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N.° 19 SESSÃO DE 24 DE NOVEMBRO DE 1894

Presidencia do ex.mo sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios — os dignos pares

Conde d’Avila

Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. — Correspondencia. — O digno par Jeronymo Pimentel manda para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao ministerio do reino.

Ordem do dia: continuação da discussão do projecto de resposta ao discurso da corôa. — O digno par marquez de Vallada usa Iargamente da palavra, sustentando uma moção que manda para a mesa. Foi admittida á discussão. — O digno par Jeronymo Pimentel requer que se consulte a camara para que se prorogue a sessão até se votar o projecto. E approvado o requerimento do digno par. — Usam da palavra sobre a ordem os dignos pares Bernardino Machado e Antonio Candido. Responde aos dignos pares o sr. presidente do conselho. — O sr. presidente annuncia que, em conformidade com o regimento, será votado em primeiro logar o projectoe depois os additamentos. — O digno par Telles de Vasconcellos pede á camara lhe permitta retirar a sua proposta. Consultada a camara, resolveu affirmativamente. — O digno par Antonio de Serpa declara, em nome da commissão, quaes os additamentos que ella póde acceitar, propondo que a moção do sr. marquez de Vallada fique para ser apreciada em occasião opportuna. — O digno par Costa Lobo dirige uma pergunta ao governo, respondendo-lhe o sr. presidente do conselho. — Lido na mesa o projecto, é approvado. — São approvados os additamentos dos dignos pares D. Luiz da Camara Leme e Vaz Preto, e rejeitados os dos dignos pares Baptista de Sousa e Costa Lobo. — A camara decide que a moção do digno par marquez de Vallada seja opportunamente apreciada. — O sr. presidente levanta a sessão, designando a seguinte e a respectiva ordem do dia.

Ás duas horas e um quarto da tarde, achando-se presentes 22 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Leu-se a acta da sessão precedente, que foi approvada sem reclamação.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Officio do sr. ministro do reino, incluindo uns documentos, em satisfação do officio da secretaria d’esta camara, n.° 27, de 20 do corrente mez.

O sr. Presidente: — Estão inscriptos os seguintes dignos pares:

(Leu.)

Tem a palavra o digno par o sr. Jeronymo Pimentel, visto não estar presente o sr. Rocha Peixoto.

O sr. Jeronymo Pimentel: — Sr. presidento, limito-me a mandar para a mesa um requerimento pedindo,.pelo ministerio do reino, alguns documentos a fim de poder discutir a proposta de lei apresentada á camara dos senhores deputados sobre a instrucção primaria e secundaria.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o requerimento mandado para a mesa pelo digno par o sr. Jeronymo Pimentel.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

Requerimento

Requeiro, que seja pedida ao ministerio do reino uma nota da frequencia, por disciplinas, nos ultimos cinco annos, nos lyceus de Lisboa, Porto, Coimbra, Braga, Evora

ë Ponta Delgada, e do rendimento proveniente das matriculas e exames n’aquelles lyceus, no mencionado periodo, e da despeza que cada um d’elles custou ao estado.

Camara dos pares, 24 de novembro de 1894. = Jeronymo Pimentel.

Foi mandado expedir.

O sr. Presidente: — Tinha agora a palavra o sr. Coelho de Carvalho, mas como s. ex.a não está presente, e ninguem mais se acha inscripto, vae passar-se á ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de resposta , - ao discurso da corôa

O sr. Presidente: — Tem a palavra sobre a ordem 0 digno par o sr. marquez de Vallada.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, eu pedi a palavra sobre a ordem para enviar para a mesa uma moção para ser junta á resposta ao discurso da corôa, a favor do qual eu voto, mas juntando-lhe a minha moção.

O meu primeiro dever é ler a moção que está por mim escripta ha dois dias.

«A camara dos dignos pares exultará, e com ella o paiz, se vir, como espera, que o governo do reino, amestrado pelos dolorosos ensinamentos da experiencia, procurará de uma maneira efficaz levantar o credito nacional, restituin-lhe o seu antigo brilho e valia por meio de medidas promptas e efficazes, em ordem a tornar impossivel a repetição dos monumentaes escandalos que produziram a ruina do paiz e a desgraça de tantas familias, reduzindo-as á miseria e á fome.

«N’esta ordem de medidas urgentes se comprehendo sem duvida o castigo severo áquelles que por meio de criminosas especulações e explorações, se locupletaram com a pujança alheia, offendendo o paiz nos seus legitimos interesses, e muito especialmente os bancos e companhias que reduziram ao mais lastimoso estado.

«Já d’est’arte e por estes meios se restabelecerá o respeito ao principio da auctoridade e se fortificará o credito nacional com grande proveito para a nossa patria e para a conservação das nossas instituições; e o governo do paiz poderá assim emprehender nobres e honrados commettimentos salvadores em beneficio da nação, da monarchia, da ordem e da liberdade.»

Tenho a honra de enviar para a mesa a minha moção de ordem.

Sr. presidente, eu voto a resposta ao discurso da corôa que está assignada por v. ex.a e pelos dignos pares os srs. Antonio de Serpa e José Luciano.

Apesar de eu não folgar tanto como s. ex.as...

Eu misturo o folgo com o lamento. O folgo vem no indicativo, e a mim parece-me que deveria vir no conjunctivo ou no futuro.

Eu folgarei ou folgaria, se porventura nós tivessemos a esperar alguma cousa. E um voto que formo com maiores desejos do que esperanças.

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Eu uso da palavra «exultar» em logar da palavra «folgar», significando uma alegria hypothetica que eu desejaria que se tornasse real e verdadeira.

Mando a minha moção para a mesa.

(Pausa.)

O sr. Presidente: — A moção é lida depois do discurso do digno par.

O Orador: — Eu aguardava as ordens de v. ex.a

Sr. presidente, a cegueira dos politicos é seguramente a ruina das nações.

Não se curam os males dos estados nem com os impetos de audacioso, nem com as esperas de acanhado.

Não ha perigo, é a voz da imprevidencia.

Não ha remedio, é o grito do desalento. Não seja, pois, a imprevidencia a nossa partilha, nem o desalento o nosso apanagio.

A prudencia nas deliberações, com a firmeza nos desempenhos, é a pedra de toque dos bem avisados politicos e dos precatados patriotas.

Tres são as fontes de certeza para o individuo: a rasão, a auctoridade e a historia.

Quando a rasão affirma o que a historia nega e a auctoridade condemna: «ha incerteza, ha duvida, ha perplexidade na convicção humana».

Quando, porém, a rasão, a auctoridade e a historia confundem os seus testemunhos em favor de um principio ou da apreciação de um facto, então esse principio ou a apreciação d’esse facto sáe da esphera das verdades contingentes e passa á classe das verdades absolutas; deixa a região dos principios problemáticos e eleva-se á altura dos principios eternos.

Encaremos a politica como uma sciencia sublime e ao mesmo tempo clara.

Nunca em tempo algum foi mais urgente a propagação d’esses estudos moraes inspirados por uma elevada metaphysica social que é ao mesmo tempo uma luz do espirito e um nervo do coração.

Mas, sr. presidente, no meio d’esta confusão geral dos espiritos, d’este desvairamento das paixões politicas em que a fraqueza dos expedientes tem vindo substituir a robustez dos systemas, quando o poder da ficção procura reconquistar um imperio que julgavamos abolido, quando a audacia do facto consummado procura subjugar a santidade do direito, é difficil escolher logar seguro em campos aonde sómente os interesses mesquinhos triumpham e de onde a verdade e a justiça desapparecem e fogem.

Tristes verdades que a experiencia quotidiana confirma, que a historia regista, e que a consciencia dos bem avisados profundamente deplora.

