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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 24 DE FEVEREIRO DE 1858.

Presidencia do ex.mo sr. Visconde de Laborim,

Vice-presidente.

Secretarios, os Srs. Conde da Louzã (D. João),

Visconde de Balsemão.

(Presentes desde o começo da sessão, os Srs. Ministros da Fazenda e Justiça.)

Ás duas horas e meia da tarde, achando-se presente o numero legal, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, que foi approvada na fórma do regimento, por não haver reclamarão em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia: Officio do Ministerio do Reino, declarando que a Deputarão que deve apresentar á sancção de Sua Magestade os authographos das Leis approvadas pela Camara, seria recebida na dia immediato pela hora do meio dia.

O Sr. Presidente nomeou a Deputação, que se compunha dos Dignos Pares: Ex.mos Srs. Vice-presidente Conde de Mello Conde de Peniche Conde da Ponte de Santa Maria Conde do Sobral Conde de Thomar Conde da Taipa. O Sr. Secretario continuou dando conta da correspondencia:

Um officio de J. Fradesso da Silveira, na qualidade de Secretario da commissão de pesos e medidas, remettendo 30 exemplares do Jornal Mercantil, em que vem publicado um relatorio da mesma commissão.

- dito, do Sr. Visconde de Fornos de Algodres, participando, que em consequencia de ter fallecido seu irmão, o Arcediago da Sé de Vizeu, não podia comparecer.

- dito, enviando exemplares da exposição feita sobre um concurso da Escóla Medico-Cirurgica de Lisboa.

O Sr. Conde de Thomar disse que se havia annunciado a distribuição de um papel de alguns interessados nos concursos da Escóla Medico-Cirurgica de Lisboa, e que sendo este negocio um dos que estão pendentes na commissão de instrucção publica ahi se exigem alguns documentos, que já foram pedidos. Não censura o Governo por não os ter mandado até agora, mas aproveita a occasião para repetir que se tornam indispensaveis, e roga ao Sr. Ministro da Justiça peça ao seu collega do Reino, que quando lhe fôr possivel os envie.

O Sr. Secretario Visconde de Balsemão declara á Camara que o Sr. Conde de Mello lhe pedíra fizesse constar, que não podia comparecer á sessão de hoje por estar incommodado.

(Entraram os Srs. Presidente do Conselho, e Ministro da Fazenda.)

O Sr. Ministro da Justiça declara que tendo pedido a palavra antes de ser presente o Sr. Ministro do Reino, fóra no intuito de dizer que tomava nota da declaração do Sr. Conde de Thomar, para prevenir o seu collega, que ordene a remessa desses documentos a que o Digno Par alludiu.

O Sr. Marques de Vallada aproveita a occasião para annunciar uma interpellação ao Sr. Ministro da Guerra.

Disse que recebêra uma carta do Presidente da Camara municipal de Guimarães, e outra assignada pelos membros da mesma Camara, nas quaes, empregando-se expressões muito cortezes, e pelas quaes se mostra sobejamente grato, faziam recahir sobre elle orador a culpa da ordem expedida pelo Governo para que o 7 de caçadores fosse removido para Valença. Parece-lhe que a censura que dirigiu ao commandante daquelle corpo não podia tornar responsavel o mesmo corpo; mas tendo lido n'um jornal da capital, affecto ao Governo, expressões que não póde deixar de notar, e vinham a ser: — «a necessidade de castigar os fanáticos» se poderia presumir que os homens catholicos, amantes da justa liberdade de consciencia, e observantes das leis da Igreja, reclamando contra os abusos da auctoridade, pediam o castigo dellas. O Sr. Ministro da Guerra, como se induz, depois da interpellação que elle orador lhe dirigira, ordenou que o mencionado corpo fosse removido para Valença. Já lá está. Não sabe se foi por castigo, ou resultado do que expozera na Camara dos Dignos Pares, e por isso deseja uma explicação sobre o facto, para se desencarregar desta especie de accusação feita em Guimarães. Mandaria por tanto para a Mesa a sua nota de interpellação.

O Sr. Barão de Porto de Mos envia para a mesa o seguinte requerimento:

(Requeiro que pela repartirão competente se remetta a esta Camara a relação dos bens que andam annexos á fabrica da Marinha Grande, pertencentes á Fazenda, e quem actualmente se acha no usufructo desses bens.»

Requer a urgencia, porque tendo de ser apresentado nesta Camara um contracto sobre o arrendamento da fabrica da Marinha Grande, e sabendo que ha bens consideraveis hoje em usufructo do actual arrendatário, se faz necessario que a relação a que allude o seu requerimento seja presente para nessa occasião bem se podér avaliar o referido contracto.

Consultada a Camara foi approvada a urgencia.

O Sr. Presidente declara que se passa á ordem do dia, que é a continuação da discussão do parecer n.º 101.

O Sr. Conde de Thomar expõe que no fim da anterior sessão não poderá usar da palavra, porque, cansado já da resposta que déra a alguns defensores do projecto, e vendo a hora muito adiantada hão poderia tractar a questão nos devidos termos; e tanto assim fóra que a Camara o reconhecera depois, que concedida a palavra ao Sr. Visconde d'Athoguia, pela mesma razão o dispensara de orar, adiando a discussão para este dia. Verá nesta occasião elle orador se póde passar em revista os argumentos apresentados pelos defensores do projecto, quer membros da Camara, quer os Srs. Ministros, e demonstrar que esses mesmos argumentos devem confirmar a Camara na idéa de que a commissão seguiu os Verdadeiros principios.

Além deste intuito, tem igualmente de dar uma satisfação aos Srs. Ministros, para os convencer de que se tractou a questão da sua situação politica, com relação a este Ministerio, foi mais em opposição de argumento a argumento, do que por desejo de collocar SS. EE. em difficuldades; porque ao contrario estimaria que SS. EE. tivessem occasião de explicar a situação, talvez, um pouco falsa, em que alguns dos Srs. Ministros se collocaram neste negocio, sentindo ao mesmo tempo ter de demonstrar aos Srs. Ministros, que nas explicações que deram não foram muito felizes.

Entrando no assumpto diz que o parecer da commissão é impugnado por algumas razões, que infelizmente foram tão contradictorias, que dão margem a dizer-se, que a consequencia dellas é a approvação do mesmo parecer. Se bem se recorda, o unico orador que defendeu este projecto, de modo a podér inclinar a Camara a approval-o, foi o Sr. Visconde de Castro. Apesar disso pede licença a este seu nobre amigo para lhe dizer que as suas razões são aparentemente sólidas.

Se bem se lembra, disse não haver duvida que os verdadeiros principios estão no parecer da commissão, porém ella propria reconhecia haver casos em que extraordinariamente se podesse adoptar esta medida; nem ser possivel duvidar de que a Madeira ia n'uma continuação de prosperidade de 1854 até hoje, e que por isso não queria a responsabilidade da suspensão desse prospero progresso, devido em parte á medida adoptada, ou a uma certa coincidencia que não sabia bem explicar.

Julga que não altera aforra da argumentação, mas entende que sendo este um modo coherente da defeza do projecto, se caiu na infelicidade de ser logo contradicto pelo proprio Ministerio, pois foi o Sr. Ministro da Justiça quem asseverou, que longe de haver na Madeira tal progresso de prosperidade, continuava alli o mal das vinhas, o receio da choleramorbus, e mais que tudo havia a insubordinação dos habitantes da Madeira!

Pois se esta medida, segundo as informações officiaes do Sr. Ministro da Justiça — o homem mais competente para dar esclarecimentos—tem dado em resultado a continuação do mal das vinhas, e a insubordinação dos cidadãos que outr'ora foram pacificos: pergunta como poderá ser approvada? Entende que preferentemente se deve acreditar nas informações dos Srs. Ministros, nem o Sr. Visconde de Castro lhe poderá levar a mal que de mais credito ás informações saídas dos bancos dos Srs. Ministros, do que ás suas. Por esta informação do homem mais competente no Ministerio — daquelle que tem mais conhecimento das circumstancias em que se acha a Madeira, a medida proposta dá em resultado, depois de quatro annos de execução, os factos que se acabam de apontar, e quando os Srs. Ministros se explicaram, disseram (note-se bem) ter sido a experiencia que lhes servira de guia para approvarem esta mesma medida que n'outro tempo rejeitaram!

Desgraçada experiencia que leva o Ministerio a ser incoherente, e os Srs. Ministros a mudarem de opinião, approvando o que n'outras circumstancias rejeitaram.

Tracta-se de prorogar por mais um anno uma lei que, na opinião dos Srs. Ministros, tem apresentado estes resultados! Que lei é essa? A que permitte a accumulação das funcções militares e administrativas no mesmo magistrado, podendo elle accumular os dois ordenados. Qual o fundamento da lei? Lêa-se o artigo, e vejam as circumstancias em que se achava a Madeira em 1854. É necessario, para se marchar logicamente, elevar a convicção á Camara, que se mostre que as circumstancias extraordinarias em que se achava aquella ilha em 1854 existem hoje.

Ainda nesta parte (continuou o orador) não estão muito de accôrdo os Srs. Ministros, porque já se disse tambem dos bancos do Ministerio — que se não póde sustentar serem as circumstancias da Madeira as mesmas que em 1854.

Se fossem as mesmas, ainda assim a medida não poderia ser approvada, porque seria consequencia a inefficacidade do remedio, acontecendo além disso ferirem-se os principios — principios incontroversos, sustentados pelos defensores e oppositores do parecer, que não combatem os Srs. Ministros, nem o podiam fazer. SS. EE. foram os primeiros que prestaram homenagem aos principios emittidos pela commissão. Só ha dois Dignos Pares que os combatem — os nobres Conde da Taipa, e Visconde de Balsemão.

Repete portanto que para se sustentar esta medida será necessario mostrar-se em que consistem hoje as circumstancias extraordinarias que a exigem! Não é isto o que se mostra, e era o que convinha provar.

