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sarias; porque, senão conseguisse o seu fim, tambem não contrahia responsabilidade perante a sua propria nação, e perante o mundo.
Mas em Abril a posição do governo inglez foi outra; o governo inglez em Abril collocou-se em posição differente do que tinha até ahi; então elle offereceu mediação e arbitramento; e arbitramento de tal modo, que o havia de fazer effectivo pela força das armas, se se desse o caso de ser necessario. O governo inglez ficava sendo mediador, arbitro, e garante, e por isso é que julgou não dever prestar esta mediação sem condições, porque incorria tambem em responsabilidade. Os motivos que tinha para offerecer essa mediação em Abril passado, eram em consequencia das reclamações do Governo de Portugal, e pelo interesse especialissimo, que a Grã-Bretanha tinha na pacificação de Portugal, Nação sua antiga alliada, porque interessava na paz e na concordia dos Portuguezes; e porque no estado em que então existiam as cousas em Portugal, não podia haver resultado pratico algum da simples mediação. Já se vê pois, e é evidente, que approvar esta medeação é approvar a intervenção, porque a intervenção não era senão uma consequencia necessaria desta mediação; a intervenção não era senão a consequencia necessaria, quando se désse o caso da não submissão da Junta do Porto; e dando-se a necessidade desta intervenção, segue-se que quem approvou a mediação, approvou ipso facto a intervenção.
Esta mediação foi acceita pelo Governo em Abril passado; mas já antes da acceitação, muitos conselheiros de Sua Magestade, pessoas de maior saber, e dos mais distinctos serviços, tinham sido ouvidas sobre este objecto; e ellas todas concordaram unanimemente em que se acceitasse a mediação; e no Conselho d'Etsado a que V. Em.ª assistio se decidiu igualmente que se acceitasse. Depois de tudo isto, o Ministerio de que eu fiz parte acceitou a medeação com aquellas condições, sem mais declaração nem modificação alguma; isto é, tal qual estava concebida nas instrucções dadas por Lord Palmerston em S de Abril; e então fez-se o protocollo de 28 d'Abril com o Ministro de S. Magestade Britannica, e o Coronel Wilde, no qual se consignou esta acceitação. Mas o Governo, Sr. Presidente, fez mais ainda: não só acceitou estas condições puramente taes como estavam concebidas, mas communicou a Sir H. Seymour, que estava prompto a adoptar quaesquer disposições especiaes, que lhe podessem occorrer a elle Ministro inglez, para na execução fazer, a mais ampla possivel, a amnistia, e tirar de toda a duvida as intenções do Governo a este respeito.
Será por ventura necessario, que eu agora reproduza o quadro lastimoso das calamidades que soffria Portugal? Não por certo, Sr. Presidente, porque todos sentiram essas calamidades, e todos sentem ainda os seus effeitos (Muitos apoiados); até os nossos filhos recordarão tambem com lagrimas os soffrimentos porque nós temos passado! E neste estado calamitoso, o mais urgente dever do Governo era fazer a paz, e procurar por todos os meios conciliar os animos dos portuguezes: estou portanto certo, de que todos os homens imparciaes hão de fazer justiça aos ministros, que, talvez pondo de parte considerações pessoaes, e com uma verdadeira abnegação de tudo que era pessoal, se sacrificaram a ter todos os trabalhos que fossem precisos para contribuir para este fim (Apoiados). Aquelles mesmos que talvez ainda estão apaixonados, hade vir tempo em que hão de lhes fazer justiça, e appello sempre do homem apaixonado para a mesmo homem possuindo toda a lucidez da sua intelligencia.
