DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 137
Sr. presidente, a pena de nullidade é abolida por iniqua; os funccionariqs que, por sua ignorancia ou negligencia, tenham transgredido a lei do sêllo, ficam desde já remittidos de toda a penalidade; e poderá ser justo que a par d'estas disposições se limite aos interessados que podem ser, e muitos são inscientes, o praso para legalisar qualquer diploma? Os principios de justiça impõem a esta assembléa a urgencia de facultar a revalidação em qualquer epocha (apoiados).
Sr. presidente, na classe 9.º da secção 2.º da tabella n.° 1 está determinado que os testamentos abertos no acto de se fazerem pagarão por cada meia folha 600 réis; sabe v. exa. e a camara o que de certo ha de ter succedido muitas vezes, é que taes documentos tenham sido sellados com sêllo inferior por negligencia do notario publico, e estando hoje nullos soffrem os interessados a maxima penalidade, ao mesmo tempo que o official de fé publica e o mais responsavel fica isento do pagamento do imposto, cuja fiscalisação lhe cabia.
Na classe dos tabelliães encontram-se funccionarios muito intelligentes, honrados e zelosos no cumprimento de seus deveres; mas não é arriscado o asseverar, que nem todos estão nas mesmas condições; em logares de diminutos proventos não póde haver a esperança de que a intelligencia acompanhe a probidade; e d'estes é que eu receio, porque as funcções do tabellionato são da maxima importancia, e demandam illustração para serem bem desempenhadas.
As rasões que ponderei quanto aos testamentos feitos na nota procedem igualmente para todos os actos, em que teve interferencia o natario publico, ou sejam aforamentos, ou escripturas de mutuo, arrendamento, etc., é elle a pessoa a quem o estado impoz a obrigação de celebrar contratos revestidos de solemnidades legaes, e que produzam a reciprocidade dos direitos e obrigações correlativas; o pagamento do sêllo era um dos requisitos essenciaes para a procedencia da legalidade do acto; não se effectuou porém ou realisou-se em verba inferior á que o regulamento prescreve por culpa do tabellião; e hoje pelo projecto a responsabilidade extingue-se quanto ao verdadeiro negligente e as partes que entrevieram no contrato, que é muito commum o não saberem ler ou escrever, soffrem o maximo castigo, a nullidade dos contratos celebrados na melhor boa fé.
Poder-me-hão responder com o praso de seis mezes para a reclamar; mas, sr. presidente, eu não posso admittir limitação de praso, desde que a minha argumentação é baseada na ignorancia em que estão os interessados da nullidade do acto pelo não pagamento do sêllo devido; póde requerer a revalidação quem d'ella tiver conhecimento, mas o cego, que fez testamento aberto e sellado com sêllo indevido, aquelle que não sabe ler e escrever, e por isso não póde conhecer do valor da estampilha, como ha de reclamar do que não póde ver ou do que ignora?
Sr. presidente, vou referir-me a outra parte do projecto, e é a que tem referencia á taxa do sêllo, que devem pagar os recibos entre particulares ou passados por elles ao estado, camaras municipaes, etc.; o projecto estabelece para as quitações de quantias superiores a 5$000 réis duas taxas, 20 réis até 50$000 réis, e 60 para qualquer outra quantia superior; é já um melhoramento que o illustre ministro da fazenda introduziu no seu projecto, porque poz fim ao systema adoptado na lei de 30 de agosto do augmento progressivo do sêllo em harmonia com o representativo do pagamento; a tabella era tão complicada, que impunha a necessidade de nos fazermos acompanhar do regulamento de 2 dezembro para não sermos infractqres das suas disposições; o imposto era tão excessivo, que muitas vezes os interessados preferiam sujeitar-se á pena da nullidade do titulo, a fim de evitarem o pagamento de valiosas quantias.
Estou porém convencido de que n'esta parte ainda o projecto poderá attingir a maior perfectibilidade, e tomando por modelo o direito que vigora em Inglaterra, tenho a honra de propor á camara a approvação de uma só taxa para todos os recibos de valor superior a 5$000 réis; os resultados que aquella nação tem auferido, são tão conhecidos, que convidam a que seja adoptada identica medida para o nosso paiz; é facil de prever a difficuldade, que de ordinario apparece, de fazer abraçar um systema, que entre nós offerece novidade; mas é para mim evidente, que o imposto moderado ha de produzir maior verba de receita, do que aquella que até hoje tem entrado nos cofres do estado, e com esta proveniencia.
Sr. presidente, vou mandar para a mesa tres emendas; a primeira tem por fim permittir a revalidação dos titulos não sellados, ou que tenham sido indevidamente, sem limitação de praso; mas precedendo o pagamento do respectivo imposto, e mais 50 por cento; a segunda elimina do artigo 15.° as palavras "dentro de tres mezes"; a terceira reduz o sêllo de todos os recibos superiores a 5$000 réis a uma só taxa de 30 réis.
O sr. Presidente: - Vão ser lidas na mesa as emendas apresentadas pelo digno par o sr. Sequeira Pinto.
Emenda ao n.° 1.° da tabella n.° 2
ecibos entre particulares, camaras municipaes, estabelecimentos de piedade ou beneficencia, facturas com quitação de qualquer natureza ou proveniencia, e outros quaesquer titulos ou documentos, que importem recibo, ou desobrigação, sendo passados por escripto particular por qualquer quantia superior a 5$000 réis, 20 réis.
Emenda ao artigo 10.°
É auctorisada a revalidação pelo pagamento do sêllo devido, e mais 50 por cento do mesmo sêllo em todos os documentos, titulos, livros e papeis de qualquer natureza, que devendo estar sellados o não estejam regularmente.
Emenda ao artigo 15.°
Eliminadas as palavras: " dentro de tres mezes em diante".
O sr. Presidente: - Os dignos pares que admittem á discussão estas emendas do digno par o sr. Sequeira Pinto, tenham a bondade de se levantar.
Foram admittidas.
O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): - Sr. presidente, um dos fins principaes d'esta lei foi o de substituir, como regra geral, a nullidade imposta por a legislação anterior, pela revalidação. Com isto houve em vista estabelecer a equidade e a justiça, e tambem um fim financeiro.
O que houve em vista, com relação á equidade e justiça, foi porque na legislação existente a pena que devia ser proporcionada ao delicto, que n'este caso era uma omissão na qual muitas vezes nem poderia haver fraude, era pelo contrario essa pena exorbitante.
Agora pelo lado financeiro, creio que todos sabem o que acontecia. A nullidade estabelecida como pena não dava nenhuma vantagem para o thesouro. Agora, por este projecto, extinguindo-se a pena de nullidade e estabelecendo-se o principio da revalidação dos actos que estavam nullos, por não terem o sêllo competente, vão tirar-se de certo melhores resultados para o thesouro, e vão ser beneficiadas as pessoas que não cumpriram a lei; porque, esta revalidação é um beneficio ás pessoas que não cumpriram, a lei, e ao thesouro, que espera e deve colher uma receita muito apreciavel com o pagamento das multas pela revalidação dos documentos que hoje estão nullos.
O digno par, approvando a revalidação, entende comtudo que não deve ter um praso limitado, como se propõe no projecto, mas que deve ser sempre permittida, o que, na sua opinião, tornará a lei mais justa e mais vantajosa para o thesouro.
N'este ponto tenho eu alguma duvida.
Nós temos uma certa disposição para a negligencia, e a prova está no modo por que se tem executado a lei actual. Se, mesmo com a pena de nullidade, tem havido immensas infracções da lei, como se póde esperar que, não se marcando um praso, haja quem venha revalidar os docu-
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