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SESSÃO N.° 20 DE 27 DE NOVEMBRO DE 1894 239

N’esta parte, sr. presidente, os clericaes, que tanto se accusam, podem levantar a fronte e fallar mais alto do que os seus adversarios.

Sr. presidente, emquanto esses inimigos do clero, a quem nós perdoamos generosamente as injustiças com que nos tratam, ou difficultam a acção dos governos com as suas doutrinas que podem estontear o espirito publico, ou procuram locupletar-se com o suor do povo com o menor trabalho possivel, os clericaes, sempre modestos, humildes e dedicados, arruinam a sua saude e expõem a sua vida no desempenho do seu ministerio do paz, de caridade, de amor, já em logares inhospitos e doentios do continente, já nos trabalhos e perigos de alem-mar, tendo por unica recompensa para a velhice e para as doenças, a miseria e a fome.

E esta, sr. presidente, uma grande verdade que ninguem poderá contestar, porque, ao missionario, quando vem para o continente, já doente, alquebrado o gasto no trabalho de conquistar almas para Deus e cidadãos para a patria, dão-lhe apenas 240 réis diarios, muito menos d’aquillo que se dá aos mais Íntimos serventuários das nossas secretarias. E, comtudo, sr. presidente, bemdito seja o Senhor, porque não faltam benemeritos da religião e da humanidade que por uma e por outra sacrifiquem saude e vida com a mira sómente nas recompensas do céu, porque nenhumas outras podem esperar da terra.

Tambem, sr. presidente, está-se para ahi sempre a dizer, talvez para desvirtuar as intenções rectas dos bispos e para os indispor com os partidos politicos, que elles querem formar um. partido catholico que aspire ao poder e governo da nação, com gente só do mesmo partido. Podiam fazer isso, sr. presidente, porque dentro das instituições ha campo para todos, e em que todos podem caber, e não seriamos nós, que unidos com o nosso clero e com muitos dos nossos diocesanos, teriamos menos elementos e menos força para realisarmos taes intentos, se os tivessemos.

Mas a verdade é que, isso que dizem, não tem fundamento absolutamente nenhum. Alem do não ter rasão de ser um partido catholico n’um paiz em que a totalidade ou quasi totalidade dos seus habitantes são catholicos, e em que a sua constituição politica e a sua legislação reconhece e protege a religião catholica como religião do estado, esse partido, sr. presidente, no meu entender, póde ter o gravissimo perigo de quebrar a unidade da fé os que não pertencessem a elle podiam deixar de ir ás igrejas e de cumprir os seus deveres de religiosos e catholicos para não parecer que pertenciam ao partido catholico.

E d’aqui poderia surgir a questão religiosa, com todas as suas funestas consequencias, para aggravar mais a situação do paiz, e é isto o que nós desejamos evitar como cidadãos portuguezes, amigos da nossa patria.

Podem, pois, os partidos politicos que se alternam no poder, governar á sua vontade, porque nós não lhe faremos concorrencia. O que nós queremos é ajudal-os a governar bem e christãmente, e constituir uma especie de união e de força junto d’elles para que, sem impedir a sua acção governativa e a sua politica, possamos evitar, quanto for possivel, que elles, condescendendo com exigencias ultraavançadas, possam combater a religião, a igreja e os seus direitos.

N’esta união e força podem estar muito á sua vontade, sem antagonismos e sem contradicções, todos aquelles que desejam a influencia salutar da religião no viver e governo do povo portuguez, ou pertençam ao partido progressista, ao partido regenerador ou a outra qualquer agremiação politica. E não se tema que d’aqui possam vir ou difficuldades para o exercicio do direito de inspecção do governo circa sacra, ou restricções para as liberdades e prerogativas da corôa, ou quaesquer obstaculos na apresentação do Real Padroeiro para o provimento dos beneficios ecclesiasticos.

No systema concordatario das nossas relações do Estado com a Igreja, é necêssario que a Igreja em recompensa da protecção que lhe dá, ou deve dar, o estado, não lhe tolha o uso justo e legitimo d’esse direito e d’essa liberdade. E nem nós queremos ou pretendemos outra cousa.

Felizmente, sr. presidente, eu vejo com muita satisfação que assim o pensam e sentem, e que não duvidam de nós, e que pelo contrario estão já ao nosso lado, não poucos cavalheiros distinctos dos partidos liberaes e estadistas eminentes e de merito superior, e aureolados já pelos seus talentos, pelos seus grandes serviços e pelo muito respeito e prestigio que têem no paiz.

Sr. presidente, tambem eu estimo ver que o governo, honra e louvor lhe seja dado, protege a religião catholica, e considera o episcopado já pelas attenções o delicadezas com que acolhe as suas pretensões, já pela solicitude com que o sr. ministro da justiça tem dado execução á lei das aposentações dos parochos, aposentações que nós, os bispos, desejamos e queremos muito para não passarmos pelo desgosto e pela dôr de vermos os nossos cooperadores no fim da vida sem soccorros e sem auxilio, já pelas honras que recommendou se prestassem ao dignissimo representante da Santa Sé, quando visitou as cidades do Porto, Braga e Coimbra, já nas propostas que tem apresentado ao parlamento para ser dia santificado o dia de S. José, e para ser considerada como nacional a festa de Santo Antonio, e, finalmente, pelas attenções com que o sr. presidente do conselho, como é proprio do seu elevadissimo espirito e gentileza, tem respondido aos meus dignos collegas que advogaram a necessidade de acudir ao estado lastimoso em que se encontram as juntas de parochia, para as quaes nós, os bispos, viriamos aqui apresentar um projecto de lei, se porventura pertencesse a esta camara tal iniciativa.

Sr. presidente, peço a v. ex.a, á camara e aos cavalheiros a quem me tenho referido, se dignem acceitar os nossos louvores e agradecimentos pela benevolencia que têem tido para comnosco, e a promessa que fazemos de empregar todos os nossos esforços para nos tornarmos dignos d’essa benevolencia e para bem servir a religião e a patria. (Vozes: — Muito bem.)

Vou terminar, porque me peza de já ter cançado v. ex.a e a camara; peço que me perdoem e que me permittam que conclua fazendo, no seio da representação nacional, um voto a Deus para que inspire o Rei, o governo e as camaras, a fim de que, pondo de parte as paixões politicas, dêem as mãos uns aos outros para levantarem a nossa querida patria do abatimento a que tem chegado, e que tantas lagrimas de sangue faz derramar aos dignos e verdadeiros filhos d’aquelles que de um punhado de terra fizeram uma nação que avassalou mares e continentes e que

Em perigos e guerras esforçados

Mais do que permittia a força humana

conquistaram esse passado de glorias, que é ainda hoje a honra do paiz e o grande brazão do orgulho nacional.

(O digno par foi muito comprimentado.)

O sr. Ministro da Justiça (Antonio d’Azevedo Castello Branco): — Sr. presidente, v. ex.a e a camara comprehendem que eu não pedi a palavra para responder ao eloquente discurso que acaba de proferir o digno par o sr. bispo conde, mas unicamente para felicitar o parlamento por ter no seu seio membros tão eloquentes, vozes tão auctorisadas.

As affirmações do digno par tiveram uma significativa opportunidade. Não é sómente a opportunidade proveniente das circumstancias em que se encontram as sociedades europêas, mas tambem a que vem da situação do nosso paiz, onde se repercutem os echos de doutrinas subversivas que deflagram em algumas nações com temerosa violencia.

Sr. presidente, tanto na minha qualidade de ministro, como de membro humilde da sociedade civil, nunca hesi-