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pelo modo por que o Sr. Ministro da Fazenda acaba de tractar a questão (apoiados). O Governo, pelo orgão do Sr. Ministro da Fazenda, declara que insiste em não se querer conformar com a decisão tomada por esta Camara! Ardia o Sr. Ministro em desejos de se declarar em hostilidade com a Camara dos Dignos Pares, e esta não recusa o campo; pois já era sabido que S. Ex.ª está gemendo sob uma certa pressão, em que se pretende figurar mal esta Casa, e desconsideral-a (apoiados); e o Sr. Ministro não teve, como se acaba de vêr, outro fim, porque effectivamente tendem á desconsideração a accusação de usurpadora das attribuições do Executivo, e da outra Camara, de violadora da Carta, e de tomar as suas decisões por surpreza. A Camara tem o direito de repellir estas asserções, aliás infundadas e injustas, saídas do banco dos Srs. Ministros (apoiados).

Mal pensava elle orador que uma questão apresentada na maior boa fé, (O Sr. Visconde d'Algés: — Apoiado.) resultado de um escrupulo que lhe sobreviera o anno passado (apoiados), tivesse este resultado. O orador faz sentir que este negocio foi levado tanto por surpreza que muito tempo havia já que apresentára esta duvida. No principio da sessão do anno passado, chamára a attenção do Governo sobre o objecto; e já então pedíra ao Sr. Presidente do Conselho que houvesse, com os seus collegas, de considerar bem a lei para vêr se acaso havia a divida que suppunha. Ainda mais; tanto se não quiz tomar por surpreza uma resolução neste negocio, que a sua proposta foi apresentada estando presente o Sr. Presidente do Conselho, trocando elle orador nessa occasião algumas palavras com S. Ex.ª a tal respeito. Que culpa portanto terá a Camara de que apresentadas as duvidas na presença do Ministerio, o Ministerio durma? Entenderá o Ministerio que os Pares do Reino, que as commissões desta camara, são seus servos para andarem sempre a pós S. Ex.ª afim de conseguirem a sua presença n'uma parte? (O Sr. Conde da Taipa: — Sobre a ordem.) Pois o Governo vê apresentar uma questão que considera attentatoria da carta, das attribuições do executivo, e da outra casa do parlamento, e não a segue, abandona-a? Pois outro qualquer Ministerio que visse em perigo um artigo da carta n'uma questão tão importante, não compareceria em toda a parte onde podesse ser tratada, para a dirigir e salvar o Código Fundamental da Monarchia? Como se póde portanto dizer, que esta questão foi tratada por surpreza?

O orador repete que a sua proposição fóra resultado de um escrupulo, e mais declara francamente, que quando se publicou a lei, creando o Conselho d'Estado Administrativo, não passou pela idéa que os Conselheiros d'Estado, que não iam exerceras funcções do Conselho d'Estado da carta, mas outras funcções, devessem ser considerados empregados do Governo, e portanto devessem ser pedidos. Mais tarde amigos seus nesta casa disseram que tinham duvidas (O Sr. Visconde de Chancelleiros — Apoiado.) e elle orador bem ou mal, dissera: « pois que não foram pedidos no primeiro anno, não façamos agora disso uma questão », e continuaram os Conselheiros d'Estado a funccionar. Fez mal talvez, em não attender logo ás reflexões e objecções dos seus amigos, sendo certo que no anno passado, como então declarou, e coesta dos Diarios da Camara: «Jurisconsultos da primeira nota, conversando sobre o objecto, pozeram duvida, se os Conselheiros d'Estado, como formando parte d'aquelle tribuna], podiam exercer nelle as suas funcções, sem auctorisação da respectiva Camara.» Assim trouxe innocentemente a questão ao parlamento, não a quiz levar de surpreza, deixou ao ministerio um anno para pensar no objecto. Este anno, regressando do campo, apresentou novamente a duvida, e fez uma proposta que se enviou á commissão de legislação, composta de homens que reunem aos seus grandes conhecimentos juridicos, grande probidade, e eram incapazes de trazerem a esta casa um parecer por surpreza, e menos de desejar que por surpreza fosse votado; (muitos apoiados) nem o Ex.mo Sr. Presidente a cuja honra e probidade todos prestam homenagem, seria Capaz de consentir que se levasse por surpreza um objecto, que toda a Camara julgou simples, e que só o governo julga que tende a distruir a Carta, e a cercear as attribuições da outra Camara, e do executivo.

