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N.º 26

SESSÃO DE 23 DE JUNHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel

Secretarios - os exmos. srs.

Conde d'Avila
Conde de Lagoaça

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - O sr. Pereira Dias pede explicações ácerca das providencias a tomar com o fim de impedir que cheguem até nós as epidemias que assolam alguns pontos do paiz vizinho. - Responde-lhe o sr. presidente do conselho.- O sr. Moraes Carvalho pede á camara que auctorise a commissão de fazenda a reunir-se durante a sessão para examinar o projecto relativo á dotação da familia real. A camara annue a este pedido.-O sr. Pereira Dias insiste em considerações anteriormente adduzidas.- O sr. Vaz Preto dirige perguntas ao governo ácerca de diversos assumptos relativos ao districto de Castello Branco. - Respondem-lhe os srs. presidente do concelho e ministro das obras publicas. - O sr. conde de Valbom faz ver a conveniencia da construcção de um cano collector de esgotos.- O sr. ministro das obras publicas diz que este assumpto já foi estudado pelo governo.- O sr. conde de Carnide refere-se ás epidemias que flagellam algumas localidades de Hespanha, e pede providencias.- sobre um dos assumptos a que se referiu o sr. Vaz Preto trocam-se explicações entre este digno par e o sr. presidente do conselho.- O sr. Sousa e Silva mostra a conveniencia de duas obras importantes para as ilhas adjacentes: os pharoes e o cabo submarino.- Dá explicações a este respeito o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Thomás Ribeiro advoga a necessidade da construcção de uma estrada de Carnaxide á Cruz Quebrada.-O sr. ministro das obras publicas promette attender os desejos do digno par.- O sr. Thomás Ribeiro agradece esta promessa.- O sr. Moraes Carvalho apresenta o parecer sobre a dotação da familia real, e requer que se dispense o regimento para que elle entre em discussão. E approvado este requerimento, e seguidamente approvado sem discussão o alludido parecer.- O sr. Sousa e Silva agradece as explicações do sr. ministro das obras publicas, e apresenta sobre ellas diversas considerações.- O sr. José Augusto da Gama requer a dispensa do regimento para a immediata discussão do parecer n.° 45, que diz respeito ao orçamento rectificado. É approvado este requerimento e posto em discussão o referido parecer.- O sr. Costa Lobo pede que se faça uma rectificação ás assignaturas do mesmo parecer.- Discursaram sobie o assumpto, agora em ordem do dia, os srs. Franzini, Moraes Carvalho, José Luciano de Castro, ministro da fazenda, conde de Valbom e Coe lho de Carvalho.- Levanta-se a sessão, designa-se a immediata e a respectiva ordem do dia.

Ás duas horas e meia da tarde, achando-se presentes 22 dignos pares, abriu-se a sessão.

Foi lida e approvada a acta da sessão antecedente.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Um officio do ministerio do reino, enviando os esclarecimentos pedidos pelo sr. D. Luiz da Camara Leme.

Para a secretaria.

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, enviando a proposta de lei fixando a dotação da familia real.

Para a commissão de fazenda.

(Estavam presentes os srs. presidente do conselho de ministros, e ministros das obras publicas e da fazenda.)

O sr. Presidente: - O digno par o sr. Pereira Dias pediu que lhe reservasse a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro do reino. Tem, pois, s. exa. a palavra,

O sr. Pereira Dias: - Effectivamente eu tinha pedido a v. exa. que me reservasse a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro do reino, isto porque desejo chamar a attenção de s. exa. para um assumpto que reputo muito grave.

Refiro-me ás epidemias que estão flagellando algumas localidades do paiz vizinho.

Este assumpto é grave, repito, e por isso não é para estranhar que elle seja tratado por um membro d'esta camara, cuja profissão, de mais a mais, é bem conhecida.

Não quero attribuir por ora demasiada importancia ao perigo que nos póde ameaçar; todavia é necessario que o governo adopte as providencias indispensaveis para acautelar o paiz de qualquer invasão epidemica. Sou o primeiro a declarar que n'este assumpto não deve haver precipitação de qualidade alguma; mas tambem não deve haver desleixo ou esquecimento da parte de quem tem obrigação, não só de providenciar, como de fazer executar as ordens que emanam d'essas providencias.

Vou referir á camara um facto que li nos jornaes do Porto, e peço ao sr. ministro do reino que me diga se elle é ou não verdadeiro.

Um passageiro que vinha de Malaga entrou em Eivas num comboio que se dirigia pelo Entroncamento para Lisboa e Porto.

O passageiro, que, se bem me recordo, vinha em carruagem de l.ª classe, chegando ao Entroncamento seguiu para o Porto e ali foi mandado isolar por ordem das auctoridades, visto que a noticia da procedencia do bilhete lhes fôra communicada telegraphicamente pelo revisor do comboio.

Não digo que este procedimento fosse irregular, mas o certo é que nenhumas providencias se tomaram, não só em relação aos passageiros que acompanharam de Elvas até ao Entroncamento o individuo que vinha de Malaga, e que chegaram a Lisboa, sem que ninguem pretendesse tolher-lhes o caminho, como pelo que respeita aos que com o alludido individuo fizeram viagem do Entroncamento até ao Porto.

Creio que d'esta falta de providencias acertadas não resultou o menor perigo; mas a verdade é que tal desleixo poderia ter acarretado serias consequencias.

Como eu quero acreditar que as providencias decretadas exercem a sua acção no ponto da fronteira d'onde segue o caminho de ferro para Lisboa e Porto, peço "o sr. ministro do reino que se digne dizer-me por que ellas não foram cumpridas, e que me de a este respeito as explicações convenientes.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministro e Ministro do do Reino (Antonio de Serpa): - Começou por declarar que veio hoje á sessão d'esta camara porque o sr. presidente o prevenira de que alguns dignos pares exigiam a sua presença para alcançarem explicações ácerca das providencias que ao governo cumpria adoptar no intuito de evitar que cheguem até nós as doenças epidemicas que assolam algumas localidades do paiz vizinho. Tem sido exactamente este assumpto que o tem impedido de comparecer ás sessões antes da ordem do dia.

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O conselho de saude reune-se ás duas horas, e o ora dor tem querido estar no seu ministerio para não demorar a execução de qualquer medida que a mesma corporação julgue conveniente adoptar com urgencia. Veio hoje mais cedo, mas o sr. director geral ficou auctorisado a pôr em pratica qualquer providencia que o conselho de saude entenda dever ser tomada em presença de Informações enviadas pelos consules.

Lembra o orador o que aconteceu ha cinco annos.

Em 1885 grassaram com intensidade em alguns pontos de Hespanha doenças epidemicas e o nosso paiz foi preservado do contagio. Não póde afirmar que esta circumstancia feliz se devesse unicamente as medidas então adoptadas, mas a verdade é que em Portugal não entrou a epidemia.

O governo mandou executar as providencias indicadas pelos homens competentes, e affiança que já existe inspecção sanitaria em Badajoz e em Caceres, não estando estabelecida nos outros pontos em que communicamos com a Hespanha, por o conselho de saude não a julgar ainda necessaria.

Com relação ao Algarve, desde que se disse que tinham apparecido em Malaga alguns casos de febre amarella, mandou-se tornar quanto- possivel incommunicavel aquella nossa provincia com os portos de Hespanha e tambem ali se estabeleceu o cordão sanitario.

Foram para o Algarve dois illustres membros do conselho de saude para dizerem que outras providencias convirá adoptar, e por esta occasião póde o orador dizer ao digno par a quem está respondendo, que um cavalheiro francez que fallou com um individuo que visitou ultimamente Malaga, lhe affiançára que nenhuma circumstancia auctorisava a taxar de anormal o estado sanitario d'aquella cidade hespanhola.

O facto referido pelo digno par o sr. Pereira Dias, de um passageiro vindo de Malaga para o Porto pela linha de Badajoz é inteiramente verdadeiro.

O governador civil do Porto, em vista da communicação que havia recebido, mandou isolar aquelle individuo.

Não lhe parece que possa ser criticado este excesso de zêlo.

O sr. Pereira Dias: - O que eu critico é a falta de zêlo.

O Orador: - Não lhe parece que possa dizer-se falta de zêlo, tanto mais verificando-se que o individuo procedente de Malaga não está atacado de molestia contagiosa.

Termina dizendo que o governo tem adoptado e continuará a adoptar as providencias attinentes ao fim de impedir que o nosso paiz seja visitado pelo cholera, e explica ainda que, alem das medidas apontadas, foram mandadas para o Algarve duas embarcações que ali exercerão uma fiscalisação maritima muito apreciavel sob o ponto de vista da incommunicabilidade d'aquella provincia com as procedencias dos portos inficcionados.

(O discurso do sr. presidente do conselho será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Moraes Carvalho: - Por parte da commissão de fazenda, peço a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se permitte que a mesma commissão se reuna durante a sessão, para examinar a proposta de lei que fixa a dotação da familia real.

Consultada a camara, concedeu a licença pedida.

O sr. Pereira Dias: - Eu devo declarar ao sr. ministro do reino que não tive idéa de censurar o procedimento das auctoridades por ellas terem excesso de zêlo.

Pelo contrario, quando eu censurar as auctoridades, em assumptos como este, será por falta de zêlo.

Quando eu mencionei o facto a que o sr. presidente do conselho tambem se referiu, foi até para dizer que era natural que, ao principio, as ordens não fossem rigorosamente cumpridas.

Emquanto ás providencias que o sr. ministro do reino, tem tomado em harmonia com as decisões de uma corporação respeitavel e competentemente habilitada, devo dizer, embora opiniões superiores opinem o contrario, que não julgo muito acertado que procedamos actualmente como ternos procedido em epochas anteriores e em circumstancias analogas; porque de certo a camara sabe que a absoluta efficacia dos cordões sanitarios tem sido contestada.

Acho prudente não dispensar esses cordões sanitarios, mas attendendo á enorme, á extensa fronteira que nós temos, em vez de os disseminarmos por toda ella, devemos antes concentrai os em certos e determinados pontos.

Eu creio que o illustre presidente do conselho sabe muitissimo bem que não é possivel evitar rigorosamente a passagem cio cordão sanitario, e sabe tambem isto pelos factos que e deram na epocha a que referiu.

Quando uma epidemia rebenta numa povoação, estão aconselhados os cordões sanitarios para a isolarem completamente; mas quando se trata de um paiz inteiro, quando se trata da immensa raia secca que divide Portugal da Hespanha, entender que por um cordão sanitario podemos preservar-nos de uma epidemia e isolar-nos da communicação dos individuos affectados, é um engano.

Eu não sei se devemos ou não ao cordão sanitario a que me estou referindo, o beneficio que se lhe attribue. O que é facto é que n'esse momento não tivemos a prova provada, porque era nenhum dos lazaretos appareceu individuo algum infectado. Todavia, eu approvo os cordões sanitarios com esta restricção: concentrados era certos e determinados pontos da fronteira, principalmente n'aquelles que estão em constante communicação com as vias ferreas.

Eu ouvi aqui fallar - e é bem certo de que nos lembrâmos sempre de S. Jeronymo quando ha trovoadas - ouvi fallar do estado em que se achavam alguns sitios da capital.

De certo não escapará ao sr. ministro do reino a vantagem de attender a esse assumpto.

Estou intimamente convencido de que o conselho de saude publica o terá já estudado; porque n'uma occasião tal é necessario tomar providencias?.

Eu quereria que este zêlo, que este cuidado se mantivessem permanentemente.

Nem sempre é possivel isolar os grandes centros de população, tel-os n'um estado sanitario de tal ordem que obste ao apparecimento de certas endemias locaes; todavia, na occasião actual, urge attender especialmente a essas circumstancias e sanear o mais possivel alguns pontos da cidade.

Ouvi dizer que em virtude das obras do porto de Lisboa, vão desaguar n'uma a doca de fluctuação muitos canos de esgoto, o que na realidade se me afigura um grande inconveniente.

É necessario providenciar a este respeito.

Tenho a intima persuasão de que o conselho de saude cumprirá o seu dever e que o sr. ministro do reino igualmente cumprirá o seu.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Vaz Preto: - Fui prevenido pelo sr. Pereira Dias que dirigiu perguntas e pediu explicações ao sr. ministro do reino sobre o mesmo assumpto a que eu me queria referir. Desejava saber quaes as providencias tomadas pelo governo na presença da epidemia que está grassando no reino vizinho. O sr. ministro acaba de dar explicações e declarar o que tem feito até agora. Por consequencia só me resta aguardar os acontecimentos e ver se as providencias adoptadas conduzem ao effeito que se pretende, ou se por acaso são necessarias outras mais rigorosas.

