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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 237

ao partido regenerador, que não nomearei, por. não ter assento em nenhum a das casas do parlamento.

Antigamente, disse-me aquelle meu amigo, faziam-se as eleições da seguinte fórma.

Em 1828, por exemplo, quando se mandou proceder á eleição dos tres estados, o governo expediu uma circular, que se acha impressa, em que só recommendava aos juizes de fóra que tivessem por bem proceder ás eleições, mas que deviam attender que os individuos suspeitos não era conveniente que fossem admittidos a votar.

De maneira que os juizes de fóra, no momento da eleição, tinham que dizer a qualquer individuo, de cujas idéas politicas desconfiavam: "O senhor é suspeito, e da parte de El-Rei intimo-o a não votar."

Na actualidade acontece quasi o mesmo. Agora é o administrador do concelho que deve entender nas suspeições, e o ministro do reino (ou quem faz as suas vezes, quando exerce estas funcções o sr. Sampaio) procede de modo que não destoa senão pela fórma do antigo regimen, haja vista a maneira por que se procedeu na eleições de Aveiro, mandando-se proceder duas vezes á eleição de certas corporações, em condições extra-legaes, mandando mesmo suspender a execução das leis, praticando emfim os actos, que aqui e na outra camara se discutiram com relação ás eleições de Belem; e depois de tudo isto, preparado o terreno, diz-se ainda ao administrador do concelho: "olhe que os povos hão de dar o seu voto a fulano, arranje-se como quizer; mas esse fulano é que ha de ser eleito; d'isso dependerá a sua carreira, o seu adiantamento n'ella".

E ahi tem v. exa. armado o campo da corrupção e da violencia; os que têem interesses dependentes da auctoridade, e são muitos; os que têem de lhe prestar contas de confrarias, como administradores; os que têem filhos recenseados ou a recensear; e os que, por pouco esclarecidos, temem demasiadamente a acção da auctoridade, e, mais ainda, as vinganças dos tyranetes ou mandões, que em grande escala se têem creado á sombra d'este governo, buscara o seu socego, abatendo a sua dignidade perante elles; concorrem com o seu voto para virem essas maiorias, que não são a expressão da vontade popular, mas sim da vontade ministerial.

E o que digo com relação a este governo póde applicar-se, em grande parte, a outros governos.

Hei de procurar sempre ser justo, e, por isso direi que quando os governos, sejam quaes forem, quando usam de taes meios para trazerem uma maioria ao parlamento, a camara electiva não representa verdadeiramente a escolha da nação, o remedio para isto está em grandes reformas, que o partido progressista menciona no seu programma, e que agora não seria opportuno desenvolver, mas que é sempre conveniente lembrar.

A constituição, imperfeita como é, procurou a correcção d'esse facto n'esta casa.

Não trato agora de saber se é efficaz ou não este meio de correcção, mas se a maioria da camara dos pares for todos os annos alterada para o governo ter, permitta-se-me a expressão, uma maioria de benevolencia e gratidão, então a efficacia do remedio constitucional desapparece, e creio que estaremos muito proximos de nos acharmos nas condições de um governo pessoal, e, longe de se poder considerar este corpo legislativo um elemento da representação nacional, será um poder pessoal de um homem ou quando muito de uma politica.

Não posso, por consequencia, adoptar a doutrina do sr. presidente do conselho, pelo contrario, rejeito-a e combato a com todas as insignificantes forças da minha intellicia.

Agora devo dirigir-me ao meu nobre amigo, o sr. Mártens Ferrão, para lhe dizer que tambem não concordo com a opinião de s. exa. ácerca do direito que temos do discutir as eleições da camara dos senhores deputados.

Sempre respeito a grande intelligencia, saber e elevação de caracter de s. exa., e quando houver duvidas sobre materia de direito, necessariamente me hei de sujeitar ao criterio do meu illustre amigo e collega; mas em materia politica permitta-me que discorde, pois não posso concordar com a sua doutrina.

Vejo que o artigo 139.° da carta constitucional, que não sei se já foi executado alguma vez n'este paiz, nos dá o direito de apreciar por esta fórma a politica do governo quando a não façamos de modo mais efficaz como devia ser.

Esse artigo diz assim:

"As côrtes geraes, no principio das suas sessões examinarão, se a constituição politica do reino tem sido exactamente observada, para prover como for justo."

Creio que nós ainda não cumprimos este preceito da carta.

Parece incrivel que desde a sua outorga, esteja sem ser cumprido um artigo d'ella.

Mas, se olle não foi cumprido, não nos prohibam ao menos o exercicio do direito incontestavel que temos de apreciar a politica de qualquer governo, no exercicio mais ponderoso das suas funcções, qual é o de manter illeso o suffragio do povo, fundamento de todo o nosso direito constitucional.

Desculpe-me o digno par e meu amigo esta minha franca exposição, mas não posso deixar de ver a questão por esta fórma.

O meu amigo, o sr. Costa Lobo, citou hontem aqui um exemplo da mestra constitucional - a Inglaterra - eu quizera que ali fossemos aprender a salvaguardar a liberdade da urna, e tornando a referir me á nomeação de pares lembra-me uma anedocta, que não posso dizer precisamente aonde vem, mas que é exacta.

Quando a camara dos lords n'uma questão altamente importante estava empenhada n'um debate em que o governo se via em perigo de largar as pastas perante ella, houve um ministro que teve a imprudencia de dizer á camara, que ella podia receber em seu seio, por nomeação regia, um certo numero de pares, que alterasse a sua feição.

Foi combatida altamente esta lembrança, e até se duvidou, que o governo podesse n'uma occasião d'estas fazer entrar uma porção de pares na camara, a fim de alterar a sua feição, antes da votação; levantou-se então um dos membros da opposição e disse: "é tão ponderoso este acto, e é tão perigoso para a causa publica, que eu lembro á camara a conveniencia de antes fazer a vontade ao governo do que collocar a corôa na triste posição de alterar a nossa feição politica antes de uma votação e portanto sem condições politicas que justifiquem o exercicio do poder moderador." Lembro isto, não á esclarecida intelligencia do sr. presidente do conselho; mas para auxiliar a sua memoria, a fim de não continuar a abusar d'esta elevação ao pariato de caracteres aliás muito conspicuos, porque póde attribuir-se ao governo o desejo de querer nomear a sua maioria todos os annos, unicamente pelo facto de irem arrefecendo as disposições dos seus amigos mais dedicados. E já que fallo na disposição que vão tomando os amigos mais dedicados do governo, devo dizer, que não estranho esta posição; o quando eu disse que a posição que tinha hoje era a que tinha hontem disse a verdade, porque tenho sido sempre opposição a este governo desde o primeiro dia da sua existencia. Com isto não quero irrogar censura áquelles cavalheiros, que num dia apoiam dedicadamente qualquer situação, e que nobremente desareigados das affeições que os ligavam aos ministros, e da dedicação partidaria de que por tantos annos foram a força mais possante da situação, saltam por cima d'estas considerações, e cheios de vigor pelo amor da patria, e attendendo ao grito da sua consciencia, depois de terem feito digna e nobremente todas aquellas reflexões que a amisade aconselha, e a politica exige, rasgam essas conveniencias politicas, porque acima dos partidos está a patria, acima d'essas convenien-