Sr. Presidente, o Governo portuguez pediu o auxilio das potencias alliadas, em virtude do tractado da quadrupla alliança; reclamou o cumprimento do tractado dessa alliança, mostrando que era applicavel ao estado das cousas em Portugal. Não preciso expor quaes são as disposições desse tractado, seria gastar tempo inutilmente, por isso que todos os D. Pares estão muito certas de qual foi o tractado de 22 de Abril de 1834 concluido com Hespanha, França, e Inglaterra, para a expulsão de D. Miguel, a fim de por este modo se acabar aquella guerra civil. O Governo pois, Sr. Presidente, reclamou os auxilios destas potencias signatarias do dito tractado julgando-o applicavel ás circumstancias em que estavamos. Este objecto é summamente importante; e eu desejaria que todos os portuguezes tivessem conhecimento do que houve nesta questão, e que cada um formasse a sua opinião conforme melhor entendeste, e é por isso que não posso dispensar-me de referir historicamente, o que se passou de principal a este respeito, resumindo o quanto fôr possivel, assim como procuro tambem resumir tudo o mais, quer em relação a factos, quer mesmo era relação a reflexões.
O governo inglez entendeu, que o tractado da quadrupla alliança não era applicavel ás circumstancias em que se achava Portugal; mas mui diversa foi a opinião de grandes estadistas d'inglaterra, taes como Sir Robert Peel, a quem com muita satisfação tenho ouvido fazer a devida justiça nesta Camara (O Sr. C. de Thomar — Apoiado), e igualmente diversa era a Opinião de Lord Aberdeen: ambos pensavam que era applicavel esse tractado. Outra era tambem a opinião decidida do governo francez, a qual era contraria á do governo inglez (Apoiados); e tambem o Sr. Pacheco pensava, que o tractado da quadrupla alliança devia ser applicado ao caso de Portugal. (Apoiados.) O governo hespanhol dizia, que para conseguir-se o grande e tão desejado fim da pacificação de Portugal, era preciso o concurso das, potencias alliadas; que em primeiro logar se deviam por em pratica todas os meios conciliatorios e pacificos, procurando) por todos os meios de persuasão e de conciliação, acabar a guerra de Portugal; mas que se isto não fosse possivel, dizia o Sr. Pacheco, era necessario acaba-la por algum modo; e por isso elle estava prompto a concordar-se com o governo inglez, não intervindo em Portugal sem o consentimento, e accordo do mesmo governo inglez; mas como se poderia dar um caso tal, uma calamidade tamanha e tão extraordinaria, que fosse necessario ao governo hespanhol intervir immediatamente, sem haver tempo de se fazer esse concerto com o governo inglez; então nesse caso, o ultimo, e o mais arriscado, nessa grande catastrofe (parece-me que é até esta a palavra de que usa), havia de intervir mesmo sem esse expresso concerto; porque nesse caso não havia duvida, que o consentimento da Inglaterra era certo, por isso mesmo que esta tinha o maior interesse na pacificação do Paiz na sustentação da dignidade da Corôa, e na sua conservação. Mas dizia ao mesmo tempo o Sr. Pacheco, que declarava perante todo o mundo, que não se entendesse, que o governo hespanhol tinha a menor vista interessada a respeito de Portugal, quando elle não queria ter a menor influencia nos negocios deste Paiz: esta é que foi a declaração cathegorica do governo hespanhol, salvas as circumstancias secundarias, de que me não posso fazer cargo, nem é necessario; mas este é o resumo da deliberação do governo de Hespanha, publicada á face de toda a Europa.