Mas a commissão, como ia dizendo, examinou a proposta, confrontou-a com a Lei, viu que era um negocio de tanta simplicidade, que não podia admittir opinião em contrario, e então exarou o parecer que se leu em sessão. A Camara, vendo que a materia era clara e de grande simplicidade, não envolvendo em si a questão nos termos em que a apresenta o Sr. Ministro da Fazenda, julgou que nem mesmo era preciso imprimir-se o parecer, votando-o desde logo, havendo mais a notar que foi approvado por unanimidade.

Elle orador não diz, que haja infallibilidade nesta decisão da Camara, mas diz que é audacia da parte do Sr. Ministro o dizer: — vós, Pares do Reino, decidistes contra o que dispõe a Carta Constitucional; usurpastes as attribuições da outra Camara; usurpastes tambem as attribuições do Poder moderador; haveis, portanto, Pares do Reino, desdizer-vos do que resolvestes, ou, pelo menos, consignar n'um projecto de lei isso que entendeis!—É preciso, repete, ter muita audacia e muita coragem o Sr. Ministro da Fazenda, para apresentar por tal modo a sua opinião! Permitta-se-lhe mesmo dizer, que na qualidade de Ministro elle orador não é daquelles que teem tido menos coragem (talvez que os seus proprios adversarios não lhe neguem isto); mas confessa, que lhe faltava a necessaria para proceder como S. Ex.ª acabava de o fazer, e como S. Êx.a deseja que os Dignos Pares procedam.

Acredita, porém, que isto não está na cabeça de S. Ex.ª, e que nesta parte não é mais do que um instrumento de certa pressão malefica, com o damnado intento de negar á Camara a consideração que ella merece, e com vistas de conseguir que possa entrar aqui quem tanto deseja.

A Camara dos Pares votou com toda a reflexão o assumpto em questão; e elle orador espera que se não ha de desdizer da approvação unanime, que deu ao parecer da sua commissão, porque no momento em que se desdissesse, e em presença do modo como foi tractada pelo Sr. Ministro da Fazenda, acabava com a sua existencia, perdia inteiramente a sua dignidade, e desappareceria, por facto proprio, a Camara dos Pares da nação portugueza.

O Conselho de Estado administrativo e contencioso não funcciona. Daqui resultam grandes prejuizos para a causa publica, como se ponderou. Resultem muito embora, diz o Governo, porque insiste na sua decisão, e insiste a tal ponto, que se a Camara dos Pares não quizer por meio de um projecto de lei resolver a questão, tambem o Governo não levará esse projecto á Camara dos Srs. Deputados! Assim, se existisse um conflicto entre as duas casas do Parlamento, como disse o Sr. Ministro, o Governo não lhe importa, pois o que quer é sustentar o seu capricho! Se ha o conflicto (que elle orador julga não haver) era dever do Governo apresentar-se no meio delle.

Diz o Sr. Ministro que a Camara dos Pares cerceou uma attribuição do podér executivo, e que ella não quer seguir o conselho que o Governo lhe dá de reduzir a sua resolução a um projecto de lei. Pois se a resolução da Camara dos Pares cerceou uma attribuição do podér executivo, violou a Carta Constitucional nesta parte, e é preciso interpretal-a neste ponto authenticamente, como é então que o Governo aconselha á Camara dos Pares que faça um projecto de lei a tal respeito? Pois não vê o Governo que propostas desta ordem não podem ter a iniciativa senão na Camara dos Srs. Deputados, e observados os preceitos marcados na Carta? Isto é palpavel (apoiados).

