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242 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

devessem levar o governo a fazer essa concessão, embora provisoria e temporaria, ao governo hespanhol.

Não posso deixar de lastimar que, depois das prolongadas negociações que duraram seis annos, de 1887 a 1893, para que se chegasse a um resultado, depois de tanta e aturada discussão que houve entre os negociadores portuguezes e os negociadores hespanhoes, que sustentavam o mais possivel a reciprocidade da pesca nas costas dos dois paizes, depois d’essa grande lucta para obtermos o exclusivo até ás seis milhas, fossemos, passados poucos mezes depois da approvação do tratado, e por um simples traço de penna, alterar o que estava disposto no mesmo tratado!

Eu hei de mostrar, sr. presidente, que para nós portuguezes e, especialmente para os pescadores algarvios, não havia conveniencia nenhuma em que se introduzisse no tratado similhante alteração, desapossando-nos da maior, da mais importante das compensações que n’elle tinhamos alcançado. A verdade é esta: nós fizemos por aquelle tratado grandes concessões á Hespanha. Uma d’ellas foi até n’esta camara objecto de reparos e de censuras até dos proprios amigos do governo: a que se referia á livre importação dos gados, principalmente do gado vaccnm. Pois a esses reparos respondia-se dizendo que tinhamos obtido uma grande compensação na limitação do direito da pesca para os hespanhoes; e é d’essa compensação que nos desapossámos!

Alem de que, mais um motivo ha para eu desejar que se discuta Iargamente: e é que da leitura do Livro branco sobre as negociações do tratado, resultou para mim a convicção de que, terminado que seja o praso do convenio, nós teremos ainda de ver ou prorogado esse praso, ou tornado definitivo o que hoje é apenas provisorio e temporario.

Passo a ler a minha nota de interpellação.

(Leu.)

O sr. Presidente: — Vae ler-se a nota de interpellação mandada para a mesa pelo digno par o sr. conde de Castro.

Leu-se na mesa, e é do teor seguinte:

Nota de interpellação

Peço que seja prevenido o sr. ministro dos negocios estrangeiros de que desejo interpellar s. ex.a ácerca do accordo provisorio sobre a pesca, ultimamente celebrado com a Hespanha. = Conde de Castro.

O sr. Presidente: — A nota de interpellação será expedida, e os documentos serão novamente requisitados.

O sr. Conde de Castro: — O que eu peço a v. ex.a, sr. presidente, é que logo que venham os documentos, e o sr. ministro dos negocios estrangeiros se dê por habilitado a responder á interpellação, v. ex.a marque o dia para ella se realisar.

O sr. Presidente: — Será destinado o dia compativel com a conveniente ordem dos trabalhos da camara.

O sr. Conde do Casal Ribeiro: — Se pedi a palavra quando a camara attendia á oração admiravel do esclarecido prelado de Coimbra, e se agora invoco a benevolencia dos meus collegas para me ouvir breves palavras, não o fiz, nem faço, movido pela pretensão vaidosa de ter alguma consideração de valia a acrescentar áquellas que foram produzidas pelo venerando prelado, com tanta auctoridade pessoal, como verdade de doutrina e belleza de fórma. Obedeço apenas ao desejo vehemente, ao appello do consciencia, que me não permitte calar em silencio o testemunho de respeito profundo e adhesão incondicional ás manifestações tão sabias, tão dignas, tão consentaneas ao seu alto caracter, que têem sido feitas aqui pelos veneráveis prelados da igreja luzitana — hoje pelo sr. bispo-conde, em dias anteriores por outros de seus illustres collegas na missão apostolica.

Grata, consoladora e util tem sido a presença n’esta casa dos dignos prelados. É motivo para nós de justa satisfação possuirmos na nossa camara, por virtude do preceito constitucional, collegas taes, que podem ser, e em realidade são, mestres e exemplo. E motivo de complacencia grande vel-os tomar parte nos nossos trabalhos, por modo ao mesmo tempo tão prudente e tão apropriado á sua missão na igreja e á sua alta posição no estado.

O bem da religião e os interesses da patria inspiram os doutos prelados; e as suas vozes auctorisados, sinceras, eloquentes, têem sido acolhidas com benevolencia devida pelos membros do governo, e escutadas por todos com o acatamento e attenção que merecem. (Apoiados.)

Por mim declaro que ao offerecer-lhes, como offereço, a minha cooperação sem reservas, sinto só a pequena valia da offerta, por vir de quem vem. Mas se é curto o valor d’esta pequena unidade de apoio, póde e deve ser importante a somma de outras numerosas adhesões de maior peso e prestigio. E essas adhesões creio eu que não faltarão, porque seguramente n’esta casa e fóra d’ella são muitos os que sentem a necessidade inadiavel de maiores esforços, especialmente attentos e dedicados a compenetrar efficazmente a sociedade portugueza com a influencia salutar das idéas christãs.

N’este intuito bem podem congregar-se quantos se sintam convictos d’essa necessidade imperiosa, sem que por isso ninguem tenha de abdicar das suas convicções ou compromissos politicos ou partidarios, sem que tenha de variar a sua posição na politica, ou essa posição seja, como a minha, isolada e alheia a partidos, ou seja filiada n’elles, tomando parte nos partidos e grupos que existem ou venham a existir, e seguindo com fidelidade as suas bandeiras.

Pois que, como o disse com tão persuasiva clareza o sr. bispo conde, não se trata, nem deve tratar-se de organisar partido novo com o sympathico lemma do catholicismo, partido aspirante e concorrente ao poder com os outros partidos organisados, ou que venham a organisar-se. Nada d’isso. Mas convém tratar-se pura e simplesmente de agremiar esforços a prol da benefica dilatação da influencia religiosa na sociedade portugueza; e essa de nenhum modo é incompativel com os programmas e tendencias dos varios partidos.

D’isto temos já a primeira prova no acolhimento favoravel que as manifestações dos illustres prelados têem recebido na bancada do governo; e de certo foi gratíssimo ouvir ha pouco as palavras tão sensatas, tão dignas de si, e d’aquelle a quem respondia proferidas pelo sr. ministro da justiça, e outras similhantemente bem inspiradas do sr. presidente do conselho em uma das ultimas sessões. Acolhimento igual deve esperar-se de outros quaesquer ministros, que as vicissitudes politicas levem um dia a substituir os actuaes nos conselhos da corôa.

E bom é que assim seja; assim será naturalmente, e deve ser, porque o alargamento da influencia religiosa, não é, não foi, nem ha de nunca ser um obstaculo ao progresso social; antes é auxiliar o garantia da sua realisação ordenada.

Vamos longe já do encyclopedismo, que ha mais de um seculo predominou nos espiritos, lançando n’elles tantas perturbações, e deixando tão funestos vestigios nas sociedades modernas. Demasiado tempo prevaleceram os seus erros, as suas negações, os seus scepticismos. A experiencia dos seus resultados na educação social provocou a reflexão dos espiritos observadores, e evidenciou as lacunas insuppriveis abertas pela deficiencia da fé christã. O ideal de restaurar o vigor do principio religioso, e abrigar a sociedade sob a influencia d’elle avassala hoje os espiritos de melhor tempera, e dia a dia ganha mais amplo terreno no mundo scientifico, no mundo litterario e no politico.

Singular desmentido ao orgulho das falsas philosophias! Singular desmentido ás predicções da escola de Comte,