Allude o orador a ter o Sr. Ministro da Justiças, para justificar sua mudança de opinião, recorrido ao mal das vinhas, o que entende muito extraordinario (apoiados); e pergunta, quem póde admittir, que a accumulação das funcções militares com as administrativas no mesmo individuo, e mais alguns centos de mil réis, por esse exercicio, possam destruir esse mal que manda a Providencia? Deduz portanto deste augmento, que o Governo só deseja uma auctoridade energica, que vá castigar a insubordinação dos povos da ilha da Madeira, d'ahi infere mais, que o Digno Par o Sr. Conde da Taipa estava senhor do pensamento ministerial, quando na anterior sessão S. Ex.ª deu a entender a necessidade do paiz ser governado por Governos militares. Comparadas tão espontaneas revelações, esperava que o Digno Par viesse a esta sessão, vestido de sacco, e com a cabeça coberta de cinza, pois asseverára S. Ex.ª na anterior sessão, que se tivesse proferido tal heresia, assim viria pedir perdão á Camara (riso.)

Allude ater dito igualmente o Digno Par, que havia em liberdade garantias demais, e que só era preciso crear a auctoridade; e dar-lhe força. Dissera tambem, que o projecto de lei em discussão continha uma medida, que não só dava maior força e maior acção á auctoridade, como era tambem mais economico, circumstancias que se deviam ter em vista, para se não negar a approvação ao projecto; accrescentando igualmente sentir, que a proposta medida não fosse permanente. De tudo isto inferia elle orador, que o Digno Par a que se reportava, entendia ser necessaria na ilha da Madeira a reunião das funcções e dos ordenados, sem o que não poderá haver alli auctoridade; e que estimaria vêr generalisada esta medida.

O Sr. Conde da Taipa rectifica ser engano do orador, e que unicamente se referira ás colonias.

O Sr. Conde de Thomar insiste em que S. Ex.ª quando fallou, entendeu ser colonias tudo que está separado da metropole por um braço de mar, e assim é claro que, pelo menos, e Digno Par deseja, que a ilha da Madeira e os Açôres, sejam governados por esta fórma. Declara, porém, que elle orador entendeu, e mais alguns Dignos Pares, que das palavras empregadas por S. Ex.ª se deprehende serem seus desejos, que a medida fosse geral (apoiados.)

Tira portanto da argumentação do Digno Par consequencia de que para a ilha da Madeira, e os Açôres S. Ex.ª quer esta medida.... Não se admira. de que assim pense o Digno Par, porque S. Ex.ª que tem uma intelligencia por todos reconhecida, e grande independencia em presença de todos os Ministérios, (facto por todos confessado), só tem um unico defeito o vem a ser que convencido de que taes e taes pessoas são convenientes no Ministerio, se deixa levar de tal modo arrastado, que muitas vezes sustenta medidas que não estão nas suas idéas, nem se ajustam com as opiniões muitas vezes emittidas por S. Ex.ª (apoiados), e tanto é assim, que nesta mesma occasião S. Ex.ª se deixou arrastar desse pensamento ministerial, por estarem na Administração pessoas com quem sympathisa.

Se acaso se deseja uma auctoridade militar para governar a ilha da Madeira, parece, que, em vista da insubordinação em que se acham os ha

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bitantes daquella ilha, e da qual informou o Sr. Ministro da Justiça, ha vontade em governar com chibatadas, e varadas; porque se não fóra assim, não sabe porque não se ha de nomear um individuo civil! (apoiados.)

Pede tambem á Camara, que note ter sido o mesmo Sr. Ministro quem dissera na sessão antecedente ser necessario alli um homem energico, e que só um individuo militar tinha essa energia; sendo só esse quem poderia acabar com os males, que se dão na ilha da Madeira. Francamente declara que não reconhece a necessidade da energia militar, para acabar com o mal dás vinhas! (apoiados.)

Sabe, que o Governo não se esquece da ilha da Madeira; sabe tambem, que quer mostrar que aquella ilha ainda está mais perto da capital, do que muitas terras do continente; por que o Sr. Ministro da Justiça, que tem a peito o administrar justiça recta, e emprega a todos, restituindo inclusivamente já algumas victimas da politica cabralina, julgou agora, que devendo tractar-se de premiar os serviços ecclesiasticos, por onde devia começar era pela ilha da Madeira, dando honras de conegos a certos parochos, e promovendo outros!

Estranha, que S. Ex.ª não tracte tambem de remunerar os serviços dos ecclesiasticos do continente do reino, que os teem prestado relevantissimos, e que se dê por desculpa de o não haver ainda feito, o não terem chegado ao Governo as competentes informações! (apoiados). Aponta para o Diario do Governo, onde se encontram os despachos de que falla, e em presença dos quaes * de outros motivos, diz por ahi muita gente, que S. Ex.ª assim obrára, porque a ilha da Madeira é um nicho eleitoral de S.Ex.ª, sendo taes despachos a paga de antigos serviços e acto preparatorio para as futuras eleições (apoiados.)

Passando a occupar-se do Sr. Conde da Taipa parece-lhe que S. Ex.ª se escandalisou de elle orador o [ter collocado nos bancos dos progressistas (O Sr. Conde da Taipa—E se fosse no dos conservadores tambem), e declarou que não pertencia a uns nem a outros, e duvidou mesmo do que fosse ser progressista na nossa terra, e do que fosse ser conservador. Não tem duvida em o explicar. (O Sr. Conde da Taipa—É justamente o que eu desejava ouvir) É sua opinião attendendo só aos factos, pondo de parte a honra, probidade, e intelligencia dos individuos desse partido, de alguns dos quaes é particular amigo, que ser progressista hoje na nossa terra é combater por vinte annos debaixo da bandeira dos principios economicos, e quando chega a ser podér, julgar que «economia» é uma palavra anachronica, e que só deve desperdiçar sem peso nem medida a fazenda publica, é arguir os governos, durante vinte annos, de se empregar em unicamente no desenvolvimento dos interesses materiaes do paiz, censurando-os por abrir algumas legoas de estradas; e incitando as populações contra estes systemas, e quando chega a ser podér firmar a sua bandeia em abrir estradas, é combater os impostos para o desenvolvimento das obras publicas, incitando as populações á revolta, e apresentar depois outros mais onerosos, é gritar contra a decima de repartição, contra as leis de saude, contra os cemiterios, gritar finalmente contra tudo isso que já serviu de bandeira para fazer revoluções no nosso paiz, e depois adoptar todas essas medidas, é lêr como um dos primeiros capitulos do programma de partido a extineção do commando em chefe, e desde que se chega ao podér conserval-o, segundo dizem, como elemento politico.

Isto e o que vem a ser hoje progressista na nossa terra, mas se lhe perguntarem a elle orador se faz má idéa dos individuos desse partido, declara que não, e reconhece em muitos delles intelligencia, honra e probidade, honrando-se mesmo com a amisade. de alguns, mas nem por isso póde deixar de dizer que este é o credo politico de tal partido.

Em quanto aos conservadores serão isto, e peior ainda, mas não lhe pertence demonstral-o, e então faça-o o Digno Par, por que elle orador não quer dar armas contra si. (O Sr. Conde da Taipa—Desejava mais que V. Ex.ª o fizesse.) Faça-o S. Ex.ª, mas peço-lhe que recorra a factos desta ordem, se os encontrar.

Dissera que estimava ter dado logar a explicações por parte dos Srs. Ministros, porque lhe parecia que estavam collocados n'uma posição falsa, sendo por isso conveniente que dissessem os motivos, porque mudaram de opinião, e tinha dito tambem que lhe parecia (podendo ser achar-se em erro) que as explicações, não tinham sido satisfatórias para o primeiro Ministro que pediu a palavra, que foi o Sr. Ministro das Obras Publicas.

S. Ex.ª disse que se não lembrava de nos outros annos ter fallado sobre esta questão, mas lembrava-se de ter votado contra.

Antes de passar adiante dirá, que S. Ex.ª não fez um grande discurso, segundo disse, porque se achava incommodado. S. Ex.ª disse que reprovara os maus principios e fins do projecto, e elle orador julga que isto é o que se póde dizer de mais forte para reprovar uma medida, mas S. Ex.ª disse tambem que nessa occasião não tinha confiança no Governo.

N'uma questão de principios como esta, depois de S. Ex.ª dizer que reprovava os principios meios e fins do projecto, parece que isto não é um negocio que se possa considerar como de confiança ou desconfiança, e julga tambem ter sido mais conveniente não se recorrer a tal razão para hoje approvar o que então se reprovou.

Em quanto ao Sr. Ministro da Justiça, já se occupára da resposta de S. Ex.ª, e escusava repetil-a a Camara, mas parece-lhe que não levará a convicção dos membros desta casa a approvar a medida, ao contrario concorrerá para fazer approvar o parecer da commissão, porque S. Ex.ª mostrou concludentemente que a medida não tem apresentado, resultados favoraveis, e só o grande mal da insubordinação dos povos.

Seguiu-se em terceiro logar o Sr. Ministro da

Fazenda, que disse ter assignado n'outra occasião o Parecer, vencido, por não offender os principios; mas que, depois de assignar vencido trabalhara porque o projecto fosse approvado, e offerecera o seu voto ao então Sr. Ministro do Reino, se delle carecesse para fazer passar a medida, o que esse Ministro não aceitou por ter uma grande maioria. (O Sr. Avila — Não foi isso que disse.) Parece-lhe que toda a Camara o ouviu.

Se esta razão de S. Ex.ª póde servir para mostrar e justificar a mudança de opinião, elle orador, pela sua parte, sente que tal se apresentasse.

Tambem não sabe para que vieram os elogios pomposos ao cavalheiro, que ultimamente occupou os dois logares de Governador civil e militar da ilha da Madeira; porque extraordinario seria, que dissessem mal, sendo hoje aquelle cavalheiro collega de S. Ex.as—Elle orador não tem motivo de queixa desse cavalheiro, é o primeiro a reconhecer seus serviços, mas isto não póde servir de fundamento para a approvação do projecto, porque ninguem póde affiançar que o individuo que fôr, em virtude da nova lei, nomeado para aquelle logar ha de seguir os seus passos.