Aproveito, porém, a occasião de estar com a palavra para dirigir ainda algumas perguntas ao sr. ministro do reino. Eu desejava saber se na freguezia do Soalheiras continua o estado anormal de estar funccionando a junta de

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parochia do anão anterior, que se tem recusado terminantemente a dar posse á legalmente eleita resistindo ás ordens das auctoridades? E desejo saber tambem se s. exa. está já habilitado a dar explicações ácerca dos motivos que determinaram o alvará do governador civil de Castello Branco que dissolveu a mesa da misericordia do Fundão.

Se s. exa. não está habilitado peço o faça sem demora para tratarmos com a maxima brevidade n'uma das sessões proximas d'este assumpto que é importante e serio pois não quero deixai o ficar para o anno bem fazer alguns reparos accentuados á violencia que se praticou. Visto s. exa. não estar preparado, desejo ao menos que s. exa. remetia a esta camara o alvará do governador civil de Castello Branco que é um documento curioso, e impagavel que revela a alta competencia d'aquella tão distincta auctoridade!

E conveniente que a camara avalie por este famoso documento a alta capacidade e os relevantes serviços d'este juiz que foi nomeado governador civil de Castello Branco em paga dos favores eleitoraes prestados por s. exa. na eleição do Fundão e que. se está locupletando com dois ordenados, apesar de estar com licença e nada fazer.

Quando analysar este famoso documento hei de provar á evidencia que elle é arbitrario e despotico, que nenhuma rasão tinha de ser, e constitue uma illegalidade; mas para isto necessito que s. exa. esteja habilitado com os documentos competentes.

Emquanto ao sr. ministro das obras publicas cuja presença eu solicitei, desejava saber que destino levou uma representação que entreguei a s. exa., mandada pela camara municipal de Belmonte, pedindo para que s. exa. providenciasse a fim de que a estacão do caminho de ferro, em logar de ser onde a projectavam, que é muito distante de Belmonte e em sitio insalubre, um verdadeiro pantano, fosse construida mais proximo do povoação e em sitio sadio.

O local que melhor satisfaz as necessidades do concelho é aquelle que a camara indica.

Sr. presidente, peço tambem a s. exa. que dê as devidas providencias para que a estação telegraphica de Belmonte comece a funccionar, pois ha já bastante tempo que foi creada e ainda hoje não tem pessoal nem apparelhos, nem o que é indispensavel para aquelle fim.

Chamo tambem a attenção de s. exa. para um outro assumpto bastante importante.

Foram-me dirigidas representações de tres concelhos do districto de Castello Branco, Proença a Nova e Villa Velha de Ródão e Oleiros, para eu entregar ao sr. ministro. As camaras d'esses municipios pedem com toda a justiça ao governo que os ponha em communicação com o caminho de ferro para poderem gosar dos beneficies da viação accelerada, para a qual teem concorrido sempre e desenvolver o seu commercio e as suas industrias.

Se com effeito fazem elevados sacrificios para a viação publica e para a accelerada, de que não gosam, desejam e querem tambem tirar algum proveito, e por isso pedem a ligação com o caminho de ferro na estação mais propria, que é a Villa Velha.

As representações das camaras pedem para que o governo inclua na rede das estradas do paiz uma estrada que a junta geral já pediu, estrada que ligava o concelho de Proença a Nova com o de Villa Velha, partindo das proximidades de Sobreira Formoza. Este é o pedido das camarás, que me parece deveriam ter feito outro pedido, mais consentaneo com os seus desejos e que resolve a questão de prompto, pedido que eu faço em nome d'ellas, e que v. exa. poderá satisfazer, porque está auctorisado por lei. Eu peço a v. exa., em nome d'aquelles municipios, que mande immediatamente estudar e pôr em construcção um ramal, que saindo das proximidades de Sobreira Formoza, se dirija á estação de Villa Velha a mais proxima.

O ramal que peço é pequeno, não excede a 20 kilometros.

Para v. exa. o mandar construir, o que me não parece muito difficil, tem v. exa. auctorisação sufficiente.

Este pequeno ramal que será de 15 kilometros, pouco mais ou menos, porque cinco já estão construidos, deve seguir provavelmente a seguinte directriz: sair das proximidades de Sobreira Formoza, e seguir pelos povos das Giesteiras, Machiaes, Foz de Cabrão, Tavilla a Villa Velha.

Sr. presidente, para estes tres assumptos chamo a attenção, zêlo e actividade do illustre ministro das obras publicas e estou certo que s. exa. tomará em consideração as reclamações d'estes povos, que são justas, e por isso devem instantemente ser attendidas.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Antonio de Serpa): - Em primeiro logar, cumpre lhe dizer ao digno par o sr. Pereira Dias, que, tendo assistido á sessão do conselho de saude era que se tratou da canalisação de Lisboa, póde certificar que este assumpto mereceu a devida consideração, e que a tal respeito foram pedidas informações que habilitem o governo a fazer executar a obra de modo a offerecer as necessarias garantias para a saude publica.

É uma questão que ha de merecer um estudo proporcional á sua importancia.

Era resposta ao digno par o sr. Vaz Preto digno, pelo que respeita á junta de parochia da Soalheira, ha de observar a disposição da lei, e pelo que se refere ao alvará do governador civil de Castello Branco que dissolveu a mesa da misericordia do Fundão, colherá os necessarios esclarecimentos, e, no uso do direito que lhe compete, examinará as rasões que determinaram aquelle acto.

(O discurso do sr. presidente do concelho será publicado na integra e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Arouca): - Tem a responder ao digno par o sr. Vaz Preto, que a representação da camara de Belmonte foi submettida ao exame das estações competentes, e em relação á estação telegraphica dará as ordens necessarias para que a obra se execute no sentido dos desejos manifestados pelo digno par.

Pelo que respeita ás representações de dois concelhos de Castello Branco, ordenará que se proceda como se requer, porque, segundo a lei de 1887, é permitida a construcção de estradas, sem ser por empreitada geral.

(O discurso a que se refere este extracto será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Conde de Valbom: - Sr. presidente, eu desejava chamar á attenção do sr. ministro das obras publicas para a necessidade, agora muito mais impreterivel do que em circumstancias normaes, de fazer com que se construa o collector, que faz parte do plano de melhoramentos de Lisboa e seu porto. (Apoiados.)

O plano d'esta parte das obras consta-me que já percorreu as estações competentes e que o governo está habilitado a mandar proceder á obra.

Portanto chamo para este assumpto toda a solicitude do governo. (Apoiados.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Arouca): - O digno par o Or. conde de Valbom chamou a sua attenção para um assumpto que já foi estudado pelo governo.

De accordo com o sr. director das obras do porto de Lisboa, estão dadas as competentes ordens a fim de que se proceda á construcção do collector na parte mais importante.

Póde o digno par estar certo que o governo não descura este assumpto.

(O discurso a que se refere este extracta será publicado na integra, em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Conde de Carnide: - Quando eu pedi a pala-

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vra estava-se fallando da questão das epidemias do reino vizinho, e das providencias para evitar o contagio. É a este assumpto que eu me refiro.

Em 1885, sendo ministro do reino o sr. conselheiro Barjona de Freitas, e presidente do conselho o sr. Fontes, tomaram-se medidas as mais energicas, a fim de que ella se não communicasse ao nosso paiz, e apesar de ter sido muito intensa a epidemia em Hespanha, não chegou a entrar em Portugal.

Ora, eu não sei se essas medidas foram boas ou más, o que sei é que os resultados foram excellentes, e todos devemos desejar, sr. presidente, que o governo adopte as mesmas providencias adoptadas pelo sr. Barjona e ainda mais algumas se for possivel, porque este negocio é da maior importancia e urgencia, e eu peço ao governo que, pondo de parte todas as considerações de interesse commercial ou individual, só se empenhe em obstar a que o flagello seja importado de Hespanha.

Por isso eu, longe de pedir a presença n'esta camara do sr. ministro do reino, prefiro que não venha, porque, não o vendo aqui, convenço-me de que está no ministerio do reino tratando da questão capital de nos salvar do cholera.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, agradeço ao illustre ministro das obras publicas, a promptidão com que s. exa. te comprometteu a satisfazer ás reclamações feitas dos povos que se dirigiram a s. exa. por meu intermedio. Agradeço, pois, as explicações completas e satisfactorias, que acabo de ouvir; nem esperava outra cousa de s. exa. porque conheço o ^eu caracter levantado e serio que está superior ás questões pequenas, filhas de uma politica mesquinha e tacanha.

Conheço muito s. exa., e sei que se occupa dos negocios da sua pasta com toda a assiduidade, fazendo justiça a todos com a maior imparcialidade. Fico, pois, certo que as suas palavras serão breve traduzidas em obras, e as suas promessas cumpridas.

Emquanto ao sr. ministro do reino, não posso dizer o mesmo, e pelo que respeita ao assumpto a que me referi, vejo que s. exa. está completamente desmemoriado, o que não admira attendendo aos seus muitos affazeres. Não me admira, pois, que lhe escape as minuciosidades d'esta ou de outra qualquer questão.

O que admira, porém, é que tendo " exa. já dado na outra casa do parlamento explicações sobre esta questão, em que s. exa. tem uma gravissima responsabilidade, diga que nada sabe!!!

Nada sabe o sr. Serpa agora do acto despotico, arbitrario illegal que praticou, e na outra casa do parlamento n'um discurso pronunciado por s. exa., tomou o compromisso de remediar promptamente este mal e de mandar proceder o mais depressa possivel a nova eleição?! S. exa fez bem em se comprometter, porque as rasões do illustre deputado que o interrogou eram tão ponderosas, o acto era tão despotico e arbitrario, e a violencia de tal ordem, que s. exa. não ficava bem procedendo de outro modo. O que eu esperava era que as suas palavras passassem logo á execução, que as suas promessas fossem cumpridas, no que não fazia mais do que cumprir o seu dever.

Estes são os factos. Causa-me, pois, surpreza que s. exa. queira agora ainda estudar a questão?!

N'esse caso eu quero que a camara conheça a fundo aquelle famoso documento e por isso eu peço ao sr. presidente do conselho que mande a esta camara o alvará e a correspondencia trocada entre s. exa. e o governador civil de Castello Branco. Logo que esses documentos estejam presentes e s. exa. se der por habilitado, eu me encarregarei de demonstrar que este acto foi arbitrario, illegal e contrario ás leis, e que s. exa. foi instrumento inconsciente de odios e de vinganças mesquinhas.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino (Antonio de Serpa): - Entende que é possivel ter se dado qualquer equivoco pelo que respeita ás palavras que pronunciou na outra camara; mas é natural que ali dissesse que se ia proceder a nova eleição da mesa da misericordia do Fundão, visto que a anterior tinha sido dissolvida.

Occorre-lhe dizer que a lei não determina uma nova eleição, mas que o governo a póde ordenar.

(Publicar-se-hão na integra, e em appendice a esta sessão, as palavras do sr. presidente do conselho, quando s. exa. haja revisto as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Vae Ter se o requerimento que o digno par o sr. Vaz Preto mandou para a mesa.

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que seja enviado a esta camara o alvará do governador civil de Castello Branco, dissolvendo a mesa da misericordia do Fundão, bem assim a correspondencia official que houver a este respeito. = Vaz Preto.

Mandou-se expedir.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, diz o sr. presidente do conselho que a lei não obriga a que se faça immediatamente a eleição. Tem rasão. Estou completamente do accordo.

Eu sei que a lei não obriga a que s. exa. mande fazer immediatamente a eleição, mas tambem sei que o que obriga n'este caso é a moralidade.

O que obriga é o cumprimento do seu dever de remediar os erros e males que praticou. O que obriga é o reconhecimento do acto despotico que praticou e a illegalidade que commetteu.

O que obriga sobre tudo é a sua palavra compromettida que o ministro tem obrigação de honrar. Eu já disse e torno a repetir: quando s. exa. se der por habilitado, que espero seja breve, hei de provar á evidencia que o acto é arbitrario, despotico e illegal.

Se s. exa., apesar da demonstração clara e evidente que eu fizer, não desempenhar ainda a sua palavra, eu concluirei que s. exa. é tambem responsavel pela politica nefasta, vergonhosa e de perseguições que se está fazendo no Fundão.

É necessario que s exa. se colloque á altura da sua posição e não seja consciente ou inconscientemente instrumento de vinganças e perseguições mesquinhas.

Esta politica immunda, só emporcalha os seus inventores, e aquelles que podendo e devendo impedil-a se tornam instrumentos doceis d'aquelles que nunca deviam ter saído da mediocridade em que Deus os collocou.

É isto que o sr. presidente do conselho ainda não comprehendeu, mas que eu lhe farei comprehender se não cumprir a sua palavra.