Mas que vemos nós em roda de nós? Estamos em um perfeito campo de batalha, em que os exercitos ora se approximam, ora se combatem ou se confundem. Erguem-se os clamores de alerta que ás vezes se confundem com os mandados de silencio. Como, porém, distinguir as cores das bandeiras, se umas estão enroladas, se outras estão por terra?

O povo está fatigado de vãs promessas: anceia pelas realidades. Quer obras que salvem e não palavras que soem.

São as obras os melhores pregoeiros dos sujeitos.

Na sua linguagem elevada, exclamava Cicero, o principe da tribuna: «Quid est enim civitas nisi juris societasn».

E que nos diz a historia patria, e ouvida ella, inspirar-nos-ha que esta terra é a sociedade do direito?

Não, a historia diz-nos que é a sociedade do avesso, diz-nos que a nossa sociedade é a sociedade de interesses illegitimos e de pretensões escandalosas; e a rasão, avaliando os factos que a historia aponta, robustece a nossa affirmativa, e a auctoridade sanccionando-a, pronuncia-se por o nosso julgado.

Differentes imagens se apresentam ao meu espirito contristado. Afigura-se-me ver um galeão ingente sulcando encapeladas ondas, com ventos contrarios, em mar borrascoso, em noite medonha. O commandante já abandonou à direcção do barco; não tem bussola que o guie, não tem luz que o alumie. O terror apoderou-se da guarnição, a incerteza invade os espiritos, e a confusão presagia o naufragio.

E uma visão que passa, mas é uma impressão que fica.

A ‘tempestade devasta toda uma região, o relampago alumia as collinas, os raios precipitam-se nos valles e as trevas com suas tristezas quasi fazem succumbir os nossos espiritos com o desalento que asphyxia e com o terror que mata.

Mas quem sabe se ao cabo de tanto labutar e ainda envolvidos em espessas trevas similhantes á sombra da morte não enxergaremos ao longe uma luz que nos guie a abrigo de segurança e que seja como o vulto da esperança erguido sobre a lousa de um sepulchro.

Trabalhemos, pois, com ardor, e confiados na Providencia não se nos apagará na alma o ultimo clarão de esperança.

Sr. presidente, quando contemplo o trabalho consciencioso e ao mesmo tempo energico de tantos homens de estado que grangearam com a sua poderosa iniciativa brilhantes paginas na historia das nações, entristece-se o meu espirito quando contemplo o rebaixamento da nossa politica que não é inspirada nos principios salutares da justiça e dos interesses dos povos, mas se consubstancia na satisfação de interesses illegitimos, de protecção escandalosa e criminosa dos exploradores e especuladores que para saciar a propria cobiça, escudados com a impunidade, patenteiam a sua ousadia defraudando os bancos, as companhias e atacando d’est’arte os interesses legitimos, que por serem legitimos se convertem em direitos manifestos de tantas individualidades que têem reduzido á miseria e á fome e de tantas companhias que têem destruido e aniquilado.

Aonde está o banco lusitano? Aonde o banco do povo? Em que estado se encontra a companhia real dos caminhos de ferro do norte e leste e a companhia nacional de Foz Tua?

É mister que acabe esta impunidade que se traduz em inteira protecção para os ladrões e para as ladroeiras; e tambem se invocarão rasões de estado para esta protecção. aos crimes e para este incitamento a criminosos?

E mister accentuar bem claramente que a segurança do estado exige uma mudança completa nos seus processos politicos e administrativos; inaugurando-se uma verdadeira restauração da sciencia politica, que se assimilhe a um balsamo salutar e benefico que possa curar as feridas que os nossos homens politicos, por sua má orientação, descuido ou cumplicidade, têem permittido se tenham feito no nosso corpo social, nas pessoas que o compõem e de que tem resultado o descredito do paiz, a ruina das familias e sómente o bem estar de um punhado de syndicateiros e agiotas que já de ha muito deviam estar na penitenciaria ou no degredo.

A patria carece de prompta reforma, tão necessaria ao bom funccionamento das instituições e tão util ao povo e ao monarcha.

E preciso que fique bem claro que a protecção que se tem dado aos devastadores dos bancos e das companhias é crime de lesa-nação, e que só póde ser nocivo aos interesses do estado. A ladroeira não póde ser a base do throno de um Rei nem o estrado em que assente a cadeira do um chefe de republica.

Executem-se as leis, e se as não houvesse, deveriam fazer-se; mas legem habemus. Não se occultem inqueritos, e patenteiem-se aos juizes para que elles julguem em proveito da nação.

Quando contemplo com mágua o estado do nosso paiz, recordo-me do retrato que fez do governo de Portugal, no tempo do Rei D. João III, um fidalgo poeta e guerreiro, D. João de Menezes, tão conhecido na nossa historia pela sua coragem e talento. Referia-se elle ao nobre conde de

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Sortelha, D. Luiz du Silveira, que tendo obtido grande valimento do monarcha veiu a decair por intrigas das camarilhas que para se verem livres da sua influencia persuadiram ao Rei que o enviasse para um governo em Africa, e por essa occasião, e em despedida, lhe enviou D. João de Menezes estes significativos versos:

Com estes ventos de agora Perigoso é navegar Que se mudam cada hora,

E quem vae de foz em fóra Nunca mais póde tornar.

O navio pende á banda,

A rasão não é ouvida,

A vontade tudo manda,

Quem lia de andar desanda,

Quem tem alma não tem vida.

Estão no Cancioneiro de Rezende estes versos.

O governo representativo, o governo constitucional veiu, por assim dizer, desfazer muitos attritos e estabelecer uma fórma que muitas vezes tem sido adulterada, mas que, quanto a mim, é a unica salutar e benefica para os povos, porque o paiz não é d’esta ou d’aquella classe, mas compõe-se de todas as classes.

Faliam muito do povo certos politicos, mas só se lembram do povo nos dias das eleições.

O povo não se corteja para se tyrannisar, não se lhe promette para não cumprir, porque o governo de uma nação depende do povo; a prova está em que não póde haver presidente de republica nem Rei, sem povo.

Recordarei a historia patria, e recordal-a-hei com enthusiasmo, tanto mais porque a parte da historia a que me vou referir tem relação com factos da minha familia.

Todos sabem que estando a lei civil de accordo com a lei politica, a lei dos morgados era a que se seguia na successão ao throno.

Quando morreu D. Fernando, sua unica filha, D. Beatriz, estava casada com D. João I, Rei de Castella. O paiz estava em revolução por aquella influencia estranha, por aquelles manejos, conhecidos de todos, para se apoderarem do nosso paiz; a independencia nacional, um dos maiores bens dos povos, estava ameaçada de ser absorvida, como mais tarde foi, por Castella. D. Beatriz não podia ser Rainha de Portugal.

Os filhos de D. Ignez de Castro eram superiores em direitos ao Mestre de Aviz, depois D. João I, pois que D. Ignez tinha celebrado matrimonio com D. Pedro I, e quando faltasse qualquer formalidade para a validade do sacramento não havia impedimentos dirimentes e havia boa fé no acto, e, portanto, superioridade em direitos ao Mestre de Aviz, pois que esse era bastardo; mas era D. João I o homem que o povo estimava, o porque a salvação do povo era a primeira lei do estado, e só elle era considerado por o povo como o unico homem que poderia, por sua energia e elevadas qualidades, assumir a posição de chefe do estado, para o levantar do abatimento em que se encontrava e para defender a nossa independencia e liberdade, e, portanto, foi proclamado Rei e salvador da nação.

