O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

457

torio resultado, e então parecia-me que elle exclamava Eccomi al, fin in Babilonia. Eis me alfim chegado a Babilonia, deveria antes dizer, mas com lagrimas de arrependimento — Eisme alfim em uma Babilonia de finanças; mas não; deixemol-o entregue ao seu dourado sonho; e então proseguindo com o eloquente discurso, que era escutado pelos escravos que silenciosos o ouviam, rodeado de mil turibulos, cuidava ter chegado ao zenith da felicidade. Mas porque não reparava que os applausos dos escravos eram comprados, porque o insonso não era mais do que íiimo, e os seus planos oram pó, eram cinza, eram nadai Mas o sonho não parava aqui, e eu, que tambem sonhava, parecia-me ouvir o romantico Arsaces qual outro Narciso enamorado de si mesmo concluir radiante:

II Ciel per me s'apri

Amore m'animó...

O céo para mim se abriu, amor me animou. Para Arsaces o céo tinha-se abrido, e o amor tinha-o animado! Para o Sr. Ministro da Fazenda tambem o céo se abrio, tambem amor o animou, mas foi um estrelado coo em um dourado sonho que passou, foi o amor que o animou, era o amor do fomento! É esse amor quem o eleva ao alto throno em que se considera collocado, throno que ninguem lhe inveja, que ninguem lhe disputa; throno de barro e eplie-lhero e que, por a inconsistencia da sua base, em breve o veremos desabar, não ao estampido do canhão, mas no meio dos apupos do ridiculo. E vós Arsaces, e vós Narciso, e vós Necker e Calbert, tudo a um tempo elevado no alto throno da vossa intelligencia e saber!

Eu sou tão pequeno que nem posso, nem sei appreciar esse saber profundo, que até desconheço e pareço não ver o fructo das suas lucubrações, e por isso parecia dizer que eu só podia avaliar as vantagens dos caminhos de ferro na provincia do Alemtéjo, e isso mesmo por o prazer sensual de mais commodamente poder viajar em aquella provincia, porque nella tenho algumas herdades, e porque quero gozar dos commodos e delicias que me offerece a construcção desses caminhos. Nobre e prodigioso ministro, até quizeste de mim fazer um epicurista só propenso a acreditar nos prazeres dos sentidos, mas incapaz de apreciar as altas concepções do espirito e do genio! De nada mais sou capaz! Se estas expressões, se estas provocações viessem de algum homem de authoridade, se viessem de algum homem que tivesse apresentado ao paiz um systema para a organisação das. finanças, se viessem de algum homem em fim que pudesse fallar de si, eu diria Beatus ccnlcr qui te portavit et ubera qitw sujeis ti.

Mas, o Sr. Ministro não póde usar dessas expressões, não póde dirigir-se assim a ninguem, o muito menos a nenhum dos dignos Pares, porque elles de certo hão de saber repellir aggressões similhantes da parte de S. Ex.ª! Eu de certo não estou resolvido a deixar-me aggredir por ninguem, e muito menos pelo Sr. Ministro da Fazenda. Nego-lhe a competencia, embargo-lhe a authoridade que se quer arrogar. Ora o Sr. Ministro, respondendo ao digno Par o Sr. Conde da Taipa, disse que não lhe parecia regular que o digno Par aqui viesse protestar contra uma Lei. Oh! Sr. Presidente, pois para que estamos nós aqui? Para que vimos aqui? O que fazemos nós aqui? Não será para discutir, examinar, approvar ou rejeitar e. mesmo protestar contra qualquer Lei que venham submetter á nossa discussão? É em verdade original o espanto do Sr. Ministro, e se nós só estamos aqui para approvar as medidas que o Sr. Ministro nos apresentar, então podemo-nos ir embora, porque nada temos aqui a fazer; e esta Camara se converterá em uma chancellaria do Ministerio, em uma habitação de escravos e deixará de ser a mansão nobre de homens esclarecidos e independentes em beneficio da patria.