Sr. Presidente, continuando a referir historicamente o que se passou nesta questão, sobre se devia ser applicado o tractado da quadrupla alliança, devo fazer vêr que Lord Palmerston dizia, que ainda que o tractado, segundo a sua letra, não podia applicar-se, com todo segundo o seu espirito podia receber applicação em dois casos, e eram — se D. Miguel estivesse em Portugal, ou se alguma insurreição, proclamando D Miguel, apparecesse para o collocar no Throno — porque então, ainda que segundo a letra do tractado não fosse logo authorisada expressamente a intervenção, com tudo era-o pelo espirito desse mesmo tractado; mas que D. Miguel não estava em Portugal, nem havia neste Paiz uma insurreição digna de alguma menção, levantada em nome delle para o collocar no Throno; que o que elle via disputar em Portugal era uma cousa muito differente, isto é — que se disputava quem havia de ser Ministro, e qual havia de ser o systema da Administração, e nada mais; e que isto não tinha nada absolutamente com a questão de D. Miguel. O governo francez era d'outra opinião, e a expôz com toda a clareza e precisão, de maneira que ninguem póde equivocar-se. Nas instrucções de Mr. Guisot ao Ministro francez em Londres, se contém a declaração expressa da opinião do governo francez a respeito desta questão: nessas instrucções se diz, que o tractado da quadrupla alliança subsistia em direito, porque em direito a posição de Portugal, pelo que toca ao pertendente que contesta a legitimidade da Senhora D. Maria II, era agora a mesma, que ao tempo da conclusão deste tractado (Apoiados repetidos), e applicavel de facto era tambem o tractado, porque tudo quanto se estava passando em Portugal, e a direcção que a insurreição tinha tomado, mostravam bem a necessidade da sua applicação.
Na verdade, o governo francez considerava as proclamações dos generaes miguelistas; os amnistiados de Evora-monte concorrendo á guerra civil; a estada de D. Miguel em Inglaterra; a animação que elle dava d'alli á insurreição; as ordens que mandava para se reunirem os seus sectarios á Junta do Porto, recommendando que o fizessem sem perder de vista o seu principal objecto. (Apoiados.) E que se os miguelistas diziam outra cousa, era com vistas de evitar as consequencias do tractado; era para se servirem da união com a Juntando Porto, como meio para conseguir o seu grande objecto, e preencherem o seu principal dever, como elles entendiam ser, o de collocar D. Miguel no Throno. (Apoiados.)
E tambem Lord Palmerston, era um dos seus despachos dizia — que D Miguel se tinha obrigado pela convenção de Evora-monte, não só a não entrar em Portugal, mas até a não perturbar, de maneira nenhuma, a tranquillidade dos dominios portuguezes; e se pois D. Miguel perturbasse de alguma maneira os dominios portugueses, e violaste a convenção de Evora-monte, então daria motivo para hostilidades aquelles com quem contractou não tornar a entrar em Portugal; mas que havia muita differença entre aquelles dos seus sectarios, que o queriam collocar no Throno, e entre aquelles que o tinham abandonado para se unirem á Junta.
E n'outro despacho diz Lord Palmerston — que o desprêso da convenção de Evora-monte, poria virtualmente D. Miguel em estado de hostilidade com as potencias, com cujos agentes aquella convenção foi concluida.
N'outro despacho dizia — que D. Miguel estava em Londres, e que não podendo as leis inglesas contrariar seus movimentos, elle se poderia transferir para Portugal em qualquer occasião.
Houve um agente diplomatico, que argumentou contra a applicação do tractado da quadrupla alliança, dizendo — que admittir a interferencia estrangeira pelo fundamento deste tractado, seria estabelecer um direito perpetuo, para interferir em todas as circumstancias em, um reino, que a Inglaterra era interessada, e estava resolvida a conservar independente. — Mas esta razão, de que com a applicação do tractado. Se estabeleceria um direito perpetuo de interferir em todas as circumstancias, não pareceu muito logica aos governos hespanhol, e francez; e até Lord Palmerston nunca se serviu de tal razão: o que elle unicamente disse, foi — que era do essencial interesse de Inglaterra, obstar em Portugal á influencia dominadora de qualquer outra potencia.
O governo francez considerava, que os factos por mim já apontados, demonstravam a justiça da applicação do tractado. E com effeito parecia, que nada mais era preciso para mostrar a ruptura da convenção de Evora-monte. Se D. Miguel estava em Londres, e d'ahi animava e dirigia a insurreição, e se a união dos miguelistas á Junta não era abandono da causa de D. Miguel, antes um meio de melhor a servir; as declarações, ou protestações nunca podiam prevalecer contra os factos. Esta foi sempre a doutrina do governo inglez, e eu apontarei unicamente um facto notavel, que teve logar em 1826; época certamente muito notavel na nossa historia, por ser o anno em que se estabeleceu a Carta Constitucional (Apoiados.)