Em ultima analyse deverá confessar-se, que o unico e mais importante serviço que se attribue aquelle magistrado é ter-se conduzido muito bem por occasião do flagello da choleramorbus naquella ilha, não se apontando medida alguma por elle adoptada para remediar os males que a lei teve em vista, dizendo-se, até geralmente, que foi por este motivo que o dito magistrado foi chamado ao Ministerio; do que tudo se póde e deve inferir que hoje o ser enfermeiro-mór em qualquer terra em que apparece o contagio, é recommendação sufficiente para ser Ministro! Não desconhece que o serviço é importante, arriscado, e até mesmo para agradecer; mas julga que o mesmo serviço tem sido prestado por muitas pessoas a quem o Governo não deu nem uma palavra de agrado!

Vê que a ilha da Madeira está sendo escóla para se obterem os grandes empregos de Commandantes militares, Ajudantes do Chefe do Estado, Governadores geraes, Ministros, etc... etc... Alli é que se podem ter as grandes notabilidades para os altos empregos, acabando por virem a ser Ministros, argumentando-se para isso, e sempre, com grandes serviços prestados na Madeira; mas depois diz um Ministro da Corôa, que a situação daquella ilha é afflictissima, por extremo difficil, e que se torna necessario adoptar a medida proposta. Então que foram lá fazer esses individuos indicados com tanta especialidade?

Pelo que respeita á prosperidade de que fallou o Sr. Visconde de Castro, presume que S. Ex.ª se referia á mudança de culturas, pensamento efficaz que alli existe ha muito tempo; mas pergunta a S. Ex.ª se a accumulação da auctoridade civil e militar concorreu alguma cousa para tal; se os productos que alli se colhem de agoardente da canna de assucar, em substituição á cultura das vinhas, são devido ao pensamento, esforço e auxilio dessa auctoridade, e mesmo do Governo, ou se provieram do instincto dos povos, que conhecendo a situação falsa em que se achavam, entenderam necessario abandonaras vinhas, e passar a outro genero de cultura que não fosse tão precario e sujeito a similhantes males? Para fazer comprehender aquelles povos estas suas necessidades e vantagens será preciso o emprego da chibata, ou o ataque da bayoneta? Será para isto que o Sr. Ministro da Justiça requereu uma auctoridade militar e energica para a Madeira? Se elle orador visse que o Governo vinha pedir ás Camaras auctorisação para emprestar dinheiro aos lavradores que se encontrassem em difficuldades para variarem estas culturas, conviria então, e diria que esse remedio era muito efficaz, ou pelo menos de verdadeira utilidade; mas dizer-se-lhes: — ahi vai um empregado tomar conta do governo da ilha, reunindo ás funcções militares as administrativas, e assim tereis melhorada a vossa situação — declara que não entende. Se isto é um bem, um remedio para destruir a situação em que se acha a Madeira em consequencia do mal das vinhas, então seja-se mais franco, olhe o Governo para todo o paiz, que é essencialmente vinhateiro, olhe especialmente para a provincia, que não tem senão vinhas, e proponha este mesmo remedio para essa provincia. Está certo de que o Douro não quer auctoridades que accumulem as funcções administrativas com as militares, quererá meio para occorrer ás suas necessidades, mas se lhe offerecessem este, não o acceitaria.

Diz-se porém que o meio adoptado na ilha da Madeira não tem produzido máo resultado, porque nenhuma Camara municipal representou ainda contra elle. Este argumento assim produzido foi muito applaudido pelos Srs. Ministros, não vendo estes que se collocaram por isso em uma posição difficil: porque se esse argumento colhe, a sua primeira obrigação era retirarem da outra Camara aquelles projectos que lá estão, contra os quaes já tem apparecido muitas representações das Camaras municipaes. As Camaras municipaes da ilha da Madeira podem entender que não está dentro das suas attribuições o representarem sobre a approvação ou rejeição das medidas affectas ao Corpo legislativo, e esta talvez seja a doutrina mais sã; mas como se apresenta tal urgencia, e é applaudido pelos Srs. Ministros, ver-se-ha quando chegar a discussão desses projectos o que dizem de taes representações. Talvez digam que as Camaras municipaes exorbitam das suas attribuições, que não se podem intrometter senão em objectos do respectivo municipio, e que assim não devem ser attendidas. Tal é o resultado de se empregarem argumentos que teem duas pontas, e que facilmente se podem voltar contra quem os emprega.

O Sr. Marquez de Ficalho, fallando sobre este objecto, disse muito bem «se precisaes na ilha da Madeira de um empregado que tenha maior ordenado para que desenvolva maior zêlo pelo serviço publico, proponde o augmento desse ordenado, que não tenho difficuldade em votar por isso.» Elle orador acompanha a S. Ex.ª nesta proposição, sem se importar com a difficuldade que apontou o Governo de não podér fazer a proposta geral para todo o reino. Não pretende o Governo justificar esta sua medida pelas circumstancias extraordinarias da Madeira? Então, se as circumstancias extraordinarias da Madeira servem para se violarem os principios, reunindo as funcções administrativas com as funcções militares, não podiam ellas servir para se pedir um ordenado maior para o Governador civil? (apoiados). O Sr. Conde da Taipa fez depender destes augmentos o bom serviço e zêlo dos empregados. Sendo assim, a primeira obrigação do Governo era propôr esse augmento, porque de contrario entender-se-ha que não quer tal zêlo pelo serviço publico, e se tornará auctor, ou pelo menos cumplice, do máo serviço que elles prestem. As nossas circumstancias bem conhece que são difficeis, mas ninguem levaria a mal, neste caso especial, e attentas as circumstancias excepcionaes em que se diz estar a Madeira, pedir o Governo augmento de ordenado para o respectivo Governador civil.

Argumentam os impugnadores do parecer, dizendo haver pontos pertencentes á monarchia, onde ha empregados que reunem as duas funcções, e que esses logares inclusivamente teem sido servidos por homens que não são militares. Apontam-se Gôa e Macáo; mas não se vê que ha grande differença entre a doutrina estabelecida nessa Lei e a desta, cuja prorogação se tracta. Além estabeleceu a Lei que reuna as funcções militares e administrativas, inclusivamente um paisano, mas neste, o caso é inteiramente differente, porque se teve em vista a accumulação dos dois ordenados, o que não se póde dar senão no militar, porque o empregado civil nunca póde ter um vencimento de militar. Portanto devia vêr o Sr. Conde da Taipa que a comparação não era bem feita.

Se elle orador está bem certo, a ilha da Madeira não tem empregado algum superior ha cinco ou seis mezes. Pergunta então ao Governo, quaes os inconvenientes que tem resultado desta suspensão; quaes as consequencias que neste interregno tem resultado em vista das desastrosas circumstancias da ilha da Madeira, e dos soffrimentos dos seus habitantes? Deseja se lhe diga o que tem influido para o maior ou menor augmento da cultura da canna do assucar, o não existir lá esse militar que reuna as duas funcções?

Não se supponha que e um empregado de primeira ordem, aquelle a quem está entregue a administração da ilha, pois, segundo lhe consta, nem secretario de administração é, e méramente um official de secretaria. Se pois em virtude de tal desleixo tem havido algum inconveniente, o Governo é o unico que se torna altamente responsavel, porque deixou em taes circumstancias uma provincia tão importante, sem curar de lhe remediar o mal. Presume qual será a resposta dos Srs. Ministros: será que se tem assim estado todo este tempo á espera da discussão do projecto. Caso porém, que recorram a essa razão, permittir-lhe-hão dizer que é miseravel, por isso mesmo que o Governo estava pela Lei auctorisado a nomear um Governador civil, e podia nomeal-o sendo militar, dando ordem ao commandante militar para obedecer em tudo ás ordens desse Governador civil, e assim mantinha o seu systema, de ter á frente daquelle Governo um militar. Em todo o caso o Governo não devia deixar de ter uma pessoa de cathegoria elevada, encarregada da administração dessa parte tão importante da monarchia. Em vista disto fica tambem sem força alguma o argumento de ser preciso, que a auctoridade possa estar alli sempre bem prevenida, para receber os cumprimentos das pessoas mais importantes que alli vão; porque se a Madeira está nesse caso, porque se entrega o seu governo e administração a um official de secretaria? Note-se tambem que esse empregado não tem a accumulação dos ordenados, e que se contenta com o seu modesto vencimento de official da secretaria. Portanto tudo prova que as razões allegadas a favor da medida são improcedentes.

O Sr. Presidente do Conselho—Peço a palavra sobre a ordem, ou para a explicação de um facto.

O orador — Se V. Ex.ª quer já usar da palavra____

O Sr. Presidente do Conselho — Nada.

O orador continua expondo que de tudo quanto acaba de dizer, ha de por força tirar-se a consequencia de que neste negocio não ha senão um capricho em fazer passar o projecto. Repete portanto, que se se quer dar um ordenado maior, não haverá difficuldade em adoptar a proposta; se sr deseja uma auctoridade militar, ha na Lei podér para o fazer; e se póde dizer ao commandante da força, que alli está que obedeça a esse militar. Sendo assim; que necessidade ha de fazer uma alteração na legislação? Só para dizer que o Governo tem um capricho em levar ávante esta medida.

Outra razão ainda. É necessaria essa auctoridade? Sem ella não se póde governar a ilha da Madeira? Como essa auctoridade ha de ser homem, e está sujeito ás vicissitudes da fraca natureza humana, quando ficar impossibilitado de podér servir, quem o ha de substituir? A Lei não o diz, e o projecto tambem não diz quem ha de exercer o Governo nesse interregno.

O Governo póde dar explicações sobre este objecto, ou seguir o conselho que lhe deu o Sr. Conde da Taipa, que disse—que se elle fóra Ministro não trazia este projecto ás Camaras. Nem era necessario, repete elle orador, porque o Governo pela legislação existente tem todos os meios de conseguir o mesmo que pretende pelo projecto, e portanto isto não passa de um capricho.