Disse o Sr. Ministro, quando todas as outras nações civilisadas marcham, é necessario que nós tambem marchemos, e se não ha nenhuma que desconheça as vantagens dos caminhos de ferro, é preciso que tambem nós os não desconheçamos.

Eu intendo que é discussão perdida entrar-se no desenvolvimento da utilidade dos caminhos de ferro, e nesta parte acompanho o digno Par o Sr. José Maria Grande nos seus desejos, mesmo porque não é muito acertado pretender entrar na demonstração de axiomas: convenho pois no principio, mas convindo no principio posso discordar nos meios de realisação; póde ser util este ou aquelle caminho, esta ou aquella linha em certas occasiões, ou dadas certas e determinadas circumstancias. O Sr. Ministro da Fazendo lança sempre mão do seu cavallo de batalha, que á o caminho de ferro de leste, cuja construcção está entregue a uma companhia a quem S. Ex.ª tantas Portarias tem dirigido para que cumpra as condições a que se obrigára para com o Governo, e que tenazmente se tem recusado a isso, mostrando o pouco que considera a authoridade do Sr. Ministro.

Sr. Presidente, nós podemos desejar todos que Portugal seja por toda a parte cortado por caminhos de ferro: a questão, porém, a tractar é se nós estaremos em circunstancias de termos caminhos de ferro em todas as direcções. O caminho de ferro de leste é uma necessidade por todos reconhecida; ninguem desconhece a sua importancia e vantagens, que delle poderemos tirar, quando se realise a sua construcção, porque elle vai ligar-nos com a Hespanha, e bem depressa com a Europa inteira; mas que vantagem haverá em se ir construir logo um outro caminho de ferro, quasi junto a esse?... Que vantagens tiraremos deste caminho?... Talvez; que eu tenha uma idéa errada, mas quanto a mim, a construcção deste caminho é realmente um pensamento insano; usarei da palavra insano, e de que tanto se admirou o Sr. Ministro, que um outro digno Par a empregasse, porque

Insano é uma palavra portugueza, e de uma significação muito sabida, e que se encontra em qualquer diccionario da lingoa portugueza: quer dizer—falto de senso, quasi louco. É uma palavra que se deriva da lingoa latina, e S. Ex.ª deve saber latim, sobretudo sendo, e querendo ser uma encyclopedia ambulante.

Admira-me que um digno Par que tem acompanhado o Governo, não direi na sua marcha triumphal, mas sim na sua marcha funebre, nos dissesse hoje aqui, que é preciso não quebrarmos a fé dos contractos, quando é isso o que o Governo tem feito constantemente, quando é esse o systema do Sr. Ministro da Fazenda, se proceder similhante, e tão insolito systema chamar-se póde.

Eu confesso que quando se organisou esta Administração, tive fé nella, e no Sr. Ministro da Fazenda, e nos seus collegas, sobretudo no Sr. Presidente do Conselho, e nesse ainda a tenho, e sirva isto de resposta ao Sr. Ministro da Marinha, que me fez uma pergunta; pois eu que sempre respondo a quem me pergunta, com maior razão devo ter essa cortezia para com S. Ex.ª, que é tão amavel. S. Ex.ª disse-me que lhe parecia que eu no principio mostrava queria apoiar o Ministerio (O Sr. Ministro—Foi supposição, disse que não podia esperar que não quizesse apoiar o Ministerio). Ah! percebo, era uma meia cousa; não esperava que não quizesse apoiar: era uma especie de Limbo, aonde me queria collocar; pois eu intendo que não faço opposição, é apoiar: eu occupo-me pouco do Limbo, e só penso no céo ou no inferno.

