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SESSÃO N.° 23 DE 16 DE FEVEREIRO DE 1907 221

quella que recebeu, se houvessemos procedido com serenidade e cautela.

Nós não estamos preparados para obras hydraulicas. Falta-nos a aprendizagem.

Ha no nosso paiz homens competentes em materia de construcção de caminhos de ferro; mas já não succede o mesmo com respeito a outros serviços, mormente os serviços hydraulicos.

Continuando, porem, na analyse do projecto, vê que o Governo calcula em 1:500 contos de réis a quantia necessaria para todas as obras.

O Digno Par Sr. Teixeira de Sousa referiu-se á inconveniencia dos pequenos emprestimos.

Acha muito judiciosas e razoaveis todas as ponderações do Digno Par acêrca do projecto; mas, no ponto restricto de que se trata, seja-lhe permittida uma observação.

Os emprestimos pequenos são, por via de regra, onerosos; mas ha uma grande differença entre o emprestimo que este Governo pretende realizar e o emprestimo contratado para o caminho de ferro da Swazilandia, e isto por uma razão de ordem moral.

É que n'este emprestimo os contratadores ganharam quinhentos contos de réis e o Ministro da epoca sabia qual o lucro d'elles.

No emprestimo a que se refere o projecto em discussão, o Sr. João Franco, desde que note que os contratadores lucram alguma cousa, deixa de negociar com elles.

São estes os principios, de S. Exa., é são estes os principios do Governo, porque a camara viu ha pouco que uma das preoccupações do Sr. Ministro das Obras Publicas consistia na grande vantagem que ha em não remunerar qualquer serviço, por mais perfeito que o mesmo serviço seja.

O ideal do Governo é que o funccionalismo passe o seu tempo a trabalhar gratuitamente para o Estado.

Será um ideal muito apreciavel, no pensar do Governo, mas que tem o grandissimo defeito de lançar muita gente na miseria.

N'este emprestimo, pois, a realizar-se, os contratadores não ganharão 500 contos de réis.

Disse tambem o Digno Par Sr. Teixeira de Sousa que este projecto deroga a futura lei de contabilidade publica.

Não deixa de reconhecer, como S. Exa., que o projecto em ordem do dia deroga o espirito da lei de contabilidade publica, mas n'este caso como nos repertorios, ha sempre o Deus super omnia.

A reforma da lei de contabilidade publica teve dois fins; tranquillizar o Sr. Mello e Sousa, que é a nympha Egeria do Ministerio, e dar uma feição apparatosa á concentração liberal.

A lei de 1881 tem produzido os resultados que derivam de qualquer lei de contabilidade n'um paiz que luta com a falta de meios para fazer face ás despesas publicas.

Metter dentro das formulas de uma lei de contabilidade publica todas as deficiencias do Thesouro, todas as mil circumstancias que derivam da escassez de dinheiro para occorrer a despesas imprevistas ou singulares, é uma verdadeira utopia.

E continuará o regime dos emprestimos, se proseguir o regime dos deficits; com a lei actual, como com a futura, a situação será exactissimamente a mesma.

Voltando ao projecto, vê que elle se compõe de auctorizações e de boas intenções.

As auctorizações são o que o projecto annuncia nas suas diversas bases; as intenções são as que o Sr. Ministro revelou hoje á Camara.

Pelo que respeita a obras, promette o nobre Ministro andar com economia. Pelo que toca a officinas de reparações apenas o que for julgado imprescindivel, e, pelo que respeita ao pessoal, S. Exa. não tenciona nomear o director, o sub-director, os empregados, porque entrega esse assunto ao conselho de administração.

Pelo que se refere á nomeação de pessoal, afigura se-lhe que as boas intenções do Governo não hão de durar muito.

O Sr. Presidente do Conselho vê rarear o seu estado menor, e ha de ver-se na necessidade de supprir as vagas criadas por algumas deserções.

No que toca ás officinas de reparações, disse o Sr. Ministro, em resposta ao Digno Par Sr. Teixeira de Sousa, que ficarão as que já se encontram no porto.

Isto não pode ser, porque essas officinas pertencem a particulares.

Não deseja n'este momento investigar a necessidade que haja de estabelecer quaesquer officinas de reparações para a exploração do porto de Lisboa; mas, pelas palavras do Digno Par Sr. Teixeira de Sousa, fica-se sabendo que nós temos um vastissimo arsenal, com muitos empregados, e onde a construcção de navios se faz por forma que não navegam, o arsenal que o Sr. Ministro da Marinha pensou em transferir para a outra margem do Tejo. E diz pensou porque o programma de S. Exa. está reduzido á simples formula de ver navegar na bahia de Lagos os navios dos outros.

Se esse arsenal, pois, não serve para a construcção e reparação de navios, não poderia servir para as officinas do porto de Lisboa?

Crê ter justificado com a sua exposição que, acêrca d'este projecto, todas as opiniões teem cabimento.

Pode o Digno Par Sr. Espregueira, relator, irritar-se pela circumstancia de imaginar que elle orador combate o projecto ; quando, afinal, não faz senão defendê-lo, sob o seu ponto de vista. O projecto tem até uma grande vantagem, e é que tanto quem o defende, como quem o ataca, tem sempre razão.

Seja qual for a forma por que se trate de executar o que se projecta, o resultado final será de pouca perda para o Estado.

O actual Ministro é responsavel, e não é.

Tem a responsabilidade que resulta de ter vinculado o seu nome ao projecto, mas é irresponsavel, porque se louvou na opinião do pessoal technico, e os nossos technicos nem sempre são os que melhor vêem as cousas.

Houve um projecto de largo alcance economico, e que foi concebido por Marianno de Carvalho, um homem que possuia extraordinarias faculdades de intelligencia, que era um grande mathematico, um professor eruditissimo, um jornalista brilhante, um eximio parlamentar, mas que não era um estadista.

Entende-se, geralmente, que um homem de eminentes dotes de intelligencia pode ser um estadista, e não é assim.

De 1836 para cá, e quer referir-se apenas aos mortos, porque dos vivos rezará a historia, só dois homens encontra que tenham verdadeira e realmente merecido o nome de estadistas: o Conde de Thomar e Fontes Pereira de Mello.

O Conde de Thomar acabou com a desordem proveniente de uma lucta politica encarniçada; e Fontes, reconhecendo que a situação do paiz, pelo seu lado economico, carecia de um profundo desenvolvimento, deu-lhe todas as condições de progresso.

Fontes morreu em. 1887, cedo de mais para o paiz, mas a tempo para elle.

Marianno de Carvalho excedia talvez, em dotes intellectuaes, aquelles dois vultos da nossa politica, mas faltava-lhe a energia.

A sua ductilidade não lhe consentia a insistencia no proseguimento de uma ideia, ou na realização de um pensamento.

Como ia dizendo, Marianno de Carvalho concebeu o plano de um porto em Cascaes; mas viu naufragar a sua ideia perante as reclamações da Associação Commercial, que allegára importar essa innovação o prejuizo dos catraeiros.

Succedeu que os catraeiros ficaram