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N.° 27
SESSÃO DE 8 DE JCNHO DE 1887
Presidencia do exmo. sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa
Secretarios - os dignos pares
Frederico Ressano Garcia
Joaquim de Vasconcellos Gusmão
SUMMARIO
Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - Leu-se uma nota do digno par Miguel Osorio Cabral de Castro. - Antes da ordem do dia usam da palavra os dignos pares Manuel Vaz Preto Geraldes e o sr. presidente do conselho de ministros, que manda para a mesa uma proposta de accumulação. A camara approva esta proposta. - Usam novamente da palavra os dignos pares Vaz Preto e presidente do conselho. - O digno par Mexia Salema dá algumas explicações sobre o processo Ferreira de Almeida. - Ordem do dia: continuação da resposta ao discurso da corôa. - Usa da palavra o digno par Thomás Ribeiro e manda para a mesa a sua moção. - O sr. ministro da guerra fez a sua declaração de voto. - O digno par Ornellas de Vasconcellos manda para a mesa um parecer da commissão de negocios externos. Foi a imprimir.- O digno par visconde de Borges de Castro envia tambem um parecer da commissão de negocios externos, sobre a convenção consular. Foi a imprimir. - Usa da palavra o digno par eleito o sr. Coelho de Carvalho, que termina o seu discurso, mandando para a mesa uma proposta tornando extensivos ás forças de terra, que tomaram parte na tomada da ponta norte da bahia de Tungue, os louvores consignados aos valentes tripulantes dos nossos vasos de guerra. O sr. ministro da marinha e ultramar responde ao digno par. - Leu-se na mesa uma mensagem, vinda da camara dos senhores deputados, a qual foi remettida á commissão de fazenda.- O digno par Agostinho de Ornellas pede explicações ao sr. presidente do conselho sobre a epidemia de variola na Madeira. Responde o sr. presidente do conselho. - Agradece a s. exa. o sr. Ornellas e pede que se proceda á construcção de um lazareto. - O sr. presidente, tendo dado a hora, levanta a sessão, dando para ordem do dia da sessão de 10 do corrente a mesma.
Ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 22 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.
Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.
Mencionou-se a seguinte:
Correspondencia
Um officio do ministerio dos negocios estrangeiros, remettendo 100 exemplares do Livro branco, contendo documentos relativos á delimitação das possessões portuguezas e allemãs na Africa meridional.
Mandaram-se distribuir.
(Estava presente o sr. presidente do conselho.)
O sr. Presidente: - Convido o digno par o sr. Gusmão a vir servir de secretario.
Tive a honra de receber hontem uma carta do sr. Miguel Osorio de Castro, em que me pede para declarar á camara que não tem podido comparecer ás sessões, por motivos justificados, e que desejava tambem que fosse rectificada uma inexactidão em que incorrera no discurso que pronunciou n'esta camara, e para que essa inexactidão seja rectificada.
Vae ler-se a carta de s. exa. para que a camara tenha conhecimento do seu conteúdo.
Leu se na mesa e é do teor seguinte:
IIImo. e exmo. sr. - Tendo eu affirmado, n'uma das sessões passadas, na camara dos dignos pares do reino, que o actual sr. arcebispo de Goa, era hespanhol naturalisado portuguez, facto muitas vezes accusado pela imprensa periodica e de que eu estava convencido, ficando-me porém alguma duvida, parece haver assegurado o contrario pessoa auctorisada, resolvi verificar o facto nos documentos officiaes e reconheci que estava em erro.
S. exa. é nascido em Hespanha, de pae portuguez e mãe hespanhola, está portanto comprehendido nas disposições do § 2.° do artigo 1.° da carta constitucional portugueza. Não desejando que fique na camara a impressão de uma accusação inexacta, feita por mim, tomo a liberdade de pedir a v. exa. o favor de dar d'isto conhecimento á mesma camara, em meu nome. Estimando muito que esta minha declaração apparecesse na publicação da respectiva sessão em v. exa. a fizesse.
Agradecendo a v. exa. o favor de se encarregar desta missão, aproveito tambem a occasião para renovar os protestos de muita consideração que tenho pela pessoa de v. exa.
Quinta das Lagrimas, 6 de junho de 1887. = O par do reino, Miguel Osorio Cabral de Castro.
Ficou a camara inteirada.
O sr. Presidente: - Serão satisfeitos os desejos do digno par, inserindo-se esta declaração no Diario da camara.
Tem a palavra o sr. Vaz Preto.
O sr. Vaz Preto: - Pedia a v. exa. a fineza de declarar se já foi enviado a esta camara o processo do sr. Ferreira de Almeida.
O sr. Presidente: - Tenho a declarar ao digno par, que em uma das passadas sessões, á mesa deu conta á camara d'esse processo, que veiu da camara dos senhores deputados, e que foi enviado immediatamente á commissão de legislação criminal.
O Orador: - Por consequencia tendo vindo já para esta camara o processo sem duvida ha de seguir os tramites que o regimento marcar.
Ora, sr. presidente, fallando sobre este ponto...
O sr. Presidente: - Peço ao digno par queira ter a bondade de fallar um pouco mais alto para eu poder ouvir s. exa.
O Orador: - Dizia eu que, se o processo já foi enviado para esta camara, ha de seguir os tramites marcados na lei; fallando sobre este assumpto apenas quiz exprimir o meu desejo, de que logo que o parlamento se ache fechado, v. exa. participe ao governo a existencia nesta casa do processo a que me refiro, a fim da camara ser convocada a constituir-se em tribunal de julgamento.
V. exa. sabe melhor do que eu o que é necessario fazer; no entanto quero deixar bem consignado este meu desejo.
Pela lei de 15 de fevereiro de 1849, a camara dos pares para ser constituida era tribunal tem de ser convocada pelo Rei, ouvido primeiramente o conselho d'estado.
A camara dos senhores deputados já satisfez melhor ou peior ás prescripções do artigo 4.° do acto addicional.
Portanto eu espero que v. exa., depois de encerrada a camara, dê andamento ao processo para que seja julgado sem demora.
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Aproveitando a occasião de estar com a palavra, dirigir-me-hei ao sr. presidente do conselho.
Parece-me que está quasi a findar o praso com relação ao tratado de commercio com a Hespanha. N'este ultimo tratado não se attendia aos verdadeiros interesses de Portugal, principalmente aos que se referem á agricultura e á exportação de gado.
Eu desejava saber, sr. presidente, se o governo está resolvido a fazer um novo tratado em que sejam salvaguardados os interesses do paiz, ou se tencional renovar esse tratado?
(O orador não reviu.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Pedi a palavra para declarar ao digno par que o governo se está. occupando ha já bastante tempo da renovação do tratado de commercio com a Hespanha.
Ainda na ultima vez que esteve em Lisboa o sr. conde do Cagai Ribeiro, nosso ministro em Madrid, s. exa. tratou d'esse assumpto com o governo e em especial com o sr. ministro dos negocios estrangeiros e da fazenda para accordarem sobre as bases da renovação d'aquelle tratado.
Sei que os trabalhos, que se tem feito sobre este assumpto estão muito adiantados, que o sr. ministro dos negocios estrangeiros se tem occupado assiduamente d'esta materia, e que o sr. conde do Casal Ribeiro dedica a este negocio todos os seus cuidados, e que espera melhorar o tratado actual quanto possivel.
Eu sou da opinião do digno par. Effectivamente é prociso acautelar no novo tratado, os interesses do paiz. N'este ponto sou insuspeito, porque fui d'aquelles que mais combateram na outra casa do parlamento o ultimo tratado de commercio com a Hespanha.
Posso asseverar ao digno par, que o governo ha de empenhar todos os esforços para que no novo tratado se assegurem e defendam quanto possivel os interesses da nossa agricultura.
Aproveito a occasião, para mandar para a mesa uma proposta de accumulação.
Leu-se na mesa a proposta, que foi approvada.
O sr. Vaz Preto: - Ouvi as declarações do sr. presidente do conselho de ministros, e folgarei de reconhecer que serão traduzidas em obras as palavras de s, exa.
S. exa. declarou que combateu o tratado que actualmente, vigora, e esta declaração traz implicito o reconhecimento de que esse tratado é mau.
Effectivamente, a convenção com a nação vizinha, que actualmente vigora tem prejudicado enormemente os interesses da nossa agricultura, e por isto se reconheceu ha muito tempo a necessidade de reformar esse tratado, de sorte a prohibir os enormes abusos que elle permitte. Entre outros, citarei o que se dá com o azeite.
O azeite hespanhol transita livremente para os portos do paiz, e é d'elles exportado com a marca portugueza.
O azeite hespanhol, como a maior parte da gente sabe, ou é falsificado lá ou aqui, com oleo de semente de algodão, e vindo de Hespanha em odres, é baldeado aqui para vasilhas novas, ás quaes se applicam as marcas portuguezas.
Chamo, pois, a attenção do sr. presidente do conselho, sobre este facto, a fim de que s. exa. diligenceie. introduzir no povo tratado uma clausula que não admitta a baldeação do azeite hespanhol nos portos portuguezes, porquanto são evidentissimos os prejuizos que um tal meio fraudulento nos acarreta.
É notoriamente conhecido o estado desgraçado em que se encontra a nossa, agricultura, e, por consequencia, acabe-se por uma vez com esse, abuso, que, obriga os, nossos productos a adquirirem, lá fóra, uma reputação immerecida. Registo, a declaração do sr. ministro do reino, e peço a. s. exa., que tome tambem nota das minhas palavras.
(O orador não reviu.)
O sr. Presidente: - Respondendo á pergunta, que me dirigiu o digno par o sr. Vaz Preto, tenho a dizer que o processo a que s. exa. se refere, já veiu da camara dos senhores deputados, e está actualmente affecto á commissão de legislação.
S. exa. deseja tambem saber o estado de adiantamento em que se acha este assumpto. A este respeito, póde algum dos membros da referida commissão, dar a s. exa. os esclarecimentos necessarios.
S. exa. referiu-se tambem aos deveres que me impendem como presidente d'esta camara, quando ella tenha de se constituir em tribunal de justiça.
Permitta-me s. exa. que reserve para uma occasião opportuna as explicações que possa dar-lhe sobre o assumpto.
O sr. Mexia Salema: - Pelo que v. exa., sr. presidente, acaba de dizer, eu, como membro da commissão de legislação, na ausencia de outro mais competente, apresso-me a informar a camara do que mais lhe convem saber alem da resposta dada pela presidencia á pergunta que fez o digno par o sr. Vaz Preto.
Tendo v. exa., por deliberação da camara, mandado para essa commissão de legislação o alludido processo do sr. deputado Ferreira de Almeida, para, que a mesma desse parecer sobre qual o seu proseguimento em observancia das leis e do regimento d'esta camara, quando ella se constitue em tribunal de justiça, a commissão, dando toda a importancia que merece ao assumpto, reuniu logo hontem mesmo, a fim de o resolver devidamente, e, nomeando o competente relator, ficou marcado novo dia de reunião para se desempenhar dos seus deveres com a maxima brevidade.
Creio que com mais estes esclarecimentos que apresentei deve tambem ficar satisfeito o digno par o sr. Manuel Vaz Preto.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão da resposta ao discurso da corôa
O sr. Presidente: - Como não ha mais ninguem que peça a palavra antes da ordem do dia, vamos entrar na ordem do dia.
O primeiro orador que tem a palavra sobre a ordem é o sr. Thomás Ribeiro.
O sr. Thomás Ribeiro: - Sr. presidente, entro pela segunda vez n'este debate, e entro em más circumstancias.
V. exa. comprehende que, depois de tão larga discussão, que já hoje se não recommenda, nem pela novidade do assumpto, nem pela esperança de justiça, nem pela possibilidade de resistencia, a camara deseja vel-a terminar.
Mesmo quando algum amigo do governo, para se robustecer contra nós, receita o reagente infallivel do timeo danaos, quando, á falta de defeza, chama a esta questão - politica ou partidaria - a maioria friamente applaude, porque sabe na sua consciencia que o não é.
Tomado de muito desanimo venho concluir a minha tarefa, que traduz: obediencia á imperiosidade do meu dever e tristeza pelas minhas desillusões.
Confio, porém, na extrema benevolencia dos membros d'esta assembléa; sei que me dispensará mais alguns minutos de attenção consentindo que eu ainda converse com ella, de fugida, sobre as cousas do nosso padroado e da concordata.
Vou, tratar de restringir e comprimir quanto possivel as considerações que me resta. formular.
Sr. presidente, infamaram de graves suspeitas a innocentissima proposta que tive occasião de apresentar á camara a primeira vez que fallei.
Essa proposta, aliás terminava por um voto de confiança ao governo, e só tinha em vista legalisar o acto - abusivo ou irreflectido, ou forcado - que o governo praticara, approvando a concordata, o que é attribuição exclusiva do poder legislativo. Era reivindicar para as côrtes o que ás côrtes pertence e lhe foi usurpado pelo poder executivo,
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sem que ao menos incluisse este acto no pedido do bill de indemnidade affecto ao parlamento, Era avisar os poderes publicos de que marcham perigosamente por fóra do rumo que reciprocamente lhes marcam as leis fundamentaes.
Era validar pelos meios possiveis, legaes, um tratado que, sem a approvação do poder legislativo, não está perfeito, e cuja execução, na minha opinião de jurisconsulto, póde ser considerada irrita e nulla.
Tenho notado que todos os oradores que até hoje tomaram logar neste debate, por parte da maioria, têem chamado a attenção dos seus correligionarios para o perigo da acceitação da minha proposta; e sem a discutirem na sua essencia, e sem combaterem a sua affirmação, querem que seja rejeitada.
É commodo o expediente, mas a verdade é verdade e o parlamento exauctora-se.
O proprio sr. dr. Senna, um orador tão illustrado, um homem de tão nobres sentimentos, um dos mais vehementes defensores do governo, declarou que a maioria não podia acceitar a minha proposta sem pôr em risco a existencia do governo.
Pois bem: vou mostrar até onde chega o meu espirito conciliador; venho propor á maioria e ao governo que façam commigo uma concordata. E espero em Deus que esta será mais consentanea com a justiça, mais facilmente acceitavel pelas côrtes portuguezas.
