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220 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

conhece, e mesmo porque não tem o habito de offender ninguem; deseja simplesmente dizer o que a verdade dos fectos lhe suggere.

N'esta altura do seu discurso o orador cita um livro do engenheiro Sr. Adolpho Loureiro, pelo qual se reconhecem as deficiencias com que foram executadas algumas das obras que se prendiam com os melhoramentos do porto de Lisboa, uma das quaes, o telheiro da alfandega, derruiu, o que veio demonstrar a pouca segurança de conhecimentos technicos dos funccionarios encarregados da sua construcção.

O custo de algumas d'essas obras excedeu em muito os orçamentos que lhe haviam sido calculados.

Por isso elle, orador, tem limitada confiança em que as obras que se vão construir para a exploração do porto sejam realizadas dentro da verba de 1:500 contos de réis.

Sabe que o Sr. Ministro das Obras Publicas, no seu relatorio, diz que essa verba é suficiente; mas elle, orador, tem duvidas a esse respeito, e é por isso que diz ser limitada a confiança que deposita n'essas affirmações.

O Sr. Ministro, n'este projecto, poz pouco de sua casa.

Não o censura por isso, mas quem lê o projecto, e quem lê o relatorio da commissão que em tempo foi nomeada pelo Digno Par Eduardo José Coelho, vê que, entre um e outro documento, a coherencia é perfeita. Vem isto para dizer que, assim como no parecer da commissão se revela a leveza com que o assumpto foi estudado, assim o projecto é desacompanhado de factos positivos e concretos que habilitassem amplamente o Parlamento a exercer o seu criterio e o seu exame.

Este Parlamento, ou outros, conta entre os seus membros engenheiros distinctos que facilmente podem avaliar da bondade ou sinceridade dos meios que se preconizam como excellentes para levar a bom termo o pensamento governativo; mas a verdade é que nem todos os membros das assembleias legislativas são obrigados a dispor de conhecimentos technicos para esse exame.

O meio de supprir essa deficiencia está na apresentação, como já disse, de factos concretos e positivos.

Tem, repete, limitada confiança na acção do Governo com relação ás obras que se projectam.

Apontou o Sr. Ministro a moderna acção centralizadora do Estado no que respeita a administrações de soberania. E certo que se invoca hoje a necessidade de centralizar nas mãos do Estado a administração dos caminhos de ferro, a dos portos e outras; assim como houve uma epoca em que se julgou absolutamente preciso demittir o Estado, de sua mão, por periodos temporarios, e a empresas particulares, aquillo que elle não estava habilitado a gerir.

Em França, por exemplo, o pensamento que domina é o do resgate de todas as linhas ferreas.

Depois da guerra de 1870 manifestou-se o desejo de readquirir, no menor prazo de tempo, aquella auctoridade e prestigio que a França tinha perdido. Reconheceu a França a necessidade de tratar da reorganização do seu exercito, das suas obras publicas, das suas escolas, das suas finanças, de tudo emfim, que pudesse concorrer para a realização do seu desideratum.

A França via-se a braços com a indemnização de guerra que lhe tinha sido imposta pela Allemanha, e que se elevava á enormissima cifra de cinco milhares de milhões de francos, e tinha ainda a liquidação das despesas de guerra, que orçavam por tres milhares.

Reconhecendo a necessidade de renovar tudo que se encontrava em decadencia, mas, dispondo de um orçamento limitado, não duvidou demittir da sua mão a quasi totalidade das suas linhas ferreas a empresas particulares.

Foi isto um mau acto de administração? Foi um mau acto politico?

Decerto que não, porque a França viu que n'um breve periodo de tempo, e com limitado sacrificio, teria construida toda a sua rede ferro-viaria, e, pelo que respeitava ao futuro, estava elle garantido, desde que nos contratos se estabelecia o direito do resgate em qualquer occasião.

Se o Sr. Ministro das Obras Publicas lhe perguntar se o Estado deve intervir na administração do porto de Lisboa, responderá affirmativamente; se porém S. Exa. lhe perguntar se o Estado deve explorar o porto, responderá que não.

É forçoso, pois, distinguir entre administrar e explorar.

Dados os nossos costumes, seremos porventura aptos para essa exploração? Decerto que não. Contentemo-nos pois, em fiscalizar.

A exploração por conta do Estado, importa por porventura que elle se de sinteresse ou deixe de tornar effectiva a sua fiscalização?

Não.

O Estado, por um estudo attento da maneira por que essa fiscalização se exerce, é que pode averiguar se a exploração é ruinosa, ou se produz beneficos resultados.

Depois da pratica de alguns annos, adquire os conhecimentos precises que lhe podem determinar a orientação a seguir no assumpto, e evita assim o perigo de se lançar n'uma, aventura, de que poderá colher amargos fructos.

Este negocio do porto de Lisboa, tem nos offerecido grandes e dolorosas surpresas.

O Sr. Hersent, n'um livro que publicou, justificava a razão das suas reclamações.

Esse livro não teve uma larga diffusão, nem grande leitura; mas devia tê-la.

Por esse livro se pode apurar que nem sempre as empresas particulares deixam de ter razão nas reclamações que apresentam. Uma grande parte d’essas reclamações deriva da indecisão dos Governos, e do desconhecimento das condições em que os factos se realizam, e muitas vezes até da pertinacia com que o amor proprio nos impede de confessarmos os nossos erros.

Se o Sr. Ministro se der ao incommodo de compulsar o livro a que elle, orador, se reporta, terá occasião de ver ahi relatado minuciosamente o que se deu com relação ao cães da alfandega. N'esse livro se vê que por parte da fiscalização se exigiu uma diminuição na espessura do muro d'esse cães, e vê-se igualmente que por parte do empreiteiro se ponderava a inconveniencia d'essa modificação.

Technicamente, ou theoricamente, entendeu-se que tal modificação podia fazer se, e o resultado foi cair o muro, e o empreiteiro julgar-se no direito de pedir indemnizações.

O empreiteiro, a quem era comminada a obrigação de acceitar o projecto, limitou-se a fazer umas ligeiras sondagens no Tejo, e a propor modificações que tendiam a reduzir os seus encargos, o que, aliás, era natural.

A obra continuou-se com grande difficuldade, porque é legitimo e é justo recordar que as condições do Tejo foram insuficientemente estudadas.

Reconheceu-se que desde o Caes do Sodré até o Caes das Columnas o terreno assentava em lodo, o que tornava impossivel ou difficultosissimo o caes que Hersent era obrigado a construir.

O empreiteiro veio com outras reclamações; e, como ellas constituiam uma boa situação para o Estado, preferiu-se um acto de- força que nos trouxe difficuldades, algumas de caracter internacional, o que aliás era de prever, porque um paiz como o nosso está sempre na imminencia de soffrer as imposições dos paizes estrangeiros, quando elles tratam da defesa dos interesses dos seus subditos.

Preferiu-se um acto de força, como disso, exactamente como se praticou em relação á questão do caminho de ferro de Lourenço Marques, questão que teria tambem solução diversa d'a-