Em 1826 os miguelistas já então, como sempre, quizeram destruir a Carta Constitucional (Apoiados); rebelaram-se, e depois tiveram que fugir para Hespanha; e o governo hespanhol desse tempo, prestou-lhes auxilios, munições, armamentos, e tudo quanto lhes foi necessario. Então, e na presença desses factos, o governo inglez entendeu, que devia mandar uma expedição a Portugal, para que essas tramas dos miguelistas, auxiliados pela Hespanha, não nos privassem da nossa Constituição, e por consequencia da nossa liberdade. Sr. Presidente, estou persuadido, de que uma das melhores peças que todos os portuguezes devem estudar, é o discurso que Mr. Canning fez no Parlamento, na occasião em que mandou para Portugal a expedição commandada por Sir William Cliton: este discurso vem no Courier desse tempo, e creio que em todos os outros jornaes. Nesse discurso, depois de Mr. Canning expor, que a Inglaterra tinha só em vista a paz e prosperidade de Portugal, não sómente pela antiga alliança, mas até pelas sympathias de um e outro povo; depois de dizer á face do Parlamento, e de todo o mundo, que em quanto houvesse em Inglaterra um braço que se podesse levantar, nunca Portugal deixaria de ter o seu auxilio para defender a sua independencia; mostrou que todas as declarações feitas pelo governo hespanhol, contrarias aos seus actos, não podiam embaraçar a conducta de Inglaterra; porque, o governo hespanhol dizia, que não pertendia de maneira alguma influir nos negocios de Portugal; mas entretanto armava e auxiliava os miguelistas.
A Inglaterra e todo o mundo vio, qual era a verdadeira conducta do governo hespanhol a respeito dos negocios de Portugal. Na Camara dos Communs, onde foi pronunciado esse discurso, houve um Deputado que contrariou opinião do governo, e foi Mr. Hume; e creio que é o mesmo Mr. Hume que ultimamente se distinguiu tanto nos debates do Parlamento inglez, relativo aos nossos negocios. (Vozes — É o mesmo.) Naquella época disse Mr. Hume, que não devia vir a expedição a Portugal, importando lhe pouco que os rebeldes vencessem (Apoiados.) As razões em que fundava a sua opposição ao governo, eram: primeiro, porque o governo hespanhol dizia, que não tinha intenção de influir nos negocios de Portugal, nem de atacar o Reino, e que esta declaração daquelle governo devia ter toda a força, não obstante o que dizia Mr. Canning. Disse mais (o declarou que dava a sua opinião sobre a questão aberta e ousadamente), que sentia existissem taes Tractados, quaes aquelles a que se havia referido Mr. Canning; e que tinha pena de que jámais se tivesse concluido algum Tractado, pelo qual a Inglaterra se suppozesse estar obrigada aprestar auxilios a Portugal em occasião, em que nós lhe não podiamos prestar compensação alguma. E com esta profunda dialecta, e com o estilo que lhe é familiar, produziu tão grande impressão na Camara, que todos se pozeram a rir. (Vozes — Muito bem. Muito bem.)
Não obstante porém ser a opinião do governo francez a que acabei de referir; comtudo, depois que Lord Palmerston ellaborou as suas instrucções, e as mandou não só para Portugal, mas tambem para as côrtes alliadas, e foram por conseguinte presentes ao governo francez; Mr. Guisot as achou justas e rasoaveis; e como Lord Palmerston dizia, que todo o portuguez amante do seu paiz devia com ellas ficar satisfeito, então disse Mr. Guizot a Lord Normanby, que não era necessario continuar mais a suscitar a questão da execução do Tractado da Quadrupla Alliança, visto que as condições apresentadas pelo governo inglez eram justas e rasoaveis.
