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quando a commissão, fazendo mais demorada a discussão do orçamento, demittiu de si aquelle dever e remetteu-o outra vez para a camara, para que ella lhe fizesse as alterações que julgasse necessarias, para depois serem remettidas á commissão, invertendo assim as respectivas attribuições, tornando-se a commissão em camara e a camara em commissão.

Vozes: — Não pôde referir-se ao que fez a outra camara.

O Orador: — Perdoem-me vv. ex.ªs, porém é necessario que me refira a este facto, porque pretendo fazer uma pergunta aos srs. ministros, e depois me dirão se estou ou não fóra da ordem e se a podia fazer sem alludir á outra casa.

Pergunto aos srs. ministros se, á vista do artigo 46.ª da carta constitucional, que diz o seguinte:

«O poder executivo exerce por qualquer dos ministros d'estado a proposição que lhe compete na formação das leis, e só depois de examinada por uma commissão da camara dos deputados, aonde deve ter principio, poderá ser convertida em projecto de lei.»

Pergunto, repito, se entendem que um só ramo do poder legislativo pôde interpretar um artigo da carta sem intervenção do outro e sem a sancção do rei? E a isto que eu quero que os srs. ministros me respondam. «

O sr. Conde de Thomar: — Eu peço a V. ex.ª que me conceda a palavra sobre a ordem.

O Orador: — Pergunto agora aos dignos pares se estou fóra da ordem, e se entendem que a camara dos senhores deputados pôde tomar uma resolução, como a que tomou, interpretando um artigo da carta constitucional sem a intervenção d'esta camara e do rei?

O que é verdade é que aquella determinação da outra casa demora a discussão do orçamento, de que depende a final organisação da fazenda, que os srs. ministros dizem que hão de apresentar para janeiro, ou talvez para as kalendas gregas!

Sr. presidente, é preciso que se reconheça que o paiz não pôde ser governado assim; é preciso que se saiba que a nação portugueza tem direito a que façam justiça aos seus clamores, porque elles são justos e datam de ha muito tempo. Eu não quero dizer que os srs. ministros actuaes são responsaveis por este estado de cousas, o mal é muito antigo, e por isso maior é a necessidade de que os srs. Ministros actuaes apresentem a organisação definitiva da fazenda, para que ha de concorrer muito a discussão do orçamento.

Eu não tinha agora tenção de fallar sobre este assumpto, mas fui levado a isto pela leitura que o sr. duque de Loulé fez da proclamação, e só tencionava pedir a palavra para explicar o meu voto sobre o projecto em discussão.

O sr. Presidente: — O requerimento que diz respeito ao negocio do sr. Antunes, vae ser remettido á commissão administrativa da camara. Agora está inscripto sobre a ordem 0 digno par, o sr. conde de Thomar, mas tem primeiro a palavra o sr. presidente do conselho, que a pediu por parte do governo.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Conde d'Avila): — Ninguém faz mais justiça do que eu ás rectas intenções do digno par, o sr. visconde de Fonte Arcada, mas na verdade parece que s. ex.ª quer provar que é o auctor d'esta proclamação a que o sr. duque de Loulé acaba de referir-se, porque o nobre visconde queria tambem uma dictadura rasgada. Eu não a quero, e declaro francamente que sou inimigo das dictaduras. Dictadura constitucional, como a quer a proclamação, não sei o que seja; dictadura illustrada pôde ser, porque já a tivemos.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a palavra para uma explicação.

O Orador: — Eu já disse que ninguem faz mais justiça ás rectas intenções do digno par do que eu.

A censura de s. ex.ª a este ministerio reduz-se a que elle não assumiu a dictadura em larga escala. É verdade. O ministerio usou da dictadura unicamente n'aquillo que julgou que era indispensavel para dar satisfação ás necessidades do paiz, e sobre as quaes o paiz se tinha pronunciado, e entregou o resto ao corpo legislativo. Agora diz o digno par «o paiz está geralmente agitado». Respondo não façamos nós a agitação, porque o paiz não está agitado, e tanto não está que não fez effeito algum essa proclamação. O sr. duque de Loulé julgou conveniente repellir a responsabilidade que lhe podia provir d'esse papel; mas responsabilidade que ninguem lhe pediu, porque ninguem acreditaria que s. ex.ª podia ter aconselhado tal publicação, ou cooperado para ella; mas como o nome do sr. duque figura n'este papel, s. ex.ª entendeu dever chamar a attenção da camara, o fez muito bem, para protestar contra toda e qualquer cumplicidade que lhe quizessem attribuir n'este documento, mas ninguem acreditou em tal, e basta ver que todos olharam para este papel com a desconsideração que elle merece; todavia o sr. duque de Loulé fez o que devia.