Sr. Presidente, eu fiei-me no Sr. Ministro da Fazenda actual, porque S. Ex.ª não tinha precedentes deshonrosos; e sendo joven, e devendo por isso mesmo ambicionar uma carreira brilhante, aproveitando ao paiz o seu engenho, eu intendi que S. Ex.ª podia fazer um serviço á minha patria, mas essa illusão bem depressa se desvaneceu; S. Ex.ª foi quem se encarregou de me illuminar a seu proprio respeito. Agradeço-lhe sincero favor tão grande; e outros confiei eu que poderiam mudar de vida, e converter-se, pois que do conversões está a historia cheia: na historia profana, e na historia sacra temos com effeito exemplos, e bem grandes de arrependimentos sinceros: as Magdalenas, as Margaridas, e as Egypciacas, que de grandes prostitutas se tornaram grandes santas, poderiam servir de exemplo a algum homem, que, tendo encetado a sua carreira publica na estrada do crime, podesse, em consequencia das modificações que de ordinario fazem os annos, podesse, digo, acabar no caminho da virtude, e merecer a coroa da gloria. Eu, como digo, tive esperanças nos Srs. Ministros, e do Sr. Visconde d'Athoguia, que me fez a pergunta, esperei sempre que S. Ex.ª acompanhasse os seus collegas; mas nada disso aconteceu, e eu fiquei illudido nas minhas esperanças; outros houveram que, pelo contrario, quando ainda não tinham actos do Sr. Ministro da Fazenda para os poderem avaliar, não tiveram esperanças em S. Ex.ª, e logo disseram e escreveram, que tinha triumphado o contracto do tabaco com a entrada do homem das indemnisações! Assim é que a Revolução de Setembro annunciou a entrada do Sr. Ministro, e hoje considera-o como o regenerador das nossas finanças, como um Colbert, ou um novo Neefror! Eu creio que posso dizer, que os applausos de hoje valem tanto como os doestos, como os apodos de então! Eu é que não partilhava aquella opinião, de que S. Ex.ª estava comprado pelo contracto do tabaco; e se tal opinião tivesse tido, tendo provas para o dizer em publico, tinha coragem para daqui lhe dirigir as minhas censuras nesse sentido, e proclama-lo um ente abjecto o obnoxio ao meu paiz.

Mas que conceito póde merecer um Ministro, que se rodeia dos homens que lhe chamaram ladrão, ladrão uma, e muitas vezes.; que bradaram ao povo—Conhecei o ladrão, agarra o ladrão!... — Esses homens são os esteios do Sr. Ministro de hoje: avalie o publico, julgue o paiz entre o grande financeiro, e seus defensores. Quando S. Ex.ª fez publicar o ominoso Decreto de 3 de Dezembro, comecei eu a desconfiar do seu alcance politico; comecei a ver em S. Ex.ª não um homem de systema, mas um homem de expedientes mesquinhos e prejudiciaes; começaram então as suas operações. Suo as suas operações, mas o caso está que operem bem; os Generaes tambem operam no campo da batalha, mas muitas vezes são surprehendidos pelo inimigo, e não desfructam o futuro que se lhes antolha!

As inscripções, segundo vejo, são hoje o obbey horse do Sr. Ministro da Fazenda, são o seu consolatrix afftictorum (riso). Quando está afflicto, vamos, diz elle, á Junta do credito publico; de modo que havemos de ver as inscripções serem offerecidas como papel para embrulhar nos armazens e tendas de Lisboa.

Mas o Sr. Ministro da Fazenda promette-nos um porvir glorioso, e desassombrado para o seu successor! Oxalá que venha esse successor; quem sabe se eu terei tambem de lhe fazer opposição; talvez que eu o esteja vendo; parece-me que sim.

O digno Par, o Sr. J. M. Grande, recordou-me com saudade do antigo tempo em que eu estudava logica; quando S. Ex.ª nos foliou em nome da logica, pareceu-me estar ouvindo o meu mestre, que empunhava a férula, e dizia — vamos á lição. Pareceu-me estar estudando o Genuense! Diz S. Ex.ª — porque approvámos o artigo 1.°, devemos approvar o artigo 2.°!—Pois em resposta ao digno Par, digo, que eu não approvei o artigo 1.°, e por isso não approvo o 2. (O Sr. J. M. Grande—Não fallava com o digno Par). V. Ex.ª é grande, e eu sou pequeno, estamos em muita distancia. O digno Par não fallava para mim; acompanha o Sr. Ministro no desfavor com que este me tractou. Fallava para a Camara, porque esta é que é logica, excepto eu. S. Ex.ª collocou-me n'uma grande distancia de si; agradeço-lhe a mercê, o não abdico della; deixe S. Ex.ª estar que não temos abdicação, porque as taes abdicações tambem têem o seu desfavor; ha muita gente que, por ser abdicador, perdeu o logar de Ministro de Estado, que tanto ambicionava, e tanta conta lhe fazia.