Vamos, pois, fazer nós aqui uma concordata.
A minha moção tem alguns resaibos politicos; pois vamos tirar-lh'os.
E, para esse fim, convido para meus collaboradores o sr. presidente do conselho, o governo e os seus amigos politicos d'esta casa.
A minha convicção profunda, profundissima, é que o governo praticou um acto manifestamente illegal, tomando por si faculdades só do poder legislativo. Este acto podia considerar-se de dictadura se quizesse o governo pedir a necessaria absolvição, porque, obtida ella, teria o acto illegal legalisação posterior, resalvando por essa fórma o seu peccado original. Não o quiz fazer; e o motivo é o que se vê da declaração sincera, que eu lhe agradeço, do sr. ministro dos negocios estrangeiros, não deixar noa annaes da nossa historia constitucional exemplo tão damnoso a futuros dictadores.
Honrado escrupulo que, a não ser manifestado, ninguem presumiria n'aquelles que para não darem o exemplo de approvarem e ratificarem em dictadura um acto de tamanho alcance, que não trouxeram á approvação do parlamento, preferem concluil-o pelos processos de 1828 depois da acclamação dos tres estados. (Apoiados.} O processo é mais commodo, mas é mil vezes mais pernicioso o exemplo.
Como acto de dictadura as camaras tinham direito de discutir e de approvar ou rejeitar, como acto de poder absoluto haveria que promover, se o parlamento zelasse a sua dignidade, mas não ha que discutir.
Vista a insistencia do governo e vista a susceptibilidade politica dos seus amigos, attendendo principalmente ás revelações e considerações que ouvimos no brilhante discurso do sr. Senna, discurso pelo qual eu o comprimento cordealmente, porque s. exa. não tem só a minha admiração, tem tambem a minha sincera amisade, sendo certo que nem desejo crear difficuldades ao governo que está nem ao que vier relativamente á concordata, antes é meu desejo derimil-as, porque n'estas questões toda a politica é damnosa quando se torna partidaria e facciosa, venho solicitar uma concordata não dos meus amigos, mas do governo e da sua maioria.
Venho mostrar que não desejo crear difficuldades a ninguem nesta questão, pois venho diligenciar que procuremos de commum accordo um meio de revalidar o acto praticado pelo governo, de se approvar a concordata negociada com a Santa Sé, e infelizmente ratificada sem previamente ser submettida á sancção do poder legislativo.
Desejo, repito, encontrar uma formula que revalide este acto e não crie difficuldades nem a este nem a outro qualquer governo.
Para o conseguir consultei antes de tudo a minha consciencia, não de partidario mas de portuguez e de seu dictado escrevi esta nova proposta que trago formulada.
Deveria começar este meu segundo discurso, sr. presidente, por ler a nova moção; mas v. exa. me desculpará não o fazer, attendendo a que se assim procedo é para que fique bem sabido quanto previamente a quero tornar maior de toda a suspeição, fazendo-a assim bemquista de todos os dignos pares.
O sr. Osorio de Castro amigo do governo, quiz indicar-me um caminho que á falta de legalidade levava á legalisação; disse-nos que não era moção no rigor da palavra mas era um alvitre individual. Fosse o que fosse esse alvitre queria dizer, pelo menos, que o governo devia procurar um meio de sanar o seu acto abusivo.
Parece, sr. presidente, que todos têem receio de manifestar a sua opinião em assumpto tão melindroso, como este.
O digno par o sr. Osorio de Castro aconselhava amigavelmente o governo, sem o menor desejo de o hostilisar a que incluisse a concordata no bill de indemnidade que tem de apresentar ao parlamento. Depois até o conselho retirou!
Pois quer a camara e quer o governo que prevaleça este conselho?
A idéa não é minha, o conselho foi do digno par que acompanha o governo é que fez as declarações mais completas de adhesão á politica actual, e se o governo me disser que o acceita eu não mando para a mesa a minha segunda moção em substituição da primeira, retiro a primeira pura e simplesmente.
Se o governo entender, que sem desaire para a sua dignidade sem contradição para a sua marcha politica ou administrativa, a póde acceitar eu voto por ella e retiro a minha moção.
É possivel que n'este momento o sr. presidente do conselho não queira interromper-me para me dizer se acceita ou não este meu alvitre. Em todo o caso e aguardando a sua resposta eu peço licença a v. exa. para ler agora a minha moção, e depois veremos se qualquer d'ellas ou a minha primeira apresentada, ou a idéa do digno par o sr. Miguel Osorio, ou esta que vou ter a honra de ler ou ainda uma qualquer de melhor alvitre é acceita pela camara.
O que eu peço aos dignos pares, áquelles que acompanham devota e convictamente a politica do governo, é que empreguem todos os seus esforços para que sáiamos d'esta desgraçadissima situação.
O sr. Presidente: - Eu devo observar a s. exa. que o digno par, o sr. Miguel Osorio Cabral, desistiu da sua moção. Não sei se o digno par estava presente á sessão quando este facto se deu.
O Orador: - Foi simplesmente uma idéa apresentada pelo digno par; elle o disse e já o referiu. Pois bem, como por via d'elle essa idéa deve ser insuspeita ao governo e á maioria, não tenho duvida nenhuma de a acceitar desde que o governo a acceita tambem, e retiro a minha moção.
Na falta de resposta ou de acceitação do governo, offereço a que vou ler.
(Leu.)
O digno par o sr. dr. Senna, deve ficar satisfeito por ver que o seu conselho foi seguido.
(Continuando a leitura)
Eu não digo que approvo com louvor esta concordata, não o posso fazer, mas entendo que a dignidade da nação obriga muita vez os homens publicos a não desapproval
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actos do governo, embora tenham desejo de protestar contra elles.
Não posso dar mais provas de condescendencia á camara e ao governo.
Sr. presidente, a argumentação do governo é perfeitamente especiosa quando quer sustentar que a concordata de 1886 sendo uma consequencia da concordata de 1857, é apenas um acto de execução.
Eu sinto que não esteja presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros mas s. exa. não póde estar em toda a parte, está representado pelo sr. presidente do conselho, e muito sentindo a ausencia do seu collega tambem muito estimo que o sr. presidente do conselho esteja presente.
O nobre presidente do conselho é um jurisconsulto distincto, tem compulsado as leis e os codigos, e portanto, póde apreciar e ver bem como eu fundamento a minha argumentação, principalmente nos principios do direito.
O governo teve necessidade, dizem os seus amigos politicos, e eu sou echo dos seus seus amigos nesta occasião, "teve necessidade, repito, de acceitar as ultimas imposições de Roma, que consistiam em que dentro de tres mezes fosse approvada a concordata e ractificada.
O governo devia n'essa occasião convocar as côrtes, e não entro nas rasões por que o não fez, mas o que sei é que as camarás, convocadas para janeiro, furam adiadas, depois dissolvidas e fez-se um novo parlamento.
Haviam passado os tres mezes improrogaveis pela Santa Sé, e o governo para não perder este beneficio, tão apregoado pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros, usou de poderes que não tinha, approvando a concordata. Não averiguo agora se approvou porque não tinha côrtes ou se não quiz ter côrtes para poder approvar, furtando-se á sua fiscalisação.
Do que ninguem certamente duvida é de que eu sou amigo do sr. Mártens Ferrão como se póde ser amigo de um dos homens mais importantes deste paiz; todos sabem que conheço a sua alta capacidade e as suas eminentes qualidades; todos sabem e eu já aqui o disse, que elle alcançou tudo quanto podia alcançar ou antes que salvou quanto podia salvar-se do padroado portuguez na India, quando negociou a concordata. Faço esta declaração previa para que, ao expor opiniões em que não estou de accordo com o sr. Mártens Ferrão, não me attribuam a idéa de que pretendi melindrar sequer o eminente jurisconsulto e homem de estado, que tem a sua assignatura n'este documento. Não podia nunca ser essa a minha intenção.
Tambem não posso censurar o governo, porque acceitou a concordata que s. exa. negociou e que, como muito bem disse nos seus despachos, tem a responsabilidade de duas situações, responsabilidade que eu não regateio nem nego na parte que me pertence.
Nós não assignámos a concordata, é verdade, mas levámos longe a negociação. E a proposito podia já responder a umas advertencias feitas hontem pelo sr. Barros e Sá, que sinto não ver presente e sinto tanto mais quanto é provavel que incommodos de saude o privem de comparecer. Podia responder que a responsabilidade é de quem assigna, pois tem na sua mão rejeitar todas as negociações anteriores; mas não rejeito responsabilidades, acceito-as.
V. exa. vê perfeitamente que estou numa situação excepcional, politicamente fallando.
O partido regenerador não tem voz n'esta casa por ora, e, portanto, não posso fallar em nome d'esse partido. Fallo individualmente e só.
O partido regenerador não tem voz aqui por ninguem ter ousado ainda levantar a gloriosa espada que caiu ao pé do leito de morte do nosso chorado chefe.
Isto não quer dizer que não haja summidades no partido a que tenho a honra de pertencer, quer dizer que a consciencia de cada um se acanha de addir aquella herança, onde vêem grandes honras com grandissimas responsabilidades.
Por consequencia, a minha voz apparece isolada, sem os coros dos meus amigos, sem o applauso dos meus correligionario s3 e tambem sem a sua approvação.
N'estas circumstancias, que politica posso eu fazer?
O meu voto, ainda que fosse muito qualificado, será só um voto e esse nem espero nem desejo que seja n'esta questão molesto ao governo.
N'estes termos, posso estar divergente das opiniões do sr. Mártens Ferrão, sem suspeição de malquerença.
Refiro-me ás opiniões juridicas de s. exa., unico ponto em que estou discorde do illustre jurisconsulto.
A questão é esta: fez-se uma concordata e nos seus preliminares, e durante a negociação e finda ella, todos os documentos que o Livro branco nos apresenta dizem que era uma nova concordata que se estava negociando; dil-o o bom senso tambem; e eu pergunto aos meus collegas se aqui, nesta de 1886, não ha uma refundição completa, uma alteração essencial da de 1857? Ninguem ousará negal-o.
Agora ouça-me o sr. presidente do conselho:
Como pretende o governo justificar o modo por que procedeu approvando e ratificando a concordata sem attender a que approvar é acto exclusivo do poder legislativo?
Á falta absoluta de boas rasões entendeu que uma rasão má sempre é um argumento; e procurou a má rasão.
É passima, porém, e é de sentir que não achasse melhor. Vejamos:
Nós temos aqui uma concordata que nos tira em favor da propaganda a maior parte da grande area onde, pelas bulias dos Santos Padres, e ainda pela concordata de 1857, podiamos exercer o direito de padroado, com exclusão absoluta de quem quer que fosse. É verdade que para tornar effectivo esse direito havia difficuldades.
Dizia em 1857 o sr. Ferrer:
"Em vista d'este mappa (o do Indostão) teremos de organisar, pelo menos, quinze dioceses alem das que ficam designadas na concordata." (Que eram seis.)
Calculava, pois, e pelo menos, o sr. Ferrer, que a vastidão do territorio onde nos ficava direito, já então cerceado, de exercer padroado, dava para vinte e uma dioceses! Esta concordata de 1886 deixa-nos quatro, ou cinco se contarmos a de Macau, e todo o resto fica para os padres da propaganda!
Ora pergunto eu: a- concordata de 1857, que nos reservava todo aquelle territorio no oriente, é a mesma que nos deixa territorio para quatro dioceses no Indostão?
Será a mesma cousa esta concordata, que nos tolhe toda a expansão de futuro, que essa outra em que se nos reconhecia direito ao exercicio do padroado n'um territorio immenso, qual antes o hauriamos, apenas com excepção de Hong-Kong, Quamsi e Paulo -Penany?
Mas não temos agora só estas excepções, temos outras onde cabem trinta dioceses.
E será isto a mesma cousa?!
Não.
O proprio sr. Mártens Ferrão tinha disto a consciencia quando dizia ao governo que esta concordata cabia bem dentro da outra de 1857. Se cabia! E ficava ainda panno para mangas. (Riso.)
Se cabia e cabe dentro d'ella é porque é mais pequena, e muito mais pequena. (Apoiados.}
Depois d'isto, como vir eu pretender sustentar que a presente concordata não é mais do que a execução da de 1857?!
Realmente este argumento não é facil de subsistir n'um logar onde ha tantos jurisconsultos como ha na camara dos dignos pares da nação portugueza! A rasão da sua persistencia e successivas reproducções é homenagem prestada ao illustre negociador, que a suggeriu, e a cuja auctoridade se acoita sempre e invariavelmente o governo.
O Santo Padre fez muito mal em nos impor já em 1857
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as restricções que nos impoz. Não o inspirou já então o Santo Espirito, na escolha do seu quinhão de territorio.
Fez mal! e parece que foi escolher a dedo uns pontos no extremo oriente, onde não mora a porção melhor, nem a mais conversivel, da humanidade.
Sua Santidade ha de arrepender-se ainda da tripulação que, n'aquellas paragens, recrutou para a sua navegação piedosa, a perfidos marinheiros confiada.
Não quero dizer com isto que a barca de S. Pedro sossobre; mas ha de ver-se em graves riscos nos mares aparcelados do oriente, onde só nós lhe podiamos dar mareantes práticos e leaes. A barca de S. Pedro metteu piratas a bordo, principalmente desde 1857; e agora entregou sem condições o leme á propaganda, lançando ao mar o padroeiro portuguez. Ha de arrepender-se.
Affirmo-o! porque Portugal, muitissimo respeitado-no oriente, mais que a propaganda, tem sido sempre tambem mais respeitoso do que ella com a Santa Sé. Affirmo-o! porque antevejo os resultados desta politica de padres, mais damnosa para a religião do que para Roma, e mais damnosa para Roma do que para nós. (Apoiados.)
Como póde o governo dizer-nos que a ultima concordata é a execução da concordata de 1857?