A proclamação diz:

«O nobre duque de Loulé acaba de declarar-se abertamente em plena opposição ao governo do conde d'Avila.» E mais abaixo:

«Só uma dictadura illustrada pôde salvar o paiz. Aceite o duque de Loulé esse principio, e verá em torno de si toda a nação.»

A proclamação acaba assim:

«Que o grito da revolução rebente por toda a parte, que haja uma só vontade, que ella se resuma n'este grito de guerra:

«Abaixo o ministerio!

«Abaixo o parlamento! " «Viva a dictadura constitucional e illustrada! »

O sr. duque de Loulé fez pois muito bem em vir declarar que, não só não aceita estas doutrinas, mas que está perfeitamente em opposição com ellas. Foi isto o que me

pareceu ter ouvido ao nobre duque. (O sr. Duque de Loulé: — Apoiado.)

Por consequencia s. ex.ª fez um excellente serviço, proprio dos principios, liberaes que tem seguido toda a sua vida, porque agora fica-se conhecendo, não digo na camara, porque não é preciso, mas fóra d'ella, onde pôde haver gente que julgasse o contrario, que o sr. duque de Loulé repelliu a complicidade n'um tal papel, que não podia ser redigido senão por inimigos de s. ex.ª

Quanto á agitação, de que fallou o sr. visconde de Fonte Arcada, repito, que o paiz está tranquillo e que o não agitemos nós com alguma palavra mal pensada. Eu tenho obrigação de ter informações mais cabaes do que o digno par, e posso asseverar a s. ex.ª que o paiz está tranquillo e que as leis são cumpridas.

O motivo principal que o digno par tem para não estar contente comnosco é porque nós não usámos largamente da dictadura! Esta circumstancia, quanto a mim, só prova a favor da actual administração.

S. ex.ª acrescentou que o governo só passado muito tempo é que se apresentou ás camaras com um complexo de medidas, que o digno par teve a bondade de discutir já, em logar de esperar que ellas viessem da outra camara. Não é exacto o que s. ex.ª disse. O governo apresentou na outra camara, logo que ella se constituiu, essas medidas. Queria o digno par que o governo apresentasse na camara projectos, quando ella não podia funccionar, porque estava occupada na verificação dos poderes dos seus membros? Logo que a camara se constituiu apresentámos ali os projectos, que podemos confeccionar no pouco tempo que tivemos, e pedimos acamara que, se julgasse bons esses projectos, os votasse, e declarámos que preparávamos outros para submetter ao seu voto.

Dissemos mais que, se as camaras entendessem que deviam fazer qualquer modificação nos mesmos projectos, nós a aceitaríamos quando não sacrificasse o seu pensamento, e pelo contrario o melhorasse.

Com relação a economias fazemos o aceitamos todas as que não desorganisem os serviços publicos, porque economias que desorganisem esses serviços só produzem augmento de despeza.

O digno par, alludindo ao methodo adoptado ultimamente na outra camara para a discussão do orçamento, que s. ex.ª declarou contrario ao artigo 46.° da carta, perguntou ao governo se estava de accordo com esse procedimento. Ainda que entendo que esta camara não tem direito para discutir e censurar o que se passa na outra camara, comtudo parece-me que me deve ser permittido repellir a censura explicando um acto que, quanto a mim, só merece louvores.