Ora, elle orador entendeu sempre que o corpo legislativo era o conselheiro do Governo; mas depois, do que acabou de dizer o Sr. Ministro da Fazenda vê que se inverteram as posições! Podem as Camaras legislativas entender na sua sabedoria, que uma questão qualquer se deve resolver de tal ou tal fórma, que o Governo entendendo o contrario, e não se conformando com essa decisão, diz ás Côrtes: — aconselho-vos que reconsidereis, porque offende-se a Carta com a vossa resolução! — De modo que vem a apparecer agora uma nova entidade na nossa organisação politica; entidade que vem a ser — um conselho aos corpos deliberantes.

(Entrou o Sr. Presidente do Conselho). É notavel dizer o Governo, que o serviço publico soffre muito com o presente estado de cousas, mas elle Governo não cede! Não sabem os Srs. Ministros que da sua não cedencia ha de necessariamente resultar o conflicto entre o podér legislativo e o podér executivo?...

Já que alludiu a conflicto, precisa dizer a Camara o que pensa a tal respeito. A Camara dos Pares declarou, que entendia que os seus membros, que o eram tambem da secção administrativa, e do contencioso do Conselho de Estado, não podiam accumular ambas as funcções sem serem pedidos pelo Governo, e consentidos pela Camara; e deu-se como provado, que a Camara dos Srs. Deputados entende a lei em sentido contrario. Deseja elle orador se lhe diga quando foi tractada esta questão naquella casa? Antes da resolução tomada pela Camara dos Pares, não (apoiados): depois, não se podia dar o conflicto, porque nas circumstancias de accumular as funcções legislativas com as de membro das secções do contencioso e do administrativo do Conselho de Estado só o estão os Srs. Ministros da Fazenda e da Justiça; e como S. Ex.ª são Ministros não se póde dar o caso de apparecer o conflicto, porque não ha logar a pedir, com relação a S. Ex.ª, uma decisão igual á tomada por esta Camara.

O orador podia neste ponto invocar o testimunho de membros da outra Camara muito competentes e respeitaveis, com quem ha conversado a este respeito, que se tem mostrado de accôrdo com a resolução que a Camara dos Pares tomou. Mas se apparecesse o conflicto?... É sua opinião que a Camara dos Srs. Deputados estava no direito de resolver na sua alta sabedoria o contrario do que a Camara dos Dignos Pares resolvêra, porque podia entender de differente modo a applicação do direito ao facto. Dada, porém, a divergencia, ao Governo cumpria vir perante o Parlamento defender pelos meios constitucionaes a sua opinião. Foi o que se não fez: até se praticou o contrario desta doutrina, vindo o Sr. Ministro da Fazenda declarar que a resolução tomada por esta Camara é illegal, e que não póde por modo algum produzir os seus effeitos!...

Diz o Sr. Ministro, que as secções do contencioso administrativo do Conselho de Estado, hão de funccionar porque assim o quer S. Ex.ª! Hão de funccionar porque S. Ex.ª tem na Lei os meios para obrigar os membros dessas secções a irem ahi trabalhar!... Bem se sabia já que esta era a doutrina do Sr. Ministro da Fazenda. Doutrina acompanhada de ameaças contra os Conselheiros de Estado!... Elle orador, pela sua parte, declara, que com quanto respeite muito o Sr. Ministro da Fazenda, como lhe tem mostrado, não póde comtudo admittir, nem receia pela sua parte taes ameaças, que de certo fazem á causa ministerial maior mal que bem; mas sempre deseja vêr esses meios que o Governo tem para fazer funccionar o Conselho de Estado nas secções do contencioso administrativo, uma vez que os Dignos Pares que fazem parte daquelle Tribunal, queiram conformar-se com a resolução adoptada, como não poderá deixar de acontecer! Deseja saber quaes são esses meios que S. Ex.ªs tem á sua disposição, para obrigar esses Conselheiros de Estado a sujeitarem-se ás ordenado Sr. Ministro da Fazenda! Exclamou o Sr. Ministro que se cerceou um direito ao Poder executivo! Não vê o Sr. Ministro que os ditos Conselheiros de Estado, fortes com a intelligencia que dão á Lei e fundados na resolução desta Camara estão no seu direito, recusando-se ao exercicio de taes funcções? Não vê ainda S. Ex.ª, que mesmo na presença da resolução da Camara elles se podem recusar a accumular as funcções legislativas com as de Conselheiro de Estado administrativo, porque a Lei diz que poderão accumular, querendo? Em vista da Lei, e depois da resolução que a Camara tomou, elle orador não sabe que haja membro da Camara dos Pares que queira ir de encontro a uma resolução da Camara, só para fazer a vontade ao Sr. Ministro da Fazenda (apoiados)!

