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gente que se administra mal? Portanto o governo, que é tão paternal, devera, desde já, tomar debaixo da sua tutela os maus administradores!

Também se invoca a mobilisação da propriedade; e acaso não ha ahi outras propriedades, que não a das religiosas, no mesmo caso?

E a companhia das lezirias, contra a qual se tem levantado tantos clamores! Quererá o governo acabar com ella? Eu não sei se esses clamores são justificados, mas é certo que elles se têem erguido, e permitta-se-me que osTecorde aqui ainda que só por incidente.

Sr. presidente, não é o desejo de administrar bem as casas das religiosas, é a necessidade que ha dos bens que ellas possuem, e Deus queira que façam bom uso d'elles, porque eu tenho muito medo de reformas; pois quando se trata de reformar alguma cousa em o nosso paiz, o que se faz é crear logares novos, e admittir logo novos-empregados para as secretarias, preterindo-se os serviços 'de muitos bons e antigos empregados, para fazerem entrar homens, sob o pretexto da necessidade politica, .para pagar assim a muitos escriptores e amotinadores, que impõem como condição de se callarem o emprego pingue que o governo lhe dá e o talher que lhe concede na mesa do orçamento. Pague o governo aos calumniadores mas pague-lhe da sua algibeira, que só lhe registaremos o mau gosto.

Sr. presidente, é preciso dizer toda a verdade sem receio dos apodos da inveja nem dos tiros da calumnia. Cumpre pois ao homem verdadeiramente patriota e verdadeiramente independente apresentar francamente a sua opinião, 'embora tenha sempre por partilha a injuria, o sarcasmo e a calumnia; por a minha parte tenho sempre despresado as injurias, e na verdade estão ellas tão abaixo de mim, que nem podem ferir-me sequer.

A respeito da injuria e da calumnia repetirei o que disse em outra occasião: a calumnia assimilha-se á vaga atrevida que investe impávida o formidável rochedo, e qup sendo ousada quando investe mostra-se humilde quando retira, pois que rechassada com violência comprehende a própria debilidade, e corre então a enconder-se no mar, aonde se perde, se confunde, desapparece e morre.

Sr. presidente, eu espero alguma explicação por parte do sr. ministro dos negócios estrangeiros; hei de por.ém votar contra o projecto, porque reputo necessário o prévio accordo com a santa sé. Reputo necessário esse accordo como o reputaram muitos dos meus collegas, embora ficássemos vencidos na questão do adiamento, como ficaremos n'esta. Ficaremos vencidos, mas não convencidos.

Sr. presidente, eu peço á camará que attenda não só á letra do projecto, mas também ao seu espirito, e pense a camará qual pode ser a confiança que nos pôde, inspirar um ministério, que em seguida á medida tyrannica e im-politica que acaba de adoptar contra uma mui illustre associação religiosa de ensino, vem declarar que apoia um relatório, no qual muito detalhadamente se declara que é necessária a conservação das casas religiosas, tanto das que se dedicam á vida ascética, como d'aquellas que se dedicam ás obras de caridade, e principalmente das que se dedicam ao ensino e educação!

Não me admira que o sr. Ferrão se tivesse-lembrado também no seu relatório de tocar um ponto importante, qual o da creação de*casas de religiosas, que se dediquem á obra evangélica do melhoramento da condição moral das prisões, cuja reforma nós tinhamos direito a esperar do sr. ministro da justiça. Sei que ha já uma medida apresentada por s. ex.a, a qual nós havemos de examinar. Eu faço parte de uma commissão, nomeada pelo sr. José SilvestreRibei-ro, para a reforma das cadeias, e para a qual fuinomeado ^pelo-sr. Avila, no que s. ex.* mostrou que fazia de mim melhor conceito do que mereço (O sr. Ministro ãa Fazenda:—Não, senhor). Eu agradeço o aparte de s. ex.a, que é devido á sua amisade, a qual espero que .hei de sempre conservar.

Ora, em relação á commissão a que me refiro, direi por incidente e de'passagem que nós nada podemos fazer, porque se nos pretextou que a reforma 'do código penal não podiadeixar de ir de accordo com a reforma das cadeias. Eu sei que ha trabalhos muito importantes dos membros d'essa outra commissão, mas esses trabalhos acham-se envolvidos na poeira das gavetas, e nenhum caso se faz d'el-les. Pois devem fazer. Isto é dito por incidente, e tem relação com o relatório do -sr. Ferrão: foi uma 'digressão, mos o objecto tem realmente connexão com o assumpto'de que trato, e por isso fiz esta declaração.