O poder vem de Deus, mas a investidura é dos povos, e a salvação do povo é a primeira lei do estado. E verdade que esta lei tem sido falsamente invocada, umas vezes para estabelecer o despotismo e outras para implantar a anarchia.

É preciso que ao povo se repitam aquellas palavras, citadas pelo nobre ministro da justiça: Caveant consules, ne quid detrimenti capiat respublica; mas é tambem necêssario addicionar-lhe outras, de um livro mais sublime, a Biblia, que, apesar de velho, tem atravessado os seculos: Cavete a falsis prophetibus qui veniant ad vos in vestimenta orium sed intus sunt lupi rapaces.

Acautelae-vos dos falsos prophetas que a vós se approximam cobertos com a lã das ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores, e esses lobos devoram a patria, e esses lobos devoram o bem publico, e agora até devoram o que encontram nos cofres publicos, São os taes alcançados.

Já se lhes não chama ladrões, apesar de metterem no bolso o que encontram nos cofres publicos, confiados á sua guarda, mas passeiam por esse mundo á sua vontade e bello prazer.

Aquelles que têem nas mãos as redeas da governação precisam de estar muito acautelados, e nunca foi tão necessaria essa cautela como no momento presente.

Olho para o estado do paiz, olho em roda de mim, folheio a historia de todos os dias nos jornaes, e n’ella vejo a citação de factos, que depois sujeito á minha apreciação, segundo a limitada intelligencia que a Providencia me concedeu; mas, como me concedeu alguma, uso d’ella, como disse, e vou apreciando tudo o que passa, tudo o que occorre.

Mas não se deve olhar para as cousas indifferentemente. Quem tem os seus estudos, quem possue uma certa ordem de conhecimentos, tem de fazer mais alguma cousa.

Façamos a investigação do corpo social e politico com circumspecção para que seja feita com acerto. Será um proficuo estudo de anatomia social, mas é preciso mais alguma cousa. N’um gabinete anafomico de um hospital procede-se á investigação das differentes partes do corpo humano, mas outro estudo mais importante a fazer é o das relações e funcionamento dos orgãos entre si, e esse é o estudo da physiologia; mas como o homem é um composto de duas substancias, a saber, alma e corpo ou espirito e materia, é mister completar estes inqueritos scientificos com a psychologia, que é a sciencia do espirito por a sua união com a materia.

Os phenomenos da materia estudam-se por meio da observação e systema experimental e não é menos necêssario estendei a aos phenomenos do espirito.

Este estado de anatomia o physiologia social e de psychologia applicada aos phenomenos da sociedade é urgente. A comparação das epochas e dos acontecimentos é tambem uma luz necessaria para os homens politicos.

Eu hei de ler ao sr. Sequeira Pinto, que vejo presente, um trecho de um parecer do procurador da corôa do tempo de Luiz XIV. Este procurador escrevia em tempos distantes, mas o que elle então disse, póde perfeitaménte ajustar-se ás epochas modernas, e sobretudo do nosso paiz, victima dos syndicatos. Elle dizia a verdade, e eu gosto muito de dizer tambem a verdade.

Respeito a verdade e a justiça, e gosto de apresentar sempre as provas justificativas d’aquillo que avanço.

É exactamente como nos tribunaes. O juiz aprecia as provas para formar o seu juizo. Diz a carta constitucional, e antes d’ella disse-o o direito natural, que devem ser castigados aquelles que praticam actos criminosos, e premiados aquelles que fazem o bem.

(Leu o discurso em que se pedia a punição dos que se apropriavam dos dinheiros da nação e que levantavam palacios e castellos á custa do suor do povo.)

O mal e o crime é antigo, o que é, porém, moderno, é a protecção aos criminosos e a impunidade para o crime. Ataque aos cofres publicos, desfalques das forças do paiz, riquezas improvisadas, tudo passa, 6 como o contrabando. Se é em pequena escala é castigado, mas se é em grande, então os taes nossos amigos são indulgenciados.

Os policias prendem, por exemplo, um desgraçado que trazia um relogio de prata de pouco valor, e lá vae para a esquadra por suspeito, mas não perguntam nem os nossos governos perguntam por que fórma arranjaram tamanhas riquezas homens que ha pouco nada tinham e nem ganharam na loteria, nem com um casamento rico, nem com um legado ou doação; pois na França, como eu quando tratar em interpellações especiaes e successivamente sobre

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os desfalques aos bancos, ás companhias e aos cofres publicos, hei de demonstrar, puniam-se, e até um celebre ministro que enriqueceu fabulosamente, o celebre Focket, e que edificou um palacio phantastico que lhe custou 15 milhões de francos, deu ao Rei uma funcção sumptuosa e em seguida foi preso e rigorosamente castigado.

Recordo o chanceller Bacon em Inglaterra. Recordo o ministro que em França se acha na penitenciaria recebendo o castigo das suas prevaricações.

Eu já tenho ouvido dizer que a auctoridade perdeu o seu prestigio e os cofres publicos o seu recheio; são estas as declarações que os homens politicos fazem com pasmo.

Porque é que os cofres publicos não têem dinheiro? Porque os têem esvasiado aquelles a cuja guarda elles têem estado confiada.

Agora já se não diz furto; e creio que os mandamentos da lei de Deus não soffreram nenhum acto addicional; mas para que se possa estabelecer a igualdade em tudo, soffreram decima, e de dez que eram, passaram para nove; já não ha o mandamento «não furtarás». Agora já se não chama furtar, nem roubar, é um alcance; são cousas que andam sempre na ordem do dia; antigamente andavam na ordem da noite.

Eu tenho algumas terras juntas ao pinhal da Azambuja, e estive já para convidar alguns cavalheiros para irmos ali construir, não direi alguns chalets, não me agrada muito a phrase, mas algumas casas para nos mudarmos para lá, visto ter-se o pinhal da Azambuja mudado e posto escriptos.

Eu ouço dizer que os governos são todos fortes, são fortissimos, rmas depois vejo que dentro em pouco desapparecem. Ás vezes tambem se morre de indigestão. No corpo physico, assim como no corpo social, ha uma certa ordem de molestias de que se não póde escapar. A superabundancia de forças muitas vezes produz a apoplexia e a inanição produz a tisica. Diversos paizes têem sido atacados de molestia de inflammação. D’esse mal tem soffrido a França em varias epochas. A Polonia foi atacada de ina-nição, que foi produzida por a imprevidencia. O nosso paiz está-se parecendo muito com a Polonia.

O sr. duque de Loulé subiu uma vez a esta tribuna, e em poucas palavras, como elle costumava, perguntou ao sr. Fontes, que estava então no ministerio (isto foi em 1867), perguntou-lhe o que é que o governo tencionava praticar para resolver a questão de fazenda; — pergunta muito simples, mas que ao mesmo tempo era muito concreta. Entretanto eu não farei agora essa pergunta ao sr. ministro da fazenda; n’outra occasião hei de fazel-a por partes, hei de dividil-a, hei de dynamisal-a, para me informar a respeito de certos assumptos. Espero que realisarei tudo isto, se Deus Nosso Senhor continuar a favorecer-me com a saude de que goso hoje.

Não é das situações mais agradaveis o combate que tenho emprehendido, mas hei de caminhar na mesma orientação; e desde já declaro que não hei de votar a ruina do paiz, por caso nenhum da vida. Posso ser vencido, mas não da vida. E creio que tambem já não ha vencidos da vida, morreram, desappareceram. Eu meditei muito sobre este partido dos vencidos, julgando que elles estariam todos.muito magros e com fome, mas não estavam.