S. exa. está mal esclarecido e mal informado sobre esta assumpto. Informe-se bem e siga a sua rasão e tenho a certeza cumprirá o seu dever, não a contento de alguns dos seus collegas, mas em satisfação da moralidade e dos principios e a contento da sua consciencia

O sr. Sousa e Silva: - Sr. presidente, no principio da sessão legislativa, o meu collega e amigo, o sr. Botelho Faria, dirigiu-se ao sr. ministro das obras publicas para tratar de dois assumptos importantes para as ilhas adjacentes. Eram elles o cabo submarino e os pharoes.

Quanto ao cabo submarino, respondeu s. exa. que tinha mandado ouvir o procurador geral da corôa, e que se o parecer fosse favoravel á rescisão do contrato elle seria rescindido.

Ora, sabe s. exa. que um accionista da companhia ingleza concessionaria do cabo requereu para que se dissolvesse a mesma companhia, por entender que não estava no caso de cumprir os deveres que lhe impendem do resultado da concessão, e mesmo por já ter passado o praso que lhe tinha sido concedido pelo governo portuguez para o lançamento do cabo.

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Isto foi contestado mais tarde pelo advogado da companhia, declarando, não só que ella estava perfeitamente nas condições de cumprir o contrato, mas que tinha toda a esperança de obter uma nova prorogação de praso.

Ora, n'estas circumstancias, eu pergunto ao br. ministro das obras publicas se já recebeu o parecer do sr. procurador geral da corôa, se esse parecer é favoravel á rescisão, e no caso de ser favoravel e s. exa. tenciona demorar muito o decreto rescindindo o contrato.

S. exa. sabe que emquanto o actual contrato estiver de pé, não se póde fazer mais cousa alguma com relação ao cabo submarino.

A este respeito nada mais acrescentarei, pois todos sabem que os representantes dos Açores se reuniram em conferencia para accordar com o governo ácerca da maneira mais pratica de conseguir que o cabo submarino se torne em breve uma realidade.

Quero acreditar que o governo tem a melhor vontade de attender aos desejos da população açoriana, desejos que, aliás, não surprehendem, porque actualmente, para a communicação rapida de noticias, distam mais de nós aquellas ilhas do que a mais distante das nossas colonias.

Com respeito á illuminação das ilhas adjacentes, peço a s. exa. que, se acha pequeno o numero de engenheiros en carregados de formular os projectos dos pharoes e os respectivos orçamentos, nomeie mais alguns que possam coadjuvar o que está encarregado d'este serviço, e faça incluir no orçamento geral do estado a verba para construcção de pharoes que n'elle foi incluida sempre até
1885-1886, em virtude da lei que mandou proceder á illuminação das costas.

Peço tambem a s. exa. que, no caso de querer favorecer os Açores, deixe para mais tarde a construcção dos pharoes que comsigo trazem despeza mais avultada, e trate por agora de mandar estudar de preferencia os pharos do terceira e quarta ordem, porque, se estes não abrangem uma tão estensa faxa de horizonte, podem no entretanto ser de muita vantagem á navegação entre as ilhas, que em certas epochas do anno se torna bastante difficil. Farei apenas uma excepção, e essa com respeito ao pharol que tem de ser construido nas Formigas, escolhe-os alguns d'elles cobertos de agua completamente, e outros aflorando apenas á superficie do oceano, e que demoram entre as ilhas de S. Miguel e Santa Maria.

Não é raro ver juncadas as costas das ilhas por destroços produzidos por naufragios, que não podem deixar de ser attribuidos a estes recifes, e por isso ao meu pedido faço a excepção que deixo dita, e que tenho as melhores esperanças de ver attendida pelo sr. ministro.

O s r. Ministro das Obras Publicas (Arouca): - Respondendo ao digno par Sousa e Silva, recorda o que em uma das sessões antecedentes teve a honra de explicar ao sr. Botelho de Faria, isto é que alguns dos funccionarios encarregados de estudar a melhor fórma de se proceder á illuminação das costas açorianas estão em Paris no desempenho de uma commissão official de summa importancia, e, logo que regressem, proseguirão nos seus estudos com o fim de ultimarem os trabalhos que se referem, á collocação dos pharoes.

Com respeito á inclusão no orçamento de verbas correspondentes á despeza a que o digno par a quem responde alludiu, julga mais conveniente que se tome uma resolução clara sobre o assumpto, para evitar que mais tarde fiquem sem applicação as mesmas verbas.

Em relação ás consultas da procuradoria geral da corôa tem a declarar que professa ainda hoje a opinião que emittiu ao entrar na politica, opinião que, é seguida por jurisconsultos importantes.

Parece-lhe que as consultas da procuradoria geral da corôa devem ser absolutamente secretas.

O procurador geral da corôa, é o advogado do governo. (Apoiados.)

O governo consulta o procurador geral da corôa e adopta ou não a opinião que elle emitte, assumindo perante o parlamento a responsabilidade do seu proceder.

Não sabe qual é a opinião da procuradoria geral da corôa ácerca do contrato com a companhia que tomou a seu cargo o lançamento do cabo submarino, e, portanto, nau podem as suas palavras ser levadas á conta de dissentitimento d'essa opinião, mas, seja ella qual for, affirma que o governo está nas melhores intenções de resolver a questão por uma fórma condigna.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as respectivas notas tachygraphicas.)

O br Thomás Ribeiro: - Concorda com a opinião d'aquelles que entendem que o procurador geral da corôa é o advogado do governo, e julga que este póde seguir ou não os conselhos d'essa estação official, desde que assuma a responsabilidade do seu proceder.

Vê que quasi sempre se presta grande consideração á procuradoria geral da corôa, e justo é que assim seja, principalmente nas questões de direito; mas acha que bom é tambem que se affirme a faculdade que tem o governo de acatar ou não a opinião do seu advogado, visto que muitas vezes se attiibue a essa opinião uma força quasi inexcedivel.

Dito isto, pergunta ao sr. ministro das obras publicas se os engenheiros encarregados de estudar a estrada de Carnaxide á Cruz Quebrada ainda estarão absorvidos na contemplação das bellezas que se avistam de Linda a Pastora.

Vem pugnar mais uma vez pela construcção d'aquella estrada que interessa grandemente aos habitantes d'aquellas localidade, o fazendo justiça ás boas intenções do sr. ministro, espera que tão justas reclamações sejam attendidas.

(O discurso a que, se refere este extracto será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Arouca): - Declara que não se esqueceu nem só podia esquecer do pedido do digno par o sr. Thomás Ribeiro, tanto mais dando-se ácerca da, construcção da estrada a que s. exa. se referiu um facto anormal

Trata de remover os embaraços que se têem opposto á realisação d'aquelle melhoramento, e n'isto segue á risca a opinião de um general do tempo de Cromwell, o qual, tendo nascido n'uma condição modesta e exercido a profissão de carroceiro, dizia que quando no caminho encontrava alguma pedra, preferia tiral-a pura o lado a forçar a carroça a transpor esse obstaculo.

Conta, pois, como já disse, afastar os attritos que têem obstado á construcção da estrada de Carnaxide á Cruz Quebrada, e crê que a lei das expropriações lhe facultará o meio de conseguir o fim que tem em vista.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Thomás Ribeiro: - Confio na boa vontade do nobre ministro, e mais uma vez lhe agradeço as suas boas diligencias.

O sr. Moraes Carvalho: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre o projecto que tem por fim fixar a dotação da familia real portugueza, e peço a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento para entrar immediatamente em discussão.

O sr. Presidente: - Vae ler-se.

Foi lido e é do teor seguinte:

PARECER N.° 46

Senhores. - A vossa commissão de fazenda, tendo o examinado projecto de lei, vindo da camara dos senhores

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342 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

deputados, que tem por fim fixar a dotação da familia real portugueza, nos termos dos artigos 80.° e 81.° da, carta constitucional, é de parecer que esse projecto deve ser approvado para subir á sancção real.

Sala das sessões da commissão de fazenda, em 23 de junho do 1800. = Augusto Cesar Cau da Costa = Henrique de Barros Gomes = Augusto José da Cunha = Antonio José Teixeira = Antonio da tiousa Pinto de Magalhães = Conde, de Valbum = Gomes Lages = Alberto Antonio de Moraes Carvalho, relator.

Projecto de lei n.° 6

Artigo l.° A dotação de Sua Magestade El-Rei o Senhor- D Carlos I é lixada, como nos reinados constitucionaes anteriores, na quantia de 1:000$000 réis diarios, e será abonada desde o dia 19 de outubro de 1889 inclusive.

Art. 2.° A dotação de Sua Magestade a Rainha a Senhora D. Maria Amelia, augusta esposa de El-Rei o Senhor D. Carlos I, é fixada na quantia de 60:000$000 réis annuaes, e será igualmente abonada desde o dia 19 de outubro de 1889 inclusive.

Art. 3.° A dotação de Sua Alteza Real o Serenissimo Senhor D. Luiz Filippe, Principe Real, é fixada na quantia de 20:000$000 réis annuaes, e será do mesmo modo abonada desde o dia 19 de outubro de 1889 inclusive.

Art. 4.° A dotação de Sua Alteza o Serenissimo Senhor Infante D. Manuel é fixada na quantia de 10:000$000 réis annuaes, a contar de 15 de novembro de 1889, dia do auspicioso nascimento do mesmo Serenissimo Senhor.

Art. 5.° São declaradas em vigor, no presente reinado do Senhor D. Carlos I, as disposições da lei do 16 de julho de 1855, das leis de 23 de maio de 1859, artigos 3.°, 4.°, 5.° e 6.° na parte applicavel, de 30 de junho de 1860, de 2 de maio de 1885 e de 25 de junho de 1889.

Art. 6.° Nenhuma outra quantia, alem das mencionadas nos artigos antecedentes, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, será abonada para as despezas da casa leal.

Art. 7.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Palacio das côrtes, em 21 de junho de 1890. = Pedro Augusto de Carvalho, presidente = José Joaquim de Soma Cavalheiro, deputado secretario = Antonio Teixeira de Sousa, deputado secretario.

O sr. Presidente: - O sr. relator da commissão pede que seja dispensado o regimento, e que entre desfie já em discussão este parecer.

Consultada a camara resolveu affirmativamente, e em seguida foi o parecer approvado sem discussão tanto na generalidade como no especialidade.

O sr. Sousa e Silva: - Agradeço ao sr. ministro das obras publicas as explicações que s. exa. me deu, mas confesso que as suas promessas foram um pouco vagas, e por tal fórma me satisfizeram pouco, que não tenho remedio senão voltar a pedir a s. exa. mais um bocadinho de boa vontade.

Quanto ás declarações de s. exa., de que estão no estrangeiro o director geral dos correios e o inspector dos telegraphos, e só depois do regresso d'elles poderá tomar qualquer deliberação, não me parece isso rasão plausivel, por que se aquelles funccionarios estão ausentes, ficaram em Lisboa outros que os substituem; e o pedido que faço de augmentar o pessoal encarregado do estudo de pharoes e de tão simples solução que não me parece impossivel de satisfazer, mesmo bem a audiencia d'aquelles distinctos funccionarios.

Ha uns poucos de annos que eu e os mais representantes dos Açores andámos a insistir na outra casa do parlamento pela illuminação das costas das ilhas adjacentes, obtendo sempre em resposta que não ha ainda concluido projecto algum, e quando agora peço que se augmente o pessoal encarregado dos estudos, deixa-se ainda a solução d'este pedido dependente do regresso do estrangeiro de funccionarios, que, por muito preclaros que sejam, teem na secretaria quem os substitua nos seus impedimentos legaes!

Quanto á inscripção no orçamento de uma verba para construcção de pharoes, alem de ser de lei, não me parece que tenha os inconvenientes que o illustre ministro lhe encontra, porque se é consumida, aproveitam com isso não só os Adoreis, mas tambem a navegação em geral; e se não se consome, não é a simples inscripção d'elles no orçamento que vae empobrecer o thesouro publico.

Com relação ao cabo submarino, concordo com s. exa. que ao parlamento não compete pedir a responsabilidade á procuradoria geral da corôa pelas suas consultas, pois que os ministros é que são os unicos responsaveis pelas resoluções que tomam; mas por isso tambem não deve haver o menor inconveniente em trazer ao parlamento essas consultas, visto serem, como s. exa. diz e eu concordo, simples opiniões juridicas, quando as questões a que ellas se referem não são de natureza diplomatica.

No caso presente eu não insisto, uma vez que s. exa. disse que ainda não tinha estudado o assumpto, que, a meu ver, não é muito intrincado.

Desde que se concedeu um certo praso a uma companhia para cumprir um contrato, e terminado elle não se acham satisfeitas as prescripções que lhe haviam sido marcadas, o contrato fica rescindido, maxime quando esta pena está n'elle claramente indicada, e se não deu caso de força maior.