Demos de barato que seja assim. Então desejaria que o sr. presidente do conselho me dissesse como é que, sendo esta concordata ultima um acto de pura execução, um acto de exclusiva competencia do poder executivo, com o qual nada têem as côrtes, o quizeram revestir de formulas constitucionaes, devidas sómente aos tratados propriamente ditos com as potencias estrangeiras? Para que approvaram e ratificaram? (Apoiados.} Se era acto exclusivo de execução não carecia d'essas formalidades, e se era um tratado, tinha e tem de ser approvado pelas côrtes, antes de ser ratificado pelo poder executivo. É formal a disposição do artigo 10.° do primeiro acto addicional á carta. A argumentação do governo não é sustentavel.
E não quero referir-me á concordata propriamente dita. Espero a occasião em que ella venha ao parlamento, e então a discutirei. Antes disso não a posso discutir sem incoherencia. O que posso dizer a s. exa. é, repito o que já disse, que esta concordata marca o penultimo acto do drama heróico que se intitula o padroado portuguez no oriente. Roma quer privar-nos do padroado em tudo que não seja as nossas possssões; a guerra ha de continuar. Preferiu ir já tomando posse das suas vinte e tantas dioceses, ver reconhecido um direito que nunca o fôra, e dar este compasso de espera ou de suspensão nas suas systematiças hostilidades. Em breve se ha de ver a verdade da minha prophecia. A Santa Sé, com mais ambição que reflexão, quiz levar de assalto este longamente premeditado esbulho, e o governo, com á sua já censurada reverencia humilde, censurada pelo proprio reverenciado, obedeceu e curvou-se, sem se lembrar do que o podiam accusar de traição. Assignou, approvou, ratificou e executou a concordata, com pressa que poderia parecer suspeita, se não parecesse forcada; mas deixando n'ella germens fataes de proximas difficuldades.
Eu já tive occasião de fazer algumas perguntas ao sr. ministro dos negocios estrangeiros sobre differentes pontos da concordata, perguntas ás quaes s. exa. não respondeu satisfactoriamente. O que elle mesmo confessou.
O artigo 1.°, por exemplo, tem uma redacção que pela primeira vez se emprega, e os padres não escrevem debalde ou indifferentemente uma phrase, uma palavra, uma virgula.
Nós tinhamos dois titulos de direito, que era bom não ter esquecido, nem o foram pelo illustre negociador portuguez. Tinhamos as bulias de muitos Pontifices, que nos reconheceram o direito do padroado sem limites, no oriente. Digo reconheceram, e não digo concederam.
Depois d'isso assignámos um contrato bilateral, que foi a concordata de 1857.
Tambem n'ella se fallava de reconhecimento e não de concessões.
Roma, a Santa Sé, não quiz respeitar nenhum d'estes sagrados titulos: nem as bulias nem o tratado. Esta falta de respeito pelo direito alheio, tão legitimamente adquirido e tão firmemente documentado, será um perigo para a Santa Sé porque será uma auctorisação a que lhe falto, com ella nos faltou, á palavra dada e auctorisada com a solemne referenda dos seus plenipotenciarios. Para nós é a duvida do dia de ámanhã. A concordata de 1857 era um contrato feito e concluido com todo o rigor das prescripções legaes; approvado pela nação, não em uma só mas em duas leis; e Sua Santidade recusou-se a cumpril-o;
Que certeza temos nós de que este ha de ser respeitado; este, que vae ficar falho de todas as garantias legues?
Os seis mezes para a apresentação do bispo nomeando, apresentação que fica pertencendo ao Rei de Portugal, pelo artigo 7.° da concordata, não se sabe de quando começam a contar-se. É tambem um perigo. Chamo para isto as attenções do governo. Que elle trate, se póde ainda, de sanar o inconveniente que d'aqui resulta e outros, que já tambem apontei.
A situação de Macau, por exemplo, é excepcional. Não se diz em parte alguma que seja suffraganeo aquelle bispado, da sé primarial de Goa, como era pela concordata de 1857. Antes parece não o ser por não vir mencionado onde se menciona Damão, Cochim e S. Thomé de Meliapor.
Se podesse pedir alguma cousa ao governo e, principalmente, se podesse pedir alguma cousa do futuro, pelo qual nem eu mesmo, que tenho formada a minha convicção, poderia responder, pediria que fosse esta a nossa ultima concordata; que nos deixassemos ficar como estamos, emquanto a Roma aprouvesse; não só porque não podemos lactar com a Santa Sé, emquanto officialmente sustentarmos o catholicismo como religião do estado, mas porque vivemos já hoje num paiz onde o sentimento do patriotismo e o brio de portuguezes parece ir desfallecendo a olhos vistos; e se esta questão se não levanta, e se não sustenta pelo sentimento, pela honra, pelo pundonor, pelo calculo tambem não.
Estou vendo aqui dia a dia, com muita mágua o confesso! o contrario do que se vê nas nações que teem vitalidade e virilidade. Um desfallecimento morbido ou uma indifferença criminosa. Vejo-o com grande amargura, principalmente quando partem vozes de desalento d'aquelles que deviam estar mais firmes no seu Togar e mais acrisolados no seu amor de portuguezes.
Quando uma guerra devastadora, ha pouco ainda invadiu a França, tambem do seu parlamento partiram grandes vozes de desalento. O resultado foi a aniquilação das suas forças. Vencida e esmagada, porém, quando os inimigos lhe lançaram uma enorme contribuição de guerra e, peior ainda, lhe tomaram uma porção do seu territorio, ninguem houve n'esse paiz que não protestasse entre as lagrimas e o sangue: "Havemos de reivindicar o que é nosso; custe o que custar". E pagaram de prompto, briosamente e generosamente todas as pesadissimas contribuições da guerra.
Mas a promessa de desforra ficou; existe, germina e não se desdiz.
É esse o perigo que ameaça hoje e sempre a França; é a reivindicação das suas provincias. Nobilissimo perigo motivado por esta heróica imprudencia de patriotismo!
Não estamos nós, desgraçadamente, sujeitos a perigos similhantes.
Quando perdemos alguma parte do nosso territorio, quando nos affrontam o nosso incontestavel direito, quando nos confiscam os brazões que os nossos maiores ganharam á custa das mais heroicas fadigas, não só se contesta que o exercicio do direito do padroado seja um monumento nosso de gloria, mas tem-se pena de que d'elle nos ficasse ainda algum resto fóra dos nossos dominios.
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É mais: pede-se que á camara seja cumplice d'esta exautoração.
Por isso eu peço ao governo, á este e aos que vierem, que se deixem de mais concordatas com a Santa Sé, porque em nossas discussões de hoje lhe temos dado argumentos que nunca antes tivera; (Apoiados.}
A discussão da camara dos pares sobre o padroado no oriente, está que vae correndo ha de ficar, infelizmente nos archivos parlamentares, porque não posso pedir á camara, nem ella me póde conceder, que sé queimem todas ás notas tachygraphicas e todos os discursos já impressos que rezem d'este assumpto miserando.
Estes discursos vão ficar eternamente nos archivos dá curia para com elles e por causa d'elles nos continuar a perseguir com a sua guerra sem treguas, a que, a falta de rasão, não faltam nunca pretextos.
Quero a opinião de todos, é a liberdade que a reclama; aprecio o voto livre e independente dos corpos legisladores, más sinto uma dor profunda quando comparo o brio de outras nações e à unanimidade do seu protesto, na presença de uma desattenção ou de um attentado com o estoicismo dos nossos poderes publicos e do nosso povo; indifferente para as cousas maximas e só inflammavel se porventura o é, para as secundarias ou para as minimas.
Emquanto outras nações juntam os seus partidos todos; n'um só partido - o da patria - nós respondemos a quem protesta contra a invasão que nos leva os nossos dominios ou desconhece os nossos direitos, que ainda é demais o que nos fica. (Apoiados.}
Á vista do que não fazem falta nenhuma os bispos portuguezes.
Para que viriam elles? Para continuarem os seus agradecimentos ao Santo Padre? Não é preciso. O digno par a quem me refiro agradeceu por elles a generosidade de Roma, (Apoiados.} ou, antes, não lha agradeceu, mas reconheceu-lh'a, confessando-a com mágua.
Estas questões são de sentimento?
Bem hajam os poetas que ás tratam com o seu coração é com o seu enthusiasmo. (Apoiados.)
No dia em que nós tivermos de inquerir quanto nos custa e quanto nós rende cada padre no oriente em terras do nosso padroado, n'esse dia o padroado deixa de ser uma honra e o Rei de Portugal deixa de ser padroeiro. N'esse dia abdicâmos, passando de cidadãos independentes à simples mercenarios.
Desde esse instante deixemos a outrem, que não a nós, a protecção das christahdades do padroado portuguez no oriente.
Antes d'isso, não. E é bem que nó meio d'esta Babylonia alguem diga cousa que todos entendam. Não é facil, bem sei, porque nós estamos na verdadeira Babel, senão de linguas, de opiniões. Babylonia, denunciada pelo digno pai o sr. dr. Senna, que se queixou de não comprehender como em volta do partido progressista se grupavam, tanto os homens de idéas mais adiantadas, como os de intentos mais retrógrados e reaccionarios; os que desejam ordens religiosas, e os que não querem padres para cousa nenhuma, nem missões, nem padroado, nem igrejas.
Tem rasão, o digno par.
E sabe v. exa. o motivo d'esta Babel?
Dizia já o grande tribuno portuguez: - José Estevão:
- É porque o baralho politico está mal enaipado. (Apoiados.}
Já o estava no seu tempo, quanto mais agora!
Ahi tem o digno par porque ninguem se entende n'esta Babylonia.
Pois não se ouviu ainda hontem o digno par o sr. Barros e Sá dizer que a culpa dos nossos desastres com a Santa Sé era devida aos governos de Portugal? (Apoiados.)
Ora isto, será tudo, menos fazer historia, como ella deve ser feita; isto é fazer historia ad usum.. . seja de quem for ou do que for, mas não é editar a verdadeira historia.
E á proposito de historia; eu vou, desde já, n'uma confissão difficil alliviar a minha consciencia embora á custa da minha reputarão. Vou dizer á camara e a v. exa. que para mim não houve nunca um homem mais respeitavel como historiador do que Alexandre Herculano; pois bem, é d'elle a culpa principal da maior parte das historias que hoje andam em curso a respeito dos nossos feitos no oriente. Desde que elle escreveu é prólogo do Roteiro de D. João de Castro, em que dizia - que estavamos pagando em seculos de ignominia (salva á redacção), os seculos de crimes commettidos mo oriente, todos se julgam auctorisados á denegrir, á titulo de imparcialidade; os feitos dos seus maiores.
Ora n'isto não ha, nem justiça, nem verdade historica.
É verdade que os seus seguidores pregoam como um dos mais gloriosos nomes ou, antes - entre os poucos gloriosos nomes, dos capitães da India o de D. Francisco de Almeida, bem o ouvimos ao digno par o sr. Fernando Palha; pois justamente foi esse um dos soldados mais crueis, na orientação do prologo do citado Roteiro, que governaram á India.
Ninguem desconhece á sua historia, e, principalmente, à sanha feroz com que vingou o desastre de Chaul, onde ficou morto o moço D. Lourenço de Almeida, seu filho, uma das mais brilhantes figuras dás nossas epopeas orientaes.
Era tambem a necessidade politica de, pelos methodos d'aquelles tempos, e d'aquelles paizes impressionaveis, se manter, pelo prestigio do valor e do arrojo heróico, o que não podia sustentar-se pela força numerica em regiões tão afastadas.
Não é assim que se faz historia, repito, é muito menos se faz no parlamento; menos ainda n'esta camara, onde se acham porventura representadas tradições, cuja honrada memoria sempre tivemos por sagrada.
Tenha paciencia o digno par; isto prova o muito que eu estava attento ao seu discurso e quanto aggravou a mágua de o ouvir a sympathia que lhe consagro.
Pois póde dizer-se com verdade, que Affonso de Albuquerque, D. João de Castro, D. Francisco de Almeida, Duarte Pacheco, Mascarenhas, os condes da Vidigueira, de Alva, da Ega e de Alvor, e tantos outros não fizeram na India mais do que descobrir mercados de especiarias?
Oh! sr. presidente, honrados merceeiros! nobres merceeiros! na verdade! (Apoiados.) Mas é bom que se saiba por quem é preciso completar esta singular historia, que esses mercadores tiveram por commis voyageur, por caixeiro ambulante, quem, sr. presidente? Um homem, - um padre chamado Francisco Xavier! uma das maiores glorias de Portugal, - o apostolo das Indias. (Apoiados.)
- Nobilissimos commerciantes de cravo e de pimenta servidos por tão illustres caixeiros! faz honra e dá gloria pertencer á patria que foi vossa, mesmo assim amesquinhados como sois.
Sr. presidente, eu não posso ver amesquinhar as grandezas da minha terra; não descendo, creio, de nenhum d'estes homens tão grandes, mas quando a elles tenho de me referir, digo sempre com muita ufania e com verdadeiro orgulho: - "Os nossos maiores". - Que é honra ser da terra que elles illustraram tanto. (Apoiados;)
Voltemos á injustiça do digno par õ sr. Barros e Sá, donde me desviou a presença do sr. Fernando Palha.
"N'estas questões do padroado são os governos de Portugal os culpados da nossa decadencia", dizia o digno par.
É falso. A cada qual a responsabilidade que lhe compete. É falso.
"Estivemos treze mezes sem responder a uma carta de Sua Santidade o Papa Pio IX ao Rei", dizia hontem o digno par.
Pois ainda bem!
Não ha signal de maior respeito do Rei Fidelissimo ao chefe da Igreja, que não responder áquella carta; não ha
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signal de maior respeito para com o Summo Pontifice, dó que deixar sem resposta aquella carta.
A resposta, se fosse immediata, podia ser cruel.
Uma carta em que se ousa vir dizer-nos que, sé quizer-mos alguma cousa de Roma, havemos de despojar-nos de todos os fructos da nossa gloriosa revolução liberal, renegar todos os principies, rasgar todas as leis que na liberdade se inspiravam!
Pois isto diz-se a um paiz que se preza dás suas tradições, da sua nobreza do seu espirito patriotico, e das suas conquistas liberaes?
Isto hão se diz 5 e quando ousa propor se, é signal de respeito não responder.