Sr. Presidente, tenho exposto historicamente o que me pareceu necessario, sobre o que se passou a respeito da applicação do Tractado da Quadrupla Alliança. Mas não desejo se diga, que estando a fallar neste objecto quiz unicamente referir o que se tinha passado, sem tambem expor a minha opinião. Eu pois o vou fazer nos termos mais breves que me fôr possivel.
Em primeiro logar digo, Sr. Presidente, que não tracto aqui da colligação entre os miguelistas e liberaes, formada para as eleições, ou para que por meios constitucionaes se oppozessem a qual quer governo. Eu não tracto deste objecto, que é alheio ao meu proposito, ainda que já se tenha aqui fallado nisto; eu não tracto da colligação formada para se oppôr ao Governo por meios constitucionaes, nem do proveito que d'ahi possa vir ao progresso das doutrinas liberaes, fallo unicamente da união e liga da insurreição miguelista com os liberaes; e devo dizer que estou muito persuadido (e Deos me livre que deixasse de acreditar), que os illustres chefes liberaes estavam convencidos da boa fé e sinceridade das declarações dos chefes miguelistas, e que é impossivel que annuissem á união, se não acreditassem nessa sinceridade; tanto mais quanto é certo que elles haviam de ser suas victimas. Ora, posto isto e bem estabelecido, digo que a minha opinião é a de Sir Robert Peel, de Lord Aberdeen, de Mr. Guizot, e do Sr. Pacheco. Eu não acredito, Sr. Presidente, na sinceridade dessas declarações; não creio na repentina e quasi miraculosa conversão desses miguelistas, que correram ás guerra civil e á desolação da patria (Apoiados) para fazer a reforma da Carta. (O Sr. V. de Laborim — Muito bem.) Não duvido que elles quizessem a reforma da Carta, principalmente de certo artigo que lá está, reforma operada pela intelligencia das bayonetas de Evora-monte; mas esta não era de certo a reforma, que queriam os illustres chefes liberaes que lá estavam. (O Sr. M. de P. de Lima — Apoiado.) Ainda que acreditasse, não entregaria eu logo o commando dos soldados da liberdade, dos soldados do Senhor D. Pedro, a estes respeitaveis neophitos, por mais respeitaveis que fossem.
Sr. Presidente, pondo de parte a applicação do Tractado da Quadrupla Alliança, devo declarar, que o governo hespanhol nunca teve intenção de usar do direito de intervenção nos negocios portuguezes, sem o accordo de Inglaterra. O governo hespanhol tinha perfeito conhecimento dos perigos, que corria a Hespanha com o estado de cousas em Portugal; o governo hespanhol, torno a dizer, tinha perfeito conhecimento dos perigos que corria a Hespanha com a guerra civil de Portugal; via muito bem, que a tranquillidade publica em Hespanha era ameaçada com a insurreição de Portugal; e conhecia os males que lhe haviam de resultar do complemento de uma revolução, ou demagogica, ou miguelista, ou composta de um e outro elemento; salva depois a ruptura pela guerra immediata. O governo hespanhol conhecia isto, e tambem sabia, que a intervenção, dada esta circumstancia de perigo imminente para a Hespanha, era conforme ás declarações que por muitas vezes tem feito o governo inglez; e era conforme tambem aos factos muitas vezes por elle praticados, ás declarações feitas muitas vezes no decurso da guerra da revolução de França, ás declarações feitas no congresso de Verona, em que se tractou da intervenção da França na peninsula, declarando o Representante britannico Lord Wellington — que não se póde intervir nos negados interiores de outro paiz, excepto quando elles affectam os interesses essenciaes da outra nação.
