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SESSÃO N.º 23 DE 7 DE MARÇO DE 1992 5

"Em terceiro logar que nenhum official de carta possa accumular em si dois officios da minha real fazenda, nem dois ordenados nas folhas d'ella, declarando os como declaro por incompativeis e prejudiciaes á paternal clemencia com que procuro que os effeitos da minha real benignidade cheguem ao maior numero de necessitados benemeritos, que couber no possivel.

"E tudo debaixo da pena de perdimento dos officios e inhabilidade, para entrar em outro. - EL REI. = Conde de Oeiras".

Digam-me se estas disposições são ou não justissimas e se mais adequadas as póde haver para a situação em que nos encontrámos. Se as subsistencias estão caras e se escasseia o trabalho, mais uma rasão para desaccumular os serviços. O argumento que refuto é, pois, contraproducente.

Já em tempos li á camara uma lista das funcções desempenhadas por certos individuos que são pares ou deputados. Aqui a tenho ainda, e d'ella lerei parte, mencionando apenas os cargos, e omittindo os nomes.

Por exemplo {lendo). Ha par do reino que, é ao mesmo tempo lente aposentado, de uma escola superior; director aposentado de um serviço importante; director geral de um ministerio e membro de um conselho consultivo.

Ha deputado que é ao mesmo tempo lente da escola polytechnica; lente do instituto; vogal do conselho das alfandegas; inspector das alfandegas e vogal da commissão da manutenção do estado; exercendo ainda diversas commissões no estrangeiro. E ha outros. Aqui estão, com sete e oito empregos.

Porque? Porque, sr. presidente?!

Cumpram-se as disposições dos alvarás de D. João IV e do marquez de Pombal.

Referiu-se o digno par o sr. Antonio de Serpa ás côrtes constituintes de 1820, a que pertenceram os: grandes patriotas Borges Carneiro, o illustre pae de s. exa. e o avô do sr. Margiochi.

Pois a primeira cousa que fizeram as constituintes de 1820 foi tratar de uma lei de incompatibilidades.

Diz, porém, é digno par que estes homens eram respeitaveis, é certo, mas eram theoricos?! Ora eu peço á camara que compare a situação de 1820 e a moralidade que havia então n'este paiz, com a situação do para actualmente, e a moralidade que actualmente existe. D'essa comparação ver-se-ha bem que não se trata unicamente de uma questão theorica.

Mas ha mais. Trinta annos depois d'aquella epocha, passou-se na camara dos deputados um facto que vem corroborar o que eu acabo de dizer. Foi nada mais e nada menos do que um facto succedido com o pae do actual, sr. ministro dos estrangeiros, o sr. Costa Lobo, que era caixa claviculario do contrato do tabaco. Era um homem de excellentes qualidades, notavel pela sua philantropia; todos o adoravam, más apesar das suas altas qualidades, puzeram o fóra da camara. A proposito d'esse facto houve larga discussão, na qual tomaram parte os primeiros oradores da camara, como Garrett, Rebello da Silva, Holtremann e José Estevão.

Eu tenho aqui as palavras d'este illustre tribuno; não lerei os discursos de todos, porque todos disseram mais ou menos a mesma cousa. José Estevão disse, e com elle Garrett, que não se podia admittir na camara um individuo, apesar da respeitabilidade do seu caracter, que fosse director de qualquer companhia, porque esse individuo não podia ter independencia bastante para resolver sobre qualquer negocio de que porventura a camara tivesse de tratar. Isto não era insinuação ao caracter d'aquelle illustre cavalheiro; era apenas uma prevenção da lei.

Quem póde duvidar do caracter e das boas intenções de José Estevão e Garrett?

Eram uniformes as suas opiniões, e por isso apenas farei transcrever no meu discurso o extracto do discurso do grande José Estevão:

É o seguinte:

"Que estavam empenhados n'uma questão de principios e que apesar dos esforços que se faziam para livrar o parlamento das influencias politicas e das companhias, ainda esta questão apparecia.

"Referindo-se a 1846 declarou que já em tempo se inseriu na lei o principio das incompatibilidades, ainda que essa resolução custou a levar a effeito. Que em 1848, quando se tratou de fazer a lei eleitoral, appareceu a mesma lucta. Que o pensamento do decreto a tal respeito, era separar do parlamento as influencias das companhias, para o deixarem livre de exigencias pessoaes no exercido de legislar e arredar as suspeitas de que elles tinham alguma influencia nas suas deliberações, mas que para o conseguirem era preciso que houvesse força e tenacidade. Que elle e os seus amigos não abdicavam das suas idéas."

Pois é o que eu faço agora.

Como a historia é rica d'estes exemplos, e eu não posso prescindir da historia, porque ella é que justifica 5 dá rasão ao meu projecto, vou citar alguns dos modernos.

Em 26 de março de 1873 foi o sr. Fontes bem mal tratado na camara dos senhores deputados (o meu illustre amigo o sr. Serpa deve lembrar-me) e parece-me que ainda hoje vejo o seu busto, que está ante mim, estremecer indignado sobre o seu pedestal, recordando-se da acre moção de suspeição que então se apresentou.

Farei transcrever uma parte do discurso com que o fallecido Saraiva de Carvalho precedia a apresentação da sua moção:

Dizia o sr. Saraiva de Carvalho:

"Não será porventura verdade que certas incompatibilidades devem estar, ou antes, estão promulgadas na consciencia de todos, embora o não estejam na lei positiva? Não tem a moral publica as suas exigencias? Eu entendo, sustento que ha incompatibilidade moral entre o cargo de ministro da corôa e o de administrador de companhias subsidiadas e dependentes do governo. (Apoiados.)

"Não admittimos que haja ministros com as duas naturezas de ministros da corôa e de administradores da companhia dos caminhos de ferro! (Muitos apoiados.) Ê isto uma suspeição; e aos olhos do publico torna-se ella mais grave, pelo facto dos accordos com a companhia dos caminhos de ferro de norte e leste serem uma especie de morgado dos ministerios regeneradores! (Muitos apoiados)"

Quem administra agora esses morgados?...

A moção é a seguinte:

"Considerando que em todos os negocios relativos a emprezas ou companhias, que tenham dependencias do governo e do parlamento, é absolutamente necessario, que os que hajam de lhes conceder vantagens e estipular segurança a para o estado, não tenham os seus interesses ligados com os las companhias e empresas cujas pretensões têem de examinar e decidir perante o direito ou a equidade, sem a menor sombra de affeição ou desfavor.

"A camara, lamentando que os interesses da companhia dos caminhos de ferro portuguezes, fossem antepostos aos do estado e menosprezados os rigorosos preceitos da moralidade, essenciaes na governação publica, passa á ordem do dia,

"Sala, das sessões, 26 de março de 1873. = Saraiva de Carvalho = Marianno de Carvalho = Pinto Bessa = Bandeira Coelho = Pereira de Miranda = Silva Mendes = Francisco de Albuquerque."

Diga-me a camara que significação tem esta moção?... Ella deu até logar a que o sr. Fontes, em uma das suas phrases felizes, dissesse que certas insinuações nem chegavam a edameal-o, pois as repellia com o bico da sua bota.

Por essa occasião levantou-se o sr. José Luciano de Cas-