A culpa é dos governos de Portugal? vamos ver.
A Santa Sé quer ser discutida. Eu sinto o pelo respeito que lhe é devido e sempre se lhe tributou. Porém, como nos faz um peccado da nossa reverencia humilde e como nos diz que tudo d'ella dimana e nada da propaganda!!! proseguiremos constrangidos mas obedientes á sua indicação.
Comtudo, podia provar com os documentos que tenho aqui e os que estão no Livro branco, que tudo ou quasi tudo quanto se adduz ou se faz contra os nossos padres, contra as nossas christandades e contra os nossos direitos, é quasi exclusivamente da propaganda.
Aquelle memorandum, mesmo onde eramos arguidos de reverencia humilde com que tratavamos o Santo Padre, e dá propaganda; e hão é já original, é cópia. Tudo aquillo ou quasi tudo se encontra n'um jornal da propaganda, intitulado: Resegna italiana, e tem a assignatura bem conhecida de Eduard Soverini.
Aquelle memorandum é uma reproducção dos artigos d'aquelle propagandista; mas a Santa Sé mostra-se ciosa de não ser directamente discutida e põe a thiara na cabeça da propaganda; não ha senão dirigirmo-nos a ella. Eu fal-o-hei sempre com respeita; seguindo a velha usança, não já dos nossos governos liberaes, mas dos nossos Reis, no tempo em que elles regiam é governavam, como logo mostrarei, com respeito mas com dignidade.
Pois então os governos de Portugal têem a culpa de todos, os malogrei com a Santa Sé?
Será para se lisongear o Papa que se diz isto, ou para fazer historia ad usum... propagandae ?
O que é com certeza é um symptoma de decadencia, bater nos nossos para lisonjear estranhos.
Ha um facto historico, que vem aqui muito a proposito.
Quando Napoleão I teve varias conferencias em Bayona com Carlos IV, estava este monarcha velho, tropego e dementado.
A sua augusta consorte era Uma senhora, decaída tambem, um pouco pela idade e muito pelos habitos pouco ré guiares da sua vida de soberana, meio beata, meio mundana.
Tinha-se dado a celebre revolta de Madrid em maio de 1808, na qual os soldados francezes haviam sido maltratados; porque a usurpação napolionica, em projecto, do throno dos Reis Catholicos foi tolerada pelos Reis, mas nunca pelo nobre povo hespanhol. Queixava-se da revolta em termos acres o grande Imperador,
imputando-a aos velhos Reis desthronados, que o ouviam trementes.
Assustados d'aquella ira, mais simulada que real, do vencedor dos Reis, chamaram á sua presença o seu filho, que era e tornou a ser depois Fernando VII, e na presença de Napoleão, a quem chamavam seu amigo, seu patrono e seu generoso vencedor, attribuiram a revolta ao filho, chegando o pae a erguer sobre elle a bengala, que lhe servia de encosto, e assim a mão, que rara vez o abençoára.
Isto no meio de convicios e affrontas nada proprios de tão altas categorias.
Napoleão, refere Thiers, retirou-se enjoado d'esta scena e monologando: "Que pae! Que mãe! Que filho!"
Os dignos pares, que accusam exclusivamente os governos de Portugal da perda do padroado no oriente, fazem como Carlos IV e sua augusta esposa: levantam a mão é o açoite sobre os seus ministros, degradando-os e degradando se, para lisonjearem o Pontifice, que aliás se mostra enjoado da reverencia humilde com que o tratam.
Este caminho não é o meu.
Não lisonjeio ninguem, mas não consinto que, injustamente, os poderes publicos do meu paiz, que officialmente o representam, sejam, em homenagem a estranhos, enxovalhados pelos seus. Isso não!
É preciso fazer historia como ella deve ser feita, e não ad usum. É preciso contar os factos conforme elles se passaram e não a sabor de ingratas phantasias.
Sr. presidente, de quando data esta lacta entre Portugal em favor dos seus direitos e a côrte de Roma, os seus commissarios, os seus padres, os seus frades, os seus vigarios apostolicos, os seus cardeaes, e os seus bispos in partibus contra nós e contra o nosso padroado?
Desde quando? É de hoje? Não. É de 1834? Não. É da concordata de Í857? Não; e quem o disser, ou desconhece ou escurece a historia.
Se nos lisonjearam e exaltaram muito emquanto eramos os unicos a ter a força, o prestigio e a auctoridade n'aquelles paizes longiquos do oriente, essa reverencia durou pouco. Os navios aventureiros dos nossos navegadores e conquistadores deixavam atraz de si uma longa esteira luminosa, e, seguindo a, todos podiam aprender o caminho para a India.
Roma teve conhecimento pelos seus padres e pelos nossos presentes das riquezas d'aquelle mundo, e dos vendilhões do templo se fez a sacra companhia das Indias, hoje conhecida pelo nome de propaganda. Desde então começou a milicia romana uma guerra sem treguas contra nós; guerra desigual, guerra fatalissima para nós e mais ainda para a religião, e para elles.
O tempo me justificará.
Vem de muito longe a guerra, nem sequer disfarçada na sua preceituada mansidão evangélica, nas fórmas, ao menos, e nas palavras. Nem isso.
O excepto do memorandum que citei e se lê no Livro branco é nada, em relação a outros documentos.
De longa data os Papas, mesmo referindo com reverencia tambem os nossos serviços á Igreja, nos teem dirigido injustas e pouco paternaes palavras; mesmo quando estamos em boas relações officiaes.
Um exemplo basta para se ver a benevolencia que á Santa Sé devemos j nós, ruim catholico, mais do que obediente, - evangelisador.
Alexandre VII, o Papa Alexandre VII, creára varios vicariatos apostolicos na India. Portugal protestara e Roma respondia ao protesto:
"Póde dizer-se que ainda que fosse concedido aos portuguezes o padroado das Indias (esta duvida honra a Santa Sé) não teria agora comtudo nem vigor nem rasão de ser... porque sendo esta a maior servidão que possa acceitar a Igreja de Deus, não concede a conservação dos referidos padroados senão em attenção á summa protecção que póde esperar dos padroeiros (onde ficaram as bulias que nos concediam a perpetuidade incondicional do padroado?. ..) Ora assim como esta suprema protecção da parte dos Reis de Portugal se achava "no seu vigor ao tempo em que se diz ter-lhe sido concedido o indulto" (Isto é defeito do traductor) "acima mencionado, por Leão X, sendo então os portuguezes poderosissimos nas Indias, amados e respeitados por todos, CONDIÇÕES QUE HOJE LHES FALTAM ABSOLUTAMENTE ..." Não careço de ler a conclusão do periodo; careço, porém, de protestar contra esta asseveração, que não é exacta, que é injuriosa e malevola. (Apoiados.)
Tambem Roma faz historia para seu uso; mas lá não é novidade.
Não somos poderosissimos como a omos nas Indias orientaes, mas amados e respeitados somos e sempre o fo-
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mos. Sem isso não teriamos sustentado esta lucta desigualissima de seculos com Roma; sem isso não haveria os rogos que se ouvem dos christãos do nosso padroado, que não querem ser da propaganda; sem isso não nos deixaria igrejas e dioceses, agora mesmo, fóra dos nossos dominios. (Apoiados.) Sem isso não seria preciso que nas escolas primarias inglezas e nas da propaganda fossemos dia a dia injuriados e calumniados.
Amados e respeitados somos, incontestavelmente, na India.
Porem, são estes os comprimentos que nos dirigia o Papa j Alexandre VII. Vem n'elles compendiada a justiça de j; Roma para com Portugal.
Estranham alguns dignos pares que o catholicismo dos nossos padroadistas de Ceylão se apegue mais á corôa de Portugal do que á mitra de Roma. Se na sua mente entram duvidas sobre a pureza e a orthodoxia das crenças religiosas dos ceylonezes, uma cousa ha que não póde entrar em duvida, e com a qual os dignos pares deviam exultar: o seu amor por a nossa patria, o seu orgulho de poderem chamar-se portuguezes.
Esses povos de Ceylão, que ainda hoje, mal ou bem, faliam o portuguez, apenas estiveram sob o nosso dominio menos, de um seculo; sendo depois tomada a ilha pelos hollandezes, e mais tarde pelos inglezes, obtiveram que se conservasse ainda o portico de uma fortaleza construida por nós.
Foi o caso que os dominadores de então, querendo melhorar o systema de defeza da sua ilha, deitaram abaixo as muralhas das nossas fortificações; os habitantes assistiam compungidos a essas demolições, mas pacientes e mudos. Quando, porem, os demolidores attingiram o portico, encimado pelo brazão das quinas, os ceylonezes protestaram em altos brados: "Tirar as armas, não, que são as nossas armas!"
E os nossos inimigos respeitaram, mais do que a Igreja - a santa mãe -, mais do que o governo portuguez, que devia ter orgulho d'este affecto, os brados da boa gente de Ceylão!
Quando algum portuguez desembarca nos portos da ilha, e o ceylonez escuta a sua linguagem, approxima-se d'elle, declarando-lhe que tambem é portuguez, e trata-o com os maiores obséquios e distincções.
Estes e outros factos darão porventura ensejo a folhetins graciosos, a desdens scepticos de utilitarios e realistas, que alguma cousa hão de ter feito as novas escolas que andam a doutrinar, ou a envenenar os povos, no intuito de os desligar das suas tradições, obliterando n'elles a consciencia dos seus deveres. Engeitem, engeitem ou calurnniem as nossas glorias passadas, engeitem ou desprezem as glorias ainda presentes, que eu teimo em ficar-lhes fiel na excentricidade do meu patriotismo, protestando contra essa criminosa indifferença, e desejando que o governo, sem lho pedir, envide todas as suas forças para resgatar esses fieis do poder dos infieis, ou de fieis superiores, que, em vez de os amarem, pretendem subjugal-os; fazendo votos por que Roma accorde a tempo de fazer justiça.
É nossa a culpa das invasões da propaganda? Este era o assumpto de onde por mais de uma vez me desviei. A elle volto, e peço desculpa das minhas digressões.
Não leu a camara os documentos publicados no Livro branco? Não viu n'elles a mais completa defeza, n'este ponto, dos governos de Portugal? Não é preciso buscar outros documentos para nossa plena, ainda que dolorosa justificação; basta o Livro branco, e n'elle o celebre memorandum que acompanhou a nota do cardeal secretario d'estado, de 15 de abril de 188o, para mostrar ao paiz se os nossos damnos no padroado das Indias são devidos á nossa incuria, se á sanha implacavel da propaganda e de Roma.
Vamos ler a paginas 67, ainda no memorandum:
"... Antes de continuar seja-nos permittido reflectir como do que fica referido se vê que não foi só um ou dois Pontifices que por caso extraordinario tiveram de resistir ás pretensões dos ministros do Rei de Portugal e do partido goano, mas uma longa serie d'elles; QUATORZE PAPAS NO DECURSO DE DOIS SECULOS LUCTARAM CONTINUAMENTE POR ESTA CAUSA."
V. exa. ouviu, sr. presidente? QUATORZE PAPAS, por espaço de DUZENTOS ANNOS, é Roma que o confessa, quatorze papas, continuamente, no espaço de duzentos annos, luctaram contra o nosso direito. Vem contados n'este memorandum esses prelados, um a um, e tenho aqui a lista; vem contados desde. Clemente VIII até Gregorio XVI. Faltam dois; é preciso completar a lista: falta Pio IX e falta Leão XIII. Ao todo dezeseis Papas e mais de duzentos annos, e a culpa sempre nossa!
Em 1580 perde-se a nossa independencia; entram na India os theatinos e os carmelitas, vanguarda da, propaganda, e é culpa de Portugal. Em 1640 reconquistámos a independencia, que Roma só reconhece finda a guerra dos vinte e oito annos em 1668; quasi um seculo em que Roma ia tomando posse de todo o nosso padroado, talvez tambem por culpa nossa. No reinado de D. João V, ora rompimento de relações com Roma, ora predominio absoluto de Roma! No reinado de D. José, a lucta com os jesuitas e com Roma; e Roma governando contra nós e a pesar nosso, nos negocios ecclesiasticos de Portugal, e mais ainda nos do oriente; que tudo isto se passa n'aquelles dois seculos que a propaganda mediu. No reinado seguinte o predominio absoluto de Roma, pelo beaterio da Rainha. Depois, por motivo da invasão franceza, a saída da côrte para o Rio de Janeiro. Em 1828, a côrte de Roma mal com o senhor D. Miguel; em 1832 mal com o senhor D. Pedro; em 1834, com a senhora D. Maria II.
No intervallo das nossas desavenças pretendiamos prover de prelados as nossas dioceses; Roma não confirmava; tenho aqui tambem a lista dos bispos que nomeámos e que Roma não quiz confirmar. Quando em 1843 conseguimos ter um arcebispo em Goa, feita a paz com Roma em 1842, o Papa quiz que elle desprezasse as bulias da sua confirmação e se regulasse pelos breves expedidos pela propaganda; e porque o não fez o censurou publicamente.
Conseguimos depois de todos estes vexames fazer a concordata de 1857; n'ella perdiamos uma parte dos territorios sujeitos ao padroado; n'esta parte sim, executou-se a concordata, no resto não, porque Roma não quiz nomear commissario para a circumscripção das dioceses, depois da morte do arcebispo de Carthago. Tambem seria por culpa do governo portuguez, que Roma censurou o arcebispo Torres, e não quiz cumprir a concordata de 1857?
E não quero fallar dos breves Studio et vigilantia. Multa prcedare, Probe nostis e outros, mais que manifestos testemunhos da malevolencia da propaganda para comnosco e da benevolencia de Roma para com ella.
Diz-nos o sr. Barros e Sá que não são para contar-se as humilhações porque passaram os governos de Portugal para rehaver aqui a representação de Roma. Não me consta; senão das luminarias dos fieis, e principalmente dos beatos á chegada do nuncio; o que não é de espantar num paiz catholico que rejubila com a paz firmada entre o seu governo e a Igreja. Se houve humilhações lamento-as e censuro a fraqueza de quem as praticou.
