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SESSÃO N.° 19 DE 24 DE NOVEMBRO DE 1894 233

D’ahi é que veiu tudo.

Disse-se primeiro que foi o cambio do Brazil.

Oh! sr. presidente, pois o cambio do Brazil é que foi aos bancos e roubou o que lá estava?!

Nada de illusões, e não se pretenda lançar poeira nos olhos do povo.

Sr. presidente, eu tenho aqui defendido a monarchia sem a lisonjear, e defendido dizendo a verdade.

Eu disse ao Senhor D. Luiz, que desejou consultar-me sobre a reforma d’esta camara como sabem alguns que ainda estão vivos, eu disse a Sua Magestade:

Senhor: O povo não lhe importa que a camara dos pares seja composta de pares electivos ou vitalicios, o que a elle importa, e muito, é que as auctoridades nas vesperas das eleições não lhe vão bater á porta e dizer-lhe que se não votar em tal lista ha de ser multado, ha de fazer-se-lhe penhora e a sua mobilia posta no meio da rua. Isto é que ao povo importa, e tambem com outras ameaças que os influentes e empregados lhe fazem quanto a recrutamento.

Por esta occasião tocarei, ainda que de leve, em materia de reforma eleitoral.

Sr. presidente, é necêssario pôr cobro a esta decadencia moral e social, é necêssario uma nova lei eleitoral.

Eu desejo uma lei eleitoral com votação bem diversa das que temos tido. Quero votação por classes; negociantes, commercio, proprietarios, ecclesiasticos e operarios.

Venham tambem os operarios, venham os advogados, venham homens independentes, porque talvez assim se economise muito dinheiro.

Ha uns certos especuladores que apanham dinheiro aos governos e depois dizem muito mal d’elles.

È preciso uma nova lei eleitoral, e para isto organisem-se umas côrtes constituintes como fez o sr. Fontes quando ultimamente pretendeu reformar alguns artigos da carta constitucional.

Tambem acho de grande necessidade reformar o conselho d’estado, o qual, como está, mais parece um conselho de familia.

Os conselhos de familia são necessários nos tribunaes para intervirem em certos casos; mas o conselho d’estado não póde ter uma organisação identica.

Tambem eu julgo necêssario assegurar ainda mais uma melhor situação ao poder judicial.

Eu fui sempre de opinião que nós devemos elevar o mais possivel a situação dos juizes, melhorando-a em beneficio de todos nós. O poder judicial é muito mal recompensado entre nós.

Os juizes têem na sua mão as nossas fortunas; não digo a nossa vida, porque actualmente não ha pena de morte; mas têem gravissimas responsabilidades e têem dado provas da maior independencia, e ao mesmo tempo de conhecimentos profundos, porque lá estão os accordãos publicados nos jornaes de jurisprudencia e no Diário do governo.

Agora, voltando á reforma do conselho d’estado.

O conselho d’estado devia e deve ser augmentado para que os homens eminentes, sem olhar a partidos, sejam ali representados para discutirem os negocios importantes da nação na presença do chefe de estado.

E deveria haver uma ou mais secções do dito conselho para prepararem projectos de lei, reformas e regulamentos para serem apresentados ás camaras legislativas, sendo assim um corpo consultivo, politico e administrativo, e poderoso auxiliar dos governos e advogado dos interesses legitimos dos povos e do estado, e por outro lado um corpo politico que aconselhe o poder moderador.

Sr. presidente, nas nossas provincias ha muita illustração e muita independencia, e eu posso dar d’isso testemunho, e é minha opinião que muitos d’esses homens honrados devem ser aproveitados na administração dos negocios publicos por suas aptidões, honradez e independencia.

Vou-me referir a dois feitos notaveis que provam a confusão que reina na nossa administração politica.

O sr. Antonio Ennes é um homem de grande illustração, reconhecida por todos, já foi ministro da marinha e ha pouco publicou um relatorio, no qual diz que pela secretaria da marinha tem-se gasto muito dinheiro com cousas que nada têem com o ultramar.

Eu fico admirado, e sobretudo o que mais me admirou foi o que disse outro dia o sr. Thomás Ribeiro, que já foi ministro por tres vezes, já foi ministro do reino, da justiça, das obras publicas e dá marinha, disse-nos que quando foi ministro da marinha lhe tinham pedido que nomeasse governador para o ultramar um homem que estava condemnado em todas as instancias como ladrão, e havia outro que era contrabandista e até vendia os creados. Como, porém, o sr. Thomás Ribeiro o não nomeasse, foram dizer ao sr. Fontes que elle não servia para ministro, que não era bom para os amigos.

Depois o sr. Thomás Ribeiro saiu do governo, e passado tempo esses homens foram nomeados para governar nas nossas provincias do ultramar.

Sr. presidente, se fosse vivo o padre Antonio Vieira recordar-se-ía do sermão do bom ladrão em que se diz, fallando em geral de gentes incapazes que mudavam os seus governos para o ultramar, e dizia o illustrado padre: «Se querem favorecer certos homens dêem lhe tenças, mas não os mandem desgovernar as nossas colonias e note-se que só alludia aos incapazes.

Isto dizia o padre Antonio Vieira, um talento profundo, um theologo e politico de primeira força, que conhecia bem o mundo.

Sr. presidente, é preciso saber-se que não foi nenhum dos actuaes ministros que nomeou taes homens. É preciso mudar de vida.

Aonde está esse fogo sagrado que outr’ora abrazava tantos nobres corações? Aonde está esse amor das generosas idéas?

Parece que a alma perdeu os seus vôos e o coração os seus enthusiasmos. Esta epocha parece ter esquecido todas as glorias e extinguido todos os perfumes da vida, substituindo-lhe os frios calculos do egoismo, a sêde do bem estar e a adoração do bezerro de oiro. No seu esteril orgulho apenas conquistou o desespero, apenas abraçou a morte e apenas produziu o nada.

Creio ter provado com a rasão, com a historia e com a auctoridade, que necessitámos de mudar de processos politicos e administrativos para restituir o credito e a prosperidade ao nosso paiz. Quando a priori o não tivesse provado quanto aos principios, de certo a posteriori e com relação aos factos, sem duvida demonstrei que o modo por que se tem governado tem conduzido o paiz á banca-rota e os povos ao mais lamentavel estado. Cumpre emprehender a cruzada da restauração nacional. Quem será o homem que se colloque á frente d’este emprehendimento salvador? Quem será elle e quando apparecer clamarei eu: Quis est hic et laudabimus eum. Salvemos a patria. Venerandas cinzas dos heroes d’esta nação. Junto ás urnas que encerram estes preciosos despojos, ajoelhados e com respeito invoquemos o espirito dos heroes, cujos gloriosos exemplos por nós imitados poderão salvar o nosso Portugal, outr’ora. vencedor e hoje vencido e -vilipendiado por audaciosos estranhos e por deshonrados filhos. Gloriosos varões, que illustrastes o paiz com as vossas pennas, que o honrastes com as vossas façanhas, que o exaltastes com os vossos serviços e que o fizestes respeitar por os exemplos honrados que nos legastes em vossos testamentos de gloria, que salvastes com a vossa coragem a nossa autonomia e a nossa independencia nacional. Possa a recordação do vosso heroismo inspirar-nos na grande e gloriosa lucta, que salve o paiz dos seus inimigos e restitua á nossa patria a ventura, a ordem e o respeito. Combatamos sem quartel, corramos aos baluartes para nos em-