Ora, elle orador se bem não deseja que os Srs. Ministros sáiam das suas cadeiras, e estimaria mesmo que ficassem eternamente nos seus logares, tambem declara que não está na Camara para ser instrumento do seu capricho (apoiados). Desejaria que o Governo, antes de propôr a medida, visse se podia ter o acolhimento da Camara; devendo convencer-se de que não deseja crear embaraços ao Ministerio, nem se ambicionam os seus logares, porque se houve occasião em que ser Ministro era uma grande difficuldade, é de certo esta (apoiados); e então quem havia querer nesta conjuntura ser o herdeiro dessa situação, para desejar as cadeiras de SS. Ex.ªs? Elle orador pela sua parte declara que não; não obstante o Governo dizer nos seus jornaes, que os cabralistas já fizeram pacto com os regeneradores para deitar fóra os Srs. Ministros das suas cadeiras (O Sr. Conde da Taipa—Mas isso é licito). Mas não é exacto (O Sr. Conde da Taipa—-Isso é outra cousa). Não ha necessidade de pactos com nenhum partido politico, o unico pacto consiste em approvar boas medidas nesta Camara (apoiados); portanto dá ao Digno Par a certeza de que se póde estar de accôrdo em certos pontos tanto com o centro como com a extrema esquerda sobre principios, sem se fazerem pactos para entrar na Administração, porque Ministérios compostos de elementos heterogéneos não podem governar o paiz.

O Sr. Conde da Taipa — Eu disse que era licito fazer o pacto para deitar o Ministerio fóra, e depois fazer o que quizerem.

O orador declara a S. Ex.ª que se está convencido de que existe o pacto, fique na persuasão de que elle orador e os seus amigos não fizeram nenhum pacto, e lhe parecia bom que o Governo não fizesse similhante cousa (apoiados).

O Sr. Presidente não podendo admittir que se falte á ordem, pede aos Dignos Pares não interrompam o orador (apoiados).

O Sr. Conde de Thomar torna a repetir que julgava muito conveniente que o Governo não desse ordens aos escriptores a quem paga para estarem constantemente invectivando os homens publicos deste paiz (apoiados), pois nesta Camara é licito, usando elle orador do seu direito, dizer que essas jaculatórias dirigidas ao Governo unicamente são devidas á esperança de obter um logar na alfandega, ou um tabellionato; e quando se acham homens destas circumstancias, não devem nunca os Srs. Ministros consentir que ataquem caracteres respeitaveis do paiz (apoiados).

Expõe que se acha um pouco cançado, e que não póde continuar a fallar, mas como é presidente da commissão de administração publica talvez tenha ainda de pedir a palavra terceira vez, mas por agora pede perdão á Camara de a ter occupado por tanto tempo, e conclue votando ainda pelo parecer em discussão.

O Sr. Visconde de Algés—Muito bem.

O Sr. Presidente concede a palavra ao Sr. Presidente do Conselho de Ministros, e Ministro dos Negocios do Reino para uma explicação.

O Sr. Presidente do Conselho — Sr. Presidente, é unicamente para rectificar um facto a que alludiu o Digno Par que acabou de fallar. Disse S. Ex.ª — que a administração da ilha da Madeira estava ha tres ou quatro mezes abandonada, e que um Official de Secretaria é que se achava á testa daquelle districto. Isto não é exacto, nem podia porque era uma manifesta violação do Código Administrativo. O magistrado, que está á testa daquella administração é um Secretario geral interino, e esta qualidade de interino não obsta por certo a que possa substituir, em conformidade do Código Administrativo, o Governador civil. Não era possivel fazer outra nomeação, e a demora da decisão deste negocio é que tem sido causa do Governo não ter nomeado para o Funchal um Governador civil; nem era possivel encontrar quem quizesse nestas circumstancias, em quanto estivesse pendente esta resolução, ir ser Governador civil para a ilha da Madeira por quinze dias talvez.

O Digno Par chamou a este argumento—miserável; mas a Camara avaliará se elle merece este nome, e se no estado provisorio, antes da decisão do negocio que se discute, era possivel e facil achar quem se quizesse encarregar da administração daquelle districto esperando a cada momento ser removido.

O Sr. Presidente—Segundo a ordem da inscripção segue-se a Sr. Visconde d'Athoguia, e tem o D. Par a palavra.

O Sr. Visconde d'Athoguia declara, que muito deseja vêr convertida esta medida em Lei, pois entende que por. ella se faz grande beneficio á sua patria. Se os Srs. Deputados tem além do dever de defender os interesses geraes do paiz a prosperidade da provincia que lhes entregou sua procuração, não tendo o Par esse duplo dever, não se poderá comtudo obstar a elle orador que mostre gratidão pela terra a que deve nascimento e favor.

É sob estes pontos de vista, que approva o projecto em discussão, e tambem porque para isso tem fundamentos na propria opinião dos illustres membros da commissão de administração publica, que assignaram o respectivo parecer.

Depois de lêr o parecer, continuou expondo que quando a Administração de que fez parte apresentou este projecto na outra casa, teve nella, da parte dos cavalheiros que não estavam de accôrdo com a mesma Administração, a opposição mais violenta; mas os Dignos Pares, que assignaram o parecer são os proprios que reconhecem, que pela medida proposta se não atacam os principios constitucionaes, e o nobre Ministro da Justiça, quando na anterior sessão explicou a sua posição fazendo parte do actual Ministerio, retirou de certo as expressões, que como Deputado ennunciara, de que por esta medida se calcavam os principios inconcussos da Carta Constitucional. A Camara mesmo não poderá comprehender, que S.Ex.ª continue a occupar a sua cadeira, se não se entender que retira hoje aquella asserção. Felicita-se por tanto como membro da Administração passada, da qual se disse que tanto mal queria fazer ao paiz, e que tantas medidas apresentára que feriam de frente os principios inconcussos da Carta Constitucional, de encontrar agora no seu maior adversario um companheiro para podér vencer. Felicita-se, nova

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mente o repete, porque solatiun est miseris socios habere penates!

Nada mais elle orador poderá accrescentar ao expendido pelo Sr. Visconde de Castro, em favor da medida do Governo; mas tendo sido o seu nobre collega contradictado pelo Digno Par o Sr. Conde de Thomar, por isso desejava que S. Ex.ª confirmasse o que dissera, ou, posto elle orador se não explicasse melhor, lhe permittisse o fazel-o.

O Sr. Visconde de Castro—Está em boa mão.

O Sr. Visconde d'Athoguia continua expondo que como natural da ilha da Madeira incorreria n'uma grande responsabilidade, se concorresse para se lhe fazer presente de uma auctoridade que soubesse unicamente manejar a espada, pondo de parte o governo paternal de que aquelle povo tanto precisa. Por esta occasião permitta-se-lhe tambem significar o desgosto com que ouviu dizer ao nobre Ministro de Justiça, que os madeirenses estavam insubordinados. Esta asserção trazida como argumento da conveniencia e necessidade da medida, para elle orador, só concorreria para a negar in limine (apoiados). Intenda-se portanto bem qual foi o principio e razão porque a Administração apresentou este projecto: não foi para levar aquella ilha uma espada afiada que pezasse sobre os seus compatriotas, pelo contrario, quiz-se que um militar (e em geral os militares nunca tem mostrado vontade de usar das armas contra os seus concidadãos), quiz-se, repete, que um militar conciliasse e governasse sem castigar, que essas são as attribuições essenciaes do Governador civil. Desde o momento que se intenda que a accumulação destes dois empregos são augmento de força para castigar, rejeita a medida. (O Sr. Ministro da Fazenda—Apoiado.) Folga com o apoiado do nobre Ministro da Fazenda; S. Ex.ª intendeu bem o fim da proposição; pois quando se fez uma concessão generosa não houve animo hostil contra a provincia a quem ella se facultava.

Se se désse o caso, de que pelas desordens publicas na provincia fosse necessario pôr esta em estado de sitio, a administração que estivesse á testa dos negocios devia retirar esse homem que reunia as duas funcções, pois já não era capaz de exercel-as. Dada esta intelligencia que é necessaria para se conhecer o voto delle orador, afiança que a reunião das duas funcções militar e administrativa não é para ir castigar crimes (O Sr. Ministro da Fazenda—Apoiado), pelo contrario, intende que um militar valente comprehendia bem a sua commissão, e não lhe ficava mal, reunindo as duas funcções, em ceder um pouco da severidade militar, que obriga um pouco mais á disciplina (apoiados).

Torna a repetir, a questão é, se uma medida méramente administrativa póde continuar os beneficios, como disse muito bem o Sr. Visconde de Castro, já incetados, e que tão bom desenvolvimento tem apresentado, e, como tambem disse o Sr. Visconde de Castro, se convem alterar o systema de que se tem tirado tão proficuos resultados. O Sr. Conde de Thomar pareceu considerar como asserção generosa aquillo que o nobre Visconde tinha apresentado como uma parte desse desenvolvimento. S. Ex.ª não quiz dizer que a ilha da Madeira estava em tal prosperidade, não foi isso. Se bem intendeu, esses desenvolvimentos que ahi vão apparecendo pouco a pouco, são em pequena escala, mas ajudados por uma auctoridade previdente hão de tomar incremento.

Disse o Sr. Conde de Thomar, que da existencia dessa auctoridade se seguiu a insubordinação fatal, asseverada por parte do Sr. Ministro da Justiça: não é assim. Essa insubordinação, se a houve, foi devida á ausencia do nobre Ministro da Guerra. Estava elle orador então em Inglaterra com muitissimo pouca saude, e por isso não podia vêr os jornaes da ilha da Madeira; mas foi informado dos tumultos que alli tiveram logar, e diz que o incendio do lazareto, e os ataques aos estrangeiros que, em boa fé, iam para aquelle porto, não teriam de certo tido logar, se alli estivesse o nobre Ministro da Guerra (apoiados). Daqui deduz, portanto, mais uma razão para approvar a medida.

Perguntara o Sr. Conde de Thomar, se unicamente o facto de ter sido enfermeiro o Sr. Ministro da Guerra, naquella desgraçada crise por que passou a Madeira, se podia dar como razão necessaria para passar esta medida? Respondia que antes desse desgraçado caso, em que aquelle nobre militar mostrou uma coragem civica; igual ou superior a tinha mostrado, prestando grandes beneficios á ilha da Madeira. Havia retirado a levada do Rabaçal; tinha regado, e tornado ferteis os campos, fazendo-os produzir sem grande custo; tinha desenvolvido por toda a parte uma actividade extraordinaria na tiragem das agoas, principio necessario e unico para podér trazer áquelle municipio a maior fertilidade. Permitta-lhe, pois, a Camara nesta occasião dizer, pois conhece todos estes serviços, que elle orador tem muita honra em haver concorrido para a primeira, e segunda nomeação desta auctoridade.