Foi sem treguas a guerra de Roma contra o nosso padroado, e guerra desigualissima; pois que nos accusavam de falta de padres, não nos consentindo bispos; pois que nos negava as bullas emquanto es tiveram escondidas e, depois que appareceram, a efficacia dos seus preceitos; pois que dava aos nossos prelados bulias ostensivas, e queria obrigal-os a faltarem ao padroeiro, bandeando-se com a propaganda; pois que, obrigando-nos a firmar a concordata de 1857, só no que perdiamos como ella esteve Roma pela sua execução, faltando em tudo mais á fé dos tratados, e negando-se tenazmente até a dar ao arcebispo de Goa as precisas jurisdicções, a que se tinha obrigado, as essen-
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ciaes e indispensaveis, ao passo que as davam exageradas aos seus vigarios apostolicos; guerra desigualissima que tinha por fim encerrar-nos dentro do territorio de Goa e obrigar-nos a assignar um tratado em que pela primeira vez se reconheceu direito de fundar dioceses na maior parte da India, sem pertencerem ao padroado portuguez.
Por tudo isto eu peço e espero que seja esta a ultima concordata. Que nos levem o que é nosso, visto que, sendo paiz catholico, a lucta com Roma é impossivel, mas não sejamos cumplices no attentado.
Os inglezes, - e não se imagine que vou dizer mal de Inglaterra, ou que tenho menos boa vontade a esta nação. Os dignos pares, que amam entranhadamente a Inglaterra, podem guardar sem sobresalto os seus affectos.
Os inglezes consta que tiveram influencia na terminação, um tanto brusca d'esta concordata.
É possivel, uma vez que se tratava de estabelecer auctoridades catholicas nos seus dominios indiaticos; e até me não admiraria que, uma vez por excepção, uma nação protestante valesse mais ante o Santo Padre que um povo catholico.
Fallo n'esta circumstancia para lembrar ao sr. ministro dos negocios estrangeiros que lhe pedi uma hora de sessão secreta, se em sessão publica nos não quizer dizer tudo o que parece saber.
Desejo saber, e a isso tenho direito, que notas houve de Inglaterra, que protestos e que estorvos a que levasse-mos por diante a nossa negociação, até ao ponto de salvaguardarmos todo o nosso direito.
Antes d'isso não tenho nada que dizer, custando-me a acreditar que a nossa fiel alliada concorresse, directa ou indirectamente, para nosso prejuizo, que se offerecesse para a execução capital effectuada em Roma e tão fielmente reproduzida aqui hontem pelo digno par e meu amigo o sr. Barros e Sá.
Teve s. exa. principalmente um momento de inspiração sublime.
"Não assignámos uma concordata, exclamava o digno par no cumulo da sua dôr, assignámos uma capitulação."
É verdade!
E em que circumstancias?
O quadro não é meu, é ainda do digno par o sr. Barros e Sá:
"Portugal tinha enrolada ao pescoço a extremidade de uma corda e pela outra extremidade puxava a mão inexoravel e rude do cardeal Jacobini." (Apoiados.)
(Interrupção que não se ouviu.)
Devia saber, devia saber.
O quadro é de mestre e o auctor é insuspeito ao governo e a Roma.
Eu por mim, tão verdadeiro acho o desenho, que sinto os vergões da corda... principalmente no pescoço do governo.
Já disse aqui, e repito, que vamos sendo em demazia um paiz de attentos veneradores. Entrámos no systema das cedencias; ha muito tempo que não fazemos outra cousa; e quando queremos reagir vem-nos aconselhar aquelle romance portuguez, tão conhecido e tão justamente estimado, do sr. Arnaldo Gama, O sargento mór de Villar.
Quando as ordenanças do alto Minho foram esperar as forças invasoras de Soult, ao vel-o entrar prepararam-se para lhe fazer fogo; acudiu, porem, a prudencia do sargento mór dizendo encareci dam ente aos seus soldados:
"Não atirem, demonios, que se assanham!" (Riso.)
Assim fazemos nós ha longo tempo. Ha muito seguimos o systema de não assanhar ninguem. É muito prudente, mas seria agradavel que uma vez por outra cedessemos de ceder.
Não quero dizer que os outros não cedam nunca.
Tambem o Santo Padre cede do cumprimento dos seus deveres, em favor do que chama - os seus direitos.
Quando o Santo Padre, o chefe da Igreja, achou tantos meios de se desligar do cumprimento da concordata de 1857, que farão os outros Reis, que não são Papas!
O exemplo é fecundo; e tambem não é original.
A proposito de falta de cumprimento de contratos bilateraes:
No tratado da entrega de Bombaim, ou antes no que respeita á sua execução, ha cousas mais extraordinarias do que essas que hontem nos apontou o sr. Barros e Sá.
Exemplo:
O governador Antonio de Mello de Castro ia para a India, ao contrario do que se julga e escreve, na intenção, e com instrucções precisas do governo, de entregar Bombaim aos inglezes. Como não havia em Portugal n'esse momento esquadra digna de um viso-rei e os inglezes tinham pressa, foi a bordo de um navio inglez, escoltado por outros navios de guerra inglezes, não levando por isso o titulo de viso-rei, mas de governador geral.
Nas costas de Africa oriental, proximo de Moçambique, recebeu Antonio de Mello a noticia de que os hollandezes estavam cercando e bombardeando Cochim. Como as clausulas do tratado obrigassem os inglezes a ajudar-nos na defeza das nossas possessões, o governador da India reclamou do almirante que desviasse o rumo de Bombaim para Moçambique, a fim de libertar a praça portugueza; pois o almirante desprezou a requisição do governador e fez-se de véla para Bombaim.
Era uma violação flagrante do tratado, em virtude do qual se ia dar aos inglezes, não posse de Bombaim,- mas, verdadeiramente, da India.
Isto deu em resultado uma grande resistencia da parte do governador, que levou tres annos para lhe entregar Bombaim. E não fez só isso, porque n'esse tempo ainda se luctava, e cedia-se apenas ante o direito e a justiça, ou extenuado na lucta.
Antonio de Mello de Castro, como visse que as communicações que enviava para o reino iam primeiramente á mão dos inglezes, que de toda a sua correspondencia tinham conhecimento antes que o tivesse El-Rei, lembrou-se de mandar á metropole um padre, que se chamou Manuel Godinho, que veiu a pé pela costa da Arabia a Portugal com representações do governador a Sua Magestade, para ter a certeza de que ás mãos do soberano chegassem confidencialmente. Propunha o governador o resgate de Bombaim a dinheiro de contado, que para tanto se offereciam os habitantes da cidade; quando porem o fidelissimo padre chegou ao reino já estava concluida a entrega de Bombaim aos inglezes.
Nunca se soube o que este padre veiu fazer a Portugal. A academia real das sciencias diz no prologo da ultima edição do roteiro da sua penosa viagem ignorar-se o motivo d'ella.
O motivo foi este, que deixo referido. Acham-se os respectivos documentos no archivo da secretaria geral do governo da India, onde os encontrei.
Dada a posse da cidade, que era só a que havia a entregar-se-lhes,
apropriaram-se acto continuo da ilha de Salsete, que lhe é contigua, ilha a que no seu ultimo discurso se referiu o digno par, o sr. arcebispo resignatario de Braga. Quando se lhes fez notar que tinham tomado o que lhes não pertencia, responderam: que nas marés baixas se passava da cidade, para a ilha a pé enxuto por uma restinga de areia!
Aqui está o que valeu para os senhores inglezes o tratado a que o digno par o sr. Barros e Sá se referia e como elles o cumpriram.
Não fallo já do porto e cidade de Columbo que deviam restituir-nos e nunca restituiram.
Tratados!
Quanto aos jesuitas que o digno par, o sr. marquez de Rio Maior aqui apresentou como grandes doutrinadores, dando como prova que lá tinham seus filhos o sr. ministro das obras publicas e o sr. Dias Ferreira, é preciso que
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se saiba (e deve sabel-o o sr. dr. Senna, que tanto se occupou d'elles) que os jesuitas de tudo sabem, até fingir que o não são, segundo as pessoas cuja educação se lhes incumbem: tanto o sabem que de certo não educam os filhos do sr. ministro das obras publicas, ou os do sr. Dias ferreira da mesma maneira que educam ou podem educar outros discipulos.
Fazem-se tudo para todos: Omnibus omnia factus sum.
E aqui é justo dizer-se que os nossos melhores missionarios no oriente foram os jesuitas. (Apoiado do sr. marquez de Rio Maior.)
Obrigado pelo apoiado, mas ouça v. exa. até ao fim que talvez não continue a apoiar-me.
Não basta dizer os serviços que a principio nos prestaram, é bom saber tambem a paga que nos deram.
Os jesuitas prestaram grandes serviços ao catholicismo, principalmente na China. Haviam já conseguido do Imperador o direito de pregar a religião catholica em todo o imperio, com a só condição de que não prohibiriam o culto quasi religioso que no celeste imperio sé presta a Confucio, e de consentirem que continuassem a respeitar-se as inscripções dos antepassados dos chins nos logares sagrados. Era a questão dos ritos chihezes, cujo respeito os padres prometteram, como culto civico, approvando esta resolução, como approvou a Santa Sé.
Como, porém, a China começasse a entremostrar-se aos padres um paiz encantado, de opulencias e maravilhas, veiu a ambição tental-os, e, sob o pretexto de que não era muito catholico o culto de Confucio e o dos mortos, determinaram em Roma mandar logo á China alguem como visitador apostolico, e aqui veiu a celebre historia do arcebispo de Antiochia, depois cardeal de Tournon, legado a latere de Sua Santidade, que foi para lá pôr em desconfiança o imperador, que o expulsou dos seus estados, de onde veiu para Macau excommungar toda a gente, no que fez um mal extraordinario, ao catholicismo, pelos escandalos que produziu, e ao padroado portuguez mal não menor pelas tremendas luctas em que se empenhou.
O patriarcha de Antiochia entrou na India e na China sem respeito aos direitos e privilegios do real padroeiro, impondo a sua jurisdicção conferida pelo Papa, más não reconhecida pelo Rei de Portugal.
Ahi começa, abertamente agora, a rebeldia de Roma contra o padroado. Vou ler a v. exa. um novo trecho de historia editada em Roma, tambem ad usum propagandx.
Aqui o tenho n'este famoso Livro branco.
É bom que alguem defenda Portugal, visto que todos o têem atacado, e até os seus pares o não poupam, e já que os governos não podem reagir contra este poder enorme e incontrastavel, porque actua sobre as consciencias.
É de todos conhecido como Clemente XI, querendo pôr termo ás dissenções levantadas nas missões do oriente, ácerca dos ritos chinez e malabar resolveu enviar, na qualidade de legado a latere, monsenhor de Tournon..., pedindo a
El-Rei D. Pedro de Portugal protecção para o legado e seu sequito, e escrevendo ainda ao arcebispo de Goa para que o recebesse fraternalmente e lhe tornasse facil o desempenho da sua missão. Porém as auctoridades portuguezas, não só lhe negaram esta protecção, mas uniram-se os seus inimigos".
Parece que Roma procedeu regularmente; respeitando as prerogativas da corôa de Portugal e que nós faltámos ao que deviamos ao chefe da Igreja. Pois bem; vamos a ler um trecho da mesma historia em edição correcta e decida-se imparcialmente de que lado está a verdade.
Já que não podemos defender o nosso direito, acudamos pela verdade.
Aqui está um documento não contestado, originario da India.
Tem, por titulo Relação sincera e verdadeira do que fez, pretendeu e occasionou na missão da China e em Macau o patriarcha de Antiochia, Carlos Thomás Maillard de Tournon. Encontra-se impresso no Chronista do Tyssuary, pelo sr. Riyara, fidelissimo colleccionador de documentos historicos do oriente. Aqui vem minuciosamente narrada a historia do cardeal e das suas gentilezas no oriente.
Tanto que a sagrada congregação de propaganda fide começou a mandar vigarios apostolicos ás missões do padroado de Portugal começou tambem El-Rei a defender o seu direito.. ".
(Interrompendo a leitura.)
Era bom que o digno par o sr. Barros e Sá ouvisse esta leitura para não accusar o seu paiz com tanta violencia.
(Continuando a leitura.)
"... a defender o seu direito, ordenando aos viso-reis da India que não permittissem que os vigarios apostolicos e missionarios, não vindo por Portugal, entrassem nas missões do real padroado, e muito menos que tivessem juridicção nas terras do dominio de Portugal. Estas mesmas suas ordens renovou El-Rei quando soube que, contra sua vontade, se mandavam novamente de Roma muitos bispos e vigarios apostolicos para a China. Depois d'isto (note bem a camara) o Santissimo Papa Clemente XI pelo padre Antonio do Rego, jesuita (que então suppria as vezes de residente de Portugal em Roma) deu noticia a El-Rei de que mandava o patriarcha de Antiochia com officio de visitador apostolico para a India e para a China. É isto escreveu tambem é mesmo patriarcha a Sua Magestade. Recebendo El-Rei esta noticia escreveu ao Papa em 27 de março.... "
(Interrompendo a leitura.)
Note-se que emquanto o Papa encarregava um padre jesuita de participar ao Rei de Portugal a nomeação do seu visitador, nomeação motu proprio, pura é simples sem respeito ás reaes prerogativas, o Rei de Portugal escrevia-lhe directamente.
(Continuando a leitura.)
"... escreveu ao papa em 27 de março de 1702 uma carta, na qual dava o seu consentimento, quanto á pessoa do patriarcha, pedia porem a Sua Santidade que, antes de o patriarcha partir para à Índia se lhe communicassem a Sua Magestade os poderes que levava, na fórma que se praticava com os nuncios; para ver se entre elles levava alguns que offendessem o seu padroado e regalia, aliás que seria difficultoso conseguir o patriarcha o fim da sua jornada. O mesmo, ainda mais expressamente dizia, El-Rei na sua resposta ao patriacha. E logo (são as suas formaes palavras) que Sua Santidade se digne de se inclinar ÁS MINHAS REVERENTES SUPPLICAS, ordenarei ao meu viso-rei da India e a todos os meus governadores e generaes, cabos e vassallos d'aquelle estado que vos franqueiam os passos, etc."