O que, peço ao sr. ministro é que tome conhecimento, logo que possa, do parecer do procurador geral da corôa e se entender que deve rescindir o contrato, o faça o mais brevemente possivel.

Como vejo que o governo entende que não deve mandar ao parlamento as consultas da procuradoria geral da coroa, e ha dias requeri que fosse presente a esta camara uma d'ellas, declaro que desisto do meu requerimento, e só peço ao governo que não demore a sua decisão sobre um negocio que já ha perto de quatro annos está sem resolução.

Refiro-me á maneira como deve ser interpretado o § unico do artigo 2õ.° do decreto com força de lei de 24 de julho de 1886, que diz que aos engenheiros civis será contada como vencimento para o effeito da aposentação a maxima gratificação de classe.

Isto está tão claramente expresso na lei, que não sei como ainda se não poz em execução.

Consta me que existem requerimentos de individuos incapazes de serviço, para se aposentarem, ha bastante tempo, e nenhum tem tido solução, unicamente por não se ter querido interpretar o artigo da lei.

Tenho dito.

O sr. José Gama: - Peço a v. exa. consulte a camara sobre se dispensa o regimento para entrar era discussão o parecer da commissão de fazenda que tem o n.° 45 e que diz respeito ao projecto de lei n.° 4.

O sr. Presidente: - Os dignos pares que permittem que se dispense o regimento para que o parecer n.° 45 entre em discussão, tenham a bondade de se levantar.

Cumpre-me advertir que este parecer fui distribuido hontem aos dignos pares em suas casas.

Consultada a camara, approvou o requerimento do sr. Augusto Gama, pelo que foi posto em discussão o alludido parecer, que é do teor seguinte:

PARECER N.° 45

Senhores. - A vossa commissão de fazenda examinou com a urgencia que a proxima terminação do anno economico exigia, mas com a devida attenção, o projecto de lei n.° 4, vindo da camara dos senhores deputados, e que tem por fim rectificar as avaliações das receitas e a fixa-

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SESSÃO DE 23 DE JUNHO DE 1890 343

ção das despezas ordinarias e extraordinarias, na metropole, no exercicio corrente de 1889-1890.

A carta de lei de 19 de junho de 1889 tinha calculado as receitas ordinarias do estado era 40.692:531$000 réis. O orçamento rectificado computa-as em 40.430:006$000 réis.

Ha, portanto, uma differença para menos de 262:525$000 réis.

Os impostos directos são calculados em mais 264:700$000 réis, os bens proprios nacionaes e rendimentos diversos em mais 201:500$000 réis; mas, sendo avaliados os impostos indirectos em menos 178:000$000 réis, o sêllo e registo em menos 139:000$000 réis e as compensações de despeza em menos 411:725$000 réis, resulta na totalidade dos recursos ordinarios a diminuição referida de réis 262:525$000 réis.

As despezas ordinarias eram computadas, segundo a carta de lei de 19 de junho de 1889, em 40.736:870$740 réis. Sendo a avaliação do orçamento rectificado de réis 43.364:987$242, ha um augmento de 2.628:116$502 réis.

Nas despezas extraordinarias, calculadas na carta de lei de 19 de junho de 1889 em 3.403:000$000 réis e no orçamento rectificado em 7.976:184$823 réis, parece ter-se dado o augmento de 4.573:184$823 réis; mas, se considerarmos que nas tabellas da lei de 19 de junho de 1889 não vinham descriptas as despezas auctorisadas por leis especiaes para a construcção de estradas, para os portos artificiaes ou melhoramentos dos portos de Leixões, Funchal, Horta, Ponta Delgada, Lisboa, e ainda outras, reconhece-se que é muito menor o augmento que se dá na avaliação das despezas extraordinarias.

No projecto de lei do governo vem minuciosamente explicadas as causas de todos os augmentos de despeza. A lei natural do crescimento das despezas manifesta-se geralmente nos orçamento? de todas as nações. É uma consequencia necessaria das exigencias, cada vez mais crescentes, da civilisação. Mas por isso mesmo que é fatal contarmos com o gradual acrescimo das despezas publicas, é norma de boa administração, em vista do desequilibrio orçamental, usar de toda a prudencia no decretamento de novas, despezas que não obedeçam a uma, impreterivel necessidade

Na verdade, o deficit ordinario que resulta da comparação das receitas e despezas ordinarias, computadas no orçamento rectificado, é de 2 934:981$242 rés. Importando as despezas extraordinarias em 7.976:184$823 réis, ascende o desequilibrio total a 10.911:166$065 réis, ou a 10.811:166$065 réis, abatendo-se 100:000$000 réis de receita extraordinaria proveniente da venda do caminho de ferro da Marinha Grande a S. Martinho do Porto, nos termos da lei de 2 de maio de 1882.

Para fazer face a este desequilibrio, vera descripta no orçamento rectificado, como receita extraordinaria, a quantia de 10.330:000$000 réis, parte do producto das emissões de titulos de 4,5 por cento, por decreto de 7 de novembro de 1889, e de 4 por cento, por decreto de 28 de março ultimo. Haverá ainda um excesso de encargos de 481:166$065 réis, que facilmente será compensado pela não realisação de todas as despezas auctorisadas. Assim, no exercicio de 1887-1888, o" ultimo de que ha contas completas, as liquidações de despezas foram inferiores ás auctorisações era 710:616$955 réis só no orçamento ordinario.

Sem entrar em mais desenvolvidas considerações, entende a vossa commissão que deve ser approvado, para subir á sancção real, o referido projecto de lei.

Sala das sessões da commissão de fazenda, em 21 de junho de 1890. = Augusto Cesar Cau da Costa = Henrique de Barros Gomes (com declarações) = Francisco J. da Coita e Silva = Conde de Gouveia = Antonio José Teixeira = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Augusto José da Cunha (com declarações) = Alberto Antonio de Moraes Carvalho, relator.

Projecto de lei n.° 4

Artigo 1.° A auctorisação e a avaliação das receitas do estado, na metropole, no exercicio de 1889-1890, são rectificadas, em conformidade com o mappa n.° 1 junto a esta lei e que d'ella faz parte, na quantia de 50.860:006$000 réis, sendo receitas ordinarias 40.430:006$000 réis e extraordinarias 10.430:000$900 réis.

Art. 2.° As despezas totaes do estado, ordinarias e extraordinarias, na metropole, do mesmo exercicio de 1889-1890, são rectificadas nos seguintes termos: ordinarias 43.364:987$242 réis, extraordinarias 7.976:184$823 réis, tudo de accordo com a legislação vigente e com os mappas n.os 2 e 3. juntos a esta lei e que d'ella fazem parte.

§ unico. O governo decretará nas. tabellas de distribuição de despeza do exercicio de 1889-1890 as rectificações necessarias em conformidade d'este artigo.

Art. 3.° Fica por esta fórma modificado o deposto na carta de lei de 19 de junho de 1889 e no decreto da mesma data, e revogada toda a legislação contraria a esta.

Palacio das côrtes, em 20 de junho de 1890. = Pedro Augusto de Carvalho, presidente = José Joaquim de Sousa Cavalheiro, deputado, secretario = Antonio Teixeira de Sousa, deputado, secretario.

N.° 1

Mappa rectificado das receitas rio estado ordinarias e extraordinarias do exercicio de 1889-1890, a que se refere a lei d'esta data e que d'ella faz parte

RECEITA ORDINARIA

ARTIGO 1.º

Impostos directos

Contribuição bancaria:

No continente 152:500$000

Nas ilhas adjacentes -$-

Contribuição industrial:

No continente 1.131:500$000

Nas ilhas adjacentes 27:000$000

Contribuição de renda de casas:

No continente 454:000$000

Nas ilhas adjacentes 13:500$000

Contribuição predial e despezas com a organisação das matrizes:

No continente 3.004:000$000

Nas ilhas adjacentes 263:000$000 3.267:000$000

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344 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Contribuição sumptuaria:

No contineute 84:500$000

Nas ilhas adjacentes 3:000$000 87:500$000

Decima de juros no continente 497:000$000

Direitos de mercê:

No continente 312:500$000

Nas ilhas adjacentes 19:500$000 339:000$000

Emolumentos consulares 80:600$000

Emolumentos judiciaes 27:400$000

Emolumentos das capitanias dos portos:

No continente 7:700$000

Nas ilhas adjacentes 1:000$000 8:700$000

Emolumentos das conservatorias de 1.ª classe 1:800$000

Emolumentos das secretarias d'estado, do thesouro publico e do tribunal de contas:

No continente 98:000$000

Nas ilhas adjacentes 4:500$000 102:500$000

Emolumentos das cartas de saude no continente 250$000

Imposto de licença para a venda de tabacos:

No continente 85:000$000

Nas ilhas adjacentes 250$000 85:250$000

Imposto de rendimento:

No continente 444:000$000

Nas ilhas adjacentes, consulados e agencia 12:000$000 4:000$000

Impostos addicionaes a algumas contribuições directas do districto da Horta 1:250$000

Impostos addicionaes por leis de 25 de abril de 1857 e 14 de agosto de 1858 150$000

Imposto sobre minas 19:600$000

Juros de mora de dividas á fazenda:

No continente 46:800$000

Nas ilhas adjacentes 3:400$000 50:200$000

Matriculas e cartas:

No continente 153:500$000

Nas ilhas adjacentes 4:000$000 157:500$000

Multas judiciaes e diversas:

No continente 41:000$000

Nas ilhas adjacentes 1:000$000 42:000$000

3 por cento de collectas não pagas á boca do cofre:

No continente 51:000$000

Nas ilhas adjacentes 4:000$000 55:0000000 7.050:200$000

ARTIGO 2.º

Sêllo e registo

Contribuição do registo:

No continente 1.982:000$000

Nas ilhas adjacentes 150:000$000

Imposto do sêllo:

No continente 1.654:000$000

Nas ilhas adjacentes 67:000$000 1.721:000$000 3.853:000$000

ARTIGO 3.°

Impostos indirectos

Direitos de consumo em Lisboa 2.201:000$000

Direitos de exportação:

No continente 270:000$000

Nas ilhas adjacentes 14:600$000 284:600$000

Direitos de importação:

De cereaes:

No continente } 1.702:000$000
Nas ilhas adjacentes

De tabacos e receitas geraes da mesma proveniencia, incluindo compensação dos encargos do emprestimo de } 7 200:000$000 réis:

No continente } 3.755:000$000
Nas ilhas adjacentes

De outros generos e mercadorias:

No continente
Nas ilhas adjacentes }12.687:000$000

Direitos da fabricação da manteiga artificial 22:500$000

Direitos de tonelagem:

No continente 80:000$000

Nas ilhas adjacentes 7:000$000

Direitos sanitarios e impostos de quarentena e de lazareto:

No continente 50:000$000

Nas ilhas adjacentes 4:700$000 54:700$000

Emolumentos geraes da guarda fiscal 30:000$000

Emolumentos pessoaes aduaneiros 16:700$000

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Fazendas abandonadas, demoradas e salvadas nas alfandegas:

No continente 8:500$000

Nas ilhas adjacentes 100$000 8:6OO$000

Guindaste e escaleres nas alfandegas das ilhas adjacentes 1:500$000

Imposto de transito nos caminhos de ferro 202:000$000

Imposto especial do vinho, etc., entrado para consumo no Porto e em Villa Nova de Gaia 116:500$000

Imposto do pescado:

No continente 151:000$000

Nas ilhas adjacentes 7:000$000 158:OOO$OOO

Imposto de producçao dos alcoois e aguardentes -$-

Imposto especial ad valorem sobre as mercadorias importadas, nos termos da lei de 20 de junho de 1883 e decreto de 22 de setembro de 1887 (pauta B):

No continente 159:500$000

Nas ilhas adjacentes

Imposto para as obras da barra de Aveiro 350$000

Imposto para as obras da barra do Douro 37:000$000

Imposto especial de tonelagem para as obras da barra da Figueira 1:500$000

Impostos por lei de 12 de abril de 1876 2:000$000

Imposto especial de tonelagem para nas obras da barra de Portimão 4:100$000

Imposto especial de tonelagem para as obras da barra de Vianna do Castello 400$000

Imposto para as obras do porto artificial e da alfandega de Ponta Delgada 1:500$000

Imposto especial de tonelagem para as obras do porto de Espozende 100$000

Imposto especial do tabaco fabricado nas ilhas 30:000$000

Real de agua:

No continente1 210:000$000

Nas ilhas adjacentes 21:500$000 931.500$000

Receita nos termos do artigo 126.° do decreto n.° 3 de 17 de setembro de 1885 e decretos de 21 de abril e 12 de maio de 1886. Trafego aduaneiro:

No continente 307:000$000

Nas ilhas adjacentes 22:000$000 329:000$000

Tomadias:

No continente 3:000$000

Nas ilhas adjacentes 200$000 3:200$000 23.127:250$000

ARTIGO 4.º

Imposto addicional de 6 por cento por lei de 27 de abril de 1882 584:000$000

ARTIGO 5.°

Bens proprios nacionaes e rendimentos diversos

Academia real das sciencias 600$000

Acções do banco de Portugal 42$000

Aguas mineraes do arsenal da marinha 500$000

Aluguer do dique e da cábrea do arsenal da marinha 1:100$000

Armazenagem nas alfandegas:

No continente 19:400$000

Nas ilhas adjacentes 700$000

Arsenal do exercito, fabrica da polvora e diversas receitas militares.