Peço desculpa á Camara de a ter occupado algum tempo com a minha pessoa, mas não podia deixar de o fazer, em vista da aggressão que me fez o Sr. Ministro da Fazenda.

Não tractarei da materia, ex professo, mas só na sua generalidade, porque não sou competente, e ninguem póde ser encyclopedico; mas tenho bastante senso commum para acreditar, que se continuarmos a seguir este caminho na estrada do decantado fomento, sempre crescendo, havemos de chegar ao tal retrocesso a que alludiu o Sr. Ministro da Fazenda. Menos palavras, e mais obras; menos programmas, e mais realidades, aconselharei eu a S. Ex.ª,

Ha dias, vi eu um mappa chegado de fora, onde se designavam os differentes caminhos de ferro das differentes cidades, e a ligação delles; a respeito de Portugal tinha tres pontinhos, por que lá fora se sabe que nós por ora não os temos, nem podemos ter. O que eu queria era, que nos alimentasse a esperança de que os haviamos de ter pela fórma que fosse mais conveniente, mas não por meios que nos propõe o Governo.

O Sr. Ministro tambem olhou para mim, e, para assim dizer, me reprehendeu, quando, tractando-se das mallas-postas do Alemtéjo, eu disse, que esse contracto se não havia de cumprir, por isso que eu tinha a convicção moral de que não podia cumprir-se. S. Ex.ª disse então — não se assuste o digno Par, que não hão-de haver indemnisações! — Esta palavra indemnisações, é, para assim dizer, a sombra de Nino, que atormenta e persegue o Sr. Ministro da Fazenda. Eu esperei então os factos, mas o que eu realmente nunca deixei de esperar foi, que similhante contracto se não realisasse; e se o trago por incidente, é para mostrar que o paiz, burlado com as promessas vãs do Sr. Ministro, com a certeza de que já não tem sido cumpridos tantos contractos, deve tambem ter a convicção de que o não serão igualmente de ora avante. S. Ex.ª fallou-nos de um estrangeiro que desejava ser o emprezario das mallas-postas do Alemtéjo, mas que se a Camara não approvasse o contracto, que já estava em vigor, não haveriam indemnisações. Eu logo exclamei, o disse a S. Ex.ª — abençoado estrangeiro, as bênçãos deste paiz venham sobre ti, por isso que tão nobremente vindes esrpôr os teus cabedaes, sem esperança de lucro! Eu lembrei-me daquelle verso de Nicoláo Tolentino:,

Chegou Monsieur de tal,

Medico em Paris formado,

Traz elixir approvado;

Não pertende ajuntar fundo,

Mas cheio do dó profundo

Tira p'lo amor de Deos

Os dentes a todo o mundo.

É o que o Sr. Ministro da Fazenda tem feito. S. Ex.ª tem tirado os dentes a todo o mundo. S. Ex.ª tem mais responsabilidade do que qualquer outro, mas por isso vem sempre com os precedentes! Porque já tal e tal Ministerio assim fizeram!

Eu não tenho procuração para defender nenhum dos outros Ministerios, mas o que noto é, que a esse systema chamavam os antigos, e chamam os estudantes — desculpa de cabo de esquadra.