Pelo que respeita ao arcebispo de Goa, D. Frei Agostinho da Annunciação, temos uma pastoral onde se lê: que tendo-lhe a igreja Catholica confiado todas as chiristandades do Cabo da Boa Resperança até á Tartaria, devia não permittir que alguem entrasse n'ellas com jurisdicção, por qualquer titulo, sem primeiro fazer patentes as suas bullas e poderes... e que o sr. Carlos Thomás, intitulando-se patriarcha de Antiocha e legado a latere, se quizera introduzir nas chistandades da India, alterando os costumes d'ellas, promulgando censuras no bispo de Meliapor, declarando por excommungados os parochos de Madrasta, perturbando as christandades, intromettendo-se na China, nos bispos do padroado real, impondo prefeitos dos bispados aos senhores bispos, intendo prover os bispados vacantes nos mesmos padroado, derogando as prerogativas da corôa e obrando tudo sem publicar as bullas e poderes, etc.
Eisaqui resposta á verdade; eis como já no principio do seculo XVIII Roma nos fazia a guerra; até ahi sobrepticias, disfarçada, hypocrita; agora violenta, aberta, declarada. Quem a tal sanha resiste por mais de duzentos annos, resiste muito e bem. Agora na phrase realista do digno par o sr. Barros e Sá, veiu o cardeal Jacobini puxar
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a corda que nos lançára ao pescoço? Agora no dizer de s. exa., assignámos uma capitulação? Não é vergonha, depois de duzentos annos de assedio rigorosos
E agora,- na presença d'aquellas - reverentes supplicas do proprio Rei, póde alguem estranhar que os governos de agora tenham para com a Santa Sé uma linguagem reverente?
Foi sempre este o nosso estylo.
E, a dizer a verdade, como é que se ha de tratar com um homem que não nos aperta a mão, mas que ã levanta por cima da nossa cabeça para nos abençoar?
Vozes: - A quem sé beijam os pés.
O Orador: - Deixo essa honra para o sr. ministro dos negocios estrangeiros; (Riso.)
Aqui está, pois, como se escreve a historia.
O Rei de Portugal soube, mas não directamente que ia para a China o legado a latere de Sua Santidade, e mandou dizer ao Santo Padre que desejava ter conhecimento dos poderes que lhe eram conferidos e as instrucções que levava. Foi como se não existisse nem Rei nem Portugal.
Ao arcebispo hão consta que ninguem escrevesse mas era ao Rei, e não ao arcebispo, que competia o beneplacito;
É triste o quadro e é longo o martyrio, desde as excommunhões do cardeal de Tournon, até á carda dó cardeal Jacobini. É triste pensar e reconhecer que a santa madre Igreja, até para os herejes mãe, teime em ser madrasta para nós: E nunca ninguem fez mais pela religião christã do que os nossos navegadores e conquistadores! (Apoiados.)
E chamar ao padroado o sr. ministro dos negocios estrangeiros, sublinhando, beatificamente o superlativo - singularissimo privilegio - sem se lembrar dos singnlarissimos serviços feitos pelos portuguezes á Santa Sé, ou para melhor dizer - á religião! (Apoiados}
Negaram-nos até as bulias em que se reconhecia o nosso direito. Essas bulias estiveram por muito tempo perdidas e negaram à sua existencia, (guando depois appareceram não as poderam negar; mas contradisseram os seus preceitos cercearam as suas larguezas e sophismaram as suas disposições.
Voltemos agora aos jesuitas, e v. exa. vae ver qual é a minha opinião a seu respeitos.
Sabe v. exa. o que elles fizeram, quando foram para a Zululandia? Sabe a habilidade com que ali souberam insinuar-se?
E note v. exa. que digo com admiração, não com desdem, o que a camara vae ouvir;
Os jesuitas já o disse é repito instruem-se em todas as sciencias, educam-se em todas as artes e aprendem todos os officios.
Para se insinuarem no animo do rei dos zulus, o que sabia de carpinteria ou marcineria offereceu-se ao rei para lhe fazer uma carruagem. E fez-lhe a mais pomposa e magnificente carruagem que podesse satisfazer a arrogante imaginação de um rei tão grande.
O que sabia de pintura offereceu-se para pintar com as mais bizarras cores o régio coche, e n'elle o brazão do glorioso monarcha. E pintou a carruagem e n'ella o brazão do rei dos zulus, o que fez as delicias da côrte e o orgulho da familia real.
Outro jesuita, que na sua profissão manual era mais humilde, foi-se offerecer ás senhoras do rei para lhes ensinar a coser á machina. (Riso.) Isto é positivo e está nos annaes da propaganda. Calcule a camara é prestigio que esta missão ganhou no paiz e a intimidade que soube ganhar na côrte da Zululandia, principalmente o que cozia á machina.
E imagina v. exa. que eu digo mal deste modo de proceder? Não. Acho excellente. Gostava de ver o padre, isso sim, para me rir, se podesse, sem que o rei dos zulus me tivesse por escarnecedor d'aquelle mulherengo de sotaina, mas acho que não se póde ser mais habilidosamente accommodaticio e insinuante, do que o foram estes expertos jesuitas.
Em todo o caso, estes factos provam que os jesuitas são o que querem ser.
Ora, na India e na China o jesuita sabia insinuar-se e ganhar o prestigio que na verdade era devido aos seus conhecimentos e ás suas incontestaveis aptidões e emquanto esteve por nós foi o nosso melhor auxiliar. Mas o jesuita não era nosso e tambem não era e não é de Roma: é da ordem.
Se Roma julga o contrario engana-se. O jesuitismo se não é ainda um estado nos estados, é uma igreja na Igreja; é uma seita autonoma;
Por isso o jesuita no oriente se mostrava por nós, em quanto nos viu mais fortes; quando se convenceram de que não podiamos vencer porque a lucta era desesperada, combateu por nós ainda e contra o cardeal de Tournou quanto foi suficiente para fazer valer a sua capitulação; depois capitulou com as honras de guerra a tempo de poder entrar na apprehensão e na divisão dos despojos que ninguem sabia como elle onde os melhores se achavam guardados.
Bandeou-se com o cardeal de Tournon; e comtudo Roma não lhe perdoou logo á sua primitiva resistencia.
O jesuita possue todas as condições necessarias de um grande missionario; não lhe falta senão, em minha consciencia o digo, não lhe falta senão acreditar em Deus. (Riso:- Apoiados.)
Para bem explicar o que é o espirito jesuitico, basta o seguinte. É uma hypothese:
O jesuita, para livrar da morte um condemnado, vae de rastos aos pés do maior tyranno do mundo e pede-lhe com a eloquencia da dor e com lagrimas de sangue a salvação d'esse condemnado.
Se a póde conseguir, tem verdadeira commoção de alegria; se hão consegue póde ainda restar-lhe uma grande gloria, a de acompanhar o padecente até ao logar do supplicio.
É preciso que à sua caridade se ostente e se veja.
Tudo isto faz bem á ordem, a engrandece e a popularisa:
Sé outrem conseguir o que elles não conseguiram, à vida do delinquente, não inscrevem o acontecimento como um triumpho da caridade, marcam-n'o como batalha perdida pela ordem; que a ordem já o disse, é mais que Roma; é quando Roma decreta o que lhe não convem, negam-lhe abertamente auctoridade, a despeito do muito que fingiram reconhecer-lhe no consilio tridentino:
Os primeiros que se oppozeram á concordata de 1857 foram os jesuitas, negando ao Papa o direito de a ratificar e ainda mais de a executar:
De resto, todas as qualidades que dá b saber, a paciencia, a abenegação, a disciplina a obediencia, tem ou simula o jesuita brilhantemente.
A ordem tem gente para tudo, até para o martyrio.
Os mais obedientes, os mais exaltados ou os mais pobres de espirito são pela ordem consagrados ao martyrio em terras dos infieis; porque tambem lhes é precisa uma lista no martyriologio christão:
Portanto, quando alguem os encarrega da educação...
(Áparte.)
Pois imagina v. exa. que elles não precisam da influencia do sr. ministro dos negocios estrangeiros, da do sr. ministro das obras publicas e de outros?
Ou julgam que se arriscam á sua malevolencia?
Não sabem que serem mestres dos seus filhos é o melhor reclamo para as suas escolas?
A primeira cousa que elles fazem antes de ensinar os filhos é estudar os paes. (Riso.)
Sr. presidente, e nós estamos sob o poder dos jesuitas.
A curia, cedendo a elle se tratando-nos como maus filhos, não desistiu de lhes dar o nosso quinhão; e de corda ao pescoço como dizia o digno par que me antecedeu na tri-
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buna, nos obrigou a violentar ou a perder de todo o padroado ou a assignar esta capitulação.
E triste que não podessemos desatar a corda ou arran cal-a das mãos do cardeal secretario de estado, mas ainda é mais doloroso que venha alguem, algum portuguez, dizer na camara dos dignos pares do reino que foi de mais o que nos ficou e que Roma devia levar nos tudo quanto ameaçava tirar-nos.
Eu sei perfeitamente quem foi um dos antepassados dos dignos pares que mostraram este desejo.
Talvez s. exas. o não saibam, talvez que nos ramos da .sua arvore genealógica o não tenham encontrado; pois bem, o seu avô foi o velho de Camões; aquelle que pregava philosophia utilitaria e cautelosa, que fazia a critica, nas praias do Restelo,- quando se embarcavam os aventureiros descobridores da India.
Os dignos pares vieram aqui dizer em- prosa o mesmo que elle disse em verso, ou em prosa de que o nosso épico fez versos.
Foi uma reproducção que denuncia atavismo; não houve originalidade.
Não é novo, é chronico e talvez aggravado agora.
Tambem para que servem as escolas realistas?
Para alguma cousa hão de servir. O realismo, infelizmente, attenta só no lado mau das cousas.
E depois, que retrocesso immenso, a inculcar-se de progresso! Quando ouvimos a apotheose da blasphemia e da idolatria, quando após tantos mil annos vemos resuscitar o bezerro de oiro, que julgavamos escondido por Moysés nas faldas do Sinai; quando vemos que os homens do futuro lhe prestam culto publico, um sentimento cruel nos avassalla.
Quando vemos que o povo hebreu, o velho escravo do Egypto é hoje quem dá as leis a tantos paizes, e que ousam proclamar aqui solemnemente o seu reinado, tem a a gente pena de que se afogassem os pharaós. (Muitos apoiados.)
(Interrupção do sr. marquez de Vallada que não se ouviu.)
De mais a mais, para que o symbolo seja completo, o Moysés desta situação quebrou as tábuas da lei ao pé do bezerro de oiro; com a differença, porém, de que o Moysés da antiguidade quebrou-as por indignado, ao ver a ignominia do seu povo; o sr. presidente do conselho, o Moysés da situação, quebrou-as por ambição de cumplicidade.
O bezerro de oiro precisava de largas considerações mas eu vou terminar, deixando incompletas as minhas referencias historicas a respeito do que se passou desde 1857 até hoje.
Esta historia não é das mais agradaveis, e é demasiado conhecida; deixemol-a pois aqui, sob o véu da prudencia; mas bem a nu, para seu remorso, na consciencia do Pontifice actual, continuador inexoravel de Gregorio XVI e de Pio IX, os inimigos das nossas liberdades.
Nós, offendidos e maguados, continuemos em nome de Deus a combater o bezerro de oiro.
O bezerro de oiro é quem faz os caminhos de ferro? N'esse caso para alguma cousa nos serve.
Encaremos o bezerro por este lado, que é util, e desçamos com o bezerro ás cousas praticas da humanidade.
Para que estamos nós sempre a dizer ao sr. ministro das obras publicas, seja elle qual for, que olhe para a nossa industria e para o nosso commercio?
Eu creio que os caminhos de ferro não se fizeram para outra cousa senão para servirem como elemento e instrumento valiosissimo ao commercio e á industria. Muito bem!
Mas aqui voltâmos nós á Babylonia, á confusão das opiniões, se não á confusão das linguas.
Pois se nós queremos desenvolver-nos como nação industrial, se queremos proporcionar ao commercio os meios de se engrandecer, se a industria e o commercio procuram dia a dia novos mercados, onde se animem e se enriqueçam, e se acima de tudo proclamamos a necessidade da riqueza, como vamos nós dizer ao Santo Padre, que nos tira por outra concordata um direito enorme de expansão para a nossa influencia, e, portanto, para a protecção tambem das nossas tentativas industriaes e commerciaes, que levou pouco e que nos leve tudo? (Apoiados.)
Pois que, sr. presidente, será indifferente ao commercio e á industria o facto de encontrar nas costas do Malabar e do Coromandel e nas ricas provincias da China gente que falle portuguez, gente que nos ame e nos respeite, e que prefira os nossos productos aos das outras nações?
Elles fallam mal o portuguez?
Póde ser, mas o seu portuguez entende-se e a mim agrada-me; ás vezes mais que o de Lisboa.
Andará por aquellas paragens adulterada a nossa lingua?
Notaveis escrupulos de purismo!
Mas é a nossa lingua.
O que não anda adulterado nos nossos portuguezes do padroado é o coração, é o amor por tudo quanto é nosso. (Apoiados.)
Não quero aventuras, não!!
Sancho Pança para rei.
Os Quixotes das cavallarias passaram, as aventuras são outras; os aventureiros persistem, mas vão noutro rumo. O que não percebo, sejam quaes forem os que prevaleçam, é por que motivos de utilidade havemos de encurtar os nossos horisontes.
Pois não está a França estendendo e alargando o ambito da sua influencia no ultramar?
Não se insurgiu a Hespanha quando pretenderam arrebatar-lhe as suas Carolinas, onde aliás não tinha commercio de nenhuma especie?
Ha mais alguma cousa, sr. presidente. A França republicana sustenta na Cochinchina um seminario catholico, e nem sequer tem o direito de nomear os directores do estabelecimento, os mestres do ensino, nem de regular a administração do internato. Tudo isso pertence exclusivamente a Roma.
Pois a Italia não foi a Massuah e não se está sustentando ali com grandes perdas, a fim de abrir mercados ás suas industrias e aos productos da sua agricultura?