Pois, sr. presidente, havemos nós acreditar que o governo esteja disposto a estas fundações, quando elle acaba (proclamando sempre os principios.de liberdade) de proscrever um certo instituto, conservando unicamente aquellas-associações que agradam ao sr. presidente do conselho?

N'outra occasião tratarei dessa matéria; agora trouxe-a apenas para reforçar os meus argumentos e para provar que o governo, n'esta parte, não tem direito á-confiança da 'Camara, mesmo até >pela inopportunidade da occasião >em •que apresentou es»a medida (apoiados).

Esta medida, de que ora tratemos, é puramente financeira; o governo deseja ter dinheiro para continuar a viver, mas não tenciona apresentar medidas de utilidade publica; esta é portanto úma d'aquellas medidas a que eu alludi no principio do meu discurso, toda impregnada de matéria e vasia de espirito. Se tudo isto é- assim, o que podemos esperar do governo? Se o governo dorme quando se trata do bem, e accorda quando se trata do mal, é como o leão furioso, que jaz em profundo lethargo, mas quando accorda procura a presa, e encontrando-a, desvairado e furioso, devora-a.

Sr. presidente, foi-me necessário apresentar todas estas rasões, porque entendi que devia ser franco, e manifestar

claramente quaes eram as minhas desconfianças, e os receios que actuavam sobre o meu espirito, para combater fortemente 'esta medida. Eu desejava que este ministério se retirasse, porque não tenho confiança n'elle, embora a tenha em alguns dos membros que o compõe como homens particulares.

Olhemos para a situação da Europa, olhemos para esses thronos que baqueam, talvez por essas concessões não dicta-das pelo desejo de fazer justiça, mas arrancadas pelo medo dos motins das praças públicas!

Um celebre auctor prussiano, que o sr. Ferrão conhece, e o sr. Avila também deve conhecer, o celebre Ancillon, disse em uma das suas obras de philosophia politica — que as concessões arrancadas pelo medo nem conquistam a gratidão nem geram a confiança, pois que sendo a obra do medo, e apresentadas com a desconfiança, produzem também grande desconfiança nos povos, e torno-os sequiosos de mais concessões, tornando assim impossivel iodo e qualquer governo. É esta a opinião, de Ancillon, e de todos os homens notáveis, quando tratam do estado febril das sociedades e, da inefficacia dos remédios, que mal avisados políticos tentam applicar-lhes.

Peço á camará que medite bem sobre o projecto; que veja bem a situação em que nos achamos, e da qual nos devemos bem compenetrar; olhe a camará e attenda para o incremento no nosso paiz das idéas revolucionarias. Chamem-me embora reaccionário, sou-o sempre, e se-lo-hemos todos os homens de bem, quando a acção do mal se oppõe á acção do bem. Pois que, terão os revolucionários a audácia de propinar o veneno, e não teremos nós a coragem, o direito e o dever de lhe oppor o antídoto?

E dizem que os homens que se oppõem a estas medidas não querem o progresso!... Não querem a civilisação!... Queremos sim, queremos o progresso das boas idéas, queremos a civilisação fundada na moral; mas não queremos esse progresso apressado, irreflectido e damninho que arrasta as monarchias, e que arrasta os reis descuidados, que não conheceram os laçOs que lhes armaram aquelles que se diziam seus amigos, mas que não eram senão formidáveis adversários, acobertados, em quanto lhes convinha, com o manto vil da hypocrisia!...

Sr. presidente, em todos os meus propósitos tenho ^sempre em vista a justiça, mas nunca o medo. Não é o medo que deve actuar no animo do homem politico; o medo foi sempre um mau conselheiro (O sr. Ministro da Fazenda:— Apoiado). Peço a Deus que sempre o retire de mim; que eu possa conservar a coragem que os meus antepassados me legaram em seus testamentos de gloria. Faça Deus que eu não seja o ultimo da minha raça. Compenetre-se a camará d'estes sentimentos, compenetremo-nos todos, e se assim procedermos a historia inscreverá o nosso nome na pagina dourada das bênçãos; não o queiramos nós inscrever no livro negro das maldições. Nós queremos a luz, a camará dos pares quer o progresso, ha de acompanhar o mundo na marcha da civilisação; mas nós queremos a luz do astro brilhante que alumia, e não a do brandão nefasto que incendeia. Queremos a luz que fulge no céu, mas não queremos aquella que, procurando dessipar as trevas, se assimilha ao clarão torvo do inferno!... Não queremos nada d'isso, sr. presidente, queremos a ordem publica, queremos a carta constitucional do Senhor D. Pedro IV, respeitada e verdadeiramente acatada. Queremo-la, e queremos sinceramente a liberdade; mas não queremos essa liberdade infrene, que levou tantos homens notáveis ao cadafalso, que exaltou a cabeça de muitos, e produziu a desordem em tudo!... Não queremos isso, havemos conspirar contra.