Já n’um antigo poeta latino eu fui encontrar alguma cousa que me denunciava que n’aquelles tempos tambem havia alguma cousa parecida com vencidos da vida, foi na Pharsalia, de Lucano, quando elle diz: Victriae causa Diis plaçuit sed victa Catoni; depois achei-os em Marcial, que se lamentava da sua posição de laudator, e depois em Voltaire, que se lamentava de estar no paço, embora o tratassem muito bem, mas obrigado á lisonja palaciana, e la reine m’appelle son pauvre Voltaire, mas apesar d’isso lamentava-se.

Mas ha outra cousa: é que esta denominação de «vencidos da vida», era um mote que elles adoptavam por modestia, collocando-se na passiva, permanecendo na activa. Elles eram como certos verbos passivos na voz, mas activos na significação, ou antes verbos deponentes, os que têem terminações passivas e significação activa. Assim todos os vencidos da vida passaram para a activa, tornando-se vencedores, assimilhando-se d’est’arte aos verbos de poentes, como por exemplo Reor (eu cuido ou julgo) ratus sum.

Eu é que não estou vencido da vida; póde ser até que alguma vez seja vencedor. Effectivamente já aqui mesmo n’esta camara algumas vezes tenho sido vencedor, assim como em outras tenho sido vencido.

Mas vamos, sr. presidente, a desenvolver uma das minhas proposições.

Declaro que hei de chamar á auctoria o sr. presidente do conselho, que tambem é ministro da fazenda, porque elle tem todas as responsabilidades, e o sr. ministro da justiça, e igualmente o sr. procurador geral da corôa, que tenho o gosto de ver presente.

Eu, sr. presidente, levantei aqui a bandeira da cruzada contra os escandalos da companhia dos caminhos de ferro e contra os do banco do povo e banco lusitano. A companhia real dos caminhos de ferro tem um passivo de 91:000 contos de réis. Quid dicam amplius. Não é preciso commentar, mas é necessaria investigação profunda o real.

Quanto ao banco do povo prenderam um homem, penhorando-lhe o pouco que lhe restava dos haveres; mas póde conceber-se que foi só este homem que roubou o banco do povo?

Em relação aos negocios dos caminhos de ferro, e outros, dizem que não ha lei para fazer instaurar certos processos; se não ha, façam-a. Ora, eu hei de demonstrar com a historia que sempre houve leis para se castigar os delinquentes; e agora mesmo parece-me que foi para isso que se crearam as penitenciarias. Pois então a penitenciaria é só para a gente do povo?!

Bem sei que o sr. presidente do conselho não tem culpa até aqui dos actos que então se praticaram, mas terá culpa agora desde o momento que não pozer tudo a claro e fizer com que as responsabilidades vão a quem cabem, promovendo o castigo dos culpados, e assim e só assim se restabelecerá o credito do paiz tão maltratado lá fóra por estas faltas e crimes impunes com grande escandalo publico.

Dizia Sampaio: «Ladrões não se encobrem de graça».

Ora meditem n’esta sentença!

E preciso, sr. presidente, não ter medo d’elles. Quem vae para o governo deve medir as suas forças e ver se póde com o peso do encargo.

Horacio dava um conselho aos escriptores que bem póde ser applicado aos politicos:

Sumite materiam vestris qui scríbites.

Esquam viribus et versate diu quid ferre recusent quid voleunt humeri.

Vós, que escreveis, escolhei uma materia igual ás vossas forças e meditae se vossos hombros podem ou recusam o peso do encargo.

E eu acrescentarei: vós, que governaes, medi bem os vossos hombros e vêde se podeis cumprir os vossos deveres, aliás deponde aquillo para que vossas forças vos não auxiliam.

Os srs. ministros dão um juramento assim como nós, e esse juramento não é uma bagatella. O juramento é um acto sagrado admittido em toda a parte nos povos cultos, e, por consequencia, não se póde illudir.

Sr. presidente, o povo geme.

E sabe v. ex.a qual é a causa de tamanha quantidade de suicidios, de tanta quantidade de familias arruinadas, de tanta quantidade de familias na miseria perseguidas pela fome?

E porque esta grande massa é como um relogio que, se se lhe quebra uma machina, quebrada ella o desarranjo é total.

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D’ahi é que veiu tudo.

Disse-se primeiro que foi o cambio do Brazil.

Oh! sr. presidente, pois o cambio do Brazil é que foi aos bancos e roubou o que lá estava?!

Nada de illusões, e não se pretenda lançar poeira nos olhos do povo.

Sr. presidente, eu tenho aqui defendido a monarchia sem a lisonjear, e defendido dizendo a verdade.

Eu disse ao Senhor D. Luiz, que desejou consultar-me sobre a reforma d’esta camara como sabem alguns que ainda estão vivos, eu disse a Sua Magestade:

Senhor: O povo não lhe importa que a camara dos pares seja composta de pares electivos ou vitalicios, o que a elle importa, e muito, é que as auctoridades nas vesperas das eleições não lhe vão bater á porta e dizer-lhe que se não votar em tal lista ha de ser multado, ha de fazer-se-lhe penhora e a sua mobilia posta no meio da rua. Isto é que ao povo importa, e tambem com outras ameaças que os influentes e empregados lhe fazem quanto a recrutamento.

Por esta occasião tocarei, ainda que de leve, em materia de reforma eleitoral.

Sr. presidente, é necêssario pôr cobro a esta decadencia moral e social, é necêssario uma nova lei eleitoral.

Eu desejo uma lei eleitoral com votação bem diversa das que temos tido. Quero votação por classes; negociantes, commercio, proprietarios, ecclesiasticos e operarios.

Venham tambem os operarios, venham os advogados, venham homens independentes, porque talvez assim se economise muito dinheiro.

Ha uns certos especuladores que apanham dinheiro aos governos e depois dizem muito mal d’elles.

È preciso uma nova lei eleitoral, e para isto organisem-se umas côrtes constituintes como fez o sr. Fontes quando ultimamente pretendeu reformar alguns artigos da carta constitucional.

Tambem acho de grande necessidade reformar o conselho d’estado, o qual, como está, mais parece um conselho de familia.

Os conselhos de familia são necessários nos tribunaes para intervirem em certos casos; mas o conselho d’estado não póde ter uma organisação identica.

Tambem eu julgo necêssario assegurar ainda mais uma melhor situação ao poder judicial.

Eu fui sempre de opinião que nós devemos elevar o mais possivel a situação dos juizes, melhorando-a em beneficio de todos nós. O poder judicial é muito mal recompensado entre nós.

Os juizes têem na sua mão as nossas fortunas; não digo a nossa vida, porque actualmente não ha pena de morte; mas têem gravissimas responsabilidades e têem dado provas da maior independencia, e ao mesmo tempo de conhecimentos profundos, porque lá estão os accordãos publicados nos jornaes de jurisprudencia e no Diário do governo.

Agora, voltando á reforma do conselho d’estado.

O conselho d’estado devia e deve ser augmentado para que os homens eminentes, sem olhar a partidos, sejam ali representados para discutirem os negocios importantes da nação na presença do chefe de estado.

E deveria haver uma ou mais secções do dito conselho para prepararem projectos de lei, reformas e regulamentos para serem apresentados ás camaras legislativas, sendo assim um corpo consultivo, politico e administrativo, e poderoso auxiliar dos governos e advogado dos interesses legitimos dos povos e do estado, e por outro lado um corpo politico que aconselhe o poder moderador.

Sr. presidente, nas nossas provincias ha muita illustração e muita independencia, e eu posso dar d’isso testemunho, e é minha opinião que muitos d’esses homens honrados devem ser aproveitados na administração dos negocios publicos por suas aptidões, honradez e independencia.

Vou-me referir a dois feitos notaveis que provam a confusão que reina na nossa administração politica.

