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SESSÃO DE 4 DE JUNHO DE 1887 357

guramente, em regra, os mais distinctos os quaes procuram os quadros do ultramar, unicos a quem a lei incumbe o ensino na escola de Goa. Primeiro defeito e gravissimo.

Quem quizer aprecial-o em todo o seu valor, compare a escola de Goa, com tal regimen, com a de Bombaim onde á sciencia começa a florescer.

E o medico indigina educado na escola de Goa que destino tem? Já vimos que lhe é vedado ser professor effectivo na sua escola, inconveniente não menos grave que o que acabo de referir, pois que todo o cuidado da legislação deveria consistir em interessar o indigena pela sua escola, abrir-lhe-n'ella uma carreira estavel e conseguir que n'um futuro1 não longinquo elle dispozesse completamente do ensino, o que era tanto mais conveniente e proveitoso quanto é certo que a raça indigena é notavelmente intelligente.

Mas ha peior! Ao que isso contra o indigena. Os goanos formados na sua escola não têem outro futuro que não seja o entrarem como facultativos nos quadros do ultramar, e ainda ahi são perseguidos porque nunca podem chegar, a primeira classe, só reservada para os medicos das escolas da metropole; e, quando a lei lhes concede aposentação por diuturnidade de bom serviço, ficam com a patente de capitão percebendo apenas 24$000 réis mensaes!

Como v. exa. e a camara podem apreciar, sr. presidente, a organisação da escola de Goa é contraria aos interesses legitimos do indigena.

Vejamos agora a altura da instrucção d'esses medicos que pela lei são destinados aos quadros do ultramar, isto é, para prestar os soccorros medicos e espalhar a civilisação nas nossas colonias da Africa principalmente.

Já vimos as qualidades dos professores da escola, syntheticamente apreciadas, attenta a sua proveniencia e ainda a circumstancia de serem obrigados a accumular duas ou mais cadeiras. Fallarei agora dos instrumentos de ensino.

Sr. presidente, os differentes ramos da medicina, sciencia essencialmente, pratica e positiva, ensinam-se lá theoricamente, sem os mais elementares meios de experiencia e observação. Parece que tudo é theologia n'aquella malfadada colonia que creio aspirou ao papado.

Não ha cadaveres, não ha instrumentos, não ha hospitaes: lêem-se ali alguns livros, e não se mostram factos, não se educam os sentidos para aprecial-os; é tudo menos ensino medico no seculo presente. Os professores de clinica alem de irem da Europa e não conhecerem, por isso, como conheceria o indigena, a raça, o clima, o solo, e a pathologia especial d'esses povos, dispõem apenas d'um pequeno hospital militar, cuja população, não excede sessenta doentes.

Hospital, de sessenta doentes, e d'um só sexo; nunca póde servir para o ensino clinico, mesmo o mais elementar.

Tal é, sr. presidente, o estado da escola de medicina portugueza em Goa!

Veja a camara se um instituto assim organisado póde aproveitar a mancebos intelligentes que ora vão deixar a vida ecclesiastica, e eu deixo ao bom censo de. v. exa., sr. presidente, e ao da camara, o julgar se não tendo nós outra escola de medicina no nosso imperio colonial, valeria a pena organisar esta escola em condições de nos dar medicos distinctos para distribuirmos pelos vastos territorios que possuimos.

Póde ser presumpção minha pouco fundada, mas afigura-se-me, sr. presidente, que para nós havia maiores vantagens em distribuir pelas terras do padroado medicos goanos intelligentes, que levassem a esses povos com os soccorros medicos, a civilisação naturalista do seculo em que vivemos, do que continuar a mandar-lhe padres que vão em procura de alguns haveres, auferidos a troco de sacramentos.

O uso pedir ao sr. ministro da marinha que se digne attender a esta questão que reputo importante e opportuna, depois de ratificada a concordata com a Santa Se.

Sr. presidente, se em alguma cousa eu entendo que devo insistir n'este assumpto de um modo particular, é pela conservação e grandeza do pouco que temos na India, d'esse resto desgraçado do imperio do grande Affonso de Albuquerque. Poisasse desideratum depende em muito da cultura do indigena.

Não descreverei á camara, para não abusar da benevolencia que se tem dignado dispensar-me, o estado em que se encontram os outros estabelecimentos de instrucção na India, e em especial o lyceu e a malfadada escola de ensino profissional. Limito-me apenas a pedir ao governo que attenda como lhe cumpre ás imperiosas necessidades da educação dos filhos d'aquelles povos.

Fecho aqui, sr. presidente, o que me occorreu dizer a respeito da concordata.

Agora vou entrar na analyse dos motivos por que registo, como hontem disse, todas as moções que foram apresentadas pelos dignos pares que me precederam neste debate.

O digno par o sr. Miguel Osorio apresentou uma moção na qual convidou o governo a dirigir supplicas ao Santo. Padre para serem incorporadas nas dioceses do padroado as christandades do Ceylão, e o pensamento de s. exa. foi secundado por outros dignos pares, e em especial pelos srs. Fernando Palha e Costa Lobo. Anima-me o mesmo sentimento de gratidão que tão nobremente manifestaram s. exa. pelos habitantes da formosa ilha, em que outr'ora foi grande o nome portuguez.

Mas, sr. presidente, eu não posso esquecer o lado politico d'esta questão! Depois de ter ouvido declarar ao sr. ministro dos negocios estrangeiros que o governo se compromettera com o Santo Padre a não fazer mais pedidos após as concessões, obtidas já depois da ratificação da concordata, eu penso que seria menos delicado apresentar novas exigencias de resto eu creio que, caso o Santo Padre julgue que o pedido d'essas christandades é justo, attendel-as-ha independentemente da interferencia do governo portuguez.

De mais eu desejaria saber, para julgar n'esta questão, se o pedido é directamente feito pelas christandades, que preferem ouvir a palavra de Deus dos labios do padre goano em recordação pelo nosso nome, ou se tal pedido vem indirectamente dos padres goanos, por lhes convir terem campo mais vasto para as suas explorações.

Aprecia v. exa. bem claramente, sr. presidente, que o nosso juizo e proceder devem ser differentes em cada uma das duas hypotheses.

O sr. Conde de Alte:- V. exa. dá-me licença?

O Orador: - Com muito prazer.

O sr. Conde de Alte: - Affirmo a v. exa. que o pedido vem directamente dos povos de Ceylão.

O Orador: - Agradeço a v. exa. a explicação que me dá e que eu acceito, apesar de saber qual e o processo por que muitas vezes se obtem dos povos essas petições.

Mas ainda n'essa hypothese não devemos esquecer-nos de que os povos que nos dirigem esse pedido se compõem de subditos de Sua Magestade Britannica, e que por isso deve haver toda a circumspecção em nos intromettermos a apasiguar as suas contendas religiosas, dando-se a circumstancia particular de, porventura, andarem envolvidos n'essa lucta padres do territorio portuguez.

O que se me afigura mais conveniente é que esse pedido para Sua Santidade vá por Londres. Consiga Sua Magestade Britannica que o Santo Padre faça a vontade aos povos de Ceylão, e depois Sua Magestade El-Rei de Portugal responderá que sim, que recebe no padroado os subditos inglezes. D'outra fórma não. Peço á camara que me dispense de alongar-me n'esta analyse. Rejeito, pois, a moção do sr. Miguel Osorio.

Passo a examinar a moção do digno par o sr. Thomás Ribeiro.

S. exa. apresentou uma moção verdadeiramente politica, apesar do digno par ter affirmado o contrario quando a leu á camara.