Barcas de passagem e pontes 20:100$000

Caminhos de ferro do Minho e Douro 85:250$000

Caminhos de ferro do sul e sueste 41:500$000

Cadeia geral penitenciaria e casa de detenção e correcção 940:000$000

Capitães mutuados pelos extinctos conventos:

No continente 712:000$000

Nas ilhas adjacentes 42:500$000

No continente 1:400$000

Nas ilhas adjacentes 100$000

Casa da moeda 1:500$000

Collegio militar 1:600$000

Correios, telegraphos e pharoes 15:000$000

Desconto para fardamento das praças da armada 990:000$000

Extincto collegio dos nobres 34:000$000

Fabrica de vidros da Marinha Grande 6:500$000

Foros, censos e pensões:

No continente 2:005$000

Nas ilhas adjacentes 1:100$000 7:200$000

Heranças jacentes e residuos:

No continente 4:000$000

Nas ilhas adjacentes -$-

Hospital dos invalidos militares em Runa 4:00$000

Imprensa da universidade de Coimbra 2:500$000

Imprensa nacional e Diario do governo 5:700$000

Instituto industrial e Diario do governo 190:500$000

Instituto industria de commercial de Lisboa 6:160$000

Juros das inscripções do curso superior de letras e de outras com applicação a diversos encargos 3:195$000

Laudemios:

No continente 900$000

Nas ilhas adjacentes -$- 900$000

Mercado central de productos agricolas 2:000$000

Monte pio militar 909$000

Padaria militar 4:000$000

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346 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Propriedades pertencentes a praças de guerra:

No continente 23:100$000

Nas ilhas adjacentes 1:000$000 24:lOO$OOO

Quotas e outros rendimentos do extincto monte pio de marinha., incluindo inscripções 21:600$000

Receitas agricolas 139:400$000

Receita por decreto de 26 de dezembro de 1867 com applicação ás obras, do Mondego 9:000$000

Receita por decreto de 3 de dezembro de 1868:

No continente 3:700$000

Nas ilhas adjacentes 400$OOO 4:1OO$OOO

Receita dos emprestimos á camara municipal de Coimbra 256$000

Receita nos termos do artigo 43.° da carta de lei de 12 de outubro de 1887 (taxa militar) 100:000$000

Receita nos termos do artigo 105.° da carta de lei de 12 de setembro de 1887 (remissão do serviço do exercito) 50:000$000

Receita nos termos dos artigos 100.°, 101.° e 102.° da carta de lei de 12 de setembro de 1887 1:000$000

Receitas avulsas e eventuaes:

No continente 110:300$000

Nas ilhas adjacentes 20:000$000 130:300$000

Rendas:

No continente 6:700$000

Nas ilhas adjacentes 3:1004000 9:800$OOO

Rendimento da hospedaria do lazareto 6:000$000

Serviço da barra de Aveiro 200$000

Venda de bens nacionaes:

No continente 12:700$000

Nas ilhas adjacentes 4:500$000 17.900$000

Venda e remissão de foros, censos e pensões:

No continente 2:200$000

Nas ilhas adjacentes -$- 2:200$000

Contribuição da provincia de Macau para o emprestimo de 400:0000000 reis
-$-

Contribuição das provincias ultramarinas para o emprestimo de 1.700:000$000 réis -$-

Subsidio pelo cofre dos rendimentos dos conventos de religiosas supprimido 176:000$000 3.819:917$000

ARTIGO 6.º

Compensações de despesa

Compensações por despezas do museu colonial e da commissão de cartographia 8:500$000

Impostos addicionaes ás contribuições do estado:

Para os tribunaes administrativos (artigo 284." do codigo administrativo, decreto com força de lei de 17 de julho de 1886) 41:220$000

Para os serviços agricolas, estradas e respectivo pessoal technico (artigos 82.°, § unico, e 64.° dos decretos de 24 de julho e 9 de dezembro de 1886) 314:180$000

Parte dos lucros das caixas geral de depositos e economica portuguesa, correspondente á despeza com as respectivas secretarias e importancia para a amortisação das obrigações destinadas á conversão da divida externa 162:665$000

Juros dos bonds cancellados e depositados no banco de Inglaterra 70:516$000

Juros dos titulos da divida consolidada na posse da fazenda:

Divida interna 1.267:984$000

Divida externa 28:593$000 296:577$000

Juros das inscripções das extinctas companhias braçaes 12:802$000

Quota da camara municipal de Lisboa pelo augmento de despeza de fiscalisação na nova area do municipio -$-

Vencimentos a cargo do banco emissor (carta de lei de 29 de julho, artigo 24.°, § 2.°, e § 2.° do artigo 7.° do decreto de 15 de dezembro de 1887) 29:550$000

Reformas militares (carta de lei de 22 de agosto de 1887, artigo 13.°) 32:000$OOO

Soldos e prets do pessoal da esquadrilha 11:584$000

Vencimentos de parte do pessoal da agencia financial em Londres (artigo 11.° do contrato de 6 de junho de 1888) 10:620$000

Subsidio pelas sobras das auctorisações da despeza pelo ministerio do reino (lei de 13 de abril de 1887 5:425$000 1.995:639$000 40.430:006$000

RECEITAS EXTRAORDINARIAS

Producto da emissão de obrigações, por decretos de 7 de novembro de 1389 e 28 de março de 1890 - menos a quantia de 3.800:000$000 réis que representa as verbas das obras publicas no ultramar (reis 500:000$000), acquisição de navios de guerra (1.700:000$000 réis) e quarta serie do emprestimo de estradas (1.600:000$000 réis) - que o governo póde applicar ás despezas deste exercicio, ficando alem d'isso auctorisado a realisar, em qualquer epocha e pelos meios que julgar mais convenientes, as sommas que no mesmo exercicio tiver despendido com construcção, estudes e reparação de caminhos de ferro, quer na metropole quer no ultramar 10.330:000$000

Producto da venda do caminho de ferre americano da Marinha Grande a S. Martinho do Porto, nos termos da lei de 2 de maio de 1882 100:000$000 50.860:006$000

Palacio das côrtes, em 20 de junho de 1890. = Pedro Augusto de Carvalho, presidente = José Joaquim de Sousa Cavalheiro, deputado secretario = Antonio Teixeira de Sousa, deputado secretario.

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SESSÃO DE 23 DE JUNHO DE 1890 347

N.° 2

Mappa rectificado da. despeza do estado no exercicio de 1S8O-189O a que se refere a lei d'ella data e que della faz parte

Ministerio dos negocios da fazenda

Primeira parte Encargos geraes

Dotação da familia real 45l:757$703

Côrtes 140:663$461

Juros e amortisações a cargo do thesouro 2.302:050$000

Encargos diversos e classes inactivas 1.310:030$565 4.204:501$729

Segunda parte

Divida publica fundada

Junta do credito publico 3:000$000

Divida publica consolidada 14.074:821$990

Divida publica amortisavel 3.847:258$800

Pensões vitalicias 14:181$000 939:261$790

Terceira parte

Serviço proprio do ministerio

Administração superior da fazenda publica 415:355$655

Alfandegas 2.277:409$062

Administração geral da casa da moeda e papel sellado 78:390$766

Repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos 848:438$939

Empregados addidos e reformados 156:477$860

Despezas diversas 58:000$000

Despezas de exercicios findos 26:000$000 3.860:079$282

Quarta parte

Fundo permanente de defeza nacional

Receitas do estado com applicação a esse fundo, no actual exercicio 147:186$330 26.151:022$131

Ministerio dos negocios do reino

Secretaria d'estado 42:226$205

Supremo tribunal administrativo 21:376$650

Tribunaes administrativos districtaes 43:133$330

Governos civis 106:688$800

Segurança publica 662:0384393

Hygiene publica 89:096$823

Instrucção publica 745:532$355

Beneficencia publica 290:344$905

Empregados addidos 6:7714405

Diversas despezas 28:4414581

Despezas de exercicios findos 2:750$000 2.038:400$447

Ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça

Secretaria d'estado 35:311$370

Dioceses do reino 150:345$432

Supremo tribunal de justiça 39:236$438

Tribunaes de segunda instancia 79:853$314

Juizos de primeira instancia 123:637$753

Ministerio publico 96:400$052

Sustento de presos e policia das cadeias 228:495$740

Diversas despezas 14:000$000

Subsidios a conventos 1:500$000

Despezas de exercicios findos 9:647350 778:427$449

Ministerio dos negocios da guerra

Secretaria d'estado 26:168$720

Estado maior do exercito e commandos militares 90:633$540

Corpos das diversas armas 3.180:264$093

Praças de guerra e pontos fortificados 47:847$880

Diversos estabelecimentos e justiça militar 583:350$781

Officiaes em disponibilidade e inactividade temporaria 35:136$OOO

Pessoal inactivo 171:822$500

Fornecimento de pão e forragens 736:668$076

Diversas despezas 296:710$000

Despezas de exercicios findos 26:707$555 5.195:309$145

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348 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Ministerio dos negocios da marinha e ultramar

Secretaria d'estado e repartições auxiliares 57:003$770

Armada 1.129:891$665

Tribunaes e diversos estabelecimentos 148:027$555

Arsenal da marinha e suas dependencias 592:349$695

Encargos diversos 125:590$000

Empregados reformados, aposentados e veteranos 40:203$548

Despezas de exercicios findos 950$000 2.094:016$233

Ultramar: Despezas do ultramar realisadas na metropole 199:084$980

Ministerio dos negocios estrangeiros

Secretaria d'estado 18:948$940

Corpo diplomatico 128:860$000

Corpo consular 139:086$002

Despezas diversas 175:049$000

Condecorações 2:400$000

Empregados addidos e em inactividade 12:127$622

Despezas de exercicios findos 1:252$365 477:573$929

Ministerio das obras publicas, commercio e industria

Secretaria d'estado 104:151$720

Pessoal technico e de administração 511:598$650

Estradas 620:0004000

Caminhos de ferro 1.000:240$300

Correios, telegraphos e pharoes 1.215:512$100

Diversas obras 1.387:093$276

Serviços agricolas, pecuarios, florestaes e ensino agricola 687:806$806

Estabelecimentos de instrucção industrial e commercial 262:582$926

Direcção geral dos trabalhos geodésicos, topographicos e hydrographicos 63:630$135

Empregados addidos e fora dos quadros 24:380$095

Diversas despezas 105:272$891

Despezas de exercicios findos 1:268$940 5.933.537$839

Ministerio dos negocios da instrucção publica e bellas artes

Secretaria d'estado 4:566$255

Conselho superior de instrucção publica 2:329$500

Instrucção superior 98:908$086

Instrucção especial 13:220$071

Instrucção secundaria 58:129$855

Instrucção primaria 114:708$032

Estabelecimentos scientificos, litterarios e de publicações officiaes 85:415$250

Empregados addidos aos quadros 1:473$040

Diversas despezas 5:050$000

Despezas de exercicios findos 450$000 384:250$089

Administração das caixas, geral de depositos e economica portugueza

Caixas, geral de depositos e economica portugueza 62:665$000

Rs. 43.364:987$242

Palacio das côrtes, em 20 de junho de 1890. = Pedro Augusto de Carvalho, presidente = José Joaquim de Sousa Cavalheiro, deputado secretario = Antonio Teixeira de Sousa, deputado secretario.