O Sr. Ministro da Justiça podia adduzir estas mesmas razões, em sustentação do projecto de lei; mas S. Ex.ª, que tinha de fallar de uma pessoa que é seu collega na Administração, poupou-se a esse elogio para fugir á qualidade de suspeito em tal circumstancia.

Mas o Digno Par, membro da commissão, que tem sustentado o parecer, disse que o Sr. Ministro da Justiça apresentará sempre idéas contra a medida, e a rejeitára, votando contra n'outro logar; sendo para estranhar-lhe o procedimento de agora, por ir de encontro aos principios. Nem a situação delle orador, nem a sua qualidade de membro desta Camara, de que muito se honra, o dispensam de reconhecer e confessar a exactidão do que S. Ex.ª disse. Como regra geral não póde ser contestado; mas roga a S. Ex.ª considere que no caso em questão, e com relação á ilha da Madeira, ha uma excepção; e é certamente esta circumstancia a que determina a elle orador a votar por esta medida, e que determinaria tambem o Sr. Ministro da Justiça a modificar a sua antiga opinião.

A mesma observação que fez o Digno Par, a que allude, é muito para ter-se em vista. Poder-se-ha desde já elevar a todos os empregados publicos os pequenos vencimentos que actualmente recebem? Será esta uma medida que, dentro de poucos mezes, não possa acabar completamente? Ninguem o dirá: mas é facil de vêr que esta medida não se póde tomar geral para todos na occasião presente (apoiados).

Acha exequivel o que disse o Sr. Conde de Thomar—a nomeação de um militar para Governador civil da Madeira, ordenando-se á força militar da ilha que ficasse sob o commando immediato e superior do mesmo Governador civil, que é militar, e o augmento de ordenado a esse magistrado—votaria mesmo pela opinião do nobre Conde, se apresentasse neste sentido uma substituição; porém prefere por mais logico, mais leal, e mais respeitador dos principios o projecto em discussão.

Repete, que se pedíra a palavra nesta materia fóra pela sua circumstancia especial de ser filho da ilha da Madeira, e porque os habitantes della seguramente esperariam, que dissesse alguma cousa a este respeito. Portanto, assim concluia que era forçado a approvar o projecto, porque o entende de utilidade para a terra onde nasceu: porque, desde que esta medida foi tomada, tem produzido bons resultados: finalmente, por vêr nella. ainda que pequena, alguma economia, e deseja economias, como o Sr. Ministro da Fazenda as deve ter em todas as despezas do Estado.

O Sr. Visconde de Algés — Sr. Presidente, tres motivos me podem chamar ao campo deste debate, e eu vou explicar quaes elles são. Não acceitarei os dois primeiros, mas acceitarei o terceiro. Um dos motivos que me poderia chamar ao campo desta discussão foi a auctoria do Digno Par, o Sr. Conde de Thomar, quando chamou em seu auxilio os Dignos Pares seus collegas, membros da commissão de administração publica, afim de o ajudarem a sustentar o parecer em discussão. Outra auctoria foi a do Digno Par, o Sr. Conde da Taipa, que referindo-se ao que se tinha passado em outros annos, e aos pareceres da commissão de administração publica, que teve o trabalho de lêr para mostrar a incoherencia que se dava da minha parte por ter votado umas vezes a favor, e outras vezes contra propostas iguaes a esta que agora se discute, parecia collocar-me em difficil situação. E o terceiro motivo é o ter eu assignado o parecer da commissão, e é este o que verdadeiramente eu acceito.

Sr. Presidente, desde 1834 que pertenço ao Parlamento ainda não deixei de dar o motivo do meu voto em todas as questões importantes, e muito principalmente quando assignei o parecer da respectiva commissão; e assim o farei agora. Não acceito o chamamento que me dirigiu o Digno Par, o Sr. Conde de Thomar, porque um parecer sustentado por S. Ex.ª e pelo Digno Par, o Sr. Marquez de Ficalho, que são dois estrenuos defensores, não carece do meu pequeno contingente para que a sua doutrina triumphe no campo do debate. Não acceito tambem o chamamento do Digno Par, o Sr. Conde da Taipa, porque ainda que S. Ex.ª não viesse trazer a esta Camara a leitura desses pareceres da commissão de administração publica, eu havia de tomar parte na discussão, porque, como disse, é esse o meu costume, e nunca deixo de motivar o meu voto sobre os pareceres em que me acho assignado, e com a circumstancia de ter apreciado differentemente este mesmo objecto.

Começarei por dar os parabens ao paiz, porque o Digno Par, o Sr. Conde da Taipa, vai mudando de sua antiga opinião. Ha annos disse S. Ex.ª nesta Camara, que já não lia senão uma pagina de cada livro, ou uma linha de cada pagina; e procedia assim, pela razão que o Digno Par manifestava de não merecerem os livros que se publicavam o emprego do tempo que se empregava na sua leitura, o que tambem era applicavel ao mais que se publicava pela imprensa, e isto sem duvida pronunciado por S. Ex.ª dava a entender o mau estado da instrucção publica em Portugal. Mas hoje que o Digno Par se dá ao trabalho, aliás penoso, de compulsar a collecção dos Diários do Governo até achar as sessões da Camara, em que se tracta do objecto em questão, para lêr e apresentar os pareceres da commissão de administração publica por occasião da discussão de pedidos iguaes ao que se faz neste projecto de lei, isto, Sr. Presidente, que é muito mais do que lêr ursa pagina de cada livro, ou uma linha de cada pagina, mostra evidentemente que o Digno Par mudou de opinião, que já se occupa das leituras, e que a instrucção publica vai em progresso entre nós (apoiados).

Sr. Presidente, como V. Ex.ª e toda a Camara sabem, esta proposta leve origem pela primeira vez em 1854, e foi apresentada pela administração a que presidia o nobre Duque de Saldanha, chamada vulgarmente a administração dos regeneradores. Sinto deveras, e reconheço mesmo, que não seja admissivel que na sessão do anno de 1858, se leia aqui o que se disse em 1854-, por que se assim fosse, eu, lendo o discurso que aqui pronunciei naquelle anno, explicaria as minhas idéas muito melhor do que o farei hoje, porque era mais moço, e linha menos falta de capacidade do que actualmente. Se pois não posso lêr o extenso discurso que sobre este objecto pronunciei em 1854, tocarei ainda que muito por extracto em alguma das razões que adduzi para fundamentar a minha opinião contra a medida que se propunha.

Em primeiro logar observarei, que isto não é uma questão ministerial, nem de confiança, mas uma questão de principios de administração (apoiados). Se por acaso houvesse um Ministerio que quizesse sustentar que geralmente se deviam accumular as funcções de Governadores militares, com as funcções de Governadores civis, isso certamente era uma questão ministerial e muito ministerial, por importar, com aberração de todos os principios o desejo de querer fazer uma alteração na legislação do paiz (apoiados). Mas essa nunca foi a questão. Os Ministros que em 1854 occupavam aquellas cadeiras, não questionaram a verdade dos principios, que se expendiam; o que intenderam foi, que as circumstancias extraordinarias da Madeira exigiam que houvesse uma excepção; os principios não podiam ser combatidos porque são de simples intuição, e de doutrina orthodoxa; mas tambem é exacto o principio da maxima lei da necessidade publica, que pede que se alterem os principios ordinarios e se substituam por um outro meio extraordinario, porém só, e em quanto durar essa extrema necessidade (apoiados).

Sr. Presidente, esta questão foi muito renhida, e de certo ninguem se lembrará mais della do que V. Ex.ª, que tomou grande parte na impugnação do projecto de lei; e a sua defesa foi sustentada pelo Digno Par o Sr. Fonseca Magalhães, que então era Ministro do Reino, e que sinto bastante não vêr aqui, por se achar doente. O que nós, nessa occasião, questionamos, era se se dava a hypothese, pela qual convinha que se reunissem as duas attribuições de Governador civil e Commandante militar; então ninguem com vantagem combateu os principios, que ficaram inconcussos; mas ainda havia divergencia sobre a necessidade da excepção, e a conveniencia da que se propunha; e a mim pareceu-me que da juncção das duas attribuições, além de se ferirem os principios, não podia resultar utilidade alguma.

Em caso extraordinario, na occasião em que se precisasse de energia, era quando eu quereria que houvesse duas auctoridades, e não uma; era nessa hypothese que eu desejaria que cada uma exercesse as suas funcções; porque a auctoridade civil exerce attribuições especiaes, que outra differente não póde desempenhar; é uma auctoridade de conciliação que póde ouvir um não, sem desdoiro do seu caracter, porque reserva a faculdade correctiva quando fôr conveniente empregal-a; e a auctoridade militar não está acostumada a ouvir a mesma negativa sobre suas determinações, e nem isso seria conforme ao seu caracter, educação militar, e espirito de disciplina (apoiados). São estes os principios que procurei largamente desenvolver em 1854, quando pela primeira vez se discutiu esta proposta, mas a maioria desta Camara julgou dever approvar o projecto vindo da outra Casa, e o projecto passou.

Em 1855 a administração que era a mesma, apresentou outra vez esta proposta, e o Sr. Ministro do Reino disse, na commissão de administração publica, de que eu era Presidente, que as circumstancias que se davam para pedir a continuação desta auctorisação, eram as mesmas que existiam quando se apresentára e discutira a primeira proposta do Governo, e que por consequencia pedia a sua prorogação.

O que fez então a commissão? Se os principios se feriram, estavam feridos, e como se afiançava que esta medida tinha produzido bons effeitos, a commissão de administração publica approvou o projecto, não querendo tomar a responsabilidade de oppôr-se á continuação dos bons resultados, que se attribuiam á providencia adoptada, asseverando-se que continuavam a existir as causas extraordinarias, que aconselharam a excepção dos verdadeiros principios; e o mesmo aconteceu na sessão de 1856, em que o Governo veio pedir outra prorogação por mais um anno, e tanto esta proposta como a de 1855 passou sem discussão nas ultimas sessões da annual desta Camara, isto é na hora do seu encerramento! E, Sr. Presidente, o que aconteceu em 1857? Aconteceu que se não discutiu nesta Camara o projecto que veio da outra casa; que o Governo desistiu da medida naquelle anno, e nesse intervallo ficou á ilha da Madeira sem ter quem lhe ministrasse as providencias importantes, que deram origem á excepção dos principios de boa administração (apoiados)!