Pois não foi a Bélgica ao Zaire, onde, tambem com sentimento do digno par o sr. Fernando Palha, perdemos só uma parte, devendo perder tudo, e não foi lá procurar o desenvolvimento do seu commercio e da sua industria?
Pois não se está fazendo a Allemanha nação colonial?
Pois não está em o ser o segredo do prestigio da Inglaterra?
Nações pequenas e grandes seguem sofregamente por este caminho, só nós havemos de retirar desta cruzada e entregar o que temos, aquillo que nos custou tantos sacrificios?
Lastimo profundamente esta errada orientação, porque o programma de hoje póde ser lei ámanhã. Nem eu queria que, principalmente, olhassemos esta questão pelo lado do interesse.
As rasões economicas são muito valiosas, mas temol-as melhores, em meu conceito, porque são sagradas. O padroado portuguez no oriente, contra o conceito do digno par o sr. Fernando Palha, era um dos maiores monumentos da gloria de Portugal. (Apoiados.)
Se a utilidade é o fructo, as glorias são a raiz.
Sr. presidente, as questões do interesse material não são as unicas nem as de mais valia para uma nação. A questão do seu brio e da sua honra são de uma utilidade mais subida e de um interesse mais sagrado.
Reconheceu-o felizmente o digno par, a quem me tenho referido; confessou-o no segundo dia em que tivemos o gosto de o ouvir; confessou que effectivamente, se não fossem as nossas glorias antigas, já teriamos deixado de exis-
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tir como nação. Esta affirmação resgatou, no meu conceito, muito do seu anterior discurso.
E pois que assim me congraço com s. exa., tenho a pedir-lhe um favor; e é que não exagere o seu culto á finança, e não a faça objecto da sua idolatria. E falso deus, a finança.
A nossa constituição politica até hontem, e dura hoje ainda para mim, dizia que um rei reina e um governo. A finança quer dar-nos outra constituição que diga: Um grande banco reina e um syndicato governa.
E mais: a respeito de - nação portugueza livre e independente, uma emenda radical e que não acceito.
Os que levam longe o culto da finança não comprehendem bem que uma nação seja uma agremiação politica com fóros de soberania e nome distiucto, bandeira e brazão; entendem que deve ser uma sociedade anonyma de irresponsabilidada illimitada.
Contra isto protesto eu. E devo dizer ao digno par, cujo espirito deve ser tão levantado quanto é esmeradamente cultivado, que isto de passar uma nação, que tem tradições gloriosas, brazões de nobreza e serviços eminentissimos, a firma commercial de duvidosa respeitabilidade, não me serve. (Repetidos apoiados.)
Aqui o digo, aqui o juro.
Eu não sei quaes são as tendencias politicas da minha terra actualmente; nem as espreito, nem as lisonjeio; venho só, e venho para dizer o que sinto, n'uma questão que me parece de maxima gravidade.
Os syudicatos são um grande instrumento do progresso; porem instrumento. Como tal entendo que os governos os devem acceitar, promover e até proteger, nos seus legitimos interesses.
Mas fique no seu logar modesto, de serviçal, que é importantissimo. No dia porem em que elle, o syndicato, quizer proclamar-se chefe, director, soberano, governo, acha-me rebelde aos seus mandamentos e revoltado contra a sua vai dosa. imprudencia. (Apoiados.)
Que se enriqueça- como coadjuvante da administração, como intermediario, como instrumento indispensavel, se quizerem, mas que fique por ahi; que não ouse sobrepor-se aos poderes publicos.
Tudo poderei acceitar menos a preeminencia do bezerro de oiro.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos dignos pares.)
O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção que foi mandada para a mesa.
Leu-se na mesa a moção, que é do teor seguinte:
"A camara, considerando que os compromissos que o governo tomou com a Santa Sé na concordata de 23 de junho de 1886 já entraram em plena execução e produziram seus effeitos, e entendendo que é da dignidade da nação não desapprovar o seu procedimento, esperando que opportunamente e em fórma devida seja legalisado, passa á ordem do dia."
O sr. Presidente: - Os dignos pares que admittem á discussão a moção do digno para o sr. Thomás Ribeiro, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Sr. presidente, pedi a palavra simplesmente para dar uma explicação muito succinta e justificativa da minha attitude como ministro da corôa, perante a negociação da concordata; explicação que foi provocada principalmente por uma referencia do digno par, o sr. Thomás Ribeiro, quando discutiu o assumpto de que se trata, n'uma das ultimas sessões.
O digno par chamou a minha attenção, como conhecedor das cousas da India, ácerca da concordata, dando a entender, se o não disse mui claramente, que, conhecendo eu ou devendo conhecer qual era o fervor com que as christandades do oriente amavam o padroado portuguez e n'elle se queriam conservar, era para estranhar, que, sendo eu ministro da coroa, desse o meu voto á concordata.
Eu tenho a dizer simplesmesmente que approvei as clausulas do pacto internacional celebrado entre Portugal e a Santa Sé pelas seguintes rasões:
Em primeiro logor, porque me convenci que se não podia obter mais nem melhor, convencimento de que igualmente ficaria possuindo quem seguisse passo a passo e durante alguns mezes as negociações da concordata, como seguiram todos os membros do gabinete. Convencimento que chegaria de certo a todos que tivessem conhecimento do desvello e zêlo patriotico desenvolvido pelo illustre ministro dos negocios estrangeiros, nas instrucções dadas ao nosso ministro em Roma o sr. Mártens Ferrão, que, como todos sabem, é um funccionario zeloso e intelligente e dotado de alta sabedoria e patriotismo. (Apoiados.}
O sr. Mártens Ferrão, creio, obteve em Roma todas as vantagens que podia obter; e o resultado das suas diligencias para com a Santa Sé, attendendo ás circumstancias que se davam, póde considerar-se uma verdadeira conquista para o pai z.
Em segundo logar approvei a concordata porque, sendo conhecedor das cousas da India, entendi ser mais conveniente obter e conservar uma circumscripção do padroado, posto que mais limitada, ainda que sufficientemente vasta, mas definida e clara, do que outra mais dilatada, mas dando logar a duvidas, querelas e invasões de jurisdicção estranha, pondo muitas vezes em completo cahos e anarchia o padroado, invasões que tão frequentes eram na sua antiga extensão.
Alem d'isso, pela concordata de 1807, as attribuições do arcebispo de Goa na sua jurisdicção extraordinaria, estavam sujeitas a ser suspensas por um simples breve pontificio, ao passo que pela nova concordata já não se podem suspender, ficando definitivamente estabelecidas, assim como ficam ainda representadas n'uma larga circumscripção as nossas glorias e o nosso prestigio, gloria e prestigio que conquistámos pelas armas e pela fé. Se não ficámos com tudo é porque nos não era possivel sustentar no seu verdadeiro pé o explendor do padroado, como era Antigamente.
Em terceiro logar, porque tambem me convenci que a causa primordial do abandono em que se encontrava o nosso padroado, era a falta de padres, que nunca poderam attingir o numero sufficiente para satisfazer ás exigencias da concordata de 1857.
E vem a proposito dizer, que tenho ouvido fallar muito e muito justamente dos nossos direitos ao padroado, mas não tenho ouvido dizer o sufficiente relativamente á obrigação que nos impunha esse direito.
As obrigações derivadas desse direito, ou a elle inherentes, eram muitas e mui complexas, e nunca tivemos nem é provavel que venhamos a ter o numero sufficiente de sacerdotes e os recursos necessarios para as satisfazer.
Era necessario prover todas as igrejas existentes e edificar novas igrejas para aquellas christandades, que já o exigiam.
Era necessario enviar missões, que successiva fossem conquistando almas para o catholicismo. Era mister fundar seminarios, levantar hospitaes e crear escolas.
Era necessario finalmente cumprir conscienciosa e dignamente com as obrigações consequentes do direito do padroado.
Ora eu entendi que não estavamos em circumstancias de nos desempenharmos destas obrigações, reconhecendo que uma das principaes difficuldades era o numero insufficiente de padres.
Com effeito, quer seja pela extincção das ordens religio-
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sas, quer seja pela má organisação dos nossos seminarios pá metropole e nas colonias, quer seja por ser outro o espirito da epocha; ou seja mesmo, o que é mais natural, pelo conjuncto d'estas causas é evidente que não podemos contar com o numero de padres que seria preciso para prover ás necessidades ecclesiasticas no padroado e conjunctamente para o serviço das igrejas e das missões nas nossas colonias africanas.
E, sr. presidente, o facto de termos missões em Africa é para nós muito mais importante do que ter sacerdotes para todas as obrigações que nos impunha o direito de padroado na India. Ha mais conveniencia para Portugal em ter missões na Africa do que na India; porque lá só podemos concorrer para a salvação das almas sob o ponto de vista religioso, ganhando-as para o catholicismo; era quanto que na Africa nós podemos conseguir, alem do que é no interesse da civilisação e da religião, affirmar cada vez mais ò nosso dominio util de soberania e dilatar sucessivamente esse dominio em novos territorios.
Por todas estas rasões, sr. presidente, eu entendi que devia subscrever, como subscrevi, a esta concordata, e fazendo-o, tenho a convicção de que concorri pela minha parte para que se celebrasse um pacto internacional justo, conveniente e digno, não só para o governo, mas tambem para o paiz. (Apoiados.}
O sr. Ornellas: - Tenho a honra de mandar para a mesa o parecer da commissão de negocios externos sobre o tratado de extradicção com a Russia. Peço a v. exa., sr. presidente, que me conceda de novo a palavra antes de se fechar a sessão para um negocio urgente.
O parecer mandado para a mesa pelo digno par foi a imprimir.
O sr. Visconde de Borges de Castro: - Por parte tambem da commissão de negocios externos, mando para a .mesa o parecer sobre a convenção consular celebrada em Berne.
Foi a imprimir.
O sr. Coelho de Carvalho (sobre a ordem): - Sr, presidente, não venho discutir a concordata; e só a ella me referirei, de passagem, quando tenha de alludir á sua ratificação sem a intervenção legal e necessaria do parlamento.
A impressão que me deixou a leitura do § 6.° da resposta ao discurso da corôa, é a causa determinativa de ter pedido e usar da palavra que v. exa. acaba de conceder-me.
Pouco tempo tomarei á camara; o sufficiente, apenas, para expor o objecto da inha proposta, que se recommenda á sua attenção pela natureza do assumpto e, principalmente, por ser a reparação de um esquecimento, que eu não faço ao governo a injustiça de suppor intencional.
A minha proposta é a seguinte: .
(Leu.)
Esta proposta vae tambem assignada pelo sr. D. Luiz da camara Leme, meu velho amigo, e antigo companheiro de lides parlamentares na camara dos deputados em tempos que já vão longe. Agradeço-lhe a sua assignatura como fineza muito especial, que nunca esquecerei.
A auctoridade de s. exa. em assumptos militares imprime á minha proposta um valor que a obscuridade do meu nome não podia dar-lhe.
Sr. presidente, permitta v. exa. e permitta a camara que, antes de entrar no assumpto da minha proposta, eu alluda, posto que de passagem, á concordata, e exponha resumidamente o meu modo de ver sobre a illegalidade da ratificação sem a previa intervenção do poder legislativo.
Eu acceito a concordata tal como está; boa ou má, acceito-a como um facto consummado, depois de a achar ratificada pelo governo.
No emtanto o que eu .sinto, e com um sentimento bem profundo, é que o governo, embora por algum motivo de ordem superior, que, aliás, não conseguiu ainda explicar-nos satisfactoriamente, se antepozesse ao parlamento, deixando de trazer á camara a concordata, para ser por nós approvada, antes de ratificada, como é preceito constitucional. N'este ponto, sr. presidente, é que eu não posso transigir por nenhuma fórma.
Afastado, como realmente estou, dos partidos que alternadamente disputam o poder, não tenho nenhum interesse partidario, nem na conservação do actual gabinete, nem na sua queda. Para mim todos os ministerios são bons, quando as suas medidas forem justas e compativeis com as necessidades publicas. A este governo ou aos seus successores, exactamente como fiz ao seu antecessor, hei de dar sempre o meu voto em tudo quanto, for justo, e de interesse publico; mas ha dois pontos em que sou absolutamente intransigente, com este e com qualquer outro ministerio.
O primeiro é o que se refere aos arranjos, a que alludiram já n'esta casa alguns dignos pares, e que, no dizer do sr. Barros e Sá, são o unico factor para os accordos dos homens publicos nos ultimos tempos e no nosso paiz. Eu protesto, como s. exa., contra o uso, se uso se tem feito ou tentou fazer, de doutrina tão perniciosa e de systema tão perigoso para a dignidade e para os interesses da nação.
O segundo ponto da minha mais absoluta e completa intransigencia, é o que diz respeito á violação dos preceitos constitucionaes, por maior ou menor que possa ser a causa determinativa d'essa violação.
Nestes dois pontos é que nenhuma situação politica terá o meu voto, que aliás não tem nenhum valor qualificativo, mas que exprime lealmente o meu modo de ver e as normas invariaveis da marcha do agrupamento politico a que tenho a honra de pertencer, e que é dirigido pelo meu velho e excellente amigo o digno par sr. Vaz Preto, que não vejo agora presente.
Portanto o governo póde contar, nas questões de administração, com o nosso apoio, ou com a nossa opposição, segundo o seu procedimento; isto é, ha de
ter-nos francamente ao seu lado em tudo- quanto for rasoavel, justo e necessario aos interesses publicos, mas não póde contar com a nossa benevolencia quando as suas propostas se desviem das normas que deixo esboçadas em traços muito ligeiros.
Emquanto, porém, á ratificação da concordata, permittam-me v. exa. e a camara que lhes diga, que divirjo completamente da doutrina do sr. ministro dos negocios estrangeiros, quando s. exa. considera a concordata de 1886 como um regulamento da concordata de 1857.
Os regulamentos não podem alterar a essencia do diploma originario. Ora a concordata de 1886 alterou profunda e essencialmente a de 1857, e constitue, por isso, um novo tratado, que, como tal, carecia da approvação do parlamento antes da ratificação. E parece que o sr. ministro assim o entendia tambem, quando recommendava ao nosso embaixador que instasse pela ampliação do praso para a ratificação, por estar a esse tempo encerrado o parlamento e não convir convocai o extraordinariamente.