N.º 3

Mappa rectificado da despeza extraordinaria do estado no exercicio de 1889-189O, a que se refere a lei d'esta data e que della faz parte

Ministerio dos negocios da fazenda

CAPITULO 1.º

Construcção de 42 caseias para abrigo das forças fiscaes, em serviço nas margens do Guadiana 16:000$000

Armamento para a guarda fiscal 22:000$000

Correame para a mesma guarda 20:000$000

Custo de uma lancha de vapor para o serviço da fiscalisação no rio Guadiana 6:000$000

Grandes reparações na machina e caldeira do vapor Açor 5:000$000

Outras despezas extraordinarias de material aduaneiro e de fiscalisação dos impostos indirectos 30:000$000 99:000$000

CAPITULO 2.º

Adiantamento á camara municipal de Lisboa, nos termos do § 14.° do artigo 1.° lei de 19 de junho de 1889 150:000$000 249:000$000

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SESSÃO DE 23 DE JUNHO DE 1890 349

Ministerio dos negocios do reino

CAPITULO 1.º

Para a acquisição de uma estufa, de ferro para o jardim botanico da escola polytechnica 2:494$261

CAPITULO 2.°

Subsidio extraordinario ao hospital de S. José para pagamento da divida aos fornecedores em 1888-1889 e para insuficiencia da receita em
1889-1890 40:339$967

CAPITULO 3.º

Despeza extraordinaria de beneficencia publica - para pagamento do que se liquidar com o resgate de penhores de pessoas pobres em Lisboa, por occasião da epidemia de influenza, em fins de 1889 e principios de 1890 40:000$000 82:834$228

Ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça

Para pagamento do fornecimento de gaz á penitenciaria de Lisboa, pela companhia lisbonense de illuminação a gaz, em exercicios anteriores -$- 17:000$000

Ministerio dos negocios da guerra

CAPITULO 1.º

Subsidio, rancho, alojamentos e transportes de emigrados hespanhoes 3:000$000

CAPITULO 2.º

ARTIGO 1.º

Estrada militar da circumvallação e continuação das obras de fortificação de Lisboa e seu porto 185:000$000

ARTIGO 2.°

Acquisição de torpedos, material correlativo e conclusão das obras da respectiva escola 20:000$000

ARTIGO 3.°

Material de pontes, telegraphos, caminhos de ferro, aerostatos militares e ferramentas para sapadores de engenheria 5:000$000

ARTIGO 4.º

Compra de cavallos e muares para os regimentos de artilheria e cavallaria e para os officiaes montados dos corpos a pé 40:000$000

ARTIGO 5.°

Para material de cartuchos 10:169$222 260:169$222

CAPITULO 3.°

Estabelecimentos de carreira de tiro em todo o reino 34:000$000

CAPITULO 4.º

Para pagamento da divida a fornecedores da materia prima de fardamentos, em relação a annos anteriores 180:000$000

CAPITULO 9.°

Para augmento de fundo permanente da corpos das diversas armas 43:000$000 520:169$222

Ministerio dos negocios da marinha e ultramar

Direcção geral de marinha

CAPITULO 1.º

Reparação e construcção dos navios da armada, ferias e maiorias de jornaes aos operarios provisorios e empregados nesse serviço 140:000$000

CAPITULO 2.º

Para acquisição de novos navios de guerra e estabelecimentos de reparação de navios (passa ao futuro exercicio) -$-

CAPITULO 3.°

Material permanente para as officinas do arsenal e estabelecimentos do ministerio e edificios de marinha 20:000$000

CAPITULO 4.º

Acquisição de material de guerra 30:O0O$000

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350 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

CAPITULO 5.º

Augmento do preço das rações nos navios das divisões navaes de Africa occidental e oriental, e estação naval da China 30:000$000

CAPITULO 6.º

Para satisfazer o custo do material, por ter sido elevado o numero de navios do armamento naval:

Combustivel, azeite e sebo 30:000$000

Sobresalentes 15:000$000

Metaes 15:000$000

Artefactos de metal 10:OOO$OOO 70:000$000

CAPITULO 7.º

Pagamento das rações aos contingentes que forem para o ultramar ou d'ahi regressarem 15:000$000 305:000$O00

Direcção geral do ultramar

CAPITULO l.º

Despezas geraes das provincias ultramarinas (auxilio para) 716:000$000

CAPITULO 2.°

Estações civilisadoras, exploração em Africa e colonisação em Lourenço Marques 244:774$000

CAPITULO 3.°

Garantia, segundo o contrato de 5 de junho de 1885, relativa ao cabo submarino até Loanda, nos termos da lei 148:000$OOO

CAPITULO 4.º

Dividendo sobre o capital levantado pela "West of India portuguese guaranted railway company, limited", nos termos da lei 150:000$000

CAPITULO 5.º

Garantia á companhia do caminho de ferro de Ambaca, nos termos da lei 133:656$000

CAPITULO 6.º

Para construcção de seis embarcações, sendo quatro para Moçambique e duas para a Guiné 87.993$000

Para artilheria e promptificações das mesmas embarcações 40:000$000 127:993$000

CAPITULO 7.º

Reparação e construcção do caminho de ferro de Lourenço Marques, nos termos do artigo 44.º do contrato approvado por decreto com força de lei de 14 de dezembro de 1883 e decreto de 25 de junho de 1889 734:004$680 2.554:427$680

Ministerio dos negocios estrangeiros

CAPITULO UNICO

Inspecção aos consulados de Portugal no Brazil - Conferencia internacional em Bruxellas - Exposição universal de Paris em 1889 - Exequias celebradas nas diversas legações por occasião do fallecimento de Sua Magestade El-Rei o Senhor D. Luiz I, de saudosa memoria-Despezas extraordinarias das legações de Portugal em Italia, Paris, Berlim e Madrid - Despeza com as embaixadas de Marrocos e do Maputo -$- 45:000$000

Ministerio dos negocios das obras publicas

CAPITULO l.º

Construcção do edificio do lyceu nacional de Lisboa 35:000$000

CAPITULO 2.º

Continuação das obras da escola agricola de reforma 25:000$000

CAPITULO 3.º

ARTIGO 1.°

Construcção e installação das estações chimico-agricolas e das coudelarias nacionaes 102:000$000

Outras despezas de material e de construcção pertencentes a serviços agricolas 111:000$000

ARTIGO 2 °

Acquisição e construcção de edificios e de material para serviço de aulas de desenho industrial e escolas industriaes 88:000$000 301:000$000

CAPITULO 4.°

Recenseamento geral da população, segundo a lei de 25 de agosto de 1857 (será descripta a despeza no orçamento de 1890-1891) -$-

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SESSÃO DE 23 DE JUNHO DE 1890 351

CAPITULO 5.º

Inquerito industrial 15:000$000

CAPITULO 6.º

Para conclusão, grandes reparações e estudos de caminhos de ferro 752:000$000

CAPITULO 7.º

Pagamentos á companhia das aguas de Lisboa, nos termos do respectivo contrato celebrado em 29 de outubro de 1888 80:000$000

CAPITULO 8.º

Estradas - lei de 21 de julho de 1887 1.600:000$000

CAPITULO 9.º

Porto artificial de Leixões, carta de lei de 6 de junho de 1883 480.000$000

Porto artificial do Funchal, lei de 23 de maio de 1884 50:000$000

Porto artificial de Ponta Delgada, lei de 21 de junho de 1887 180:000$000

Porto artificial da Horta, lei de 21 de julho de 1887 70:000$000

Porto de Lisboa, lei de 16 de julho de 1887 700:000$000

Melhoramento do porto e barra de Vianna do Castello, lei de 16 de agosto de 1888 -$-

Obras do melhoramento da enseada da Povoa de Varzim -$- 1.480:000$000

CAPITULO 10.°

Exposição do Rio de Janeiro de 1879, lei de 21 de junho de 1888 18:752$677

CAPITULO 11.º

A companhia real dos caminhos de ferro portuguezes - garantia do juro, relativa á exploração do caminho de ferro de Torres Vedras á Figueira da Foz e Alfarellos 139:871$710

CAPITULO 12.º

Á companhia nacional dos caminhos de ferro portuguezes - garantia do juro, relativa á exploração do caminho de ferro de Foz Tua a Mirandella 28:409$306

CAPITULO 13.°

Exposição universal de Paris de 1889 - Despezas (resto) com a representação de Portugal n'essa exposição 27:720$000 4.502:753$693 7.976:184$823

Palacio das côrtes, era 20 de junho de 1890. = Pedro Augusto de Carvalho, presidente = José Joaquim de Sousa Cavalheiro, deputado secretario = Antonio Teixeira de Sousa, deputado secretario.

O sr. Costa Lobo: - Uso da palavra para pedir a v. exa. que mande fazer uma rectificação ás assignaturas d'este parecer. Vejo nellas incluido o nome de Francisco J. da Costa Lobo.

Ora, em primeiro logar, não sou Francisco, e em segundo logar não sou membro da commissão de fazenda

Peço, portanto, a v. exa. que se digne dar as suas ordens, a Hm de que se faça a rectificação que desejo para que a publicação no Diario da camara se faça nos termos convenientes.

O sr. Franzini: - Sr. presidente, raras vezes costumo tomar tempo á camara, mas perante os attentados praticados contra a constituição do estado em circumstancias tão graves, eu não podia ficar silencioso, desejo lavrar nesta occasião um protesto contra o aniquilamento do poder legislativo, para o qual nós caminhamos a passos agigantados, se porventura nós e o paiz não reagirmos pelos meios ao nosso alcance contra estas arremettidas do poder executivo, contra as attribuições que devem ser exclusivamente do parlamento com a sancção real.

A leitura d'este projecto de lei encheu-me de verdadeiro assombro, pelos fundamentos que passo a apresentar.

Vejo que se propõe aqui a approvação de despezas que provem dos decretos dictatoriaes, quando nós ainda não discutimos o bill.

Portanto, se vamos sanccionar estas despezas, sanccionâmos os decretos dictatoriaes e não precisámos discutir o bill.

Ou eu estou em erro ou assim é que as cousas se entendem.

A final, julgo tambem que proveitosamente não se póde discutir este projecto sem se proceder a uma comparação d'estas verbas, com as descriptas nos differentes capitulos e artigos do orçamento geral do estado.

Por exemplo, eu vejo nas despezas extraordinarias do ministerio da marinha, direcção geral do ultramar, verbas importantissimas, de centenares de contos de réis, descriptas com singular laconismo, e da legalidade das quaes a camara de certo não terá inteiro conhecimento pelo parecer a que me refiro, e pela minha parte declaro que julgo absolutamente impossivel apreciar isto assim de repente. Reputo inopportuna esta discussão, porque não podemos pronunciar-nos sobre as despezas provenientes dos decretos dictatoriaes sem que o bill haja sido approvado. Bem sei que o governo tem maioria e que o bill será approvado, mas seria melhor, mais correcto, proceder assim, respeitando as formulas, que de alguma cousa valem, ao menos para a seriedade da representação nacional.

Eu tinha tenção de, levantando esta questão, propor o adiamento, não o faço, porém, porque não quero demorar a discussão. Apresentando estas reflexões move-me unicamente o cumprimento dos deveres do cargo que exerço e era virtude d'elle estou aqui zelando as prerogativas do parlamento. Eu sei que todos os meus illustres collegas têem muito empenho na defeza da instituição de que são dignissimos membros, mas pela minha parte entendo que é preciso impedirmos que o governo constantemente nos atropelle, passando por cima dos nossos direitos e esquecendo-se dos deveres que temos a cumprir, principalmente o de fazer respeitar e manter as instituições politicas do estado.

Não podemos deixar passar, sem haver ao menos um protesto, estes atropellos que podem ter consequencias graves. Ás vezes parece que representámos aqui, nós os deputados da nação e pares do reino, uma verdadeira come-

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252 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

dia. Oxalá que esta comedia se não transforme num drama era que a fome e o exaspero de um povo carregado de impostos represente o principal papel e um quadro bem triste.

O sr. Moraes Carvalho: - Nota que o digno par que o antecedeu no uso da palavra não atacou o projecto e limitou-se a lavrar o seu protesto contra a ultima dictadura, e julga que contra todas as dictaduras.

Entende o digno par o sr. Franzini que não devemos votar o orçamento rectificado, visto que o governo não foi ainda relevado da responsabilidade em que incorreu assumindo a dictadura da qual resultaram despezas que o mesmo orçamento consigna. Esta opinião já tem sido expendida em diversas occasiões e ainda no começo d'esta sessão a exigencia da votação do bill deu logar a uma longa discussão ácerca de poderem ou não tomar assento os pares que tinham sido eleitos em virtude de um decreto dictatorial, isto é, pretendeu-se que esse decreto fosse confirmado pelas côrtes e que só depois tivesse logar a verificação dos processos eleitoraes.

Opina que este argumento não procede, porque é necessario que nos convençamos de que decretos dictatoriaes e propostas de lei são cousas completamente differentes.

O bill representa uma proposta que tem por fim relevar o governo da responsabilidade em que incorreu, pelo facto de tomar medidas de caracter legislativo; mas como essas medidas são de execução immediata, as consequencias financeiras que d'ellas resultam têem necessariamente de ser incluidas no orçamento rectificado.