Este anno appareceu o Sr. Ministro do Reino e Presidente do Conselho na commissão, porque se tractava deste objecto, e perguntou-se-lhe, se ainda havia os motivos excepcionaes, que tornavam necessaria aquella prorogação, e que respondeu S. Ex.ª Não alegou a continuação dos motivos extraordinarios, e tão sómente ponderou, que da juncção das duas auctoridades, tinham resultado os melhores effeitos. Agora perguntarei eu, esta auctorisação é alguma contribuição que se vote todos os annos? Se acaso esta medida produziu bons resultados durante estes quatro annos, e se os Srs. Ministros entendem, que é conveniente para a ilha da Madeira fazer a juncção das duas auctoridades, porque não propõem neste sentido uma lei permanente para beneficiar aquelles povos? (apoiados.)

Se uma auctoridade militar que accumule as duas funcções administrativas e militares, é o que convem para aquella ilha; se ella é que faz com que o mal das vinhas não seja tão intenso; se ella concorre para fazer desapparecer ou diminuir o choleramorbus, então faça-se uma Lei permanente neste sentido (apoiados).

Sou o primeiro a reconhecer que os dois distinctos militares, que accumularam aquelles empregos, têem desempenhado o melhor possivel as suas funcções; que são credores da maior consideração do Governo e da nação; mas o que não admitto que se deduza dahi, é que os Governadores civis não possam fazer o mesmo que elles fizeram (apoiados).

Vendo, pois, a commissão que o Ministerio não apresentava motivos especiaes na sua proposta, que justificassem a necessidade de se continuar a conceder esta auctorisação, entendeu que se devia rejeitar o projecto; mas se o Governo fosse á commissão, e fizesse vêr, que existiam motivos extraordinarios, talvez que eu approvasse o projecto, attendendo a que se tem dito que delle se colhem bons resultados.

Diz-se que houvera acontecimentos desagradaveis naquella ilha neste intervallo em que tem estado sem Governador militar, e isto é mais uma razão para eu entender que os Srs. Ministros deviam ter-se dado pressa em fazer passar este projecto na sessão preterita, se o julgavam indispensavel; e quando isto não podesse ter logar, deviam, ao menos, nomear um militar para Governador civil, porque o podiam fazer; e noto ao Sr. Ministro do Reino, em referencia ao que S. Ex.ª ha pouco disse, que não entendo que possa haver um Secretario geral interino; e mesmo, se S. Ex.ª me der licença, dir-lhe-hei que não sei qualificar o que é esta entidade administrativa, que aliás vai fazer uma ferida na Lei. Não ha interino de interino; o logar de Secretario é amovível por sua natureza, e quando o verdadeiro Secretario está impedido, serve outro por elle, mas esse outro não exerce as funcções de Governador civil, porque lá está a Lei que mostra claramente o modo por que se devem fazer estas substituições.

Quem substitue o Governador civil no seu impedimento legitimo é o Secretario geral, e no impedimento deste o primeiro membro do Conselho de districto (apoiados).

Eis-aqui está, Sr. Presidente, a explicação dos motivos porque eu assignei da primeira vez, e combati contra o projecto, e porque das outras vezes o approvei; e fica assim demonstrado pelo meu proprio facto, que eu nunca entendi que nisto havia politica; ainda que eu pouco ou nada cuido de politica; não sou progressista nem conservador, todos conhecem que nada pertendo ser em politica, e que nem a uns nem a outros pertenço. Quando ouço fallar em pactos entre certas parcialidades mais me convenço disto, observando que não entro nelles. Mas a imprensa dá-me ás vezes differentes epithetos. Attribue-me altas pertenções politicas! De modo que eu tenho momentos em que reconhecendo que sou zero, ou ainda menos, se é possivel, hesito sobre apropria e intima convicção, pela idéa do affinco com que alguem, mas são poucos, se occupa da minha humilde pessoa (riso).

O caso é que interrompi o fio das minhas idéas com este incidente. Dizia eu, que a prova de que nunca considerei este negocio como objecto de politica é que disse ao mesmo Ministerio—não— quando se tractava de ferir os principios, apresentando-se esta medida pela primeira vez; e disse — sim — quando era difficil voltar a traz salvando principios já preteridos, e assegurando-se-me que a experiencia tinha dado muito bons resultados da medida excepcional, e que naquella occasião haveria grande inconveniencia para os povos da Madeira se as cousas não continuassem a este respeito conforme o que estava disposto antecedentemente: então não quiz tomar a responsabilidade de me oppôr á medida em taes circumstancias; mas hoje opponho-me, convencido de que ellas não existem, porque o Ministerio as não allega, como me parece que já está demonstrado. Eis-aqui pois a minha explicação (apoiados).

O Sr. Aguiar—Eu declaro que me vejo embaraçado tendo de fallar, depois de terem fallado os illustres membros da commissão, que são de certo dos mais distinctos ornamentos d'esta Casa; e não se pense que vou usar da palavra tendo a ousadia de julgar que posso accrescentar alguma cousa ao que S. Ex.ªs disseram. Eu pedi especialmente a palavra para explicar o meu voto, visto ter observado que se fez censura a alguns dos membros d'esta Camara, porque n'outra occasião foram de voto contrario aquelle que manifestaram ultimamente no parecer em discussão. Como eu estou nas mesmas circumstancias, como já votei aqui pela accumulação das funcções militares e civis, n'um magistrado superior para a Ilha da Madeira, como hoje voto contra essa accumulação, é necessario que me explique, e por esta occasião combaterei ainda os argumentos com que tem sido impugnado o parecer da illustre commissão. Mas, Sr. Presidente, eu acho-me, repito, n'um grande embaraço, e confesso que se tivesse previsto que se haviam de desenvolver tão amplamente, como se desenvolveram, os bons e verdadeiros principios que regem n'esta questão, e que haviam de ser destruidos tão completamente, como foram, os argumentos que sahiram, ou dos bancos dos Ministros, ou dos Dignos Pares que se encarregaram de sustententar, contra o parecer da commissão, a proposta do Governo, guardaria para outra occasião a explicação do meu voto.

Fui prevenido em quasi tudo, principalmente pelo Digno Par o Sr. Conde de Thomar, que fallou depois de eu ter pedido a palavra. O Digno Par destruiu um por um todos os argumentos com que se tem pretendido impugnar o parecer da commissão, e o meu nobre amigo, o Sr. Visconde de Athoguia, que pareceu combate-lo, por entender que a accumulação das funcções civis, e militares n'uma auctoridade superior, é de grande utilidade para o districto do Funchal, condemnou elle mesmo essa accumulação, e ministrou uma resposta triumphante a todos os argumentos com que o parecer tem sido impugnado.

Se eu não me engano, e não me engano decerto, porque dei toda a attenção ao que disse o Sr. Visconde de Athoguia, e tomei logo nota n'este papel; o Digno Par disse, que confessava que o Sr. Conde de Thomar havia apresentado um meio de se conseguir o mesmo fim, som certa quebra dos principios, sem soccorrer a esta medida. Pois então, se ha um meio de conseguir o mesmo fim (o Sr. Visconde de Athoguia—Para uma explicação, se me não chegar outra vez a palavra), se é um meio regular, se se não ferem os principios, se por esse meio se não faz excepção á regra, se esse meio está na lei geral, para que havemos de recorrer a um meio que fere os principios, a um meio que pela sua natureza de excepcional não se póde recorrer a elle sem fortissimas razões, sem motivos gravissimos? Pois que! Não se sabe que se não póde recorrer a meios extraordinarios, quando são sufficientes os ordinarios! Isto dispensava-me de dizer mais a este respeito, e pouco mais direi contra a proposta do Governo, e fallarei mesmo a favor della se se levar á evidencia que a nomeação d'um governador para a Ilha da Madeira, Investido com as attribuições civis e mi

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litares, concorreu, como aqui já se disse, para a diminuição da molestia das vinhas na Madeira. Se depende d'essa accumulação de funcções a diminuição da molestia dos vinhos, se della póde vir a extincção d'este flagello, que tem causado tantos males, não só á Madeira, mas a todas as provincias do reino, é necessario propôr a accumulação para todas ellas, e eu vou pedi-la para o districto de Lisboa. Perdoe-me o Digno Par o Sr. Conde do Sobral, peço-lhe que tolere o que vou dizer: eu peço, que se nomeie para Lisboa um governador civil e militar, que exerça ambas as funcções; e permitta-se-me que peça com preferencia para o districto de Lisboa, porque tenho nelle uma vinha (riso). Deve-se procurar (vozes temos o Sr. Conde da Ponte de Santa Maria) Bem; ahi temos um governador civil commandante da força militar; é meio caminho andado. Mas não, Sr. Presidente, não insisto n'este pedido, e em quanto se não mostrar que a accumulação é o remedio contra a molestia das vinhas, vou combatendo.

Para mim, Sr. Presidente, a questão de que se trata não é questão de confiança, ou falta de confiança no Governo, e declaro que folguei muito de vêr que esta declaração sahiu mesmo do banco dos Ministros, assim ella não tivera sido, por assim dizer, extorquida pelo meu nobre amigo que se senta agora no banco inferior, o Sr. Visconde de Athoguia; assim ella se não podesse tomar já como uma declaração reconsiderada, porque se me não engano o mesmo Sr. Ministro das Obras Publicas nos disse que não se deveria estranhar que elle tivesse votado contra esta medida quando era deputado da opposição, e como tal não tinha confiança no governo, e hoje a sustenta sendo Ministro, porque é natural que tenha confiança em si, e no Ministerio de que faz parte.

