236 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
sempre indispensaveis, parece-me que está breve a hora de não poderem com o peso das responsabilidades, que tão imprudentemente têem acarretado com a sua pessima administração.
Espero que o meu partido irá ao poder com as suas idéas e sem allianças que prejudiquem o seu programma; isto não ha de succeder, e se tal caso succedesse ao meu partido, eu seria o primeiro a abandonar as suas fileiras. (Apoiados.)
Sr. presidente, cabe-me n’este momento repetir aqui uma asserção, que, posto muitas vezes aqui tenha sido dita, nem por isso tem deixado de nos ser lançada em rosto como accusação; cabe-me já explicar um facto de que temos sido tão accusados.
Dizem os nossos adversarios que nós rasgámos o nosso programma quando apoiámos lealmente, como é sempre costume do partido progressista, o governo que v. exa. presidia. (Apoiados.)
Mas porque rasão o apoiámos nós?
Porque v. exa. não desmereceu, nem um apice, no conceito publico em quanto esteve no governo; porque nunca faltou áquillo a que se tinha compromettido, que tinha dito ao partido progressista, ao parlamento e ao paiz. (Apoiados.)
Porque v. exa., comquanto collocado no meio de uma situação bastante difficil, veiu ao parlamento e disse: «eu venho ao poder, mas o meu programma é o respeito ás leis e á moralidade». (Apoiados.)
Repito, pois, ainda, v. exa. fez o que tinha promettido, apesar das difficuldades que o rodeavam, e que lho tinham sido creadas peles seus antecessores. (Apoiados.) V. exa. teve sempre como lemma, como principal fundamento do seu programma, o exacto cumprimento das leis e o respeito pela moralidade. (Apoiados repetidos.)
Por que rasão, pois, se accusa o partido progressista de ter quebrado o seu programma apoiando a v. exa.? Accusa-se, porque esse partido deseja o respeito pela lei e pela moralidade? Eu creio que por esse facto não podemos ser accusados, e antes, pelo contrario, devemos ser applaudido?. (Apoiados.)
Nós não podiamos exigir de v. exa. que cumprisse o nosso programma, nós não estavamos no poder, nem n’elle podiamos estar com v. exa.; mas seguia-se por isso que desconhecessemos os serviços que v. exa. podia fazer ao paiz, e fez no pouco tempo que ali esteve? Não.
Moralidade e exacto cumprimento das leis é o fundamento de toda a governação; estou certo que o sr. presidente do conselho não ha de escrever o contrario na sua bandeira, faço-lhe mesmo a justiça de suppor que seja a sua intenção seguir este preceito; mas o que é certo é que esse lemma que v. exa. procurou seguir tem sido desprezado por esta administração, e é para sentir que assim seja, e como desejo ser exacto, ainda que severo, direi que a culpa não é tanto dos ministros como da que os cercam. Os ministros são os que menos governam este paiz. Exas. são victimas de pequenos tyrannetes de provincia, dos ambiciosos de quem se servem para terem maiorias parlamentares, e a quem têem depois de ceder em todas as pretensões, por mais absurdas que sejam, e ai d’elles, que se não forem attendidos, vem depois descobrir todas as chagas de uma administração miseravel.
O sr. presidente do conselho cerca-se de uma atmosphera de lisonjas, que lhe faz obscurecer a vista para não poder chegar aos limites do horisonte, onde se encontram as necessidades do paiz.
O que digo, sr. presidente, poderia justifical-o, mas não gosto de apontar factos, porque não gosto de citar nomes.
O sr. presidente do conselho disse que não era facil aos governos exonerarem-se quando queriam, e disse tambem que não pedia obrigar as maiorias a fazerem a vontade de s. exa.
Não é tanto assim, notarei eu. Se o systema parlamentar entre nós estivesse posto em pratica, de maneira que a representação nacional fosse e resultado effectivo da verdade eleitoral, ou da consciencia publica, de certo eu acharia rasão ao sr. ministro; mas infelizmente não se dá esse facto. E devo aqui alludir ás repetidas nomeações de pares do reino feitas por esto governo. Todos os oradores precedentes que teem apreciado essas nomeações, abstrahiram dos nomes dos novos dignos pares, e creio que os meus collegas me hão de fazer a justiça de suppor que, se porventura não tivesse a convicção do quanto merecem da patria os cavalheiros nomeados, eu guardaria completo silencio a esse respeito; mas devo dizer que, posto não conheça particularmente alguns d’elles, a todos conheço todavia pelos seus actos na vida publica e por terem os dotes necessarios para pertencer a esta camara.
O sr. presidente do conselho sustentou que não tinha nada de notavel a nomeação dos novos pares, porque, depois de votada a lei, que difficultava a admissão ao para até per direito hereditario, era indispensavel estar constantemente a nomear pares por categorias, conformo ella determina. Isto é um sophisma, perdôe-me s. exa. D’aquelle modo parece que a responsabilidade da recente nomeação de pares do reino cabe mais ao sr. conde do Casal Ribeiro e aos outros cavalheiros que promoveram a reforma da camara, do que ao governo, que julgou existir agora a necessidade de a reforçar, augmentando o numero dos seus membros.
Eu entendo que aos corpos legislativos competem funções mais elevadas do que a de serem o Pantheon glorioso dos homens que se distinguem na carreira publica; essas funcções regulam se por principies que devemos estudar com um excellente mestre de direito constitucional, o reino de Inglaterra. Se o sr. Fontes fosse ministro d’aquella grande nação, e considero-o digno disso, por certo que não havia de ousar dizer em pleno parlamento que todos os annos nomearia a seu arbitrio o numero de pares que julgasse estarem na categoria precisa para poder alcançar essa dignidade.
Com esta doutrina de s. exa., a que fica reduzida a representação das maiorias das duas casas do parlamento, taes como se acham constituidas?. Pois acaso póde dizer-se que a camara dos senhores deputados só por si representa o sentir da nação? Pois as eleições d’aquella camara são tão cautelosamente feitas, e o governo abstem-se tanto de influir n’ellas, que possamos consideral-as a genuina expressão da vontade popular, e que se deva ter por completamente dispensavel este elemento da camara dos pares?
Pois algum de nós ignora as influencias que mesmo em circumstancias ordinarias rodeiam os governos quando se trata de eleger a camara dos srs. deputados?
Acaso não sabemos que essas influencias premiram em alto grau a opinião durante a existencia do actual ministerio, por isso que o paiz está cheio de centenares de tyranetes, que são como que representantes não officiaes, mas extra officiaes do governo?
Mas, dado mesmo o caso disto assim não ser, como ha de a camara avaliar do estado da opinião que quizer ter uma bitola para medir a importancia das graves accusações que se fazem ao governo na imprensa; a eleição deu maioria ao governo, a camara dos pares foi preparada para a dar ainda antes de se manifestar a opposicão, e pelo systema do sr. Fontes sel o-ha todos os annos, de maneira que os remedios que a constituição deixou ao poder moderador para conservar o equilibrio do poder, ficam por esta fórma inutilisados e inefficazes. Isto não póde ser; o sr. Fontes devia dizer-nos qual era e motivo constitucional que obrigava o poder moderador a nomear pares, e não se desculpem com a natureza da escolha e o merito dos individuos nomeados, e que não vem nada para o caso, e quanto a liberdade de eleições, lembra-me o que ha pouco tempo me dizia um cavalheiro muito da minha amisade, pertencente