Não posso, pois, approvar o procedimento do governo, quando ratificou a ultima concordata sem a apresentar á apreciação da camara.
Se approvasse esse procedimento, sobretudo julgando-se o governo dispensado de trazer á camara uma proposta do bill de indemnidade, para regularisar mais esta sua violação da constituição, ter-lhe-ia reconhecido, e realmente não lhe reconheço, a faculdade de applicar á constituição uma hermeneutica sua e para seu uso, o direito de fazer leis e o de prescrever os preceitos constitucionaes, usurpando attribuições que são unicamente do poder legislativo.
Em conclusão, na minha opinião, todos nós, inspirando-nos n'um interesse superior ao das conveniencias partidarias, devemos condemnar os actos dos governos quando envolvem infracção da lei constitucional, e como o acto pra-
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ticado pelo governo na ratificação da concordata foi perfeitamente inconstitucional? eu consigno aqui o meu protesto e o do grupo politico, a que estou ligado e sigo como o mais obscuro dos seus membros.
Mas, sr. presidente, sem embargos dos meus principies de intransigencia em questões de violação da constituição, reconheço o dever indeclinavel de legitimar a ratificação da concordata, que o governo assignou em nome da nação. Lavrei o meu protesto, mas desejo que o acto de legalisar se não repita.
N'estas circumstancias, sr. presidente, estou perfeitamente de accordo com a opinião apresentada pelo digno par o sr. Thomás Ribeiro, com respeito ás formulas pelas quaes se póde regularisar a situação do governo e as responsabilidades em que elle incorreu ratificando a concordata sem a trazer ao parlamento.
Sr. presidente, a hora está a. dar, e eu não posso, por isso alongar mais as minhas considerações com respeito á legalisação d'este acto. Vou, portanto, entrar propriamente no assumpto da minha proposta.
Sr. presidente, todos devem estar lembrados dos acontecimentos que se deram em Zanzibar, não ha muito; e dos actos de valor praticados pelos nossos soldados por occasião da tomada da bahia de Tungue.
As primeiras noticias sobresaltaram o espirito publico e chamaram a attenção do nosso paiz, que em patriotismo e brios não cede a palma a nenhuma outra nação.
Desde logo correu o boato de que, para assegurar o nosso direito de soberania, o governo pensava em mandar áquella longiqua região uma expedição, e todos sabem qual foi o sentimento unico, espontaneo e desinteressado, que achou no exercito do continente e principalmente nos regimentos da guarnição de Lisboa, donde se suppunha que seria tirada a primeira expedição.
Sabe v. exa. quaes eram os sentimentos que animavam os nossos briosos militares?
Eram os sentimentos de verdadeiro patriotismo.
Todos queriam a preferencia na marcha; todos queriam seixos primeiros na vanguarda.
É consolador registar estes factos, que são um protesto vivo e positivo contra as opiniões dos pessimistas, que pregam por esse mundo que ha falta de disciplina e de sentimentos patrioticos no nosso exercito, pretendendo-se, posto que erradamente, escurecer os brios e os serviços d'esta instituição com as faltas, com os erros de um ou outro dos seus membros.
Pois é licito que as responsabilidades, perfeitamente individuaes, dos erros e até de crimes de um ou outro membro de qualquer collectividade alcancem em todos os seus effeitos reaes e moraes a collectividade inteira? Não é certamente.
O que é fora de duvida, é que em qualquer circumstancia afflictiva, ou não, os poderes publicos encontram sempre no exercito, o rigoroso cumprimento dos seus deveres ao par das mais expontaneas dedicações, pelas instituições e pela honra nacional.
Mas, sr. presidente, ao passo que o governo da metropole, pensava em dispor os elementos para uma expedição, e exactamente quando nos regimentos do continente se manifestavam os sentimentos, a que estou alludiudo, um punhado de bravos de caçadores n.° 1, de Moçambique, em movimento uniforme com as valentes tripulações dos nossos vasos de guerra, então estacionados nas aguas d'aquella provincia, desaffrontavam a nossa bandeira, atacavam e destruiam as povoações arabes de Meningane e Tungue, e pelas armas, tomavam posse da parte norte da bahia de Tungue, como lhe fôra ordenado; e assim affirmavam o nosso direito e o nosso dominio.
Eu tenho aqui um documento official que falla mais alto, e certamente com mais auctoridade, do que todas as considerações que eu podesse apresentar para exaltar este acto grandioso.
É uma portaria do governador geral da provincia de Moçambique. E sabe v. exa. o que diz, em phrases levantadas e patrioticas, o governador geral d'aquella provincia no diploma official a que me estou referindo?
Diz que á cooperação unanime das forças de caçadores n,° 1 e das tripulações dos nossos vasos de guerra se deve o brilhante feito da tomada e posse da parte norte da bahia de Tungue, depois da tomada e destruição das povoações arabes de Meningane e Tungue, em dois ataques vivissimos, que tiveram logar nos dias 23 e 27 de fevereiro. Affirma e louva o valor das forças de terra e mar; louva em especial oito valentes, e principalmente o coronel de cavallaria do exercito de Portugal José Raymundo da Palma Velho, que por si só foi o principal obreiro de tão brilhante feito planeado, dirigido e executado pelo mesmo coronel com muita intelligencia, serenidade e denodo.
Peço licença para ler á camara uma parte, pelo menos, deste importante documento. Reservo me para a inserir integralmente no Diario das nossas sessões, quando se publicarem as phrases que estou agora proferindo.
(Leu.}
Ora, em vista d'este documento, de caracter official, que de certo o sr. ministro da marinha não póde deixar de confirmar, diga-me v. exa.? diga-me a camara se é justo que no discurso da corôa se mencionem com merecido louvor os feitos praticados pela nossa marinha de guerra, mas se esqueçam totalmente os que praticaram as forças do exercito de terra que, segundo acabei de ler, concorreram por igual, com o seu valor e brilhantes feitos para a affirmação do nosso direito?
A hora já deu; vou, portanto, terminar, porque não devo abusar da benevolencia da camara, nem desejo levar a palavra para casa, nem mesmo é necessario alargar mais as minhas considerações, porquanto mais do que ellas, falla o importantissimo documento official, que já li á camara.
Louvar as valentes tripulações dos nossos vasos de guerra, parece-me de toda a justiça; mas excluir d'esse louvor as forças de terra, que tomaram parte n'aquelle brilhante feito, é uma exclusão injusta na partilha de gloria que por igual a todos pertenceu.
N'estas circumstancias, a camara tomará a minha proposta na consideração que merecer; hei de acatar, como me cumpre, as suas resoluções, porem, em todas as hypotheses, fico bem com a minha consciencia por ter cumprido um dever de reparação, que tive e tenho por indeclinavel,
Permitta-me v. exa. que eu me dirija ao governo, e principalmente ao sr. ministro da marinha. Duas palavras apenas.
Na portaria do governador geral são especialmente louvados oito valentes servidores do estado, e principalmente o coronel Palma Velho.
Eu bem sei que o patriotismo e os brios d'estes bravos não precisam de ser estimulados; mas a nação não perde nunca em reconhecer e recompensar serviços tão assignalados.
Chamo para este ponto a attenção de governo.
Tenho concluido.
Leu-se na mesa a seguinte moção:
Additamento ao § 6.°
Proponho que o louvor consignado para as valentes tripulações dos nossos vasos de guerra se amplie, por igual, ás forças do exercito de terra, no brilhante feito da tomada e posse da parte norte da bahia de Tungue. = Joaquim Coelho de Carvalho = D. Luiz da Camara Leme."
Foi admittida á discussão.
O sr. Ministro da Marinha (Sarros Cromes): - Tenho simplesmente a dizer ao digno par que acabou de fallar, que não houve omissão no projecto de resposta ao discurso da corôa.
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Os factos que s. exa. narrou, eram mais ou. menos conhecidos, mas não em todos os seus pormenores; mas as informações officiaes só chegaram ha pouco tempo e já posteriormente á redacção do mesmo projecto.
O1 digno par relator da commissão, que pediu agora a palavra, vae responder talvez ácerca da conveniencia de inserir ou não inserir uma ampliação no projecto, de maneira a abranger tambem as forças de terra.
Estou convencido de que a camara se associará a este pensamento. (Apoiados.)
Emquanto ás recompensas a distribuir por aquelles que mais se distinguiram nos feitos militares em Tungue, creia v. exa. e a camara que o governo, que de muito longe encaminhou os acontecimentos para chegarmos á reivindicação, pelas armas, d'essa bahia, que d'aqui dirigiu uma campanha, que não foi só militar, tem esses serviços na maior attenção; não deixarão de ser devidamente remunerados e reconhecidos por aquella fórma official por que se podem reconhecer, quando se trata de pessoas de brio, como são os valentes officiaes das nossas forças de mar e terra; para este effeito, convem todavia aguardar o movimento opportuno.
Leu-se na mesa uma mensagem da camara dos senhores deputados, remettendo o orçamento rectificado.
Foi enviado o commissão de fazenda.
O sr. Ornellas: - Sr. presidente, desejo chamar a attenção do sr. presidente do conselho para as noticias que acabam de chegar da Madeira, dizendo ter-se ali manifestado uma epidemia de variola, attribuindo-se a sua importação a um soldado do regimento de caçadores n.° 12 que foi de Lisboa, como de Lisboa foi em 1856 um batalhão de caçadores que introduziu na ilha o cholera que dizimou, no sentido litteral da palavra, a população. De 100:000 habitantes morreram 10:000.
Sabia-se que em Lisboa grassava a variola, mas nenhumas precauções se tomaram para impedir a sua introducção nas ilhas e não só na Madeira, em S. Miguel e Faial foi ella introduzida por pessoas idas deste porto.
Não só emquanto á variola, que apesar de epidemica não parece ser considerada como uma d'aquellas moléstias contra as quaes se devem tomar medidas preventivas, mas contra todas as moléstias contagiosas, estamos completamente indefesos e, ou havemos de impedir toda e qualquer communicação com portos suspeitos ou inficionados, ou temos de consentir que entrem, sem obstaculo, pessoas que trazem os germens de doenças que vão infallivelmente ceifar centenares de vidas.
Pedindo ao illustre ministro do reino providencias que a sua solicitude, sem duvida, adoptará de prompto, animo-me a lembrar a conveniencia de tomar, emfim, uma resolução ácerca do lazareto do Funchal, construido com grande dispendio, dotado com todos os aperfeiçoamentos que a sciencia exige e ha annos fechado e em bom caminho para se arruinar, sem nunca ter servido.
Diz-se que ha grande repugnancia local era que seja aberto, mas um jornal, ao menos, do Funchal advoga a sua abertura, pelo menos agora, para isolar os atacados de variola e impedir que a moléstia se espalhe nos campos onde a falta de recursos para a combater lhe assegura a prompta diffusão e deixa prever grandes estragos.
E' urgente attender ao mal presente e prevenir os futuros, decidindo por uma vez se o edificio construido para lazareto póde ser utilisado para esse fim, ou se é necessario construir outro, dando ao actual outro destino.
Sem lazareto não podemos continuar, tendo de obrigar os passageiros vindos de portos suspeitos, ou a fazer quarentena em qualquer barcaça surta no porto, ou a não communicar com a terra e seguir viagem para o porto mais proximo da escala, que é de ordinario Cabo Verde.
O sr. Presidente de Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Respondendo ao digno par que acaba de fallar, tenho a dizer que não tomei ainda conhecimento official do facto por s. exa. apontado, mas que o acho de tal maneira grave, que vou immediatamente informar-me pelo telegrapho e ordenar as providencias que se julgarem mais urgentes.
A ser verdadeiro o facto a que se referiu o digno par, não ponho duvida na abertura no lazareto e em auctorisar as despezas necessarias não só para a sua construcção, mas para tudo o mais que for indispensavel para a disseminação, do mal.
É o que tenho a dizer a s. exa.
O sr. Ornellas: - Agradeço ao sr. presidente do conselho as promessas satisfactorias que se dignou fazer. Alem d'isso, continuo a insistir em que se tome uma providencia definitiva quanto ao lazareto.
A situação actual não se póde prolongar, e pois prejudica gravemente os interesses commerciaes da Madeira, inteiramente dependentes da navegação que frequenta o porto do Funchal, e que a falta de meios de ali fazer quarentena afasta em beneficio de portos rivaes.
O sr. Presidente: - A proxima sessão será na sexta feira. A ordem do dia será a mesma que estava dada para hoje.
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas da tarde.
Dignos pares presentes na sessão de 8 de junho de 1887
Exmos. srs.: João Chrysostomo de Abreu e Sousa, marquezes, de Rio Maior, de Vallada; condes, de Alte, de Bomfim, de Campo Bello, de Castro, da Folgoza, de Linhares, de Magalhães, de Paraty, de Gouveia; viscondes, da Arriaga, de Benalcanfor, de Borges de Castro, de S. Januario, de Moreira de Rey, da Silva Carvalho; Ornellas, Vicente Lourenço, Adriano Machado, Braamcamp Freire, Aguiar, Sousa Pinto, Silva e Cunha, Antunes Guerreiro, Henrique Secco, Arrobas, Senna, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Telles de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Augusto Cunha, Carlos Bento, Carlos Testa, Sequeira Pinto, Hintze Ribeiro, Fernando Palha, Cardoso de Albuquerque, Ressano Garcia, Barros Gomes, Henrique de Macedo, Jayme Moniz, Candido de Moraes, Holbeche, Mendonça Cortez, Vasco Leão, Coelho de Carvalho, Gusmão, Braamcamp, Bandeira Coelho, Baptista de Andrade, Ayres de Gouveia, Silva Amado, José Luciano de Castro, Raposo do Amaral, Teixeira de Queiroz, Mexia Salema, Silvestre Ribeiro, Bocage, Camara Leme, Seixas, Pereira Dias, Vaz Preto, Franzini, D. Miguel Coutinho, M. Osorio Cabral, Placido de Abreu, Calheiros, Thomás Ribeiro, Thomás de Carvalho, Serra e Moura.
Redactor = Carrilho Garcia.