O sr. Antonio Ennes é um homem de grande illustração, reconhecida por todos, já foi ministro da marinha e ha pouco publicou um relatorio, no qual diz que pela secretaria da marinha tem-se gasto muito dinheiro com cousas que nada têem com o ultramar.

Eu fico admirado, e sobretudo o que mais me admirou foi o que disse outro dia o sr. Thomás Ribeiro, que já foi ministro por tres vezes, já foi ministro do reino, da justiça, das obras publicas e dá marinha, disse-nos que quando foi ministro da marinha lhe tinham pedido que nomeasse governador para o ultramar um homem que estava condemnado em todas as instancias como ladrão, e havia outro que era contrabandista e até vendia os creados. Como, porém, o sr. Thomás Ribeiro o não nomeasse, foram dizer ao sr. Fontes que elle não servia para ministro, que não era bom para os amigos.

Depois o sr. Thomás Ribeiro saiu do governo, e passado tempo esses homens foram nomeados para governar nas nossas provincias do ultramar.

Sr. presidente, se fosse vivo o padre Antonio Vieira recordar-se-ía do sermão do bom ladrão em que se diz, fallando em geral de gentes incapazes que mudavam os seus governos para o ultramar, e dizia o illustrado padre: «Se querem favorecer certos homens dêem lhe tenças, mas não os mandem desgovernar as nossas colonias e note-se que só alludia aos incapazes.

Isto dizia o padre Antonio Vieira, um talento profundo, um theologo e politico de primeira força, que conhecia bem o mundo.

Sr. presidente, é preciso saber-se que não foi nenhum dos actuaes ministros que nomeou taes homens. É preciso mudar de vida.

Aonde está esse fogo sagrado que outr’ora abrazava tantos nobres corações? Aonde está esse amor das generosas idéas?

Parece que a alma perdeu os seus vôos e o coração os seus enthusiasmos. Esta epocha parece ter esquecido todas as glorias e extinguido todos os perfumes da vida, substituindo-lhe os frios calculos do egoismo, a sêde do bem estar e a adoração do bezerro de oiro. No seu esteril orgulho apenas conquistou o desespero, apenas abraçou a morte e apenas produziu o nada.

Creio ter provado com a rasão, com a historia e com a auctoridade, que necessitámos de mudar de processos politicos e administrativos para restituir o credito e a prosperidade ao nosso paiz. Quando a priori o não tivesse provado quanto aos principios, de certo a posteriori e com relação aos factos, sem duvida demonstrei que o modo por que se tem governado tem conduzido o paiz á banca-rota e os povos ao mais lamentavel estado. Cumpre emprehender a cruzada da restauração nacional. Quem será o homem que se colloque á frente d’este emprehendimento salvador? Quem será elle e quando apparecer clamarei eu: Quis est hic et laudabimus eum. Salvemos a patria. Venerandas cinzas dos heroes d’esta nação. Junto ás urnas que encerram estes preciosos despojos, ajoelhados e com respeito invoquemos o espirito dos heroes, cujos gloriosos exemplos por nós imitados poderão salvar o nosso Portugal, outr’ora. vencedor e hoje vencido e -vilipendiado por audaciosos estranhos e por deshonrados filhos. Gloriosos varões, que illustrastes o paiz com as vossas pennas, que o honrastes com as vossas façanhas, que o exaltastes com os vossos serviços e que o fizestes respeitar por os exemplos honrados que nos legastes em vossos testamentos de gloria, que salvastes com a vossa coragem a nossa autonomia e a nossa independencia nacional. Possa a recordação do vosso heroismo inspirar-nos na grande e gloriosa lucta, que salve o paiz dos seus inimigos e restitua á nossa patria a ventura, a ordem e o respeito. Combatamos sem quartel, corramos aos baluartes para nos em-

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232 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

os desfalques aos bancos, ás companhias e aos cofres publicos, hei de demonstrar, puniam-se, e até um celebre ministro que enriqueceu fabulosamente, o celebre Focket, e que edificou um palacio phantastico que lhe custou 15 milhões de francos, deu ao Rei uma funcção sumptuosa e em seguida foi preso e rigorosamente castigado.

Recordo o chanceller Bacon em Inglaterra. Recordo o ministro que em França se acha na penitenciaria recebendo o castigo das suas prevaricações.

Eu já tenho ouvido dizer que a auctoridade perdeu o seu prestigio e os cofres publicos o seu recheio; são estas as declarações que os homens politicos fazem com pasmo.

Porque é que os cofres publicos não têem dinheiro? Porque os têem esvasiado aquelles a cuja guarda elles têem estado confiada.

Agora já se não diz furto; e creio que os mandamentos da lei de Deus não soffreram nenhum acto addicional; mas para que se possa estabelecer a igualdade em tudo, soffreram decima, e de dez que eram, passaram para nove; já não ha o mandamento «não furtarás». Agora já se não chama furtar, nem roubar, é um alcance; são cousas que andam sempre na ordem do dia; antigamente andavam na ordem da noite.

Eu tenho algumas terras juntas ao pinhal da Azambuja, e estive já para convidar alguns cavalheiros para irmos ali construir, não direi alguns chalets, não me agrada muito a phrase, mas algumas casas para nos mudarmos para lá, visto ter-se o pinhal da Azambuja mudado e posto escriptos.

Eu ouço dizer que os governos são todos fortes, são fortissimos, mas depois vejo que dentro em pouco desapparecem. Ás vezes tambem se morre de indigestão. No corpo physico, assim como no corpo social, ha uma certa ordem de molestias de que se não póde escapar. A superabundancia de forças muitas vezes produz a apoplexia e a inanição produz a tisica. Diversos paizes têem sido atacados de molestia de inflammação. D’esse mal tem soffrido a França em varias epochas. A Polonia foi atacada de inanição, que foi produzida por a imprevidencia. O nosso paiz está-se parecendo muito com a Polonia.

O sr. duque de Loulé subiu uma vez a esta tribuna, e em poucas palavras, como elle costumava, perguntou ao sr. Fontes, que estava então no ministerio (isto foi em 1867), perguntou-lhe o que é que o governo tencionava praticar para resolver a questão de fazenda; — pergunta muito simples, mas que ao mesmo tempo era muito concreta. Entretanto eu não farei agora essa pergunta ao sr. ministro da fazenda; n’outra occasião hei de fazel-a por partes, hei de dividil-a, hei de dynamisal-a, para me informar a respeito de certos assumptos. Espero que realisarei tudo isto, se Deus Nosso Senhor continuar a favorecer-me com a saude de que goso hoje.

Não é das situações mais agradaveis o combate que tenho emprehendido, mas hei de caminhar na mesma orientação; e desde já declaro que não hei de votar a ruina do paiz, por caso nenhum da vida. Posso ser vencido, mas não da vida. E creio que tambem já não ha vencidos da vida, morreram, desappareceram. Eu meditei muito sobre este partido dos vencidos, julgando que elles estariam todos.muito magros e com fome, mas não estavam.

Já n’um antigo poeta latino eu fui encontrar alguma cousa que me denunciava que n’aquelles tempos tambem havia alguma cousa parecida com vencidos da vida, foi na Pharsália, de Lucano, quando elle diz: Victriae causa Diis piacuit sed victa Catoni; depois achei-os em Marcial, que se lamentava da sua posição de laudator, e depois em Voltaire, que se lamentava de estar no paço, embora o tratassem muito bem, mas obrigado á lisonja palaciana, e la reine m’appelle son pauvre Voltaire, mas apesar d’isso lamentava-se.

