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204 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

se ainda me admittem uma terceira rasão, é convencer o paiz de que a questão financeira não é uma questão de politica, que ao paixões não devem intervir n'ella, e que todos os partidos por interesse unico do paiz devem procuram resolvel-a sendo governo, cabendo-lhes tambem a obrigação de não crear difficuldades para a solução d'ella; sendo opposição. N'isto não póde, nem deve haver differença de escolas; é um principio commum a todas ellas.

Pergunto, porém, sr. presidente, teremos nós escolas financeiras?

O sr. ministro da fazenda declarou que havia duas; tendo, porém, o prazer de ouvir ante-hontem o sr. conde de Valbom, respondendo ao sr. ministro, fiquei persuadido que havia tres escolas; e se continuarem a intervir mais oradores na discussão, poderemos crer que ainda ha mais, ou por outra, e com mais rasão, que não ha nenhuma.

Pois ha escolas financeiras com principios definidos, e vemos os diversos homens publicos acceitarem sendo ministros aquillo que combateram sendo opposição, e combaterem como opposição o que apoiaram e apresentaram, por iniciativa propria, sendo governo?

E não procedeu assim o sr. Antonio de Serpa, e não está procedendo hoje da mesma fórma o actual ministro da fazenda?

Sr. presidente, vou concluir declarando, que estou prompto a apoiar com o meu voto todas as propostas financeiras que o governo apresentar, inspirando-se das verdadeiras condições economicas do paiz e da necessidade impreterivel de equilibrar a receita com a despeza, e do organisar definitivamente as nossas finanças. Este projecto, porém, não o voto.

Combati com energia o projecto sobre o real de agua do governo passado, combato com igual energia esta auctorisação que o governo pede para poder dar de arrematação a cobrança d'aquelle imposto, e francamente declaro que nem mesmo cheguei ainda a comprehender qual o intuito do governo apresentando uma tal proposta.

O governa acabava do usar de uma auctorisação publicando o regulamento de 29 de dezembro.

Tinha os meios necessarios para montar convenientemente o serviço da fiscalisação e da cobrança do real de agua; que significa, pois, o vir hoje, sem saber o que dá o novo systema, pedir uma auctorisação, que é a negação d'aquella de que acabou de fazer uso?

Sr. presidente, será este o meio de vencer as reluctancias que por imprudencia nossa temos levantado no paiz contra todo o imposto?

Ha uns poucos de annos que, permitta-se-me a phrase, estamos fazendo cocegas ao paiz com o real de agua, e não queremos que elle as sinta, que se mecha, que só revolte! Pois não lh'as fizessemos!

Sr. presidente, espero com impaciencia o documento a que o sr. ministro se referiu na sessão passada, rendendo louvor ao empregado que o elaborou, louvor que eu agradeço, que sei que é merecido, e que por isso mesmo honra o ministro que o faz e o empregado a quem o dirige, e que eu agradeço como se me fosse feito pessoalmente, tão de perto me diz respeito tudo o que é concernente á pessoa a quem o illustre ministro se refere.

Venha esse documento, e por elle verá a camara e o paiz que desigualdades monstruosas se dão nas contribuições de lançamento.

Pois bem, corriijámos essas desigualdades, aperfeiçoemos as matrizes, e cortemos pela raiz a rasão d'essa imperfeição, que vem sobretudo e principalmente de sacrificarmos a administração á politica.

Sou proprietario, e creio poder affirmar que a propriedade não reage contra o imposto equitativamente distribuido, e que por interesse proprio ella deseja contribuir para que se equilibre a receita, com a despeza, e se acabe por uma vez com uma desorganisação fiananceira que traz sobresaltadas todas as relações da economia publica.

São de louvar todos os esforços que o illustre ministro emprega para conseguir esse fim; o paiz, porém, fazendo justiça ás suas intenções, póde deixar de acceitar as idéas de s. exa. e o pensamento das suas medidas como sendo o meio mais seguro e efficaz de obtermos a organisação definitiva das nossas finanças. Nem esta se obtem com ensaios como o do projecto que se discute, nem com medidas que, contrariando a indole dos nossos costumes, e juntando ao encargo do imposto o odioso do vexame, e o arbitrio da acção fiscal, predispõe instinctivamente contra si a consciencia já hoje demaziadamente susceptivel do contribuinte.

Não me canso de o repetir; vejamos em que paiz estamos e como o temos educado. Se a questão financeira se resolvesse pelo recurso ao imposto, independentemente do saber se o paiz o pagava, ou podia pagar, era facil resolver a questão de fazenda. O difficil, porem, é pôr em harmonia as exigencias do thesouro com as condições do contribuinte.

As difficuldades com que lutámos vem herdadas de longos annos; constituem a responsabilidade de diversas situações; e o illustre ministro, cujo animo é para muito, e cujo enthusiasmo é para muito mais, póde ver-se assoberbado pela audacia do commettimento de querer vencer de repente todas as difficuldades que o cercam, e que encontrou creadas com a responsabilidade de todos os partidos e de todas as situações. As suas aspirações têem de lutar aqui com a realidade dos factos, com a verdade pratica das condições em que o paiz se encantra. N'isto me faz s. exa. lembrado o que D. Francisco Manuel conta de um certo fidalgo nas suas Epanaphoras politicas, quando diz:

«Era este fidalgo mais especulativo que pratico em os negocios publicos; e discursando comsigo mesmo ácerca das causas do empenho em que se via a fazenda real, se persuadiu que elle só, depois de tantos, lhe achára justo e facil o remedio.»

Sr. presidente, em vista das considerações que tenho produzido já v. exa. vê que veio contra o projecto em discussão.

Como disse, a synthese do meu discurso dá a rasão do meu voto.

É possivel que o sr. ministro da fazenda, que vão usar da palavra, possa oppor ás considerações que tive a honra de apresentar á camara, argumentos que resolvam as duvidas que no meu espirito e no de muitos dos meus collegas se levantam contra a conveniencia que possa resultar ao paiz de ser approvado o projecto em discussão. Oxalá que o possa fazer, e que s. exa. convença a camara e o paiz de que a opposição que está soffrendo cata sua medida é injustificada, como são injustificados os receios de que posta ella em vigor se não consiga senão tornar mais odiosa a idéa do imposto.

Sr. presidente, quando se entrar na analyse dos artigos do projecto, na discussão da especialidade pedirei de novo a palavra, reservando-me para então propor algumas modificações aos artigos do projecto.

Por agora concluo votando contra elle na generalidade.