O Sr. Ministro da Fazenda encontrou socegado o paiz, o assim acontece porque elle já está cançado de revoluções, já conhece, a seu pesar, os heroes, já sabe que a maior parte delles só entram nas revoluções para se locupletarem com o sangue do povo, e então prefere acompanhar qualquer Governo na sua marcha funebre, e não desampara os seus casaes, para vir ao campo da batalha com a escopeta ou fouce roçadoura, preferem isso a serem vexados nos seus lares, e serem mais perseguidos do que o estão sendo com os tributos e com a falta de segurança publica para a qual não chega o dinheiro! Falla-se só em caminho de ferro para lançar poeira aos olhos, como se nós fossemos crianças, e não estivessemos experimentados vendo que o Sr. Ministro da Fazenda tem batido a todas as portas, e a todas as bolsas, não tendo poupado nenhum estabelecimento monetario. Com a fortuna de estar sempre o paiz socegado tem com effeito obtido grandes sommas em dinheiro, mas vejamos os orçamentos e contemplemos esse deficit espantoso que causa horror em vista de tantos recursos que S. Ex.ª tem tido, e com a fortuna de se achar por todos os modos mais desasombrado do que se achavam os seus successores! E continua-se a bater a todas as portas, ás vezes até rediculamente, e entretanto quando nós n'um paiz civilisado não temos uma prisão penitenciaria, e temos o preso de simples correcção junto com o assassino de sete e oito pessoas, olha-se para o theatro de S. Carlos, o cuida-se de o preparar de novo! Invocam-se os mesmos fins utilitários, e segundo a voz publica vai se tractar de um emprestimo de 60 contos para se fazer esse embellesamento faustoso no theatro de S. Carlos onde temos ouvido as melhores vozes do mundo, e se tem feito os melhores concertos de musica, tudo sem que o theatro como está apresente o menor inconveniente para esse fim! Era provavel que qualquer companhia abastada quizesse fazer essa obra, mas foi preciso recorrer-se a pessoas respeitabilissimas dando-se um exemplo inteiramente novo entre nós, porque é um emprestimo de que se encarregam umas poucas de senhoras que eu respeito muito.

O Sr. Ministro da Fazenda faz lembrar um inglez, que passando pelo nosso paiz, escreveu aqui as suas impressões da viagem, e que disse, que se admirou muito de que um religioso leigo de certo convento viesse com uma imagem de s. Sebastião á porta de um protestante para lhe pedir esmola (riso). Não sei se o Sr. Ministro da Fazenda largará a casaca de elegante dandy para vestir a sotaina e por as conchas de peregrino, e com um nicho na mão percorrerá as cidades e os campos como pedindo de porta em porta para os interesses materiaes! (Riso.) Porém o santo que trará no nicho não ha-de ser S. Sebastião, ha-de ser a imagem santa do fomento (riso).

Sr. Presidente, para um theatro que não precisava que se lhe fizessem reparos ou concertos immediatamente, contráe-se um emprestimo; e ao mesmo tempo que isto se faz, deixam-se as prisões no máo estado em que ellas se acham, e nem ao menos se tracta de ensaiar o systema penitenciario. E para que se vai fazer aquelle concerto no theatro de S. Carlos, é porque no dia 16 de Setembro deve fazer-se a coroação de El-Rei o Senhor D. PEDRO V. meu Senhor; e quer-se lisongear assim a Sua Magestade, e uma coroação não se pode fazer sem um theatro dourado por dentro e por fora. Ha-de dizer-se, Vossa Magestade merece tudo: merece é verdade: mas eu estou persuadido de que Sua Magestade, que despreza a lisonja, e que ama só a verdade; preferiria antes que se inaugurasse o seu reinado com a fundação de um hospital, e sobre tudo de uma penitenciaria e de uma boa prisão modelo, do que ter o theatro de S. Carlos dourado, e cheio de ornatos de luxo no dia da sua coroação, e isto por meio tão ridiculo e caricato.

Sr. Ministro, menos palavras e mais obras, e por isso é que eu dei esse conselho a SS. Ex.ªs, ou antes fiz as minhas observações que SS. Ex.ªs attenderão se as intenderem justas.

Concluo pois dizendo, que em presença dos factos que tenho presenceado, não acredito que se possam verificar as promessas dos Srs. Ministros, e por isso voto contra a emissão desta somma de inscripções de que tracta o projecto em discussão, assim como voto contra a creação de outras quaesquer, porque similhantes medidas sem fim nem principio são injustas, ferem o credito, arruinam o paiz, e concorrem poderosamente para o completo desbarato da fazenda publica. Voto contra o projecto.