Mas ha outra cousa: é que esta denominação de «vencidos da vida», era um mote que elles adoptavam por modestia, collocando-se na passiva, permanecendo na activa. Elles eram como certos verbos passivos na voz, mas activos na significação, ou antes verbos deponentes, os que têem terminações passivas e significação activa. Assim todos os vencidos da vida passaram para a activa, tornando-se vencedores, assimilhando-se d’est’arte aos verbos de poentes, como por exemplo Reor (eu cuido ou julgo) ratus sum.

Eu é que não estou vencido da vida; póde ser até que alguma vez seja vencedor. Effectivamente já aqui mesmo n’esta camara algumas vezes tenho sido vencedor, assim como em outras tenho sido vencido.

Mas vamos, sr. presidente, a desenvolver uma das minhas proposições.

Declaro que hei de chamar á auctoria o sr. presidente do conselho, que tambem é ministro da fazenda, porque elle tem todas as responsabilidades, e o sr. ministro da justiça, e igualmente o sr. procurador geral da corôa, que tenho o gosto de ver presente.

Eu, sr. presidente, levantei aqui a bandeira da cruzada contra os escandalos da companhia dos caminhos de ferro e contra os do banco do povo e banco lusitano. A companhia real dos caminhos de ferro tem um passivo de 91:000 contos de réis. Quid dicam amplius. Não é preciso commentar, mas é necessaria investigação profunda o real.

Quanto ao banco do povo prenderam um homem, penhorando-lhe o pouco que lhe restava dos haveres; mas póde conceber-se que foi só este homem que roubou o banco do povo?

Em relação aos negocios dos caminhos de ferro, e outros, dizem que não ha lei para fazer instaurar certos processos; se não ha, façam-a. Ora, eu hei de demonstrar com a historia que sempre houve leis para se castigar os delinquentes; e agora mesmo parece-me que foi para isso que se crearam as penitenciarias. Pois então a penitenciaria é só para a gente do povo?!

Bem sei que o sr. presidente do conselho não tem culpa até aqui dos actos que então se praticaram, mas terá culpa agora desde o momento que não pozer tudo a claro e fizer com que as responsabilidades vão a quem cabem, promovendo o castigo dos culpados, e assim e só assim se restabelecerá o credito do paiz tão maltratado lá fóra por estas faltas e crimes impunes com grande escandalo publico.

Dizia Sampaio: «Ladrões não se encobrem de graça».

Ora meditem n’esta sentença!

E preciso, sr. presidente, não ter medo d’elles. Quem vae para o governo deve medir as suas forças e ver se póde com o peso do encargo.

Horacio dava um conselho aos escriptores que bem póde ser applicado aos politicos:

Sumite materiam vestris qui scríbites.

Esquam viribus et versate diu quid ferre récusent quid voleunt humeri.

Vós, que escreveis, escolhei uma materia igual ás vossas forças e meditae se vossos hombros podem ou recusam o peso do encargo.

E eu acrescentarei: vós, que governaes, medi bem os vossos hombros e vêde se podeis cumprir os vossos deveres, aliás deponde aquillo para que vossas forças vos não auxiliam.

Os srs. ministros dão um juramento assim como nós, e esse juramento não é uma bagatella. O juramento é um acto sagrado admittido em toda a parte nos povos cultos, e, por consequencia, não se póde illudir.

Sr. presidente, o povo geme.

E sabe v. ex.a qual é a causa de tamanha quantidade de suicidios, de tanta quantidade de familias arruinadas, de tanta quantidade de familias na miseria perseguidas pela fome?

E porque esta grande massa é como um relogio que, se se lhe quebra uma machina, quebrada ella o desarranjo é total.

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SESSÃO N.° 19 DE 24 DE NOVEMBRO DE 1894 233

D’ahi é que veiu tudo.

Disse-se primeiro que foi o cambio do Brazil.

Oh! sr. presidente, pois o cambio do Brazil é que foi aos bancos e roubou o que lá estava?!

Nada de illusões, e não se pretenda lançar poeira nos olhos do povo.

Sr. presidente, eu tenho aqui defendido a monarchia sem a lisonjear, e defendido dizendo a verdade.

Eu disse ao Senhor D. Luiz, que desejou consultar-me sobre a reforma d’esta camara como sabem alguns que ainda estão vivos, eu disse a Sua Magestade:

Senhor: O povo não lhe importa que a camara dos pares seja composta de pares electivos ou vitalicios, o que a elle importa, e muito, é que as auctoridades nas vesperas das eleições não lhe vão bater á porta e dizer-lhe que se não votar em tal lista ha de ser multado, ha de fazer-se-lhe penhora e a sua mobilia posta no meio da rua. Isto é que ao povo importa, e tambem com outras ameaças que os influentes e empregados lhe fazem quanto a recrutamento.

Por esta occasião tocarei, ainda que de leve, em materia de reforma eleitoral.

Sr. presidente, é necêssario pôr cobro a esta decadencia moral e social, é necêssario uma nova lei eleitoral.

Eu desejo uma lei eleitoral com votação bem diversa das que temos tido. Quero votação por classes; negociantes, commercio, proprietarios, ecclesiasticos e operarios.

Venham tambem os operarios, venham os advogados, venham homens independentes, porque talvez assim se economise muito dinheiro.

Ha uns certos especuladores que apanham dinheiro aos governos e depois dizem muito mal d’elles.

E preciso uma nova lei eleitoral, e para isto organisem-se umas côrtes constituintes como fez o sr. Fontes quando ultimamente pretendeu reformar alguns artigos da carta constitucional.

Tambem acho de grande necessidade reformar o conselho d’estado, o qual, como está, mais parece um conselho de familia.

Os conselhos de familia são necessários nos tribunaes para intervirem em certos casos; mas o conselho d’estado não póde ter uma organisação identica.

Tambem eu julgo necêssario assegurar ainda mais uma melhor situação ao poder judicial.

Eu fui sempre de opinião que nós devemos elevar o mais possivel a situação dos juizes, melhorando-a em beneficio de todos nós. O poder judicial é muito mal recompensado entre nós.

Os juizes têem na sua mão as nossas fortunas; não digo a nossa vida, porque actualmente não ha pena de morte; mas têem gravissimas responsabilidades e têem dado provas da maior independencia, e ao mesmo tempo de conhecimentos profundos, porque lá estão os accordãos publicados nos jornaes de jurisprudencia e no Diário do governo.

Agora, voltando á reforma do conselho d’estado.

O conselho d’estado devia e deve ser augmentado para que os homens eminentes, sem olhar a partidos, sejam ali representados para discutirem os negocios importantes da nação na presença do chefe de estado.

E deveria haver uma ou mais secções do dito conselho para prepararem projectos de lei, reformas e regulamentos para serem apresentados ás camaras legislativas, sendo assim um corpo consultivo, politico e administrativo, e poderoso auxiliar dos governos e advogado dos interesses legitimos dos povos e do estado, e por outro lado um corpo politico que aconselhe o poder moderador.

Sr. presidente, nas nossas provincias ha muita illustração e muita independencia, e eu posso dar d’isso testemunho, e é minha opinião que muitos d’esses homens honrados devem ser aproveitados na administração dos negocios publicos por suas aptidões, honradez e independencia.

Vou-me referir a dois feitos notaveis que provam a confusão que reina na nossa administração politica.

O sr. Antonio Ennes é um homem de grande illustração, reconhecida por todos, já foi ministro da marinha e ha pouco publicou um relatorio, no qual diz que pela secretaria da marinha tem-se gasto muito dinheiro com cousas que nada têem com o ultramar.

