O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

194 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

não terá havido exemplos de perderem os rendeiros?- Mas quando ganhem, não será esse ganho equivalente ao risco, á sua maior actividade - ao seu zêlo, ao seu trabalho? - Mau será para o thesouro que o rendeiro perca. - Mas o estado não lucra igualmente a economia que faz nas despezas de percepção e fiscalisação? - Não é lucro tambem a certeza da cobrança do imposto?

Assim, - a verdade é que nem sempre o estado perde, nem sempre o rendeiro lucra. Em todo o caso este lucro será compensado pela economia na cobrança e certeza na percepção.

Emquanto aos vexames, é inquestionavel que a percepção e fiscalisação do imposto nos generos de consumo é sempre vexatoria, mas é vexatoria igualmente, quer seja feita por conta do estado, quer seja feita por arredamento.

O contribuinte é sempre vexado, quer seja fiscalisado pelo rendeiro, quer seja pelo agente do fisco.-O rendeiro, porém, terá sempre mais cautela em não vexar inutilmente porque o seu interesse está cem não irritar o contribuinte, em não se tornar odioso, em não levantar contra si a opinião da publico.- Se o rendeiro não e tolerante levantará contra si a animadversão dos contribuintes, e encontrará uma resistencia que não poderá vencer, e perde tudo.- A fiscalisação é sempre a mesma, quer na administração do estado, quer na do rendeiro. Quanto mais activa mais vexatoria; mas se não for activa não servirá de nada, e em tal caso é melhor extinguir o tributo.

Fallou-se tambem aqui em influencia eleitoral e politica. Eu entendo que é muito mais de receiar a influencia do fiscal do governo do que a do rendeiro, porque a d'este não poderá ser empregada senão á custa dos seus proprios interesses, e a do fiscal do governo será exercida á custa do thesouro.

Sr. presidente, está reconhecido por todos que os actuaes meios de percepção e fiscalisação do imposto do real ds agua são insuficientes.- Por isso é que por varias vezes se tem tentado estabelecer barreiras nas povoações, e guias de transito para a circulação. -Nenhum d'estes meios de cobrança tem podido praticar-se.-As barreiras caíram em 1868; e apesar do restauradas em 1878 pelos srs. Serpa e José de Mello, não poderam ser estabelecidas.- As guias de transito que foram propostas em 1873 e em 1878 pelo sr. Serpa não podaram vingar.- Se, pois, estes meios de fiscalisação, usados nas nações estrangeiras, são aqui rejetados, a que meios deveremos recorrer?!!

Não basta, auctorisar impostos, é preciso estabelecer meios administrativos de percepção.- Rejeitados aquelles que a experiencia de outros povos aconselham, quaes poderão ser adoptados? Sem meios adequados de fiscalização e cobrança é melhor extinguir o imposto.

Estou cansado, e a camara estará enfadada. Termino, pois, aqui as minhas observações.

O sr. Marquez d9 Ficalho: - Só por distracção poderia pedir a palavra, porque tenho negação para questões de fazenda, mas a minha distracção tem desculpa, porque quanto mais se afastava a discussão do projecto do real de agua, tanto mais se approximava da questão politica, e de tal modo me illudi, que julguei que era a resposta ao discurso da corôa.

Seria grande atrevimento fallar em finanças n'uma camara tão competente, que só ministros de fazenda conta seis ou sete, alem d'isso ha muitos annos que ando confuso, porque, se de um lado me dizem que podemos e devemos pagar mais, do outro me asseguram que não podemos com os encargos que temos; uns julgam-nos ricos e outros pobres; no entanto escuto as demonstrações de um e outro lado, e cada vez fico mais confuso, e noto que o maior numero julga pelo instincto estas questões; o meu, sr. presidente, diz-mo que Portugal não é miserave], nem pêco, mas que é pobre.

Não foi para tratar a questão de fazenda que pedi a palavra, pedi-a porque quero declarar que sou regenerador, e não o sou da vespera, sou do dia seguinte, porque vi inscriptas na bandeira d'esse partido duas palavras que me prenderam: paz e trabalho: a paz não a conhecia, em guerra tinha passado a minha vida, e justo era querer acabar em paz.

Sr. presidente, quando tive uso de rasão vestiram-me de luto, e rara era a familia portugueza que não tinha um signal igual; é certo que ouvi apregoar as pazes em 1804, mas a fatalidade não quiz que fossem para Portugal, porque a nação, abandonada pelo Rei, e offendida em todos os seus brios, conspirava.

Lembro-me, sr. presidente, com horror do dia em que foram justiçados Gomes Freire e os seus malfadados companheiros.

A conspiração n'esse tempo tornara-se mais larga, e propagára-se em mais vasta área; sentia-se, mas não se via, porque era agora mais sagas e prudente; rebentou por fim, e foram proclamados os principies da constituição de vinte. Porque não trouxe este movimento a paz? Porque pouco depois rebentava uma revolta era Traz os Montes. E viu-se então o seguinte quadro: um rei em Villa Franca, um principe em Santarem, as côrtes abandonando o seu palacio, a capital entregue ao seu povo, e este dando a mais severa lição a todas as outras classes, e denunciando claramente que se a anarchia pretende ás vezes ter logar nas altas regiões, não chega a propagar-se quando o povo não concorda com ella.

Chegou a carta, sr. presidente, e a paz viria com ella se não fossem os oito annos do guerra civil, acompanhada do seu tenebroso sequito de ruins paixões. Essa guerra que começou em 1826 acabou em 1834. Corramos um véu sobre as lastimaveis scenas d'esse tempo.

E eu, no entretanto, sr. presidente, descrente de encontrar a paz ambicionada, VI abrir-se ante mim um novo caminho. Fui levado por um homem, a quem preso e estimo infinitamente, a presenciar um espectaculo inteiramente novo. Esse homem senta-se n'aquellas cadeiras; refiro-mo ao sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa. Fomos companheiros e collegas nos trabalhos, collega não direi bem, porque elle foi mestre e eu discipulo. Fomos companheiros nas luctas; eu tinha visto Como se levantavam trincheiras, como se abriam fossos, como se assestavam baterias, mas não tinha visto como se faziam os sulcos na terra para dar passagem a esse novo elemento - o caminho de ferro.

Foi esse o espectaculo a que assisti.

Começava a nova era - a era da paz e o trabalho. (Apoiados.)

E essa nova era, sr. presidente, inaugurou-a a regeneração.

Eu applaudi sempre as idéas da regeneração, e ainda hoje as applaudo. Vejo n'aquellas cadeiras (apontando para as cadeiras do ministerio) cavalheiros comi cuja politica não concordo.

Não pergunto donde vem, nem para onde caminham. Donde vem, sei-o eu perfeitamente, mas para onde vão sabel-o-hei mais tarde. O que quero deixar bem consignado é que mo não contem nem no numero de seus adversarios, nem que me tenham na conta de seus amigos.

No resto da minha vida espero votar como jurado.

Não posso votar a arrematação do real do agua.

Tenho dito.

(O orador foi comprimentado por muitos dignos pares.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra o digno par, o sr. Mendonça Cortez.

O sr. Mendonça Cortez: - Desisto da palavra.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Carlos Bento.

O sr. Carlos Bento: - O exemplo é contagioso. Desisto da palavra.

O sr. Presidente: - Segue-se na ordem da inscripção o sr. conde de Rio Maior.