Ao argumento dos treze annos, apontado por S. Ex.ª já respondêra, expondo franca e singelamente o que se passár a tal respeito; mas ainda dirá, que se S. Ex.ª pensa que o argumento tem alguma força, deve lembrar-se que nos proprios Tribunaes judiciaes se resolve muitas vezes por espaço de vinte e de trinta annos, considerando-se a Lei por uma fórma, e depois dando-se uma outra intelligencia á mesma Lei, se julga de modo differente. Ora, se isto acontece nos Tribunaes judiciaes, para que vem o argumento dos treze annos, e que ainda assim só poderia de algum modo proceder, se a questão já tivesse sido discutida e decidida pelo Parlamento, o que ainda não havia succedido, e só agora pela primeira vez veio á téla da discussão n'uma das Camaras onde foi logo decidida de modo contrario á opinião do Sr. Ministro?

É verdade, que a Carta Constitucional permitte a accumulação das funcções do Conselheiro de Estado com as de membro do Parlamento: mas não sabe que a Carta tracta das funcções politicas e não das administrativas? Quem duvida que o dador da Carta só teve em vista o Conselho de Estado politico, e não a Lei, pela qual mais tarde se organisou o Conselho de Estado administrativo, exercendo as funcções que só devem ser desempenhadas pelo Supremo Tribunal de administração publica, como cupula da organisação administrativa, e que foram conferidas ao dito Conselho, unicamente por principio de economia, e para evitar a creação deste outro Tribunal? Quando se publicou a Carta, lembrou-se sequer que os Conselheiros de Estado, além das funcções politicas haviam ainda exercer as administrativas? De certo que não.

E não se diga comtudo que o Conselho de Estado politico tambem é ouvido sobre assumptos administrativos, porque com quanto seja exacto que o Conselho de Estado politico é ouvido sobre os assumptos e medidas geraes de administração, isso diversifica muito das attribuições que depois se lhe concederam em virtude da Lei, que lhe deu nova organisação como Tribunal administrativo. E se isto não é cousa muito differente, pergunta porque se não vão buscar os Conselheiros extraordinarios para exercerem funcções politicas e sob a presidencia do Rei? Não se vão buscar, porque estes Conselheiros não são aquelles de que falla a Carta Constitucional. Tudo isto mostra exuberantemente a sem razão com que o Sr. Ministro argumenta.

É preciso convir em que o modo porque o Governo se tem querido haver neste negocio, só póde trazer comsigo o estabelecer um conflicto entre esta Camara e o Governo; entre esta mesma Camara e a dos Srs. Deputados; e finalmente entre o Governo e as duas Casas do Parlamento; porque o Governo pretendendo mostrar-se defensor das prerogativas do Poder Moderador, se apresentou na Camara de uma maneira inconveniente, chegando a accusal-a de violadora da Lei, usurpadora das prerogativas do Poder Moderador (apoiados), e menospresadora das attribuições do Parlamento (apoiados), o que ninguem podia esperar ouvir da bocca do Sr. Ministro?! (Apoiados.) Haja pois mais prudencia, circumspecção e sangue frio (apoiados). Para que veio S. Ex.ª trazer a publico o que se passou nessa conferencia particular? Para que publicar aqui o Sr. Ministro da Fazenda o que se discutira ou debatera nessa mesma conferencia? Talvez que só para obrigar a Camara a uma triste figura, pois S. Ex.ª pretendia induzi-la a desdizer-se no dia seguinte do que dissera na vespera!... Ao Sr. Ministro cumpria apresentar-se como conciliador, trazendo as cousas ao verdadeiro campo, mas nunca leva-las tão longe, como as levou! Neste caso elle orador sente que S. Ex.ª assim procedesse, e deixa a responsabilidade a quem de direito pertença.