Eu fico admirado, e sobretudo o que mais me admirou foi o que disse outro dia o sr. Thomás Ribeiro, que já foi ministro por tres vezes, já foi ministro do reino, da justiça, das obras publicas e dá marinha, disse-nos que quando foi ministro da marinha lhe tinham pedido que nomeasse governador para o ultramar um homem que estava condemnado em todas as instancias como ladrão, e havia outro que era contrabandista e até vendia os creados. Como, porém, o sr. Thomás Ribeiro o não nomeasse, foram dizer ao sr. Fontes que elle não servia para ministro, que não era bom para os amigos.

Depois o sr. Thomás Ribeiro saiu do governo, e passado tempo esses homens foram nomeados para governar nas nossas provincias do ultramar.

Sr. presidente, se fosse vivo o padre Antonio Vieira recordar-se-ía do sermão do bom ladrão em que se diz, fallando em geral de gentes incapazes que mudavam os seus governos para o ultramar, e dizia o illustrado padre: «Se querem favorecer certos homens dêem lhe tenças, mas não os mandem desgovernar as nossas colonias-- e note-se que só alludia aos incapazes.

Isto dizia o padre Antonio Vieira, um talento profundo, um theologo e politico de primeira força, que conhecia bem o mundo.

Sr. presidente, é preciso saber-se que não foi nenhum dos actuaes ministros que nomeou taes homens. É preciso mudar de vida.

Aonde está esse fogo sagrado que outr’ora abrazava tantos nobres corações? Aonde está esse amor das generosas idéas?

Parece que a alma perdeu os seus vôos e o coração os seus enthusiasmos. Esta epocha parece ter esquecido todas as glorias e extinguido todos os perfumes da vida, substituindo-lhe os frios calculos do egoismo, a sêde do bem estar e a adoração do bezerro de oiro. No seu esteril orgulho apenas conquistou o desespero, apenas abraçou a morte e apenas produziu o nada.

Creio ter provado com a rasão, com a historia e com a auctoridade, que necessitámos de mudar de processos politicos e administrativos para restituir o credito e a prosperidade ao nosso paiz. Quando a priori o não tivesse provado quanto aos principios, de certo a posteriori e com relação aos factos, sem duvida demonstrei que o modo por que se tem governado tem conduzido o paiz á banca-rota e os povos ao mais lamentavel estado. Cumpre emprehender a cruzada da restauração nacional. Quem será o homem que se colloque á frente d’este emprehendimento salvador? Quem será elle e quando apparecer clamarei eu: Quis est hie et laudabimus eum. Salvemos a patria. Venerandas cinzas dos heroes d’esta nação. Junto ás urnas que encerram estes preciosos despojos, ajoelhados e com respeito invoquemos o espirito dos heroes, cujos gloriosos exemplos por nós imitados poderão salvar o nosso Portugal, outr’ora. vencedor e hoje vencido e vilipendiado por audaciosos estranhos e por deshonrados filhos. Gloriosos varões, que illustrastes o paiz com as vossas pennas, que o honrastes com as vossas façanhas, que o exaltastes com os vossos serviços e que o fizestes respeitar por os exemplos honrados que nos legastes em vossos testamentos de gloria, que salvastes com a vossa coragem a nossa autonomia e a nossa independencia nacional. Possa a recordação do vosso heroismo inspirar-nos na grande e gloriosa lucta, que salve o paiz dos seus inimigos e restitua á nossa patria a ventura, a ordem e o respeito. Combatamos sem quartel, corramos aos baluartes para nos em-

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234 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

penharmos n’esta gloriosa lide. Por minha parte, ajudado com o auxilio da Providencia, protesto que pelo posto confiado á minha guarda não será tomada de improviso a cidadella.

Pelejemos com energia esta justa e santa peleja, e digo justa, porque é a peleja da verdade, digo santa, porque é a peleja da justiça. A patria acima de tudo.

Tenho dito. (Apoiados.)

(O orador foi comprimentado por muitos dignos pares.)

O sr. Presidente: — Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo digno par sr. marquez de Vallada.

Leu-se na mesa e é do teor do seguinte:

Moção

A camara dos dignos pares exultará, e com ella o paiz, se vir, como espera, que o governo do reino, amestrado pelos dolorosos ensinamentos da experiencia, procurará de uma maneira efficaz levantar o credito nacional, restituin-lhe o seu antigo brilho e valia por meio de medidas promptas e efficazes, em ordem a tornar impossivel a repetição dos monumentaes escandalos que produziram a ruina do paiz e a desgraça de tantas familias, reduzindo-as á miseria o á fome.

N’esta ordem de medidas urgentes se comprehende sem duvida o castigo severo áquelles que por meio de criminosas especulações e explorações, se locupletaram com a pujança alheia, offendendo o paiz nos seus legitimos interesses, e muito especialmente os bancos e companhias que reduziram ao mais lastimoso estado.

Já d’est’arte e por estes meios se restabelecerá o respeito ao principio da auctoridade e se fortificará o credito nacional com grande proveito para a nossa patria e para a conservação das nossas instituições; e o governo do paiz poderá assim emprehender nobres o honrados commettimentos salvadores em beneficio da nação, da monarchia, da ordem e da liberdade.

Camara dos dignos pares, em 24 de novembro de 1894. == O par do reino, Marquez de Vallada.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que admittem á discussão esta moção tenham a bondade de se levantar.

Foi admittida, e ficou em discussão conjunctamente com o projecto.

O sr. Jeronymo Pimentel: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Tem o digno par a palavra.

O sr. Jeronymo Pimentel: — Peço a v. ex.a que se digne consultar a cama sobre se ella quer prorogar a sessão até se votar o projecto de resposta ao discurso da corôa.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o requerimento do digno par, o sr. Jeronymo Pimentel, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Está prorogada a sessão até se votar o projecto.

Tem a palavra sobre a materia o digno par, o sr. Bernardino Machado.

Peço a attenção da camara.

O sr. Bernardino Machado: — (O discurso de s. ex.a será publicado na integra e em appendice, quando houver devolvido as notas tachygraphicas.)

O sr. Antonio Candido: — (O discurso do digno par será publicado na integra e em appendice, quando s. ex.a haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro): — Não era intenção sua voltar de novo a este debate, mas provocára-o uma pergunta directa do digno par o sr. Antonio Candido.

Ninguem mais estava inscripto, e em toda a discussão parlamentar cabe a ultima palavra á opposição, o que succedia agora. Mas, perante uma pergunta nitida e clara do digno par, a camara comprehendia que nem mesmo o adiantado da hora seria para o orador uma desculpa para se furtar a responder. Visto que s. ex.a o chamára a terreno, queria, não abrir de novo a discussão, mas consignar quanto os espiritos mais lúcidos, os talentos mais brilhantes cáem por vezes em flagrantes contradicções.

O digno par, para verberar o procedimento do governo, para mostrar quanto eram inanes, despidas de fundamento e de rasão as considerações com que elle defendia os seus actos, e sobretudo os actos de dictadura, pozera em relevo um exemplo como devendo convencer a camara inteira, e esse exemplo era de que mal iria ao governo em argumentar com as questões pendentes para se furtar aos debates parlamentares, pois que pendente estava uma questão urgente para nós, da maxima importancia, a questão com o Brazil.

S. ex.a pozera em relevo a magia das palavras do digno par o sr. Vaz Preto, o seu alcance, a sua eloquencia fulminante, arrebatadora, para depois pôr em confronto a resposta lastimosa que o governo lhe dêra.

Quanto era flagrante a contradição do digno par!