Feita esta declaração, ainda que provocada pelo meu nobre amigo, o Sr. Visconde de Athougia, feita, digo, pelo Sr. Ministro das Obras Publicas, e não contrariada pelos seus colegas, é manifesto que os votos dos Dignos Pares pela accumulação, ou contra ella não significam confiança, ou falta de confiança no Governo. Assim podem votar pela proposta do Governo os Dignos Pares, que seguindo o meu amigo o Sr. Visconde de Castro, e entendendo, como elle que a accumulação das funcções militares fosse os principios, receiam que a falta della influa desfavoravelmente na tendencia que ha para o melhoramento do estado da Madeira; podem votar pela accumulação os que, como o nobre Conde da Taipa entenderem que a questão da accumulação é uma questão insignificante, uma questão insignificante que não merecia, nem carecia de ser trazida aqui; que o principio da separação das funcções, não é garantia das liberdades publicas e individuaes: que as liberdades que temos são demasiadas, e do que se deve tratar e de as restringir no interesse de dar força á auctoridade. Assim finalmente, podem votar pelo parecer da commissão, ou pela proposta do Governo os Dignos Pares que tem, e os que não tem confiança no Governo: porque, torno a repetir, a questão não e de confiança.

Sr. Presidente, eu tambem assim considerei a questão antes de fazer esta declaração o Sr. Ministro das Obras Publicas; eu considero ainda mais, como o meu nobre amigo que acabou de de fallar, que uma vez que dos bancos dos Ministros não sahissem as doutrinas, emquanto a mim erroneas e inconstitucionaes, sustentadas pelo primeiro orador que combateu o parecer da commissão, esta questão não podia considerar-se como ministerial.

Seria sim ministerial se o Governo apresentasse a questão de modo que esses principios, essas doutrinas inconstitucionaes fossem por elle adoptados como fundamento da sua proposta. A camara não poderia n'este caso deixar de considerar a questão como ministerial, e deixar de rejeitar a proposta do Governo, e estou certo de que a rejeitaria sem distincção de partidos. Faço esta justiça aos Dignos Pares de qualquer dos lados da Camara. Seria tambem ministerial a questão se a solução d'ella podesse embaraçar a marcha da administração; mas não póde embaraça-la.

Sr. Presidente, eu declaro que não tenho confiança no Governo, além d'aquella que me inspiraram as qualidades dos nobres Ministros que se sentaram n'aquelles bancos; mas eu sou justo e desejo sempre fazer justiça, tanto aos meus adversarios como aos meus amigos. Sr. Presidente, eu folguei muito de ouvir dizer ao Sr. Ministro das Obras Publicas que estava de accôrdo com os principios exorados pela commissão no parecer que se discute; esta simples declaração, ainda que elle se não tivera explicado mais, significa que o Ministerio não aceitou, antes rejeitou a defeza que um Digno Par fez da proposta do Governo, e que não póde admittir-se sem uma flagrante violação dos principios constitucionaes, e quebra das garantias das liberdades publicas, e individuaes.

Esta questão, Sr. Presidente, repito, não a considero ministerial; mas que distancia não vai d'ahi a considerar-se como uma questão insignificante, questão de lana caprina, como a chamou um Digno Par. E vem o Governo trazer esta questão ao Parlamento, vem pedir ao Parlamento o que podia fazer, accrescentou o Digno Par! Pois o Digno Par ignora que o Governo não podia sem uma lei nomear para a Madeira um magistrado que accumulasse as funcções de dois, e os ordenados! Pergunto aonde está a prohibiçao d'esta accumulação! Está nas leis cuja prorogação se pede na proposta do Governo.

Pois nas leis que se têem votado, dando auctorisação ao Governo para podér nomear aquella auctoridade, não está comprehendida virtual, quando não expressamente, a regra geral de que o governo não póde fazer essa nomeação?

Mas, Sr. Presidente, encaremos a questão debaixo do ponto de vista em que a collocou o Sr. Ministro das Obras Publicas; em que a commissão a collocou, em que a tem collocado os differentes oradores, menos um; em que não póde deixar de collocar-se; colloquemos a questão n'este terreno. O Governo reconhece os principios e está de accôrdo com a commissão, mas a commissão declara que o rigor dos principios póde ser modificado no caso em que seja indispensavel; e o Governo julgando que era chegado esse caso fez esta proposta ás Côrtes: reduz-se pois a questão a saber se e justificada a excepção e nada mais.

Sr. Presidente, V. Ex.ª sabe, e sabem todos, (mas nós temos mais obrigação de o saber) que uma excepção, e uma excepção que traz comsigo um desvio dos principios constitucionaes, não póde ser admittida sem ser justificada com fortes rasões, sem ser reclamada por urgente necessidade, por gravissimas considerações. (O sr. Conde de Thomar: — Apoiado.) O que devemos portanto examinar é quaes são esses motivos, e quaes são essas considerações. A primeira, e esta sahiu dos bancos dos Ministros, e que se póde fazer a concessão por se ter já feito: boa logica! Sr. Presidente, ha precedentes, supponhamos mesmo que esses precedentes são justificados pelas considerações que já aqui apresentaram dois Dignos Pares. E são applicaveis essas considerações á proposta que se discute?

Sr. Presidente, os precedentes não são senão factos, e não podem constituir direito, muito menos para aquelles que protestaram contra elles. É doutrina corrente. É necessario que as circumstancias sejam exactamente as mesmas, para que os precedentes possam ser invocados.

O Sr. Marquez de Vallada—Apoiado.

O Orador—(continuando). Ha necessidade de augmentar o ordenado ao Governador Civil do Funchal, disse o Sr. Ministro do Reino; pois esse augmento de ordenado póde ser uma rasão sufficiente para se fazer uma excepção á regra que não admitte a accumulação das funcções militares, e civis—regra que tem por fim garantir as liberdades publicas e individuaes, como o proprio Governo reconhece? Não é só o Governador Civil do Funchal que tem um pequeno ordenado; estabeleça-se para todos o ordenado conveniente, no interesse do serviço publico; estabeleça-se mesmo para aquelle Magistrado um ordenado maior, se se quer attender a que tem de dar frequentes jantares, bailes, e saraus, ainda que devo confessar que não sei se depois de accumulados os ordenados se tem dado esses jantares, bailes e saraus. (O sr. Visconde de Balsemão—Peço a palavra para uma explicação. Eu não fallei em bailes, nem saraus, mas em receber as personagens). Nem eu fallei no Sr. Visconde de Balsemão, ou me referi a elle; mas como S. Ex.ª declara que sustentava a proposta do Governo pela necessidade de accumular a auctoridade superior do Funchal as funcções civis, e militares, para accumular os ordenados, e ter os meios de receber convenientemente os passageiros, que frequentemente vão aquella Ilha, não seria para extranhar que eu, referindo-me a S. Ex.ª, faltasse em bailes, em saraus, e em jantares. Mas, Sr. Presidente, como é que para occorrer a esta necessidade que não tem limite de tempo se propõe uma medida limitada a um anno?

O Sr. Ministro do Reino insistiu na rasão derivada das circumstancias, que affirmou serem as mesmas, que em 1854, e 1855 fundamentaram a accumulação das funcções, e dos ordenados, mas não o demonstrou, nem podia demonstra-lo; porque os factos mostram o contrario.

Sr. Presidente, V. Ex.ª e a Camara terão observado que sobre a apreciação dos fundamentos da proposta do Governo não esta d'accordo com o Sr. Ministro do Reino o da Justiça. O Sr. Ministro do Reino disse: «rejeitae o parecer da vossa commissão, e aprovae a proposta do Governo, ella é reclamada pela necessidade d'augmentar o ordenado do Governador Civil do Funchal, e justificada pelos precedentes de 1854, e 1855; as circumstancias são ainda as mesmas.» O Sr. Ministro da Justiça disse: «votae contra o parecer da vossa commissão; votae pela proposta do Governo, não pelos fundamentos apresentados pelo Presidente do Conselho, mas pelo estado de insubordinação em que se acha o povo do Funchal, é hoje um povo insubordinado, desobediente, revoltoso, e n'estas circumstancias é necessario uma auctoridade que reuna as funcções Civis, e militares para o fazer entrar na ordem, e na obdiencia ás leis.» Eu sinto deveras que o Sr. Ministro da Justiça, de quem sou amigo ha muitos annos, e cujo merecimento reconheço, tenha tratado o povo do Funchal com tanta injustiça, e tão severamente, e que tão depressa se esquecesse das demonstrações de consideração, e de estima que tem recebido d'elle. « Os habitantes da Madeira (dizia S. Ex.ª em 1854) tem um caracter essencialmente pacifico, são obedientes á lei, respeitadores das auctoridades, submissos, dóceis, e infinitamente faceis de serem governados.....Não ha na superficie do globo um povo mais respeitador das auctoridades, mais obediente ás leis. »

Pois um povo que em 1854 era essencialmente pacifico e obediente como nenhum povo do globo, transformou-se n'um povo revoltoso, perturbador da ordem publica, desobediente ás auctoridades, e ás leis! Como se operou esta metamorfose! Ou como se combina a boa indole do povo da Madeira em 1854 com a sua má indole em 1858! Eu desejava muito ouvir a explicação do Sr. Ministro. (O Sr. Ministro da Justiça—Ouvirá). Eu mesmo a vou dar (riso).

E agora, Sr. Presidente, torno a repetir, que tenho um sentimento profundo de que esta grave injuria, que se irrogou aos habitantes da Madeira, fosse feita por um cavalheiro, que anão podia fazer sem cometter um acto de ingratidão. S. Ex.ª recebeu todas as demonstrações de consideração e de estima d'aquelle povo.

Vou explicar o procedimento de S. Ex.ª, e parece-me que elle aceitará a explicação. O Sr. Ministro da Justiça viu-se n'um grande embaraço. Era difficil saír d'elle por outro modo, e comtudo S. Ex.ª confessará, se quizer dizer o que sente, que desejara não ter soltado as expressões, que proferiu injustamente contra um povo que o distinguiu tanto, e que tantas provas lhe deu d'affeição, e de confiança.

Eu não direi que o Sr. Ministro da Justiça calumniou o povo da Madeira, porque o meu nobre amigo e incapaz de calumniar, assim como eu tambem sou incapaz de usar de similhante palavra; mas Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Justiça teve um motivo fortissimo que o arrastou a fazer esta declaração.