O Sr. Presidente disse que o digno Par lhe tinha feito uma censura, de que tem d» justificar-se: que S. Ex.ª em todo o seu discurso se tinha dirigido ao Sr. Ministro da Fazenda, attribuindo ás palavras que este proferira uma intelligencia diversa da que lhe parecia que era obvia. As palavras do Sr. Ministro = até o digno Par o reconhece = não pareceram a elle Sr. Presidente, e com elle de certo a toda a Camara, que tivessem o sentido offensivo em que as tomou o digno Par (apoiadas).

Na opinião delle Sr. Presidente o Sr. Ministro queria fazer sentir, que eram taes as vantagens dos caminhos de ferro, e a doutrina que estava expendendo, que até os membros da opposição, e designadamente o digno Par as reconhecia; se elle, Sr. Presidente, as tivesse tomado n'um sentido de offensa, ou de aggravo, teria pedido ao Sr. Ministro que as retirasse, ou explicasse; o que não o fez pelo motivo dito. Sendo por similhante razão que não chamou á ordem nem interrompeu o digno Par, quando alludiu ás indemnisações do Contracto do Tabaco, e fez referencia a uma passagem do Palito Métrico, porque viu que essas expressões sómente se podiam admittir em sentido abstracto, e não suppoz que com diversa intenção fossem ditas pelo digno Par, porque se visse que eram dirigidas individualmente ao Sr. Ministro da Fazenda, teria chamado á, ordem o digno Par, e mostrado que não procedia bem por ir de encontro ao regimento, que é do dever delle, Sr. Presidente, sustentar em toda a sua integridade, e, não sabe faltar aos seus deveres (apoiados).

O Sr. C. de Thomar — Eu não tenho grande necessidade de fallar hoje, mesmo são pequenas reflexões, as que tenho de apresentar: e como o Sr. Ministro da Fazenda disse, que tinha interesse em fallar já, não tenho duvida nenhuma em ceder a S. Ex.ª da palavra, que agora me pertencia.

O Sr. Presidente — Eu pergunto á Camara, se convêm em que falle agora o Sr. Ministro? (Apoiados geraes.)

O Sr. Ministro da Fazenda — V. Ex.ª acabou de explicar do alto dessa cadeira, o modo como tinha intendido as minhas expressões, na parte em que alludi ao digno Par o Sr. Marquez de Vallada. V. Ex.ª interpretou, e muito bem, que a minha intenção não fora de maneira alguma, nem por pensamento ou idéa, querer offender o digno Par, nem tal se podia suppôr das minhas palavras (apoiados). Tambem V. Ex.ª interpretou as expressões de que se serviu o Sr. Marquez, de uma maneira, que lhes dá um caracter inoffensivo: mas V. Ex.ª calcula as expressões do digno Par,»m virtude do seu raciocinio: permitta-me, porém, que eu declare, que não. intendi assim aquellas expressões. Eu intendi que o digno Par me dirigia offensas e injurias; e eu, Sr. Presidente, sei responder aqui e em toda a parte ás injurias que se me dirigirem, e sustentar a dignidade de homem de bem, que me preso de ser. Por vezes tenho ouvido injurias e aggressões, proferidas por S. Ex.ª contra mim; mas nunca as ouvi como hoje: o meu caracter não consente que eu ouça a sangue frio insinuações tão pérfidas, feitas pelo digno Par dentro desta Casa, onde se devem respeitar todos; respeito a que nunca faltei (apoiados): e se algumas vezes me tenho excedido, é depois deter sido provocado e offendido. Assim, eu peço a V. Ex.ª, que convide o digno Par a que declare, se a citação que fez do Palito Métrico, era dirigida á minha pessoa; e declare tambem, se as expressões allusivas ao Contracto do Tabaco eram dirigidas a mim? (O Sr. Marquez de Vallada — Essas não eram.) Depois da explicação do digno Par, eu farei as observações que intender.