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248 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

hereditariedade; mas na Inglaterra as leis civis muito ajudam a conservação da propriedade na familia, que é um elemento de força e riqueza, embora não haja ali morgados, porque na Inglaterra a aristocracia é uma grande realidade, não a aristocracia puramente de raça, porque essa aristocracia quasi acabou em toda a parte. Lord Beaconsfield, por exemplo, esse grande homem d'estado, que de certo não representa a aristocracia de raça, é um membro importante da aristocracia ingleza, apesar de uma origem nada aristocratica. Mas a aristocracia ingleza é uma força real na sociedade, porque tem muita propriedade e muita illustração, e os lords educam já os seus filhos para homens d'estado.

Entre nós não acontece precisamente o mesmo, nem acontecia já quando a carta foi outorgada. Entre nós a aristocracia, embora representasse gloriosas tradições, que eu respeito, porque não desprezo nenhuma boa tradição, ainda que essa tradição, no sentir estreito de alguns, não esteja em perfeita concordancia com o chamado espirito do seculo, e porque eu considero as tradições gloriosas como um incentivo para que os homens novos sigam os exemplos aos seus maiores, a aristocracia entre nós, digo, não era igual á de Inglaterra, e estava já em decadencia.

É verdade que tinhamos os morgados, os vinculos, mas estes serviam para arruinar a aristocracia, porque o vinculo é a negação da liberdade de testar, emquanto o praso de livre nomeação era inteiramente o contrario. (Apoiados.) A liberdade de testar é a confiança no poder paternal, o vinculo é a negação d'essa confiança. (Apoiados.)

O codigo civil não mostra demasiada confiança no poder paternal, e eu sinto que não a mostrasse (Apoiados.) como sinto que tivesse acabado com os prazos de livre nomeação e com a subemphyteuse.

Eu não sei se estas questões são mesquinhas, pequenas, insignificantes, rachiticas; mas, permitia-me a camara que me occupe d'ellas, e que por alguns momentos prenda n'ellas a attenção demasiadamente benevola dos que me escutam. Eu entendo que os vinculos foram bem abolidos; mas, repito, sinto quer fossem os prazos de livre nomeação, porque estes representam a liberdade de testar. (Apoiados.)

Ninguem ignora que na provincia do Minho uma grande parte da propriedade era constituida em prazos de livre nomeação, e essa provincia é a parte mais rica e mais formosa do nosso paiz. Bem sei que ha outras cousas de superioridade economica d'aquella provincia; ha a abundancia de agua e de estrumes, e quem tem muitos estrumes tem muitos pastos, e quem tem muitos pastos póde ter muitos gados.

Bem sei que estas questões para aqui não prestam, o que presta é a questão de saber quem ha de estar no governo. (Riso - Apoiados.)

Que importa isso?

Que importa os porquês da riqueza ou da miseria das provincias do reino?

Pois bem, eu creio que o Minho não se dava mal com os prazos de livre nomeação, como não se dá mal com as suas abundantes e feritlissimas aguas e com os seus excellentes pastos; e por isso sinto que o codigo tivesse acabado com os prazos de livre nomeação, e tambem com a subemphyteuse, e tambem com os laudemios nos emprazamentos de futuro, pois que, sem faculdade de estabelecer laudemio, nenhum incentivo tem o proprietario para aforar, sendo como é o aforamento o meio mais conducente a tornar o proletario proprietario, e conseguintemente a desamortisar a propriedade.

Isto que a rasão está ensinando é tambem o que ensina a nossa historia patria.

E a emphyteuse foi por isso, era valiosos escriptos, sustentada e defendida por um sabio, que já não existe! Foi sustentada por um vulto grandioso, a quem Portugal inteiro prestou tributo de respeito pela sua abnegação; historiador dos mais illustres entre os do nosso tempo e de todos os tempos, historiador entro todos rarissimo, pois que, foi elle ao menino tempo o monge que desenterra e traduz os pergaminhos damnificados pelo pó dos seculos, o claro narrador dos feitos de antigas eras, e o critico, o phiiosopho que agrupa os factos, que os condensa e systematisa, e d'elles deduz as leis que no seu progredir regem a humanidade. E alem d'isto, Alexandre Herculano, era mais ainda; era a probidade, a austeridade, a honradez personificada. (Apoiados.)

Veiu tudo isto para dizer que a nossa legislação civil, tal qual foi em outros tempos, e mais tal qual hoje se encontra, é de certo menos favoravel, do certo acompanha menos correctamente o principio da hereditariedade do pariato, do que o acompanha a legislação ingleza.

É claro, portanto, que grande parte de rasão assistia aos que impugnavam entre nós o principio da hereditariedade, não o encontrando em condições analogas áquellas em que se encontra na Inglaterra.

A camara dos pares não esperou pelo espirito do seculo, como imprudentemente disse este governo em 1872; não esperou que esse espirito do seculo lhe descarregado o machado reformador; a camara dos pares tratou de se reformar a si propria, seguindo o exemplo do veneravel D. Fr. Bartholomeu dos Martyres, que aconselhava aos principes da igreja no concilio de Trento: "Comecemos por nos reformar a nós mesmos, porque os reverendissimos cardeaes e os reverendissimos prelados precisam uma reverendissima reforma".

Foi o que nós fizemos, sem sermos cardeaes nem prelados. Para estarmos em maior concordancia com as idéas do progresso, reformarão nos; não precisando que o espirito do seculo viesse aqui peia porta dentro o nos manda-se embora para sermos substituidos por outra camara organisada segundo o principio electivo, principio a respeito do qual tenho grandes duvidas que possa sempre significar a independencia do eleito e a expressão da livra o razoavel vontade do eleitor, duvidas que hei de manifestar, quando me referir ás eleições de deputados ultimamente feitas em Castello Branco, Belem, Torres Vedras, Arruda e n'outros pontos do paiz.

Ha de ser-me permittido, como sempre foi, entrar na discussão d'esse assumpto. Não tratarei da validade d'essas eleições, porque é negocio da competencia da outra casa do parlamento; mas tenho direito de apreciar a responsabilidade do governo pelos actos que n'ellas o por causa d'ellas praticou.

Não cedo um palmo nem uma linha das minhas attribuições como membro d'esta camara, por mais respeitavel que seja o caracter do individuo que n'essa parte me contrarie.

Não olvidei ainda as tradições e os procedimentos do conde de Lavradio, do conde da Taipa, do marquez de Sá, do duque de Palmella, de Rodrigo da Fonseca, e do outros tantos que se occuparam de questões similhantes quando tratavam de apreciar a politica geral do seu paia, e quando impugnavam energicamente, a todo o transe, a situação politica presidida pelo sr. conde de Thomar, situação com que a actual tem grandes analogias, salva a energia da palavra e a energia da acção.

(Movimento do sr. presidente do conselho.)

Sim, porque a energia da palavra vem da energia das convicções, e corresponde á energia da acção. Seria esta, sem convicções profundas, a palavra póde ter abundante e sonora; energica nunca.

Portanto, não retiro a phrase. O sr. conde de Thomar, estadista notavel, revelou grandes qualidades de homem de governo, mas teve tambem a cegueira do poder, deixou-se allucinar pelo seu demasiado espirito conservador de si mesmo. (Apoiados.)

N'isto é que eu vejo a analogia com a situação actual.

O espirito da lei, restringindo na applicação o principio hereditario do pariato, foi acrescentar a força moral, o va-