322 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
cão dos vencimentos, pela fórma mais diçtatorial que se póde fazer.
E o imposto lançado para dotação dos tribunaes administrativos?
Não eram encargos que vinham pesar sobre os contribuintes? Não se estabeleceu a obrigação de o satisfazer? E a fórma d'esse pagamento?
Pois tudo isto fez o sr. presidente do conselho pela maneira mais rasgada de uma dictadura.
Não a fez sobre monopolios?
Pois então o que é o decreto de 27 de janeiro de 1887, sobre tabacos, decreto assignado por todos os ministros e que está na collecção das medidas dictatoriaes para que s. exa. veiu pedir ao parlamento um bill de indemnidade?
O que fez s. exa. n'esse decreto?
Augmentou os direitos sobre os tabacos e, não contente com isso, quer v. exa. ver quanto o governo progressista foi sempre meticuloso em não affectar a liberdade de industria, em não decretar novos impostos em dictadura?
Veja-se o que no artigo d'esse decreto se dizia:
"Até resolução definitiva do poder legislativo não será permittido no continente do reino o estabelecimento de novas fabricas, ou a ampliação ou modificação das actuaes, ou a reabertura das que ha mais de tres mezes tenham suspendido a laboração."
Não serão estas medidas absolutamente restrictivas da liberdade de industria?
Pois o que ficava em campo, depois d'estas restricções?
Ficavam apenas as fabricas já estabelecidas, o que era um monopolio de facto, pois não se podiam estabelecer mais fabricas que podessem affrontar aquellas.
Pois é o sr. presidente do conselho que vem dizer que o partido progressista nunca fez dictadura em materia de impostos e de monopolios?!
No relatorio do seu codigo administrativo, dizia ainda s. exa. o seguinte:
"E tão vulgar tem sido entre nós o exercicio d'esse recurso, tão frequentemente ha sido usado, não só para organisar serviços e decretar avultadas despezas, mas até para substituir a maxima garantia do cidadão nos governos constitucionaes - a auctorisação dos impostos pelos representantes do paiz, etc."
Foi o que s. exa. fez.
Lançou o imposto sem auctorisação do parlamento, e por isso offendeu a maxima garantia, no dizer de s. exa., que tem o cidadão.
E é s. exa. que vem dizer que o partido progressista nunca fez dictadura sobre materia de impostos e de monopolios!
Agora, Volva v. exa. os olhos para o que foi a nossa reforma administrativa de 1896, para os principios em que ella se inspirou, para as circunstancias em que se produziu, para os resultados que teve, e dirá por certo que não foi para obedecer a intuitos partidarios que a fizemos.
A rasão por que a fizemos está claramente expressa no relatorio do decreto publicado, mas está expressa com uma verdade tão precisa, tão incontestavel e de todo o ponto significativa, que ninguem póde deixar de lhe reconhecer a justiça.
Diz-se n'esse relatorio:
"Uma das primeiras necessidades, a que se nos afigura urgente attender, é a de remodelar a constituição e organisação dos municipios, pois muitos d'elles, pela exiguidade dos seus recursos, limitada area e diminuta população, carecem dos meios essenciaes e até de pessoal habilitado e sufficientemente numeroso, para o cabal desempenho da sua alta missão. "
Esta é a rasão clara, evidente e verdadeira por que nós fizemos uma reforma administrativa.
Não foi para nivelar questões prrtidarias, porque nós não precisámos de o fazer, não foi obedecendo a intuitos de politica caseira nem para servir interesses de campanario ou para attrahir amigos que se houvessem affastado do governo; foi unicamente para attender a uma necessidade real, absoluta, incontestavel, de administração publica, em relação á vida dos municipes que não podiam continuar a viver por aquella fórma, de modo que nem havia progresso nas localidades, nem melhoramentos possiveis n'um meio tão depauperado.
Essa foi a rasão e esta rasão entende-se.
É uma rasão que um governo póde dar a um parlamento, porque esta o póde levar a assumir responsabilidades de poderes extraordinarios.
Diziamos nós:
"Assim, os pequenos municipes entre nós, apesar dos exagerados gravames tributarios de que tem lançado mão, pouco ou nada, com raras excepções, tem podido fazer no que respeita á viação, instrucção, beneficencia, policia, hygiene e outros serviços municipaes."
Póde o sr. presidente do conselho contestar que isto fosse uma verdade absoluta, um facto evidente observado todos os dias?
O nosso pensamento foi fazer ao mesmo tempo a remodelação administrativa e á remodelação judicial, precisamente no interesse e commodidades dos povos.
O nosso pensamento foi fazer coincidir as circumscripções administrativas com as judiciaes porque era a fórma pela qual podiamos pôr ao alcance do nosso paiz regras de administração, d'estas que na pratica mais usualmente se têem de seguir e encaminhar os seus effeitos pela fórma mais segura, mais facil e mais solida.
Para isto publicámos o codigo administrativo de 1895, para isto graduámos os concelhos, e para isto fizemos ainda uma tentativa com respeito aos concelhos de 3.ª ordem.
Havia concelhos faltos de recursos, mas que, emfim, tinham a abonar a sua existencia uma tradição, um habito perpetuado, um certo amor á sua independencia local.
Queriamos, portanto, ver se, pela creação dos concelhos de 3.ª ordem, era possivel obtemperar ao mesmo tempo ás exigencias da administração publica e á exigencia de muitos dos mais pequenos municipios; e então, estabelecemos no codigo administrativo que successivamente se iria fazendo a classificação dos concelhos.
Foram estas as condições do nosso decreto com respeito á reforma administrativa.
Agora comprehendia-se que o governo se apressasse a remodelar a obra que fizemos, se a tivesse de a expungir de graves erros, ou se ella se tivesse inspirado n'outro proposito que não fosse o que ha pouco enunciei.
Então, sim, comprehendia-se que b governo viesse desfazer a nossa obra n'uma occasião em que a politica é aquillo que menos deve pesar.
Mas não foi assim que o governo procedeu.
Nós fizemos uma revisão detida, minuciosa, consciente, das condições das proprias localidades, districto a districto concelho a concelho, tendo em attenção a area, a população, as condições de vida, os recursos é os elementos de acção e movimento dos povos. E foi assim, obedecendo a um principio de economia, para cortar por despesas injustificadas, para dotar a fazenda municipal, ao menos, com a largueza sufficiente para que os serviços a seu cargo ficassem regularmente executados e para que as suas faculdades podessem ser convenientemente estabelecidas.
Foi obedecendo a este principio, a este proposito, que nós fomos successivamente effectuando a remodelação, das comarcas e concelhos.
Ferimos interesses, é certo - porque não dizel-o? - contendemos com amigos politicos nossos, valiosos e dedicados. Isto prova quanto a nossa obra foi absolutamente desprendida de considerações de ordem politica.
Não ganhamos affeições no terreno politico, é certo, mas ganhamos ao menos a consciencia de haver cumprido o