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370 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

neiro de 1606, que demonstram a perpetuidade que nos foi negada.

E tudo isto sr. presidente, se encontra largamente desenvolvido n'um optimo trabalho publicado em 1883 pelo ministerio da marinha e ultramar, devido á penna illustre de um dos homens mais uteis do paiz. De modo que mesmo os que não têem o bullario, nem sabem theologia, podem, compulsar os textos que lhes traga a convicção ao espirito do nosso direito.

Como é então que o digno par fallou da caducidade do padroado? Que documentos compulsaria? Onde foi que fez esse descobrimento?

Nem mesmo na falta de dotação nol-o poderiam arrancar sem nosso consentimento.

Eu leio ao digno par dois trechos do memorandum a que já me referi:

«Ainda quando a circumstancia de dotação, um dos titulos que constituem aquelle direito, segundo o concilio de Trento, não podesse inteira e eventualmente dar-se, n'um ou n'outro ponto do padroado portuguez, não poderia tal facto prejudicar esse direito e a condição essencial e absoluta do assenso do padroeiro para qualquer alteração ou derogação do padroado.

«É expresso e evidente; e a propria Santa Sé reconhecendo a possibilidade da circumstancia indicada, decretou, - oiça v. exa., sr. presidente - impostos e auxilios para soccorrer nas suas deficiencias o padroeiro, como se vê - ainda mais bulias! - da bulla de Julio II, por exemplo, em data de 12 de julho de 1505.»

Custa-me muito, sr. presidente, estas leituras. Mas avançam-se ás vezes asseverações com tanta facilidade que a inanidade d'ellas não póde deixar de ser demonstrada com toda a solemnidade. E a solemnidade melhor é refutal-as. com os documentos á vista.

Sobre o dominio territorial ainda lerei outro trecho tirado do mesmo memorandum: «Nem tão pouco Na occupação ou dominio effectivo, directo e permanente do estado portuguez, foi ou é condição para o exercicio directo ou supervivencia do padroado. Este póde ir e vae alem do dominio e até do direito de soberania temporal. Existe e esta exerceu-se e sempre existiu e se exerceu fora d'elles. E verdade, derivada da tradição anterior ao concilio de Trento, da definição d'elle, dos diplomas e declarações pontificias subsequentes e da historia dos nossos dias, reconheceu-a e determinou-a expressamente a propria congregação da propaganda fide por decisão de 9 de novembro de 1626. Alem de que constitue direito assente e corrente entre Portugal e a Santa Sé e que como fica dito em tempo algum e sob algum pretexto póde ser alterado ou derogado o direito do padroado, sem audiencia, concurso ou accordo do governo portuguez».

Continuarei ainda, sr. presidente, visto que estamos tão fracos em bullas.

«E não será de mais insistir ainda n'esta ultima condição que se reduz em ultima analyse a um principio rudimentar e essencial de todo o direito publico e privado, e a uma affirmação natural e irrecusavel da soberania e legitimidade ex juri communi, dos poderes que então se fixaram e exercem do direito do padroado que Portugal soube; ganhar pelas suas descobertas, conquistas e fundações. É por isso que uma bulla de 31 de janeiro de 1533 e outros, diplomas emanados da Santa Sé positivamente estabelecem que para se desmembrar de uma diocese do padroado qualquer territorio, é indispensavel o consentimento do padroeiro ...»

O padroado foi estabelecido pela Santa Sé sem reservas; nem restricções pelos serviços extraordinarios á Igreja e á civilisação christã, perpetuo e sem dependencia do dominio territorial, como ainda o confessou alem de tudo que temos citado «a bulla de Nicolau V de 1454, os breves de Leão X de 1513 e 1514, o de Julio III de 1550, o de Gregorio XIII de 1577 e muitos outros documentos analogos.

E agora, sr. presidente, segue-se o latim, porque ninguem acreditará que eu o inventasse expressamente para a questão que se debate...

A bulla de Julio III de 3 de fevereiro de 1550, diz assim: «... illique etiam per Sedem eandem derogari non posse nec derogatum censeri, nisi Joani Begis et magistri seu administratoris pro tempore existentium praedictorum ad id expressus accedat accensus...»

Na bulla de Paulo IV, de 4 de fevereiro de 1557, encontra-se o seguinte: ... decernentes jus patronatus hujusmodi Sebastiano et pro tempore existenti Regi praefato, ex meris fundatione et dotatione, competere, nec illi ullo unquam tempore quacumque ratione derogari posse, et si ei quoquo modo derogetur derogationem hujusmodi cum inde secutis nullius roboris et efficaciae fore; necnon irritum et inane si secus super his a quoquam, quavis auctoritate, scienter vel ignoranter, contigerit attentari... »

A bulla de Gregorio XIII, de 23 de janeiro de 1575, contem as seguintes palavras: «...illique etiam per Sedem praedictam quacumque ratione derogari non posse...»

A bulla de Clemente VIII, de 20 de maio de 1596, por occasião de se erigir a diocese do Congo, declara: « ...nec illi ullo unquam tempore quacumque ratione derogari posse et si ei quoquo modo derogetur, derogationes hujusmodi cum inde secutis nullius sint roboris et efficaciae... »

Basta de latim.

«O que é indubitavel é que o padroado portuguez, á face dos principios e documentos do direito constituido, não póde ser cerceado, diminuido, derogado ou desmembrado, SENÃO por um accordo entre a Santa Sé e Portugal.»

Sr. presidente, para defender o governo e a concordata de 1886, não é necessario ser mais papista que o Summo Pontifice, nem menos portuguez que a santa congregação da propaganda fide.

O direito de padroado para nós é perpetuo. O dominio territorial não é necessario para que elle se exerça, logo a caducidade de que fallou o digno par não existe, a menos que o Santo Padre quebrando todos os pactos dos seus antecessores, e negando os serviços prestados pelos portuguezes á propagação da fé christã, não queira fechar os olhos a tudo que a historia nos aponta n'esta singela questão. (Apoiados.)

Não é exacta tambem a citação que fez o digno par: Patronum faciunt dos, aedificatio et fundus. Soglia, no seu tratado sobre direito canonico, escreve: aedificatio vEL fundus. A camara escusa que eu lhe explique a profunda differença que existe entre et e vel.

Tambem não é rasão canonica que seja preciso o dominio territorial. O direito canonico não o exige.

Mas, sr. presidente, agora eu reparo, que, para convencer o digno par o sr. dr. Senna do erro profundo em que s. exa. labora, não é preciso recorrer ás bullas, nem a Soglia, nem aos textos latinos, nem ser formado em theologia.

O digno par, muito versado na historia patria, não ignora que Portugal já exerceu o padroado na China e no Japão. E todavia Portugal nunca teve dominio territorial n'aquelles paizes. Mas nem por isso os Papas deixaram de lhe reconhecer o direito do padroado n'essas regiões. Não conheceriam os Pontifices os canones?

Que dominio territorial tem hoje a França na China, aonde tenta espalhar os seus missionarios, para exercer com mais efficacia o protectorado?!

Não tem rasão o digno par em ter pensado que o direito do padroado caducava, cessando o dominio territorial. As bullas e os factos dizem-nos exactamente o contrario. Estimo tambem, sr. presidente, que o sr. arcebispo resignatario de Braga, me indique do seu logar, ainda que seja por gestos, que não sou eu o que estou enganado. A sua