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152 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REMO

bens immobiliarios, industria ou emprego inamovivel, comprovado pelo effectivo pagamento das respectivas contribuições.

«§ 4.° A moralidade póde comprovar-se por consulta abonatoria do conselho d’estado.

«Art. 5.°- A. Podem igualmente ser nomeados pares do reino por distincção especial os cidadãos que d’essa distincção se houverem tornado dignos por serviço e meritos extraordinarios, sem outra condição mais que a proposta do ministerio e approvação unanime do conselho d’estado.

«Sala da camara, 19 de março de 1878. = O par do reino. Visconde de Seabra.»

Parece-me que d’esta maneira a acção do poder moderador fica completamente livre, porque o poder moderador não póde actuar senão dentro dos limites constitucionaes consignados na carta.

Sr. presidente, procurei conformar-me na minha proposta com os principios fixados na carta, com este paladium sagrado da nossa liberdade, com esta arca da alliança em que se não póde impor mão profana sem perigo do cair fulminado.

Sr. presidente, com a carta podemos nós triumphar de todos os nossos inimigos internos e externos. Sem o pendão da liberdade que ella consagrou, sem aquelle lábaro sagrado que foi hasteado nos rochedos da Terceira e nas praias do Mindello, pelo nosso immortal dador da carta, poderiamos nós lisonjearmos de estarmos aqui hoje sentados, e de ver desenvolver no paiz a prosperidade que elle apresenta?

A quem devemos este immenso beneficio senão a este estandarte sagrado?

Esta geração, que se vae extinguindo, que illustrou o paiz, não póde abdicar o seu maior titulo de gloria. A carta não é para nós só um dogma, é mais do que isso, é uma crença racional, inabalavel; estremecemos, quando vemos mãos profanas tocar na arca sagrada, porque é sempre prenuncio de grandes calamidades. Vejam-se as outras nações o que têem ganho com o continuo movimento social em que as instituições surgem numa hora, para morrerem ephemeramente em outra. E nós não temos resistido a todas as tempestades? Não temos desenvolvido a nossa prosperidade á sombra desta égide sagrada? Precisamos portanto ser escrupulosos ao tocarmos n’esta suprema garantia da nossa liberdade.

Não se pense, sr. presidente, que este nosso affecto á carta passa a superstição mal cabida! Não, e não, a mesma carta constitucional sabia e previdentemente estabeleceu todos os meios de poder acompanhar o progresso social, sem prejudicar nenhum melhoramento, nenhum progresso.

A precipitação na reforma de pontos tão importantes não fará senão comprometter a paz, a tranquillidade e a ordem publica.

No meio da quietação politica em que nos achâmos, e em que felizmente as questões abstractas quasi estão abandonadas de todo, a não ser em alguns espiritos inquietos movidos unicamente por interesses particulares e mesquinhos, ou ambições imprevistas, abrir uma brecha em um edificio tão solido, não seria arriscar e comprometter a sua existencia? Se hoje dermos esse exemplo, o que poderá acontecer amanhã? Onde parará esse furor de destruir e de innovar sem mesmo dar tempo á contraprova da experiencia, que é a desgraça maior dos tempos modernos?

Sr. presidente, eu quero a carta toda inteira, como ella é, porque não lhe falta nada para fundamentar e estabelecer a prosperidade d’este paiz, e é a melhor garantia de ordem e liberdade que poderemos legar aos seculos vindouros.

Nem se pense, sr. presidente, que, eu sustentando estas idéas, presto homenagens pessoaes. Para mim o poder moderador é um principio; o exercicio d’elle um principio; que o Rei se chame Pedro, Luiz ou José, para mim é indifferente.

É preciso respeitar este principio, tanto como todos os outros principios fundamentaes da carta. É preciso mesmo esquecer que o systema economico da nossa constituição constituo um todo de tal fórma ligado nas suas partes, que não será facil supprimir alguma d’ellas, sem a destruir ou pelo menos prejudical-a sensivelmente, e por isso entendo que toda a circumspecção e cuidado será pouco na alteração ou modificação de seus artigos.

Quer-se melhorar a carta? Não serei eu quem se opponha, se é necessario. Nem a mesma carta se oppõe.

O que não depender da legislatura ordinaria, faça-se pela legislatura extraordinaria.

Não acho que haja tal pressa, que a nação não possa continuar mais dois, tres ou quatro annos como está.

Os perigos de uma doutrina contraria são tão óbvios, que escuso descer a especialisal-os.

A substituição que apresento, parece me que preenche tudo quanto se possa desejar: garantia de illustração de independencia, como as podemos requerer segundo as crenças geraes, por isso que no fim do tudo a independencia, por exemplo, é uma qualidade pessoal que se não póde considerar como expressamente vinculada á posse da riqueza.

Homens ricos, muito ricos, não poucas vezes se mostram mais escravos do que muitos homens pobres A illustração é necessaria; não ha emprego nenhum na sociedade para que ella se não exija, porque a carta, querendo que não haja distincções mais que a do talento o virtudes, não podia deixar de nos impor a obrigação de designar quaes os titulos que devem comproval-a.

A moralidade, essa é de mais facil apreciação.

É preciso uma abonação para evitar os perigos a que póde ser arrastado o poder moderador. Ora, não será uma grande abonação para o chefe do estado a apresentação da proposta pelo ministerio?

Não será abonação bastante a approvação do conselho d’estado, em que se acham reunidas as summidades do paiz?

Pois se se admitte aqui para a abonação de moralidade o attestado de tres dignos pares, como se póde recusar o testemunho de uma abonação d’esta ordem?

Quando chegarmos a essa parte eu terei de mandar tambem para a mesa algumas emendas.

No que diz respeito ao direito por successão, terei de fallar ainda; mas sobre esta materia temos as mãos completamente desatadas, porque não encontramos os mesmos encalhes que se nos apresentam pelo artigo 74.° da carta. Os artigos 39.° e 40.° não fazem mais do que narrar o facto que suppõem estabelecido pelo direito e pelas nomeações do poder moderador.

O poder moderador faz a nomeação dos pares, que são vitalicios e hereditarios; mas nenhum artigo da carta determina o modo, limite ou ordem d’esta successão.

Ora, sendo o pariato hereditario, a ordem da successão é regulada pelos principios geraes da legislação civil, que nos indica quaes são os que devem succeder.

N’esta parte não ha dificuldades em relação á competencia legislativa.

Sr. presidente, eu entrego á consideração da camara a proposta que mandei para a mesa, desprendido de toda a idéa pessoal e faça ella o que entender em sua alta sabedoria.

O que desejei unicamente foi manifestar o meu voto para que se saiba quaes os principios que me determinam a votar n’este ou n’aquelle sentido.

Sr. presidente, não se estranhe, nem se leve a mal este amor e aferro que nós temos aos principios da carta. Não se póde estranhar aos velhos soldados do Mindello, de Almoster e da Asseiceira, que tanto sangue derramaram para restabelecer a liberdade n’este paiz; não se leve a mal a um desterrado da patria, e que tambem militou debaixo das bandeiras gloriosas do immortal D. Pedro, este profundo sentimento de entranhado amor e respeito pela carta constitucional.