O Sr. Presidente concedeu a palavra sobre a ordem ao Sr. Conde da Taipa.

O Sr. Conde da Taipa cede da palavra. O Sr. Presidente pela inscripção dá a palavra sobre a ordem ao Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Ministro da Fazenda—Tenho a palavra agora sobre a ordem, mas desejava saber se S. Ex.ª me tinha inscripto sobre a materia?

O Sr. Presidente declara a S. Ex.ª que tambem tem a palavra sobre a materia, mas não neste logar, porque primeiro a tem o Sr. Ferrão.

O Sr. Ministro da Fazenda—Pois direi agora duas palavras sobre a ordem, e depois fallarei sobre a materia; e uso agora da palavra, porque me parece que o Sr. Conde de Thomar me fez uma allusão tão pungente, que não posso deixar de me explicar a respeito della.

O Sr. Conde de Thomar disse, por mais de uma vez, que o meu procedimento neste assumpto era filho d'uma certa pressão, que me queria levar a romper abertamente com a Camara dos Dignos Pares. Eu bem sabia, que se empregava este meio para explicar o meu procedimento, considerando-me escravo de certas influencias maleficas, que me queriam fazer instrumento seu para atacar a Camara dos Pares, e sei igualmente quem inventou esta calumnia, e tenho a lealdade de declarar, que não foi o Digno Par; mas admira-me que S. Ex.ª lhe desse credito, e se encarregasse de a espalhar; porque S. Ex.ª, que me conhece bem, que já foi meu collega no Ministerio duas vezes, deve saber, que se ha homens neste mundo pouco proprios para se deixarem dominar por influencias estranhas, eu sou um delles; e ha muita gente mesmo, que explica uma certa opposição systematica que me é feita, pela impossibilidade que ha de eu me deixar ceder a pressões.

Parecia-me que o meu caracter como homem publico era bem conhecido, para que os meus adversarios não recorressem a este meio para me combaterem. Para mim a posição de Ministro é um sacrificio e não beneficio, porque nunca tiro proveito della; a unica cousa que ambiciono é cumprir com o meu dever, como eu o entendo; e póde V. Ex.ª ter a certeza, e a Camara tambem, de que me não tenho arrependido até agora de ter seguido sempre, tanto na vida publica como na particular, os impulsos da minha consciencia. No dia em que me fóra preciso occupar a melhor posição do mundo á custa de um acto que a minha consciencia não approvasse, eu sacrificaria sem repugnancia essa posição, e por isso me julgo muito superior a uma accusação desta ordem, e admira-me que S. Ex.ª a trouxesse aqui.

Entrei no Ministerio por circumstancias estranhas á minha vontade, e supponho que o Digno Par não ignorará os esforços que empreguei para me subtrahir a esse encargo: entretanto ainda me não arrependi de me ter ligado aos homens a que estou unido, e afano-me de ter merecido o apoio dos homens honestos e desinteressados, que me sustentam dentro e fóra do Parlamento. Hei de saír do Ministerio com alguns amigos de menos: não me fazem falta porque eram falsos amigos; mas em compensação hei de saír com alguns amigos de mais, e esses compensar-me-hão dos que perdi, e que perdi sem que a consciencia me accuse de ter contribuido para isso.

Recommendaram-me moderação, n'um discurso pronunciado com a violencia que a Camara ouviu, a mim que fallei com sangue frio! E verdade que fallo ás vezes com calor, mas agora nem essa arguição me podem fazer. Não choveram os ápartes do Digno Par que me fez esta interpellação, e quasi todos elles contendo allusões pungentes e offensivas? E em quanto ao que eu disse, peço que se me cite uma só expressão, da qual se podesse deduzir menos respeito da minha parte por esta Camara.

