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158 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

No artigo 140.° pretende-se regular melhor o periodo experimenial dos artigos constitucionaes da carta; querem-se os mesmos quatro annos, mas que sejam bem mantidos, de reforma a reforma, como praso minimo, o que agora não é bem claro na carta. Explicar é aperfeiçoar, quando realmente ha duvidas.

Tambem no artigo 145.° § 28.° se pretende incluir o direito de reunião, visto como no titulo respectivo se trata das garantias dos direitos civis e politicos dos cidadãos portugueses.

Este direito que a constituição de 1822 não estatuiu expressamente, pois que os seus artigos 16.° e 17.° foram fielmente transcriptos no § 28.° do artigo 145.° da carta, foi reconhecido no artigo 14.° § 1.° da constituição de 1888. Sob o regimen da carta já o decreto dictatorial da 15 de junho de 1870 o reconheceu, fundando-se em que no direito de petição ou representação está implicitamente incluido o de reunião.

A este decreto deram força de

Não parece, á commissão que haja duvida que prevaleça contra a sua inserção na carta.

Resta fallar da materia dos artigos 39.° e 74.° §§ 1.ç, 4.° e 7.°, propostos para reforma; parte principal do projecto e que podia ser unica, visto que as outras mencionadas, com serem importantes, não poderiam, nem individualisadas nem reunidas, justificar uma revisão.

Chamando aristocratica á camara dos dignos pares tem-se-lhe por vezes querido fazer d'isso motivo de accusação.

Não é este, de certo, o pensamento do projecto, que, na reforma d'estes artigos da carta, o que principalmente pretende é poupar suspeitas a prerogativas do poder moderador; comtudo ainda frequentemente aquella insinuação se reproduz, com intenção pouco benevola, nada justa quanto ao passado, inexacta quanto ao presente.

Portugal herdou da antiga Lusitania reliquias de todos os diversissimos povos que a dominaram e que sobre ella se, despenharam de toda a parte d'onde lhe ficavam terras, ou mares estreitos e accessiveis. O norte, o nascente e o meio dia lançaram aqui as suas hostes e com ellas os seus preconceitos, o seu genio, a sua indole individual e social, o seu espirito aventureiro ou sedentario, instituições, costumes e monumentos. Aqui luctaram e aqui permaneceram. Os povos que têem a desdita de ser invadidos e, mais ainda, aquelles de cujo para se faz arena de embates e combates, têem uma compensação providencial:! aprendem muito e depressa na experiencia das proprias e das alheias desgraças. Referindo-se ás palavras do conde de Moltke, em apoio da guerra, dizia um publicista estrangeiro: "Não é tão absurdo como julgam o pensamento do illustre general; a guerra é como as grandes descargas electricas, destroem as sementeiras mas melhoram o solo; o fogo abraza mas tem luz".

Portugal, herdando nas suas tradições uma tão vasta lição de factos, de pessoas, do nações, de direito, de legislação, de artes e de politica, não era, ao constituir-se reino independente, um povo barbaro.

Os primeiros monarchas, se não foram escolhidos, foram reconhecidos G acceitos livremente pela nação, o que prova o seu espirito independente e liberal; os mestres dos principes eram já distinctos em merito e classe. Se as primeiras côrtes apontadas pela historia não existiram, como é licito conceder depois que um grande historiador o affirmou, ainda assim o seu texto apocripho não é filho da phantasia, é o transumpto fiel das tradições. E depois tivemos sempre côrtes; mesmo para o mal as tivemos, infelizmente. Seriam sombra apenas os seus poderes, mais a sombra denuncia o corpo e, sombra mesmo, protege.

O povo, o terceiro braço do estado, fez sempre, e realmente, parte dos seus poderes politicos, agremiado em classes, com os seus estatutos e insignias, disposto em associações de artes e officios, era respeitado, influente e respeitavel.

O juiz do povo e o seu escrivão em todos os movimentos politicos são vistos da logar preeminente; encontraram-se ainda na revolução de 1820.

Os municipios ou municipalidades eram instituições populares tradicionaes; mas ahi já por vezes tomava parte a aristocracia.

Apesar da sua indole accentuadamente popular eram já terreno neutro onde os dois braços do estado se encontravam e fraternisavam.

Com o espirito liberal herdou tambem Portugal o espirito aristocratico; esse era apanogio de todas as nações e é ainda o estimulo de muitas aptidões.

A nobreza, como recompensa e reconhecimento de serviços relevantes, era sempre uma instituição politica. Mas não só confunda nunca a nobreza de Portugal com a de muitas outras nações da Europa. Não que fossem menos nobres, mas eram menos privilegiados. Os grandes privilegios de dominio e predominio de jurisdicções especiaes, de ostentosas aposentadorias, de preitos e vassallagem quasi reaes, não os houve entre nós. Algumas doações regias, alguns direitos de padroado, alguns privilegios fundados em utilidade publica, e ainda alguns officios transmissiveis; e já nem isto era só da nobreza. O mesmo direito de constituir vinculos não era d'ella exclusivo.

Nobreza houve sempre.

Quando em Franca se proclamava a igualdade, e com ella os direitos do homem e do cidadão, reconhecia-se na utilidade commum direito a distincções sociaes. A constituição de Cadiz, no seu artigo 171.º, reconhecia ao Rei a prerogativa de conceder honras e distincções de toda a classe, segundo as leis. A constituição de 1822. no seu artigo 123.° X, attribuia ao Rei conceder titulos, honras e distincções, e a constituição de 1838 diz muito expressamente no titulo que se inscreve dos direitos e garantias dos portugueses: Artigo 28.° A constituição tambem garante: IV. A nobreza hereditaria e suas regalias puramente honoriticas. A carta, no § 11.° do artigo 75.°, reproduziu a disposição da constituição de 22,. e no §31.° do artigo 145.°, garantiu a nobreza hereditaria e suas regalias.

A aristocracia portuguesa formava nas antigas côrtes sempre um ramo especial dos tres braços do estado, ai historia das nossas navegações, descobertas e conquistas, com ella se enlaça: cura ella e com a monarchia, que punha ao serviço das grandes idéas e dos ousados emprehendimentos o seu poder, que era muito, as suas recompensas, que eram alguma cousa, e os seus principes, que eram verdadeiramente principaes.

E o resto da nação onde estava? Misturada com os nobres e proxima dos Reis, a quem livre e dignamente aconselhava, e advertia. Na Lusitania era essencial o encontro e a promiscuidade de individuos e de ciasses, e nós somos lusitanos. Sempre foi assim o nosso povo, a nossa nobreza, a nossa monarchia; e não era tão infeliz ou anomalo este estado social, comparado, das epochas que atravessava, com o estado dos outros povos, que, sendo Portugal um paiz pequeno, não representasse um papel digno do maior povo do inundo.

A nobreza á frente dos exercitos e das armadas, era uma auctoridade feita e reconhecida, inquestionavel, a quem ninguem se declignava do obedecer. Não é proclamar as doutrinas de H. Taine, aliás dignas de attenção; é expor um facto.

Ainda uma referencia a respeito da nobreza de Portugal. Nas lactas liberaes, se muitos nobres defenderam, no absolutismo, os seus privilegios, os seus apanagios, as suas doações regias, muitos foram proclamar a liberdade, é com ella a perda irreparavel das suas preeminencias, de que se despojavam, ás vezes com a propria vida, nos campos da batalha.

Os privilegiados de 1789 era França, que pertenciam ao