Se as côrtes não sanccionassem o bill o que aconteceria em relação ao orçamento rectificado?

Cessariam desde logo todas as despezas nelle designadas era virtude dos decretos dictatoriaes.

O certo é, e convem frizar este ponto, que as medidas dictatoriaes são de execução immediata, e por isso precisa o governo de ser relevado da responsabilidade em que incorreu pelo facto de as ter decretado, e como faltam poucos dias para terminar o anno economico, torna-se indispensavel a approvação do orçamento rectificado para que a liquidação da gerencia financeira se faça legal e regularmente.

Referiu-se o digno par a uma verba respectiva ao ultramar, não sabe se, por a achar excessiva, se por não a considerar legal.

O sr. Franzini: - O que eu notei foi que diversas despezas se achassem englobadas só com a denominação, entre outras, de despezas geraes das provincias ultramarinas excedentes a 700:000$000 réis. Não pretendi entrar na discussão do orçamento rectificado.

Q Orador: - Explica que essa verba representa o deficit ultramarino e que uma das despezas que mais o avulta foi auctorisada pelo ministerio transacto.

Não tendo sido atacado o projecto, termina aqui as suas considerações.

(O discurso do digno par será publicado na integra, e em appendice a esta Sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. José Luciano de Castro: - Pediu a palavra para dirigir uma pergunta ao sr. ministro da fazenda, e a resposta de s. exa. determinará a attitude que deve tomar na discussão encetada pelo digno par o sr. Franzini.

Entende que muito rasoavelmente procede este digno par protestando contra o facto de se discutir, antes do bill, o orçamento rectificado, facto que obriga a camara a approvar despezas cuja illegalidade ainda não está sanada; mas pondera que, andando as côrtes ha tanto tempo divorciadas das praxes parlamentares, mal podemos deixar de ceder, contrariados e convencidos, aliás, de que praticámos uma infracção dos bons principios.

Se não votarmos o orçamento rectificado auctorisâmos o governo a fazer a cobrança dos impostos, e, diga-se a verdade; este orçamento já devia ter obtido ha muito tempo a sancção parlamentar, porque á sua cobrança está o governo procedendo illegalmente.

As rasões adduzidas pelo illustre relator da commissão o sr. Moraes de Carvalho foram as que o orador apresentou por occasião de se discutir a entrada dos pares eleitos.

Disse então que os decretos dictatoriaes são de execução immediata, mas para todas as auctoridades e funccionarios e não para o poder legislativo, o qual tem a faculdade de sanar ou não a irregularidade constitucional commettida pelo governo.

Entende, pois, que se não póde exigir ao parlamento, cujas attribuições foram usurpadas pelo poder executivo, que execute os decretos dictatoriaes sem primeiro estar o governo relevado da responsabilidade em que incorreu.

Fazendo inteira justiça ás intenções do sr. Franzini e conceituando de muito acceitaveis as considerações por s. exa. apresentadas, lembra o orador á camara que é indispensavel a approvação do orçamento rectificado, visto que está a findar o actual anno economico.

Dito isto, vae fazer ao sr. ministro da fazenda a pergunta a que se referiu no começo do seu discurso.

Prometteu o orador tratar desenvolvidamente a questão de fazenda quando viesse á tela do debate o primeiro assumpto financeiro; mas, como essa explanação demandaria muito tempo, desistirá d'ella por agora attenta a urgencia da approvação do parecer que está era ordem do dia, se o sr. ministro da fazenda lhe garantir que fará ainda discutir na presente sessão legislativa, ou todas as propostas de fazenda, ou algumas d'ellas.

Não tem a menor duvida em adiar para occasião opportuna a demonstração cabal da injustiça com que o sr. ministro da fazenda apreciou no seu relatorio a gerencia do ministerio transacto; mas é preciso que s. exa. declare se sim ou não se compromette a fazer discutir ainda n'esta sessão1 as propostas que constam do mesmo relatorio.

(O discurso do digno par será publicado na integra, e em appendice, quando s. exa. tenha devolvido as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Começou por agradecer a declaração do illustre chefe do partido progressista e affiança-lhe que está na intenção de fazer discutir ainda n'esta sessão o maior numero das suas propostas de fazenda, senão todas.

Póde, pois, o digno par aguardar a discussão da primeira proposta para realisar o debate por s. exa. annunciado e então se apurará até que ponto são justas ou injustas as considerações que o orador escreveu no relatorio que teve a honra de submetter ao exame dos corpos legislativos.

Acha muito natural que s. exa. trate de contestar as asserções contidas naquelle documento, mas espera que a camara lhe permittirá demonstrar a veracidade d'ellas, se bem que, ao escrevel-as, não teve o minimo intento de offender ou censurar politica e pessoalmente nenhum homem publico.

Estando no uso da palavra e tendo já respondido á pergunta que lhe foi feita pelo sr. José Luciano de Castro, não quer desaproveitar o ensejo que se lhe offerece para dizer alguma cousa sobre o assumpto a que se referiu o digno par o sr. Franzini.

Não irá repetir os argumentos que o seu excellente amigo e illustre relator da commissão apresentou em resposta ás considerações do digno par o sr. Franzini, nem adduziria outros, porque mesmo os não ha melhores, mas dirá que lamenta profundamente que o sr. José Luciano de Castro assentisse aos reparos do digno par que foi collega de s. exa. no ministerio transacto, quando o mesmo ministerio, após uma larga dictadura que creou despezas importantes, só submetteu á discussão o respectivo bill de indemnidade no final da sessão legislativa de 1887.

Crendo que ninguem lhe levará a mal a defeza dos actos da actual situação politica, cita que, contrariamente ao proceder do governo transacto, foi o bill de indemnidade o

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primeiro assumpto de que se occupou a camara dos senhores deputados na presente sessão legislativa.

O governo procurou regularisar a sua situação, e se imo fôra o amplo debate que soffreu o bill, de certo que o parecer que está em ordem do dia só viria á discussão depois do parlamento ter sanccionado a publicação dos decretos dictatoriaes.

Termina por agora as suas considerações dizendo que para o ministerio governar constitucionalmente é necessario que seja approvado, não só o parecer que está sobre a mesa, como o que se lhe segue e que tem a designação de lei de meios.

(O discurso do sr. ministro será publicado na integra e em appendice, quando s. exa. tenha revisto as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Conde de Valbom: - Sr. presidente, eu não quero protrahir esta discussão nem tratar n'este momento a questão de fazenda com o devido desenvolvimento; reservo-me para o fazer opportunamente, limitando-me agora a fazer algumas ponderações que se me figura virem a proposito.

Visto o sr. ministro da fazenda dizer que ha de trazer á camara differentes propostas de impostos, por essa occasião nós poderemos discutir um pouco mais largamente a questão de fazenda e não agora, que o tempo aperta, porque está a findar o anno economico, e é necessario habilitar legalmente o governo para occorrer ás despezas publicas. (Apoiados.)

Sr. presidente, acaba de se referir o sr. ministro da fazenda a uma questão de principies, levantada primeiro pelos dignos pares o sr. Franzini e o sr. relator da commissão.

Seria uma banalidade repetir aqui o que disse Silvestre Pinheiro "que uma nação se governa por principios" e não por precedentes, porque precedentes e exemplos ha para tudo".

Exemplos podem servir de desculpa mas não de regra, e só perante os principios é que póde prevalecer a applicação; quando os precedentes são condemnaveis não podem de modo algum servir de fundamento a novas aberrações.

A boa doutrina é a do sr. Franzini, do sr. José Luciano e mesmo do sr. ministro da fazenda, que reconheceu que era constitucionalmente incontestavel que as medidas tomadas dictatorialmente por qualquer governo não estão legalisadas emquanto elle não tiver sido relevado pelo parlamento da responsabilidade em que incorreu usurpando attribuições legislativas.

As auctoridades devem cumprir os decretos do poder executivo, embora emanem da dictadura; mas o poder legislativo não deve sanccionar por um acto seu isolado qualquer providencia dictatorial, antes de ter concedido ao governo o bill de indemnidade que sane a sua exhorbitancia e regularise a sua situação.

Portanto, no rigor dos principios, o parlamento não deve auctorisar uma despeza que resulta de uma medida dictatorial de cuja responsabilidade o governo ainda não foi relevado. Primeiro deve conceder o bill e só depois póde auctorisar a despeza. De lastimar é que na nossa historia politica tenhamos tido de nos referir tantas vezes a medidas dictatoriaes. Depois de tão largo periodo de governo representativo era já tempo de abandonarmos essas praticas abusivas, que só podem justificar-se por circumstancias muito excepcionaes de alto interesse publico.

Eu aqui fallo em nome da boa doutrina, em nome dos principios constitucionaes, e não em nome de partido algum, porque lastimo que as vicessitudes politicas tenham levado os differentes partidos a recorrer ás dictaduras.

Devo, porém, dizer, em abono da verdade, que o sr. ministro da fazenda, na sua defeza, entrou num caminho que me parece rasoavel: tratou de desculpar o governo d'esta irregularidade.

Disse s. exa. que a discussão do bill de indemnidade na outra casa do parlamento foi demorada e fizera com que se chegasse ao termo em que tem de ser approvado o orçamento rectificado antes de ter sido approvado o bill de indemnidade pela camara dos pares, aliás teria o governo de incorrer numa nova illegalidade, para occorrer ás despezas publicas.

Eu não desejo por fórma alguma fornecer qualquer pretexto ou ensejo para o governo sair do caminho legal, e por isso não quero protrahir a discussão do projecto.

Eu protesto em nome dos principios, mas cedo em pre-presença das circumstancias especiaes da occasião.

Dos males o menor.

Prefiro antes não obrigar o governo a continuar no caminho da illegalidade, a esperar pela discussão do bill de indemnidade, visto que o tempo não dava para essa discussão prévia.

Portanto, não rejeito o orçamento rectificado.

Agora chamo a attenção do sr. ministro da fazenda, do parlamento e dos poderes publicos para as circumstancias financeiras em que nos achâmos.

É necessario que todos nós, sem distincção de partidos, e pondo de parte questões politicas, nos empenhemos em ver se trazemos as nossas finanças a um estado normal. Quer dizer, se conseguimos pelo menos approximar-nos do desapparecimento d'esse deficit permanente.

Qual é a maneira por que poderá desapparecer o deficit?

Naturalmente crescendo as receitas mais do que as despezas, ou não crescendo nada as despezas, reduzindo mesmo as despezas, em vez de crescerem as receitas.

Mas, sr. presidente, nós em vez d'isto vemos crescer mais as despezas do que as receitas, e assim não podemos ter a esperança de fazer desapparecer o deficit, antes pelo contrario, elle augmenta.

Pelo orçamento rectificado de 1889-1890, eu vejo que houve augmento nas despezas ordinarias era todos os ministerios, na importancia total de 2:628 contos de réis, e nas extraordinarias um augmento de 4:573 contos; ao passo que nas receitas ha uma diminuição de 262 contos.

O deficit ordinario é de 2:934 contos, e o deficit total, comprehendendo o extraordinario, abatida já uma receita eventual de 100 contos, é de 10:811 contos. Tudo cifras redondas.

Este quadro é desanimador para o nosso desideratum de equilibrar as receitas com as despezas, porque indica e confirma a persistencia de uma tendencia contraria.

É necessario sair d'este caminho que conduz á ruina. (Apoiados.)

No orçamento de previsão para 1890-1891 vem as receitas calculadas em 39:476 contos, e as despezas ordinarias em 43:083 contos; sendo o deficit ordinario de 3:407 contos. A este ha a acrescentar o que resultar das despezas extraordinarias, que não vem ainda computadas, mas que promettem exceder muito as dos exercicios anteriores, não só pelos compromissos que pesam sobre o thesouro de outras procedencias, mas pelos encargos enormes que derivam das medidas dictatoriaes tomadas pelo governo.

Em vista de todos estes factos, o que me parece é que é necessario que todos nos empenhemos em reduzir quanto for possivel as despezas ordinarias, fazendo produzir o mais possivel as contribuições existentes, pela boa administração, antes de recorrer ao aggravamento dos impostos, com que o paiz já não pôde, porque as suas faculdades contributivas teem necessariamente um limite.

Ninguem póde negar que o paiz está excessivamente sobrecarregado de impostos e taxas com differentes denominações, tanto geraes como locaes, e todos devera reconhecer que a elasticidade tributaria não póde ir até ao infinito, nem mesmo ultrapassar certo termo, sob pena de atrophiar o trabalho nacional.

Allega-se que este augmento successivo das despezas e dos impostos é uma tendencia da civilisação, e que todas

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354 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

as nações da Europa teem seguido este caminho de progresso, que têem augmentado consideravelmente as despezas e os impostos em todos os paizes.