Quando disse eu aqui que a Camara tinha votado por surpreza? Aqui estão os Srs. Tachygraphos, que devem ter escripto tudo o que eu disse, e dou licença para que quando elles traduzirem as suas notas, corra o meu discurso, sem que eu o reveja, pelas mãos dos Dignos Pares.

Eu não disse que a Camara tinha usado de surpreza: entrei unicamente na apreciação do facto, e disse e repito, que os Ministros não foram convidados a ir á commissão, nem a vir assistir ao debate do parecer, que motivou esta interpellação. Este parecer foi apresentado, lido e approvado, sem ter sido impresso, distribuido e dado para ordem do dia, prescindindo-se deste modo de todas as regras regimentaes. O Digno Par chama a isto surpreza, eu não o chamei, só descrevi o facto. Mas, diz o Digno Par, porque não andaram os Ministros atrás da commissão? Para mim é inteiramente novo o pertender-se, que os Ministros andem atrás das commissões para saberem quando se reunem. Não foi nunca, pelo menos, esta a pratica desta Casa. São as commissões, que tem a cortezia de convidarem os Ministros a irem discutir com ellas os assumptos importantes, sobre que tem de dar parecer. Se a Camara entende porém, que esta pratica deve cessar, é bom que o declare para que os Ministros saibam em que lei hão de viver. Não espero porém, que o faça, porque a Camara não póde querer, que os Ministros aos muitos encargos que já teem, juntem mais o de andarem atrás das commissões a pedir-lhes que os ouçam sobre as propostas, que se apresentam nesta Casa. Dia virá, em que eu lembre esta theoria ao Digno Par.

Disse S. Ex.ª que nunca imaginou a audacia com que eu me tinha apresentado neste debate. Se S. Ex.ª queria dizer coragem é esta uma qualidade, que S. Ex.ª sabe, que eu tenho, porque S. Ex.ª, que já me conhece, tem-me visto em muitas situações difficeis, e nunca me viu voltar as costas ao inimigo. Porém, qual foi a audacia de que dei provas nesta Casa? Surgiu aqui uma interpellação ácerca do Conselho de Estado, perguntou-se se elle funcciona ou não, e o motivo porque não funcciona; e eu respondi, que não sabia se elle funccionava ou não, porque ignorava isso; porque não era da minha competencia, mas no ultimo caso, disse eu, o Governo tem na lei os meios precisos para fazer com que elle funccione. Ora S. Ex.ª achou esta resposta audaciosa, mas eu creio que ella é bastante curial.

Se se perguntasse ao Sr. Ministro da Marinha a razão porque o Conselho Ultramarino não funccionava, S. Ex.ª diria que no caso delle não funccionar tinha na Lei os meios necessarios para o fazer funccionar. Portanto, não sei em que ha nisto ameaças. Qual é o Conselheiro de Estado que ameacei?

Peço a S. Ex.ª que me diga se eu ameacei aqui. alguem? Seriam ameaças um meio de fazer hoje alguma cousa? Seriam um meio de chegar a algum resultado? Vim offender gravemente esta Camara? Foi em declarar que o Governo entendia que a interpretação que a Camara deu a um artigo da Carta era objecto de uma Lei. O Governo disse, e continua a dizel-o, porque tem coragem para cumprir o seu dever, que a sua opinião é differente da da Camara dos Dignos Pares que a resolução que esta adoptara merecia ser tomada com as formalidades prescriptas no Regimento. Mas não obstante não se ter feito assim, o Governo não veiu pedir á Camara que modificasse a sua resolução, o Governo aconselhou só que se fizesse desta resolução um projecto de lei para ser remettido para a Camara dos Senhores Deputados, porque era opinião sua, que esta interpretação não podia ser dada senão por uma Lei; mas agora querer-se ainda que o Governo apresente uma proposta no sentido dessa resolução na outra Camara, quando elle nem foi ouvido sobre ella, quando elle tem uma opinião contraria, é exigir muito. Pois julga-se que ha seis homens que conheçam tão pouco a sua dignidade, que desçam tão baixo? Estará já o Governo