O que demonstra a experiencia da discussão do orçamento na camara electiva? Demonstra constantemente o seguinte — a commissão do orçamento, depois de muito tempo empregado em preparar os respectivos pareceres, apresenta-os á discussão, durante a qual são mandados para a mesa muitos additamentos e emendas, que de ordinario contrariam os trabalhos da mesma commissão. Esses additamentos e emendas são mandados á commissão, a qual dá um parecer definitivo, que é submettido á camara. Ha pois rigorosamente dois pareceres. Pelo methodo ultimamente adoptado supprime-se o primeiro aceitando como parecer da commissão o proprio orçamento: poupa-se assim muito tempo, porque cada sr. deputado manda para a mesa as propostas, modificações e additamentos que julga convenientes, os quaes vão á commissão. No entretanto a propria commissão continua no seu exame, e no fim dá um parecer sobre todas essas propostas, ajuntando as que lhe foram suggeridas já pela discussão, já pelo estudo que ella mesma fez sobre o assumpto. Não ha pois d'esta maneira a menor violação das disposições do artigo 46.° da carta constitucional, a que se soccorreu o digno par.

Mas se porventura o digno par julga que estas considerações não são exactas, formule uma proposta por escripto, que será remettida a uma commissão, e esta dará um parecer que discutiremos plácidamente, sem que para isso seja necessario empregar expressões que possam ferir o melindre da outra casa do parlamento, taes como, por exemplo, que a camara tinha sido convertida em commissão e a commissão em camara; perdôe-me o digno par que lhe diga que foi muito inexacto n'esta apreciação.

Disse tambem o sr. visconde de Fonte Arcada, que a nação tem direito a que se faça justiça aos seus clamores; de certo; mas eu perguntarei ao digno par se a nação não usou das suas prerogativas elegendo livremente os seus representantes? Quer o digno par vir aqui contestar a legitimidade das ultimas eleições? Não o quer de certo; portanto se a nação está representada pelos deputados que elegeu, deixemos a estes usar das suas attribuições, e não digamos ao paiz que está mal representado, ou que recorra a outros meios para satisfazer os seus desejos, porque esta linguagem é que pôde produzir a agitação de que fallou o digno par.

Não concorramos pois nós para que essa agitação exista, ou levantando no parlamento questões irritantes, ou pronunciando palavras cujo alcance não tenhamos bem medido, e que produzam os inconvenientes que queremos evitar.

O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente, não pedi a palavra sobre o assumpto de que se occupou o sr. duque de Loulé, porque a proclamação é uma segunda phase da machina infernal de outros tempos. Pedi-a sobre a ordem, porque me pareceu inconveniente e illegal a accusação que um digno par acaba de fazer á camara dos senhores deputados por uma decisão que ella tomou.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Peço a palavra. O Orador: — Não temos direito para tal. A camara dos senhores deputados pôde resolver sobre os negocios que lhe são affectos como melhor o julgar, assim como nós, quando a questão vier a esta camara, podemos tomar uma decisão inteiramente contraria (apoiados), isto é que é regular. E permitta-me o sr. presidente do conselho ponderar-lhe que tambem se me figurou inconveniente a defeza, e tanto assim que, se me achasse no logar do sr. presidente quando s. ex.ª alludiu á camara dos senhores deputados, te-lo-ía chamado á ordem, para que a discussão não progredisse.

Não esqueçamos, sr. presidente, os verdadeiros principios constitucionaes. Assim como não podemos querer que a camara dos senhores deputados discuta os nossos actos, porque não tem direito para faze-lo, tambem nós não devemos discutir os actos da outra casa do parlamento pela mesma rasão. Guardemos as conveniencias e as distancias que a carta estabelece entre um e outro ramo do poder legislativo, e não vamos invadir alheias attribuições.

Limito a isto, sr. presidente, as minhas considerações, pedindo a V. ex.ª que todas as vezes que uma questão d'esta ordem e natureza aqui for apresentada procure impedir que ella progrida.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr. presidente, julgando ter direito a dar algumas explicações sobre o que a meu respeito se disse, por isso pedi a palavra.

Começarei por declarar ao sr. presidente do conselho, que me accusou de adherir á ultima parte da proclamação, que das minhas palavras não se podia deduzir similhante cousa. Eu o que disse foi que era necessario que os governos tomassem em consideração tudo o que se tem dito, tendo em vista o verdadeiro estado em que se acha o paiz, estado que eu não sei qualificar de outro modo senão de agitação e grande; e por isso, sr. presidente, disse que em vista do estado do paiz era necessario que os poderes publicos se persuadissem da necessidade de acabar com essa agitação, o que de certo se não poderá obter sem as maiores e mais severas economias; pedindo então, depois dellas realisadas, os meios para se poder fazer face ao deficit; mas sem que essas economias se façam continuará sem duvida n'esse estado de agitação o paiz, estado que de certo todos lamentamos.