Quer V. Ex.ª saber o que eu supponho? Em 1854, quando se tratava d'este mesmo objecto, S. Ex.ª sendo então deputado da opposição, na sessão de 15 de Março, disse, que a excepção á regra geral só podia ser toleravel n'um caso de guerra, de sedição ou de perturbação da paz e tranquillidade publica; por consequencia não podia, sem contradição, sustentar hoje esta medida, a não ser por se dar algum destes casos; imaginou que algum delles se verificava para evitar a contradicção, em que cahia apoiando hoje a medida que em 1854 tinha combatido. «Eu disse em 1854 que a excepção á regra da separação das funcções, civis e militares só podia ser toleravel em caso de guerra, de sedição ou de perturbação da paz, e da ordem: pois bem, direi agora para sustentára a excepção proposta pelo Governo, como então disse para sustentar a regra, a regra não póde ter excepção senão n'aquelles casos, e nenhum delles se dava então, mas dá-se agora. » O povo do Funchal, que então era pacifico, submisso, obediente ás leis, hoje é sedicioso, é revoltoso. Este foi sem duvida o pensamento do Sr. Ministro da Justiça.

Mas Sr. Presidente, a mudança não está na indole do povo; o povo é o que era em 1854; a mudança houve-a na posição de S. Ex.ª, é hoje Ministro da Justiça, se fóra deputado da opposição como era em 1854, talvez dissesse como então disse: «Na Ilha da Madeira reina a paz, o a ordem, ha completo socego; não ha receio de que a tranquilidade seja perturbada, e é nesta occasião que vai estabelecer-se alli uma dictadura. »

Senti, Sr. Presidente, que o meu amigo, o Sr. Visconde de Athoguia, em vez de combater confirmasse o que o Sr. Ministro da Justiça disse ácerca da insubordinação dos habitantes da Madeira. (O Sr. Visconde de Athoguia—Por certo que não.) Não? Pois o Digno Par não disse que esta insubordinação se devia á falta da auctoridade superior investida das funcções civis e militares!

Ora, Sr. Presidente, o que eu desejava era que me demonstrassem que, se em vez d'esta auctoridade, houvesse na Madeira um governador civil, que bem podia ser militar, e um commandante da força alli estacionada, deixaria de conservar-se a tranquilidade, e a ordem, porque esse Magistrado não accumulava as funcções, civis e militares, e os dois ordenados: desejava que me demonstrassem que não se tiraria o mesmo resultado? (O Sr. Visconde de Athoguia—Parece-me que não.) Mas então, Sr. Presidente, como é que o Digno Par disse que o meio apresentado pelo Sr. Conde de Thomar tornava desnecessaria a medida da accumullação das funcções, e por ella se obtinha o mesmo fim!

O Sr. Ministro da Justiça não reflectiu de certo sobre as consequencias, que se tirariam da mudança da Índole, do caracter pacifico dos habitantes da Madeira, contra a medida que S. Ex.ª sustenta hoje como Ministro, e combateu em 1854, como deputado. Pois os habitantes da Madeira antes de serem governados por Magistrados investidos da auctoridade civil e militar, tinham uma indole pacifica, reinava ali a paz, e a ordem, e depois tornaram-se revoltosos, perturbadores da paz e da ordem! Não se podia apresentar um argumento mais forte do que este contra a proposta do Governo.

E com tudo ouvi que a medida proposta é necessaria, porque só ella póde fazer a prosperidade daquelle paiz. Essa prosperidade não a quero para mim, nem por esse preço (riso): foi por graça que eu disse que pedia um governador militar e civil para Lisboa (riso).

O Governo que a julga necessaria, que a propoz ha um anno, como necessaria, e urgente, por que a tem abandonado até hoje? Porque não foi ainda convertida em lei?

D'onde nasce a falta? do Governo, Pois não é a opinião de SS. Ex.ªs. os Srs. Ministros, manifestada muitas vezes, que o Governo que tem as maiorias não tem desculpa nenhuma, porque os negocios se demoram nas Camaras? E quem é o culpado de não estar já n'aquella Ilha um governador civil com attribuições militares? O Governo. Mas embora o Governo deixasse ficar a sua proposta esquecida por tanto tempo, o que não póde tolerar-se é que elle se tenha esquecido de nomear para a Madeira um governador civil.

Diz-se que não se achara quem fosse ser governador civil da Madeira! Oh Sr. Presidente, pois espera-se por uma medida, que póde ou não, ser approvada, que póde ou não ser convertida em lei, para estar tanto tempo sem se executar a lei? Pois se o Governo tinha intenção de nomear um governador militar para o governo da Ilha da Madeira, investido de attribuições militares, e civis, havia alguma difficuldade, alguma duvida, em nomear esse official para o Governo civil d'aquella Ilha, e receber este depois a sua investidura dictatorial, quando passasse o projecto? (O Sr. Conde de Thomar—Apoiado). Havia sobre isto alguma difficuldade? Não havia nenhuma; por consequencia os Srs. Ministros são responsaveis por todas as consequencias que podem seguir-se de estar a Ilha a Madeira, no abandono em que a tem deixado, e responsaveis por violação da lei, porque, no fim de tudo, nomear um secretario geral interino é violar a Lei, pois no Código Administrativo está estabelecido o modo de serem substituidas as auctoridades superiores do districto. (Vozes) Deu a hora.

O Orador: — Ouço que deu a hora: pois bem, eu vou concluir dizendo que me parece ter-se demonstrado que as rasões que podiam ter justificado a excepção feita nas lei» cuja prorogação o Governo pretende, não existem hoje, que não se apresentam circumstancias extraordinarias, que reclamem uma excepção á regra da separação das funcções civis das militares, e aos bons principios em que essa regra é fundada, que são destituídos de toda a força os argumentos com que o Governo e os oradores, que o apoiam n'esta questão, sustentaram a accumulação, ou como principio ou como excepção, e que em consequencia não posso sem incoherencia deixar de approvar o parecer da commissão, rejeitando a proposta do Governo.

O Sr. Conde da Taipa — Eu faço o requerimento para ser julgada a materia sufficientemente discutida.

O Sr. Conde de Thomar peie a leitura do artigo respectivo do Regimento.

O Sr. Presidente: —declara que o Regimento admitte o requerimento todas as vezes que tenham fallado dois Dignos Pares pró, e dois contra, e isto já assim se verificou. Permita-lhe porém o Digno Par, author do requerimento, que observe que ainda estão inscriptos para fallarem na materia os Dignos Pares Barão de Porto de Moz, Visconde de Castro e Conde da Taipa, e os Srs. Ministros da Justiça e da Fazenda: e para declarações, os Dignos Pares os Srs. Viscondes d'Athoguia e Balsemão, Marquez de Vallada, e o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu cedo da palavra até para não continuarmos a gastar mais tempo com esta discussão.

O Sr. Ministro da Fazenda — Tambem cedo da palavra.

O Sr. Ministro da Justiça—Eu igualmente.

O Sr. Conde de Thomar— insta pela leitura do Regimento; por lhe parecer que elle exige que quando um Digno Par proponha se julgue a materia discutida, assim o declare logo.

O Sr. Conde da Taipa—Pois declaro-o agora.

O Sr. Secretario — Leu o artigo 41.º do Regimento.

O Sr. Barão de Porto de Moz—Eu lucro com o requerimento do Digno Par Conde da Taipa, porque assim me poupo a fallar sobre a materia, até porque a minha saude não é a melhor: mas sempre quero reflectir a S. Ex.ª que eu não esperava que fosse elle quem fizesse um tal requerimento O Digno Par que fallou na materia, increpou-me de contradictorio. ora sabendo S. Ex.ª que eu tinha a palavra, parece que S. Ex.ª não devia pedir agora, que fosse julgada sufficientemente discutida. (Apoiados.) Eu necessitava defender-me da increpação que me foi feita pelo Digno Par; e saiba a camara que não tinha interesse em fallar na materia, porque nada mais se póde adduzir além d'aquillo que já tem sido apresentado em sustentação do parecer da commissão, pelos Dignos Pares que me antecederam, rasões essas que não têem resposta. (Apoiados.)

Concluo pois dizendo, e peço que d'isto se note, que uma contradicção de que eu sou arguido, pela primeira vez na minha vida, não prova senão que eu sou um homem muito coherente em vista das multiplicadas contradicções, que a cada hora se vêem, mas eu não fui contradictorio.

O Sr. Marquez de Vallada—Dirá poucas palavras, porque tinha feito tenção de não fallar n'esta questão; mas vendo que o Sr. Ministro do reino, em resposta a uma allusão feita pelo Digno Paro Sr. Conde de Thomar, respondeu que o funccionario que está governando a Ilha da Madeira é um Secretario interino do Governo Civil, não póde deixar de observar que S. Ex.ª ferira o disposto no Código Administrativo, que claramente determina quem ha de fazer as vezes de Governador Civil no impedimento d'este. E como seja possivel que na Camara dos Srs. Deputados se faça por isso uma accusação ao Sr. Ministro... (O Sr. Presidente—Expõe ao Digno Par que pediu a palavra sobre a ordem, e parecer-lhe estar fóra d'ella). Então declara que se reserva para pedir n'outra occasião certa explicação ao Sr. Ministro do Reino.

O Sr. Conde da Taipa — Peço se vote o meu requerimento.

Posto o requerimento á votação foi approvado.

Em seguida proposto o parecer da commissão foi rejeitado, e approvado o projecto.

O Sr. Presidente levantou a sessão eram cinco horas da tarde, annunciando a seguinte para sabbado (27).__

Relação dos Dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 24 de Fevereiro de 1858

Os Srs.: Visconde de Laborim; Duque da Terceira; Marquezes: de Ficalho, de Fronteira, de Loulé, de Pombal, de Vallada; Condes: das Alcaçovas, da Arrochella, da Azinhaga, do Bomfim, de Fonte Nova, da Louzã, de Mesquitella, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, do Sobral, da Taipa, e de Thomar; Viscondes; de Algés, d'Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castellões, de Castro, da Luz, de Sá da Bandeira, e de Ourem; Barões: de Chancelleiros, de Pernes, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, Sequeira Pinto, Pereira de Magalhães, Ferrão, Silva Carvalho, Aguiar, Larcher, Isidoro Guedes, e Silva Sanches.

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