Mas, sr. presidente, no «estado actual das sociedades, o homem d'estado, o homem politico, ás vezes desanima, con-frange-se-lhe o animo, aperta-se-lhe o coração, estorce-se!... No meio de toda esta porcella, quando as vagas parecem querer invadir tudo, affigura-se-me quando encaro o estado da minha pátria achar-me em um vasto campo, theatro recente de encarniçado combate; esse campo que outr'ora fora povoado de edifícios, hoje é um montão de ruinas, ao longe deixo um monte, acolá enxergo um pequeno outeiro, por toda a parte alvejam os ossos dos martyres que pereceram defendendo a justiça; caminho avante: uma capella desmoronada, um templo gothico, no qual, atravez as ruinas, pôde ainda o viajante divisar algumas bellezas da ar-chitectura, padrão .grandioso que, attestando a piedade de passadas eras, proclama a indifferença de uma geração.

Parece que accordo de um sonho, senhores. Que é feito da antiga grandeza da nossa pátria?'Que é feito d'essas livrarias aonde os antigos monges nas horas vagas da meditação e das preces se instruíam nas sciencias e até nas artes? Que é feito dos vasos sagrados, das bellas alfaias riquíssimas e de terciopello? Aonde estão as riquezas dos frades? Aonde, eu vos digo, em poder dos agiotas, em poder de algum antigo proletário que agora é rico proprietário á custa da igreja. As livrarias parte desappareceram, e fo-¦ram povoar em rasgadas folhas as lojas dos merceeiros.

Homens políticos, reformadores consummados, não ostenteis o carnartello destruidor, apresentae as vossas obras de edificação; mas nem uma, porque o homem que destroe não é o homem que edifica. Aiesses homens que tudo censuram, que tudo destroem, que a tudo se oppõem, direi — podeis ser opposição, porque as vossas idéas não servem para organisar, mas para dissolver; porém governo nunca podereis constituir, porque para governar é preciso ter idéas governamentaes, e vós amaes a desordem ea dissolução. Quando recordo o que 'a minha pátria foi e o que ella é ' enluta-se-me o coração. Ainda faltavam os bens das pobres freiras para locupletarem alguns ambiciosos insoffri-dos; «ainda era necessário este dinheiro ao governo para recompensar mais algum politico indispensável, ou para crear em nome da boa economia mais algum, logar aonde

accommodasse os escriptores que o defendem -e que atacam, affrontam e offendem o pudor publico.

As casas religiosas não estão na moda, n'ellas ensina-se ultramontanismo, assim o dizem' estes nossos reformadores impenetráveis a todas as idéas de civilisação -e defensores de absurdos que elles só chamam as boas doutrinas. Jí o governo ouve-lhe os conselhos e adopta-lhe os projectos. Mas, sr. -presidente, .se assim pensam alguns dos nossos fingidos politicos não é assim que se pensa nos paizes mais illustrados da Europa.

Notarei o que se passou no-parlamento inglez-quando foi interpellado lord Wellington n'uma das casas do 'parlamento, dizendo-se-lheahi que'fizesse executara lei em relação aos jesuítas, que segundo a letra da lei n'aquelle paiz não podem existir.

E sabe v. ex.a o que respondeu lord Wellington? Não respondeu nada, rio-se! E os jesuítas lá estão e lá têem os seus collegios; e não só na Inglaterra'^mas na Bélgica, na França existem as ordens religiosas, só aqui .têem medo d'ellas.

'Ora, o sr. marquez de Loulé conhece a historia de Inglaterra, recordarei a s. ex.a o que se passoun aquelle paiz-com sir Robert Peei por occasião da discussão àobill para o seminário catholico de Maynooth.

