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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 215

um dos directores da companhia do caminho de ferro na galeria, director de quem o sr. Fontes era collega.

Portanto, sr. presidente, uma similhante resposta era altamente significativa, e tanto mais significativa, quanto ella se refere a um projecto que era uma verdadeira espoliação, nada mais nada manos, do que um ataque directo ao direito de propriedade dos portadores de obrigações.

Repetirei, pois, o que disse já noutra occasião, é necessario que os ministros afastem de si toda a qualidade de suspeita em que possam ser envolvidos, porque têem obrigação de não parecerem o que realmente não são: é necessario que se de satisfação completa ao paiz, e foi por isso que eu achei regular o procedimento do sr. presidente do conselho, demittindo-se do logar de director da companhia dos caminhos de ferro.

Eu sou justo, e por isso digo as verdades ás vezes por uma forma rude, forma que produz uma certa má impressão no animo de alguns dignos pares; mas, como entendo que se deve ser muito claro para a nação e para o Rei, entendo que se deve chamar ás cousas pelos seus proprios nomes, e expol-as por fórma que não reste a mais leve duvida sobre a sua significação, e não apresental-as com rodeios e ornatos, que as desfiguram por tal modo que ninguem as conhece.

Digo, portanto, as verdades como eu entendo que ellas devem ser ditas; tenho todo o respeito por v. exa., sr. presidente, e por todos os dignos pares membros d’esta camara, mas não se falta ao respeito quando se traduzem os pensamentos por palavras adequadas e proprias, embora ellas sejam muitas vezes ásperas.

O sr. presidente do conselho quiz attenuar a sua responsabilidade por não ter aberto concurso para o caminho de ferro de Valle do Tejo, com a concessão do caminho de ferro do Caceres, asseverando que esta linha prejudica o caminho de ferro da Beira Baixa.

Sr. presidente, eu direi que a concessão d’aquella linha foi feita salvaguardando todas as garantias para o caminho de ferro da Beira Baixa. Não obstante, estou convencido que o sr. ministro que fez a concessão exorbitou, e que concedeu o que não estava nas suas attribuições. É verdade que a maior responsabilidade cabe ao sr: Avelino, que espontaneamente mandou offerecer á companhia a concessão do ramal de Caceres.

N’este facto reconheça a camara as relações que havia entre a companhia e os ministros regeneradores.

O governo não póde nem deve consentir que essa linha se faça, porque, feita ella, a provincia do Alemtejo o a Extremadura e Lisboa ficara a descoberto e sem meios de defeza para impedir qualquer invasão. A feituna d’aquella linha inutilisaria os esforços do honrado marquez de Sá, que conseguiu que o caminho de ferro de Badajoz passasse sob as muralhas de Eivas, o que custou centenares de contos . ao thesouro.

Alem d’estas rasões, ha outras ainda que devem influir no animo do governo. Eu entendo que o governo não póde nem deve consentir na construcção d’esta linha, porque a concessão á companhia é condicional. A companhia não póde proceder a trabalhos, emquanto uma com missão militar não concordar no traçado, e emquanto essa commissão não declarar que não prejudica a defeza do paiz. Se esta linha tem este grande inconveniente de não servir para a defeza da nação, antes prejudical-a, o caminho de ferro da Beira Baixa tem ainda a seu favor estas condições, porque é altamente estrategico, e um caminho que segue defendido por um lado pelo Tejo e pelo outro por uma cordilheira de montanhas, e tanto assim é que o governo hespanhol, reconhecendo isto, poz duvidas relativamente ao ponto do entroncamento d’este caminho, pelo considerar sob este aspecto muito favoravel para Portugal e pouco para Hespanha. Quem tem amor de patria, quem diz constantemente que é necessario fortificar Lisboa e tratar de empregar todos os meios para defender o nosso territorio, a primeira cousa para que tinha obrigação de olhar seriamente, era para os te ponto, que é dos mais graves.

Se o sr. presidente do conselho não só importa que a provincia do Alemtejo e da Estremadura, e sobretudo Lisboa, fiquem abertas a qualquer invasão, para que está sempre a onerar o paiz com a compra do armamento, e infelizmente de armamento que não presta?

Sr. presidente, attentas as declarações que fez o sr. presidente do conselho, de que as circumstancias precarias do thesouro não permittem na actualidade a feitura do caminho de ferro da Beira Baixa, dirigir-lhe-hei ainda algumas perguntas. Desejo saber como o sr. Fontes considera, em presença das suas declarações, a auctorisação que lhe foi concedida pelo parlamento para a construcção do caminho de ferro da Beira Alta, auctorisação que não é preceptiva e que por consequencia o governo podo fazer ou deixar do fazer uso d’ella.

O sr. presidente do conselho entende e reconhece que o paiz está em circumstancias muito criticas, e que as finanças não podem effectivamente consentir largos despendios. Portanto pergunto ainda a s. exa. só em virtude da auctorisação que lhe dá a camara, para construir por conta propria o caminho de ferro da Beira Alta, o governo tenciona mandar construir immediatamente essa linha, no caso de não se apresentar companhia em condições de lhe ser adjudicada? Pergunto tambem se o governo, que julgou o caminho de ferro do Algarve, de segunda ordem, e que o queria de via reduzida, o fará construir immediatamente, logo que a auctorisação seja approvada pelo parlamento?

Sobro estes pontos desejo e espero que o governo esclareça a camara, o paiz, e declare a sua opinião, clara e precisamente.

É necessario que se saiba quaes são os principies do governo, e se elles têem diversidade do applicação, segundo a linha ferrea for da Beira Alta ou da Beira Baixa. É necessario que a guia do governo seja a justiça e a moralidade, e não se prenda com vinganças mesquinhas e deploraveis para lhe sacrificar os interesses publicos.

É necessario que a fazenda publica seja administrada com economia, e t não esbanjada pelos caprichos e affeições do sr. Fontes. É necessario sobretudo moralidade, moralidade moralidade.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Eu peço desde já desculpa á camara da perturbação que possa apresentar nas minhas considerações, porque, com effeito, o assumpto tem sido por tal modo desordenado na maneira por que esta interpellação se tem verificado, que realmente eu não sei se poderei acompanhar os oradores que têem fallado, e responder ás diversas considerações que têem sido feitas.

Permitta-me v. exa. que eu antes de tudo me colloque inteiramente fóra de toda a apreciação politica, e de todas as arguições violentas e virulentas com que o digno par o sr. Vaz Preto tem verberado a situação, de que tenho a honra de fazer parte, na pessoa do sr. presidente do conselho.

Sr. presidente, eu entendo que todos nós temos obrigação de fallar a verdade, e de tomar como divisa aquella phrase de D. João de Castro, quando, escrevendo ao senado de Goa, disse: Aquella verdade secca e breve que me Nosso Senhor deu.

Eu entendo que é obrigação de nós todos fallarmos a verdade ao paiz, ao Rei, e aos poderes constituidos, como sentimos e como entendemos em nossa consciencia. Portanto, não creio que seja um monopolio de s. exa. fallar a verdade, porque essa liberdade ou esse dever é igualmente commum a todos os dignos pares, e a todos os homens que têem voz em qualquer das casas do parlamento.

Mas, parece-me, sr. presidente, que a primeira cousa que, devemos tambem fazer, é respeitarmo-nos uns aos outros, e não attribuirmos a intenções reservadas e menos dignas quaesquer observações que façamos.