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SESSÃO N.° 28 DE 23 DE FEVEREIRO DE 1907 273

tos extraordinarios e a administração das finanças em Portugal.

Creio que o projecto actual é uma boa medida e que muito deve contribuir para uma sensata e pratica orientação do regimen das finanças publicas.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - Vejo que o Digno Par Sr. Mello e Sousa se referiu á Carta Constitucional, como que estranhando que ella haja sido por vezes invocada no presente debate.

Ora eu recordo-me de nem sempre ter havido enthusiasmo na defesa do codigo fundamentar do Estado; e até creio que o Digno Par Sr. Mello e Sousa iniciou a sua carreira parlamentar acompanhando um Governo que por vezes deixou de cumprir os preceitos da Carta.

Já disse e repito que é minha opinião que a lei em debate não trará beneficios para o paiz; nem exemplos de moralidade, nem correcção a quaesquer abusos, mais ou menos inveterados na administração do Estado. (Apoiados).

Não vou discutir a Constituição ingleza. A esse respeito já o Digno Par e meu amigo Sr. Teixeira de Sousa, em resposta ao Sr. Costa Lobo, esclareceu por completo a Camara. É á nossa Constituição que tenho de me referir.

E assim vou provar que o projecto que se discute é a negação de todo o systema parlamentar.

Effectivamente, este projecto de contabilidade publica contraría inteiramente os preceitos mais substanciaes da nossa Carta Constitucional, porquanto, sendo o orçamento o computo e fixação de receitas e despesas, ficam os Pares e Deputados inhibidos de, na discussão do orçamento, apresentarem quaesquer propostas desde que envolvam augmento de despesa ou diminuição de receita. Como pode, assim, o Parlamento discutir e corrigir o orçamento se as receitas forem exaggeradas, e as despesas insufficientes?

Se, pela Carta, são os Pares e Deputados que fazem as leis, como se pode impedir o Parlamento de modificar, para mais ou para menos, consoante a verdade dos factos, o que o Governo consignar na sua proposta de lei do orçamento?

Não só a Carta, mas o Acto Addicional de 1852 determinam e precisam as funcções do Governo e as das Côrtes. Ás Côrtes compete fixar as despesas e estatuir sobre os rendimentos do Estado; ao Governo cumpre executar o que assim se resolver. Mas esta nova lei de contabilidade impede o Parlamento de exercer, como deve, as suas funcções constitucionais. (Apoiados).

Quando um Governo apresentar um orçamento que não expresse a verdade dos factos, ficam os membros do poder legislativo, com esta lei, impedidos de o alterar!

Classifico este proceder de verdadeiramente extraordinario. Muita ha de ser a desordem e os embaraços resultantes das disposições da lei, as quaes obstam a que possam ser emendadas verbas erradamente calculadas.

O Governo calcula exageradamente, a commissão de fazenda reconhece que o calculo foi exagerado, mas como não pode apresentar propostas que importem augmento de despesa, ou diminuição de receita, a verdade não se restabelece.

Isto reflecte-se depois na Camara, porque esta fica igualmente inhibida de corrigir os erros e de estabelecer a exactidão das verbas.

Por esta forma, a lei que se vae votar tira ao Parlamento a sua fiscalização, aliás absolutamente conveniente e imprescindivel. (Apoiados).

Esta lei representa, pois, um rude golpe na acção parlamentar.

É vedado aos representantes do paiz o que ha de mais importante e necessario - o exame e a contraprova da verdade no orçamento geral do Estado.

D'aqui por deante, pode o Governo elaborar os orçamentos como entender; o Parlamento não poderá corrigir os erros do calculo, nem restabelecer a verdade dos factos.

Vozes: - Muito bem, muito bem. (S. Exa. não reviu).

O Sr. Luciano Monteiro: - Tendo requerido para que se prorogasse a sessão até se concluir o debate, em que a Camara está empenhada, mal andaria se usasse demasiadamente da palavra.

Estando pois no proposito de condensar o que se me offerece dizer, no menor numero de palavras, não me preoccuparei com o que a Constituição ingleza preceitua, e muito menos tratarei de apurar o que a respeito de assumptos economicos disseram Sturm, Besson e Leroy Beaulieu.

Não possuo nenhuma especie de relações com estes illustres economistas.

O Digno Par Hintze Ribeiro pretendeu demonstrar que o artigo 13.° do projecto é anti-constitucional, porque extingue o exercicio e a acção do Parlamento.

Diz S. Exa. que o Governo, vendo uma longa estiagem, e prevendo por isso um mau anno cerealifero, calcula a receita dos cereaes n'uma certa quantia. Vem depois a chuva: e a perspectiva de uma colheita escassa converte-se na certeza de uma producção abundante. Dadas as disposições do projecto, diz o Digno Par, o Parlamento não tem meio de corrigir o calculo.

A este argumento tenho a dizer que no projecto não ha artigo nenhum que impeça essa fiscalização.

O projecto não altera, não restringe o direito que ao Parlamento cabe de applicar aos orçamentos as correcções que forem indispensaveis.

O projecto, ao contrario, o que dispõe é que por occasião da discussão do orçamento se não proponham novas despesas e diminuição de receitas.

O orçamento é uma relacionação de despesas e de receitas, auctorizadas por leis anteriores, e determinadas por circumstancias que nas proprias leis estão fixadas.

É isto o orçamento, e o que sempre tem sido.

Apresentado esse rol ou essa relacionação ao Parlamento, este não fica por forma nenhuma inhibido de ratificar quaesquer erros de calculo.

É um direito indiscutivel que ao poder legislativo compete, e que o projecto mantem sem a mais pequena alteração.

O Sr. Ernesto Hintze Ribeiro: - Mas é isso o que não está no projecto. Dispõe-se n'elle que se não podem apresentar propostas que importem augmento de despesa ou diminuição de receita e portanto não ha meio de corrigir os calculos feitos.

O Orador: - O Digno Par e meu illustre amigo - amizade nunca desmentida e provada com factos - com a sua muita intelligencia, com o seu espirito luminoso, e com a sua indiscutivel seriedade, deve comprehender muito bem que o facto de corrigir calculos é uma cousa diametralmente opposta á apresentação de propostas que augmentem a despesa ou diminuam a receita.

Aqui tem a Camara a razão por que eu sustento que o artigo 13.° do projecto não pode apresentar uma restricção ás faculdades parlamentares.

As regalias, os privilegios e os direitos parlamentares não soffrem com o projecto a mais pequena alteração.

Não deixo de concordar em que essa disposição podia deixar de ser incluida na lei, se todos tivessem justa comprehensão dos seus deveres politicos.

Nós estamos a viver n'um regimen a que falta a sua base fundamental.

O que falta é um bom corpo eleitoral que dê ao paiz uma representação genuina e que colloque o poder legislativo n'uma absoluta independencia.

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).