Não combato em absoluto esta doutrina, nem desconheço estes factos. Mas em todas as cousas ha um justo termo que é necessario não ultrapassar.

É indispensavel regular a marcha do progresso, segundo as proprias forcas de cada paiz, de modo que o augmento de encargos não exceda as buas faculdades contributivas. E depois, não devem contundir-se as despezas reproductivas com aquellas que não têem esse caracter, e que muitas vezes não só não são uteis, nem urgentes, mas representam até verdadeiros desperdicios.

Abandonar-se a esse movimento vertiginoso, póde comprometter não só as finanças do estado, mas a vida economica do paiz.

Ha tempos a esta parte as nações mais adiantadas começam a retrahir-se e a julgar necessario fazer economias, porque os seus orçamentos chegaram a avolumar-se de um modo assustador.

Para citar um exemplo, a politica financeira da França marca accentuadamente essa tendencia, procurando economisar nas suas despezas ordinarias e reduzir quanto possivel as despezas extraordinarias, não considerando como taes senão aquellas que teem um caracter meramente provisorio e accidental.

Quando se confunde a despeza ordinaria com a extraordinaria, julga-se licito recorrer ao credito para cobrir esta despeza, o que é mais facil do que lançar impostos, e julga-se haver assim encontrado um meio engenhoso de eliminar o deficit.

Tem-se abusado um pouco d'este expediente entre nós. Illusão. O que resulta é que esse deficit, que afinal n?>o é senão a differença entre a receita e a despeza, cresce successivamente com os encargos da divida que se contrahiu.

Quando a facilidade das emissões sobe, porque melhoram as condições do mercado, então a vertigem sobe tambem ás cabeças e não ha limite nas exigencias para despezas de toda a ordem.

A divida fluctuante, que só devia representar as receitas proprias do exercicio, converte-se num recurso para occorrer ao deficit, e quando chega a avolumar-se demamziado converte-se em divida consolidada, cujos encargos vem engrossar o deficit.

Embora se criem novos impostos ou os antigos rendara mais, essa forca attenuante do deficit é muito menos forte do que aquellas que actuara para o engrossar. O equilibrio orçamental toma a fórma de uma miragem, que nunca se póde attingir.

Esta é a triste historia da nossa vida financeira.

É necessario mudar de rumo e de processos, se queremos regularisar a fazenda publica.

Alem de que, não se póde recorrer indefinidamente ás praças para obter dinheiro em troca de papeis. E preciso que os mercados monetarios saibam que quem lhes vae pedir dinheiro está habilitado a pagal-o ou os encargos d'elle. Ora o desenvolvimento e a prosperidade de uma nação não segue muitas vezes o movimento rapido dos emprestimos. Quer dizer, que o desenvolvimento da riqueza de uma nação é muitas vezes inferior ao augmento dos seus encargos.

Quando ha uma divida publica pequena num paiz atrazado, quando os encargos não são ainda exaggerados, é racional recorrer-se ao credito para desenvolver a propriedade do paiz, mas isto proporcionalmente.

Fóra d'estas indicações é uma aberração.

Sr. presidente, nós temos já uma divida publica enorme e devemos ter toda a moderação em recorrer ao credito, porque os encargos da nossa divida absorvem mais de metade da nossa receita, temos alem d'isso a garantia de juros a umas poucas de companhias e indemnisações a outras, como a do caminho de ferro de Lourenço Marques.

O que eu entendo, sr. presidente, que era bom, é que nós podessemos eliminar os orçamentos extraordinarios, porque era a maneira do sabermos o que se tem e do que se póde dispor.

Não digo que possamos fazel-o desde já, mas o que digo é que é necessario acabarmos com esta extrema facilidade de lançar mão de despezas extraordinarias; e é n'este sentido que eu pedia ao governo que não usassse das auctorisações amplas, filhas da occasião, mas que não teem justificação plausivel, a si proprio se outorgadas para fazer as enormes despezas que estão em prospectiva.

Eu pedia ao sr. ministro da fazenda que tolhesse o voo a todas estas auctorisações e seguisse na pratica o conheciho conselho de Thiers que dizia: "O ministro da fazenda deve ser feroz, deve resistir a todas as exigencias, mesmo ás dos seus collegas, para chegar a um equilibrio orçamental". Ora, sr. presidente, eu entendo que o sr. ministro da fazenda fazia bem mantendo este proposito com toda á firmeza e dignidade que são proprias do seu caracter, com todo o talento e boas intenções que me comprazo em reconhecer-lhe.

O estado da fazenda publica não é assustador, nem põe em perigo os portadores dos nossos fundos, mas é difficil e carece de remedio. É necessario que o governo d'este paiz, seja elle qual for, ponha um travão na roda das despezas excessivas e procure no crescimento natural das receitas e na reducção das despezas o meio de chegarmos a um equilibrio orçamental, recorrendo o menos possivel a emissões e a despezas extraordinarias.

Não basta só criticar e apreciar os factos. E necessario não imitar aquillo que se critica, se não antes mudar de systema e corrigir os erros que se apontam.

Mas infelizmente este governo, em vez de melhorar a situação, veiu aggravar as circumstancias em que nos encontravamos com a publicação dos decretos dictatoriaes, em que abriu largo campo á despezas publicas, pouco justificadas ou adiaveis.

Eu já disse que, inspirando-me unicamente nos interesses do paiz, não faço politica partidaria, quando trato de apreciar o nosso estado financeiro e economico, mas olhando para os algarismos não posso deixar de lastimar que este anno appareça um excesso de encargos muito importantes, ao lado de uma diminuição de receita, saldando-se a conta de exercicio de 1889-1890 com um deficit de 10.800:000$000 réis.

É para isto que eu chamo a attenção da camara e a do governo, promettendo tratar desenvolvidamente o assumpto quando se apresente a devida opportunidade.

O sr. Presidente: - Vae ler-se uma mensagem vinda da outra casa do parlamento.

Foi lido um oficio da presidencia da camara dos senhoras deputados remettendo a proposição de lei que auctorisa o governo a proceder á cobrança dos impostos com relação ao exercido de 1890-1891.

Foi á commissão de fazenda.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Ouviu com toda a attenção as considerações apresentadas pelo digno par o sr. conde de Valbom, não só porque, s. exa., antigo ministro da fazenda, é uma verdadeira auctoridade no assumpto que se discute, mas tambem porque nos traços geraes com que delineou a nossa situação financeira, se approximou das opiniões que o orador emittiu no seu relatorio de fazenda, e nas que estão compendiadas em outros documentos da sua responsabilidade.

Não julga que a situação da fazenda publica seja péssima; mas entende que merece muito a qualificação de difficil que o sr. conde de Valbom lhe attribuiu. Entende tambem que é principalmente na moderação das despezas que se deve ir procurar, senão uma solução rapida e completa da questão de fazenda - mesmo porque um assumpto tão

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complexo e difficil não se resolve inopinadamente, - pelo menos o meio de, gradual e successivamente, se attingir uma situação desembaraçada dos encargos que actualmente oneram o nosso systema economico.

É dos que acreditam que o paiz tem largos recursos, e dos que fiam de uma administração prudente e sensata uma solução satisfactoria da questão de fazenda.

Temos collocado nas bolsas estrangeiras uma grande parte dos titulos da nossa divida publica, e vemos com satisfação que esses titulos continuam a ter uma boa cotação, o que representa uma grande confiança no credito que temos mantido, confiança que não desfructam, talvez, nações mais poderosas e politicamente mais importantes.

O orador refere-se a algumas observações apresentadas pelo sr. conde de Valbom, e accentua quanto lhe foi agradavel ouvir os conselhos illustrados e sensatos do digno par.

{O discurso do sr. ministro será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. tenha revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Coelho de Carvalho: - Dirá apenas duas palavras para explicar o seu voto.

Vota o parecer que se discute como conta de gerencia, e não como orçamento rectificado.

Nota que ha muitos annos que o orçamento foge á discussão parlamentar, quando devia recair n'elle uma apreciação analytica, um exame minucioso de cada verba, a fim de se verificar quaes as economias que poderiamos realisar.

Protesta, pois, contra o systema ultimamente adoptado, que julga derivar do intento de subtrahir á analyse parlamentar um documento de tanta importancia como é o orçamento geral do estado.

Se não fôra a estreiteza do tempo, pediria ao sr. ministro da fazenda que explicasse cabal e satisfatoriamente á camara a inserção da verba de 40:000$000 réis destinados a cobrir o deficit de uma subscripção particular organisada ha mezes com o fim de acudir aos doentes pobres por occasião da epidemia da influenza.

Votará a parte do orçamento que se refere a esta quantia, se o sr. ministro lho disser que já está paga; de outro modo. não, porque o facto significa apenas que o sr. Antonio de Serpa quiz honrar a palavra do sr. José Luciano.

Lembra que este digno par já declarou que se compromettera a auxiliar a subscripção, caso este auxilio não implicasse um dispendio superior a 3.000$000 ou 4:000$000 réis; e nota que o sr. Antonio de Serpa não explicase ainda o motivo que o obrigou a desviar-se tanto d'aquelle limito.

Não entra na questão de fazenda, e, por este anno, sempre que ella venha á tela do debate, limitar-se-ha a ser mero espectador.

Quando subiu ao poder o partido progressista, o sr. Marianno de Carvalho apresentou ao parlamento um orçamento que disse representar a liquidação de todas as contas do estado, e agora o sr. Franco Castello Branco traz o seu relatorio que póde ser perfeitamente equiparado ao tal orçamento de liquidação.

Applaude a sinceridade com que o sr. ministro da fazenda fez umas certas revelações ácerca do verdadeiro estado da fazenda publica; mas em todo o caso já ouviu dizer a s. exa. que- a situação das nossas finanças excede muito a gravidade que lhe attribuiu no seu relatorio.

Aguarda a discussão das propostas de fazenda para avaliar a justiça das allegações apresentadas, no entretanto estranha que o sr. ministro da fazenda no seu relatorio, esteja constantemente a confrontar o orçamento de 1884-1885 com o de 1888-1889, sem prova que os encargos enormes que pesam na gerencia que decorre de 1880 a 1890 não são o resultado das despezas descriptas nos orçamentos anteriores a 1884-1885.

Se o illustre ministro provar que os encargos que sobrecarregam os orçamentos de 1884-1885 a 1888-1889 foram todos ou a maior parte creados pela administração progressista que o orador, aliás, não defende, acceitará o confronto; mas, pertencendo ao parlamento em 1885, lembra-se que o orçamento apresentado então pela situação transacta incluia despezas avultadas feitas pelo ministerio regenerador na gerencia de 1884.

O sr. Presidente: - Deu a hora.

O Orador: - Se a camara consente, terminará com duas palavras as considerações que tem a fazer.

Pede ao sr. ministro que se compenetre da situação grave em que se encontra a nossa fazenda publica, e que trate, quanto possivel, de augmentar as receitas, evitando simultaneamente a progressão das despezas.

Depois de fazer algumas considerações no sentido de mostrar a necessidade de dar ás receitas do estado uma applicação prudente e rasoavel, conclue repetindo que vota o documento que está sobre a mesa, não como orçamento rectificado, mas como uma conta liquidada, e pede ao sr. ministro que medite no enorme dispendio a que o vão arrastar as auctorisações de despezas exaradas nos decretos dictatoriaes.

(O discurso do orador será publicado na integra e em appendice a esta sessão, logo que s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Na quarta feira, 25, continua a discussão do orçamento rectificado.

Esta levantada a sessão.

Eram cinco horas e dez minutos da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 23 de junho de 1890

Exmos. srs.: Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel; Marquezes, da Praia e de Monforte, de Vallada; Condes, de Alte, do Bom fim, de Cabral, de Carnide, de Ficalho, da Folgoza, de Lagoaça, de Valbom, d'Avila; Bispo da Guarda; Viscondes, de Alemquer, de Moreira de Rey, de Sousa Fonseca; Moraes Carvalho, Caetano de Oliveira, Sousa e Silva, Antonio José Teixeira, Botelho de Faria, Serpa Pimentel, Pinto de Magalhães, Costa Lobo, Cau da Costa, Augusto Cunha, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Bernardo de Serpa, Cypriano Jardim, Firmino J. Lopes, Francisco Cunha, Barros Gomes, Jeronymo Pimentel, Baima de Bastos, Holbeche, Coelho de Carvalho, Gomes Lages, Gama, José Luciano de Castro, Ponte Horta, Sá Carneiro, Mexia Salema, Bocage, Lourenço de Carvalho, Luiz de Lencastre, Camara Leme, Pereira Dias, Marçal Pacheco, Franzini, Cunha Monteiro, Pedro Correia, Rodrigo Pequito, Thomás Ribeiro.

O redactor = Carrilho Garcia.

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