O governo hespanhol bem sabia, que naquelle perigo, que corria a Hespanha, a justiça da sua intervenção era conforme a estas declarações; e tambem sabia que era conforme aos factos; porque, o governo inglez tem interferido effectivamente, e tem confirmado muitas vezes pelos seus factos esta doutrina, na França, nas Colonias hespanholas, na Belgica, e no Oriente. Igualmente sabia o governo hespanhol, que era tal caso, a intervenção era conforme ás doutrinas de todos os governos da Europa; porque seja qual fôr o modo porque se expliquem, todos concordam em que teem direito de intervir, quando a necessidade da sua segurança, ou os seus essenciaes interesses, exigem a intervenção nos negocios interiores do outro paiz. E elles são sempre os juizes desta necessidade; de modo, que a doutrina no fundo é a mesma, e a unica differença está, em que alguns governos teem sido mais reservados do que outros na applicação. Tudo isto sabia muito bem o Sr. Pacheco; mas tambem via que a respeito da pacificação de Portugal, a Inglaterra tinha o mais especial interesse, que a ninguem importava mais que se pacificasse este Reino, e que por tanto o accordo era certo. Que ainda nesse caso, em que a Hespanha fosse obrigada a intervir só por si por não haver tempo para se concertarem os dous governos, era tal intervenção approvada pelo governo inglez.
E com isto combina perfeitamente o que no Parlamento disse um dos Ministros Britannicos, creio que foi Lord Jonh Russell — que estando a Hespanha deliberada a interferir, não podia a Inglaterra deixar de accordar-se com ella, porque não era possivel, que jamais a Inglaterra viesse em auxilio da Junta do Porto contra a Casa de Bragança. Eis aqui, Sr. Presidente, a que se reduz tudo quanto o governo hespanhol declarou; mas depois, tendo presentes como teve o governo francez, as instrucções de Lord Palmerston de 5 da Abril para a mediação; o Sr. Pacheco achou as condições justas e rasoaveis, concordou em tudo com o governo inglez, e recommendou ao Governo de Portugal, que acceitasse a mediação com aquellas condições, e esta mesma recommendação, fez o governo francez.
Sr. Presidente, á vista destas recommendações do governo francez e hespanhol, para se acceitarem as condições da medição, e no estado lastimoso em que estava o Paiz, e em que o primeiro dever e o mais urgente, era pôr termo á guerra civil; haverá quem possa affirmar, que o Ministerio não cumpriu o seu dever?!
Sr. Presidente, sinto muito não vêr naquelle banco o nobre Par, que fallou em um destes dias passados, porque julgava necessario fazer algumas observações, não sobre muitos pontos que S. Ex.ª tocou, mas sobre um ou dous, porque são relativos ao objecto de que estou tractando. Como o não vejo, abster-me-hei de dizer tudo o que poderia: comtudo, sempre farei alguma breve reflexão. Disse S. Ex.ª, que o Protocollo foi approvado pela Junta do Porto, e que as addições eram, só para garantia. E não obstante, pouco depois dizer S. Ex.ª, que os artigos foram impostos, o que a Junta não teve outro remedio senão acceita-los, penso que a sua tenção era mostrar, que, tendo sido rejeitados os artigos das addições, a Junta não teve outro remedio se não acceder. Ora, se a Junta do Porto approvou as condições, e as achou justas e razoaveis, eu concordo neste ponto com a Junta; mas não concordo com ella na necessidade desses desenvolvimentos, e dessas addições. Não tenho por objecto examinar agora esses desenvolvimentos e addições, nem o julgo necessario; mas o que digo é, que não concordo na necessidade dessas addições, não obstante o D. Par ter dito, que a Junta queria as addições como necessaria garantia; porque, sempre julguei, e ainda agora julgo, sufficiente garantia, além da Real Palavra, aquella que era dada pelas Potencias alliadas. Todavia não duvidarei affirmar, que essas addições eram muito boa garantia; porque — que melhor garantia se poderia dar á revolta do que entregar todo o governo á revolta? (Riso). E esta asserção do D. Par fez-me vacillar sobre uma opinião que eu tinha, de que era exacto o que o Coronel Wilde referira a respeito da coacção, em que estava a Junta do Porto, porque o Coronel Wilde havia informado mais de uma vez, que a Junta do Porto estava em coacção; e es-