Pois então, quando estava pendente uma questão de tal modo grave como a questão com o Brazil, uma questão que se suscitou entre duas nações irmãs, que tantos laços de affinidade prendem; quando o chefe do gabinete, o governo inteiro era accusado de ter faltado a preceitos claros, terminantes, de humanidade, de dever e de decoro; quando a solução d’esse conflicto era instante e tão desejada, quanto a desejava o digno par, e quando se levantava alguem que representava o governo, e dava explicações cabaes, no seu sentido, verdadeiramente sinceras na sua consciencia, o digno par, illustrado, brilhante nos seus dotes, arrebatador, servia-se ‘da sua palavra inspirada, não para se pôr ao lado do governo n’essa questão, por que todo o paiz se interessa, mas para o abater e amesquinhar justamente no momento em que elle precisava de força, de apoio e applauso de todos a fim de que podesse erguer bem alto o nome do paiz!?

E julgava o digno par que o paiz se defendia e que o seu decoro se salvava desde que, abatido o governo, s. ex.a demonstrasse que são sempre as nações estrangeiras que têem rasão, e que é o governo que claudica?!

Pois não via o digno par que estava ali o exemplo mais claro e mais frisante de que, achando-se pendentes questões internacionaes, não era prudente nem avisado que o parlamento as discutisse, a fim de que os impetos e o enthusiasmo da eloquencia parlamentar, que actuam no animo dos que são mais devotados á sua nação, como o digno par, não os levassem a esquecer os interesses do paiz para se lembrarem só da sua politica partidaria?

Não queria dizer que o digno par se collocava ao lado dos governos estrangeiros que comnosco tinham contestações; mas ao lado do governo portuguez, que precisava defender os interesses do paiz, é que, assim, seguramente não estava. (Apoiados.)

Emquanto uma questão internacional se debatesse diplomaticamente entre duas nações, muito mais quando uma d’ellas fosse o seu paiz, não devia o digno par discutil-a. (Apoiados.)

Era este um conselho de amigo que lhe dava.

Terminava, respondendo á pergunta directa que o digno par lhe fizera.

O desejo do governo era collaborar com o parlamento na boa direcção dos negocios publicos; assim o parlamento quizesse collaborar com o governo. (Muitos apoiados.)

(O discurso a que este extracto se refere será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando o sr. presidente do conselho tenha revisto as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto. Vae, portanto, votar-se o projecto de resposta ao discurso da corôa.

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SESSÃO N.º 19 DE 24 DE NOVEMBRO DE 1894 235

Apresentaram-se diversas propostas: a primeira foi a do digno par o sr. Telles de Vasconcellos.

O sr. Telles de Vasconcellos: — Peço a v. ex.a que consulte a camara sobre se ella consente em que eu retire a minha proposta.

Consultada a camara, assim o resolveu.

O sr. Presidente: — As outras propostas são additamentos a paragraphos do projecto de resposta.

Vae ler-se o projectoe em seguida á votação de cada paragrapho serão votadas as propostas que se lhe refiram.

O sr. Antonio de Serpa (sôbre o modo de propor): — Por parte da commissão, declaro que ella acceita o additamento do digno par D. Luiz da Camara Leme, additamento que nada tem de politico e que se refere ao centenário do Infante D. Henrique; acceita tambem o do digno par o sr. Vaz Preto, com o qual o governo concordou; mas não póde acceitar os outros.

O sr. Costa Lobo: — Nem o meu?

O Orador: — Esse muito menos.

Emquanto á proposta do digno par o sr. marquez de Vallada, que comprehende tantos e variados assumptos, embora a commissão a não possa acceitar agora, não vê inconveniente em que ella fique sobre a mesa para ulterior resolução.

(O digno par não reviu.)

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, o sr. relator da commissão acaba de dizer agora que acceita uns determinados additamentos.

A minha moção julga-a um tanto longa; mas o caso é que é altamente conveniente que ella seja discutida opportunamente.

Julgo ser este o sentido das palavras do sr. relator.

O sr. Costa Lobo: — Desejo simplesmente perguntar ao illustre relator da commissão se na rejeição de s. ex. á minha moção está do accordo com o governo.

O sr. Antonio de Serpa (relator): — Supponho que sim.

O sr. Costa Lobo: — Pergunto então ao governo se acceita a rejeição da minha proposta, pronunciada em nome da commissão pelo sr. relator.

O sr. Presidente do Conselho. de Ministros (Hintze Ribeiro): — Sr. presidente, eu julgava que estava ha bastante tempo no parlamento para sabor as praxes parlamentares; mas vejo que não, ao ouvir o digno par perguntar-mo se acceito a opinião de uma commissão sobre uma proposta.

Agora, se s. ex.a me pergunta se ou acceito a sua proposta, respondo que não posso acceital-a.

(S. ex.a, não reviu.)

O sr. Presidente: — Vae votar-se o projectoo as moções de additamento que estão sobre a mesa.

Seguidamente leu-se o projecto, que foi approvado, bem

como as moções de additamento dos dignos pares os srs. Camara Leme e Vaz Preto, que foram approvadas; e Baptista de Sousa e Costa Lobo, que foram rejeitadas, aquella por 57 votos contra 17, e esta por 51 contra 23 votos.

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara sobre se acceita a indicação feita pelo sr. relator da commissão, para que a moção do digno par o sr. marquez de Vallada fique sobre a mesa para ser opportunamente apreciada.

Consultada a camara, resolveu nessa conformidade.

O sr. Presidente: — Não posso dar a palavra ao digno par o sr. conde de Lagoaça, que a pedira para antes do se encerrar a sessão, porque a sessão foi prorogada só até se votar o projecto. (Apoiados.)

A proxima sessão será na terça feira, 27 do corrente, e a ordem do dia apresentação de pareceres e eleição de commissões.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e cincoenta minutos da tarde.

Dignos pares presentes á sessão de 24 de novembro de 1894

Ex.mos srs.: Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa; Antonio José de Barros e Sá; Marquezes, de Fontes Pereira de Mello, de Penafiel, de Vallada; Arcebispo de Evora; Arcebispo-bispo do Algarve, de Portalegre, Bispo-conde de Coimbra; Condes, d’Avila, da Azarujinha, do Bomfim, de Cabral, de Carnide, de Castro, de Castro e Solla, de Ficalho, da Folgosa, de S. Januario, do Juncai, de Lagoaça, de Magalhães, de Paraty, da Ribeira Grande, de Thomar, de Valbom; Bispos, de Beja, de Bethsaida, de Vizeu; Viscondes, de Asseca, de Athouguia, de Soares Franco; Barão de Almeida Santos; Moraes Carvalho, Rocha Peixoto, Sousa e Silva, Baptista de Sousa, Antonio Candido, Homem de Macedo, Boavida, Lopes Navarro, Antonio José Teixeira, Jalles, Serpa Pimentel, Pinto de Magalhães, Costa Lobo, Telles de Vasconcellos, Arthur Hintze Ribeiro, Cau da Costa, Ferreira de Mesquita, Augusto Cunha, Bernardino Machado, Palmeirim, Carlos Eugenio de Almeida, Cypriano Jardim, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Ernesto Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Oliveira Feijão, Coelho de Campos, Costa e Silva, Francisco Cunha, Margiochi, Barros Gomes, Henrique de Mendia, Jeronymo Pimentel, João Chrysostomo, Holbeche, Coelho de Carvalho, Gusmão, Jorge O’Neill, Gomes Lages, Bandeira Coelho, Baptista de Andrade, Ferraz de Pontes, José Luciano de Castro, José Maria da Costa, Soares de Albergaria, Julio de Vilhena, Camara Leme, Pessoa do Amorim, Pinheiro Chagas, Sousa Avides, Vaz Preto, Franzini, Polycarpo Anjos, Rodrigo Pequito, Calheiros, Thomás de Carvalho.

O redactor = João Saraiva.

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