Eu avalio o paiz pelo meu coração e pelos meus sentimentos, e creio que na apreciação que por este modo faço não estou em erro, e a prova é que quasi todas as situações que tenho combatido têem tido sempre, pouco mais ou menos, o mesmo fim que teve o ministerio que ultimamente estava á frente dos negocios publicos. Se pois isto se dá é porque eu avalio as cousas de um modo exacto, e por isso, sr. presidente, não é preciso ter muita intelligencia, basta só o conhecimento dos factos e a boa rasão para os apreciar; basta ter frequentado os' nossos parlamentos ha mais de quarenta annos.

Agora, sr. presidente, respondendo ao sr. conde de Thomar, devo dizer que eu não podia deixar de perguntar aos srs. ministros se entendiam que se podia interpretar este ¦ artigo da carta constitucional por outro modo que não fosse uma lei, e para isso não podia deixar de me referir á camara dos senhores deputados. Ella é independente; mas não se segue por esse facto que o governo approve o arbitrio que ella adoptou, e por isso eu lhe dirigi esta pergunta para saber a sua opinião.

Não me parece pois que estivesse fóra da ordem, nem que merecesse as censuras que se me fizeram.

Não pretendo avaliar a legalidade das ultimas eleições, como disse o sr. presidente do conselho; mas quantas vezes tenho eu dito n'esta camara que o parlamento está mal constituido? Immensas vezes. E cada vez estou mais persuadido d'isso, e mais convencido que é necessaria uma reforma parlamentar. Tudo o que se está passando indica a necessidade d'essa reforma, que não quero que seja feita nas praças, mas pelos poderes politicos.

Portanto, quando digo isto, é porque reconheço que o paiz não está representado como devia estar, e estou cansado de o repetir. Já porém a minha opinião tem sido apoiada n'esta casa por alguns dignos dignos pares e pelo sr. conde de Samodães; alem d'isso, fóra d'esta camara, voga esta mesma idéa, como se vê pelo programma politico assignado no Porto pela mesa de uma reunião eleitoral, de que era presidente o sr. conde de Samodães, e em Lisboa por outro documento assignado por pessoas muito respeitaveis, algumas das quaes fazem parte d'esta camara.

Eu não quero semear a desordem no paiz, pelo contrario quero evita-la, até porque não tenho tenção de medrar com ella, nem de me aproveitar dos seus resultados.

Parece-me que tenho respondido convenientemente tanto ao sr. conde de Thomar, como ao sr. presidente do conselho, e por isso não direi mais nada.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Direi apenas duas palavras á camara. Ella viu que o sr. conde de Thomar e eu estamos de accordo, a verdade porém é que o sr. visconde de Fonte Arcada tinha interpellado o governo sobre a interpretação do artigo 46.° da carta constitucional, e o silencio dos ministros a este respeito podia indicar que se achavam na absoluta impossibilidade de responder ao digno par, quando é precisamente o contrario, como acabo de demonstrar. Esta explicação da parte do governo era tanto mais necessaria quanto que se tem espalhado, e procurado fazer acreditar no paiz, que quando o governo apresentou ao parlamento a proposta de auctorisação para a cobrança dos impostos tinha a firme resolução de aconselhar o adiamento das camaras, e não promover a discussão do orçamento e das medidas que havia proposto ao parlamento. O governo tinha por isso absoluta necessidade de explicar ao sr. visconde de Fonte Arcada o acto a que s. ex.ª se referiu, e explicar como entendi e entendo ainda, e n'isto persuado-me que fui fiel interprete da resolução adoptada na outra camara, isto é, que esse acto, alem de não ferir os preceitos constitucionaes, só merece louvores.

Agora quanto a dizer o sr. visconde de Fonte Arcada que julga o paiz pelo seu coração, responderei que o cora-