpto a attenção do nobre Ministro da Guerra, e provocar da parte de S. Exa. uma providencia, que ponha ter-a este estado de incerteza, e permitta-se-me a expressão, de indisciplina judicial, acabando-se com um constante desaccordo, que só traz inconvenientes, não sendo o menor d'elles o desprestigio dos tribunaes.

Parece-me pois conveniente que o nobre Ministro da Guerra adopte sobre esse importante assumpto uma resolução, que não se me afigura difficil e complicada; e tomarei a liberdade de lembrar o seguinte expediente:

Ou o illustre Ministro entende dever manter-se a interpretação da lei, como a tem entendido e applicado o Supremo Tribunal de Justiça em seus repetidos e uniformes julgados, e n'esse caso dá instrucções aos seus subordinados para que não levantem mais conflictos e a auctoridade militar se submetta ás decisões do Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal competente para resolver, como tem resolvido, esses conflictos. Já expuz a S. Exa. que o artigo 328.°, n.° 1.°, do Codigo de Justiça Militar é expresso quanto a esta competencia. Ou se, ao contrario, o nobre Ministro da Guerra entende que isso está fora das suas attribuições, peço-lhe então que traga á Camara um projecto de lei, por virtude do qual seja introduzida no Codigo de Justiça Militar a disposição do artigo 279.°, n.° 1.° do Codigo da Armada, a que já me referi, o que em nada altera o plano, a contextura, e a propria numeração dos artigos do Codigo Militar, porque se faria essa inscripção por meio de um paragrapho ao seu artigo 252.°

Lembro qualquer d'estes dois expedientes. Mas se a S. Exa. em seu elevado criterio occorrer outro, confio em que adoptará o que lhe parecer mais adequado.

Terminando, peco desculpa a V. Exa. ar Sr. Presidente, e á Camara pelo tempo que lhe tomei em expor estas despretenciosas considerações.

O Sr. Ministro da Guerra (Vasconcellos Porto) : — Sr. Presidente: ouvi com a maior attenção as considerações do Digno Par Sr. Eduardo de Serpa