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SESSÃO N.° 28 DE 18 DE JULHO DE 1908 9

que declararam que, estando ha um anno a reger as suas respectivas cadeiras, não lhes é paga a devida remuneração.

Ao primeiro, o Sr. Dr. Ferreira Cardoso, paga-se-lhe o ordenado de professor, mas por isso mesmo não lhe pagam o ordenado de medico do Asylo Municipal de Lisboa para que se encartou, paga direitos de mercê e respectivos emolumentos.

Ao segundo não lhe pagam o ordenado de professor do lyceu, attenta uma má interpretação que se dá ao artigo 21.° da lei de contabilidade publica.

A lei de contabilidade diz que nenhum funccionario pode accumular mais de uma commissão remunerada; mas devo declarar que os professores citados não estão nessas condições, quer dizer, a unica commissão que exercem é a de professores do Lyceu de Lisboa.

As nomeações annuaes que recaem em professores que, como os reclamantes, o são e teem sido ininterruptamente durante largos annos, são a melhor confirmação dos seus serviços anteriores, e só sob este aspecto deveriam ser consideradas. O criterio attribuido ao artigo 21.° da lei de contabilidade transforma-as porem num verdadeiro castigo, que outra cousa não é a tarefa de ensinar officialmente, sem a correlativa retribuição d'este trabalho.

Mas quando mesmo se não tomem em consideração os serviços anteriores prestados por estes professores, bastaria que a applicação exacta da lei lhe fosse imposta, pois ella permitte-lhes o desempenho da commissão em que se acham investidos, e attribue-lhes a correspondente remuneração.

Não diz a lei que o cargo em que o funccionario se ache encartado seja bem ou mal remunerado; tenha uma, duas ou muitas gratificações; tão somente estabelece que com o desempenho d'esse cargo se não possa accumular mais de uma commissão remunerada, e tal é o caso dos professores reclamantes.

Este mesmo justo criterio foi o que a outros professores foi applicado, e não ha argucias ou subtilezas capazes de explicarem a excepção havida para com os professores citados.

E tanto o criterio interpretativo do citado artigo 21.° da lei de contabilidade tem sido fluctuante e elastico por parte da mesma repartição, que agora mesmo, no actual momento, se acham em commissão de presidentes de jurys de exames nos lyceus professores, aliás muito illustres, em que concorrem condições bem mais desvantajosas, sob este ponto de vista, do que as que interferem com os professores reclamantes.

Qual será, pois, a resolução que superiormente se adoptará com referencia a esses professores, que não são obrigados a prestar gratuitamente os serviços que o Estado d'elles reclama?

Posso bem garantir que a questão que com um d'estes professores se debate, tem fundas raizes politicas, cuja historia pode ser que tenha de ser trazida á luz do dia; e só assim se poderão explicar as difficuldades originaes que lhe foram criadas. Quasi posso asseverar que de facto a victima por quem me interesso foi uma especie de cabeça de turco, apresentada á indomavel teimosia do Sr. João Franco.

A questão é, emfim, uma questão de moralidade e de justiça.

O Sr. Dr. Ferreira Cardoso, desde 1895 que é professor provisorio do lyceu do Carmo de Lisboa, e o Sr. Joaquim José de Barros é professor provisorio do mesmo lyceu desde 1902, e em virtude de uma má interpretação do artigo 21.° da lei de contabilidade é que não lhes pagam. A lei diz que qualquer funccionario não pode accumular mais de uma commissão remunerada, mas nenhum d'estes professores accumula mais de uma commissão que é a de professores provisorios do lyceu do Carmo.

Por mais que puxem, não são capazes de arranjar a estes dois funccionarios mais que esta commissão.

O Sr. Joaquim José de Barros, que é official de marinha, tem apenas um unico logar, que é o de chefe de serviço do Observatorio Meteorologico do Infante D. Luis na Escola Polytechnica, em cujo cargo se encartou e de que pagou os respectivos direitos de mercê. A interpretação dada á lei na repartição de contabilidade não pode ser applicada a estes professores. Alem d'isso, ha annos que estão regendo as suas cadeiras com louvor, por parte do reitor, acceitando o Governo os seus serviços, não se comprehendendo que não lhes mande pagar.

Perguntei se no projecto em discussão iam incluidos os ordenados a estes professores, e responderam-me que se incluiram todos menos estes.

O Sr. Ferreira Cardoso foi subdelegado de saude e medico de um asylo municipal, pelo que pagou direitos de mercê d'estes dois logares vitalicios e soffrendo descontos, de um logar - medico dos asylos - não se lhe pagando respectivo ordenado. Foi, como disse, nomeado professor do lyceu ha cem dias exercendo com a maior proficiencia o seu logar, unica commissão que exerce.

Sr. Presidente: a lei de contabilidade publica não pode por forma nenhuma attingir estes dois professores.

Se o Governo, por qualquer circunstancia, entendia que não devia pagar a estes professores, então não acceitasse os serviços que elles prestaram. Eu não comprehendo, Sr. Presidente, que professores tenham, segundo a lei, de exercer os trabalhos inherentes á sua profissão, e, afinal, nem lhe pagam os ordenados, durante o anno, nem as gratificações respectivas, pelo seu serviço de exames.

Outros professores ha, porem, que não soffrem estas inclemencias.

A um distincto professor da Universidade de Coimbra, e que é ao mesmo tempo professor do Lyceu, pagam-lhe e pagam-lhe muito bem, ordenados ou gratificações por todos os logares que exerce, e eu contra isso não me revolto, porque é necessario remunerar bem quem trabalha; mas o que é certo é que para com estes dois professores a quem me tenho referido, se dá o que tenho apresentado á Camara.

Não se pode admittir por forma nenhuma que o Estado pretenda eximir-se ao pagamento de trabalhos que manda executar, ou acceita e permitte que desempenhem.

Se isto assim continua, não admirará que muitos funccionarios se recusem a fazer os serviços que lhes sejam ordenados.

Não está presente o Sr. Presidente do Conselho e por isso eu peço ao Sr. Ministro da Guerra a fineza de transmittir a S. Exa. estas considerações, que acabo de fazer e de dizer-lhe que não é justo - e naturalmente S. Exa. é da minha opinião - que se não pague a funccionarios publicos que prestam serviços importantes, e tanto mais que se estes professores não funccionassem, tinham de nomear outros a quem tinham de pagar.

Se por acaso é necessario reformar-se a lei de contabilidade publica, para que se não dêem estas anomalias, reforme-se.

Uma lei que permitte estes absurdos annulla-se.

Sr. Presidente: peço desculpa á Camara pelo tempo que lhe tomei com as minhas considerações.

Vou mandar para a mesa o seguinte requerimento:

Requeiro que, com urgencia, me sejam enviados por copia os processos relativos aos professores do Lyceu Central da 2.ª zona escolar de Lisboa Dr. Manuel Ferreira Cardoso e Joaquim José de Barros, a saber:

a) Requerimentos dos interessados, pedindo o abono dos vencimentos a que
se julgam com direito;

b) Pareceres da Procuradoria Geral da Coroa sobre as duvidas levantadas pela respectiva repartição de contabilidade;

c) Quaesquer memoriaes ou requerimentos dos interessados com as res-