Fez-se grande opposição, por parte mesmo do partido a que aquelle homem d'estado pertencia, ao bill...; 'uma representação revestida de quarenta mil assignaturas se apresentou contra elle, e sir Robert Peei não desanimou porque elle amava a sua independência como homem publico, -e não se sujeitava aos caprichos do seu partido ou de quem quer que fosse, e por isso disse que se honrava de pertencer a um grande partido, mas sobretudo de proceder como homem independente. Tome o sr. marquez de Loulé este exemplo.

E, sabe a camará qual foi o resultaldo? Foi o bill passar e este homem d'estado vencer.

Sr. presidente, grande influencia tem tido as más 'doutrinas no nosso paiz, e direi com magua, que nós viemos ao mundo em má hora, pois só abrimos os^olhos para presenciar catastrophes, para medir abysmos e para contemplar escândalos; fortalece-me comtudo a esperança de que as catastrophes suspendem-se, os abysmos desapparecem, e os escândalos passam.

Sr. presidente, da luta entre a verdade e o erro, a verdade sairá triumphante; e honra grande caberá ao homem que sabe defender a verdade entre ruinas.

Defendamo-la. O homem que acreditou na Providencia já mais desfalleceu no combate. Por a minha parte confesso que atravez as nuvens que toldam o horisonte dos estados, affigura-se-me ver brilhar um astro de bom agouro, mas na verdade em relação ao nosso paiz podemos dizer que esse luzeiro é vulto da esperança erguido sobre a lousa do se-pulchro".

Seja pois o nosso ponto de reunião em um campo aonde todos nos devemos reunir de bom grado: é o da justiça. Agrupemo-nos em volta de um pendão que todos devemos saudar com enthusiasmo e amor; é o da carta, e firmes na defeza dos sagrados principios da justiça, que são o mais bello artigo do nosso código, seja o nosso brado na luta, nas provações e na victoria—justiça, justiça, justiça. (Muitos apoiados.— Vozes:—Muito bem, muito bem.)

'(O orador foi cumprimentado no fim do seu'discurso por muitos dignos pares e vários srs. deputados).

O sr. Visconde de Podentes: — Tendo pedido a palavra disse que no momento em que soava a hora em que devem terminar os trabalhos d'esta camará, era em verdade difficil o encetar uma discussão contra as doutrinas apresen tadas pelo digno par, o sr. marquez de Vallada, e com relação a uma matéria tão melindrosa como é a que faz o objecto da presentediscussão, e especialmente quando odi-gno par divagou tanto e por tal forma, que até apresentou um vulcão próximo a devorar-nos .''Chegou elle, orador, atéa suppor que tudo estava já submergido, e debaixo das garras de uma hydra prestes a devorar a todos. Em taes circumstancias é difficultosissimo, repete, tomar a palavra, -e entrar na discussão de um objecto de natureza tão importante como este altamente melindroso, porque toca com pontos religiosos, com pontos que não sabe, se aãreãe, se querem apresentar no sentido de acarretar um grande odioso sobre os homens, que se presam de terem sempre sustentado a liberdade d'este paiz.

Ao projecto de que tratamos, oppo-3e a a idéa de queé contrario á religião. Se o projecto effectivamente levasse ás conclusões que o digno par figurou, julga elle, orador, ou antes está firmemente convencido de que não haveria um único membro d'esta camará que não o rejeitasse in limine (muitos apoiados). Mas a'medida é... anti-religiosa, >a medida é... revolucionaria, -arííedida é... financeira... a medida é... fel e veneno...

(O orador fendo feito um grande exforço ao pronunciar estas ultimas palavras, e não podendo já sustentar-se ãe pê, caiu sobre a cadeira^ e não poãenão concluir o seu ãis-curso, foi conãuzião em braços para fora ãa sala).

O sr. Presiãente (bastante commovião): — Está levantada a sessão.

O sr. Visconãe ãe Algés: — Eu ía pedir a v. ex.* a palavra sobre a ordem para propor isso mesmo.

!0 sr. Presiãente: — A ordem do dia para segunda-feira é a mesma que vinha para hoje.

Eram quatro horas e âez minutos.

Relação dos dignos pares, que estiveram presentes na sessão do dia 9 de março de 1861

Os srs. visconde de Laborim, Cardeal Patriarcha; mar-

quezes de Alvito, de Ficalho, de Fronteira, de Loulé, das

Minas, de Niza, de Pombal, de Ponte do Lima, da Ribeira,