DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 217
o caminho de ierro da Beira Baixa, porque o projecto definitivo da Beira Alta só foi apresentado em fevereiro de 1876.
Mas, ha mais alguma cousa com respeito ás distancias, porque alem de que a extensão da linha foi reduzida de 232 kilometros a 201, o que muito reduz a despeza total, é sabido de todos que o ante-projecto do sr. Combelles partia de Mogofores e o projecto do sr. Eça parte da Pampilhosa, dando a differença de muitos kilometros de encurtamento no percurso do traçado da Beira Alta.
(Leu.)
Quer dizer, ha uma differença de 188 kilometros, resultando ainda um encurtamento de 44 kilometros, pelo traçado do sr. Eça em relação ao ante projecto do sr. Combelles.
Aqui tem v. exa. a rasão por que apparece essa contradicção, e porque não fui perfeitamente coherente com a opinião que tinha em 1875! N’esse anno acceitei a construcção simultanea dos tres caminhos de ferro, mas disse que se devia dar preferencia, tanto quanto possivel, á construcção d’aquelle que estivesse mais nas condições de ser uma linha internacional.
Disse mais, que o caminho de ferro da Beira Baixa podia resgatar a differença de extensão pelas vantagens de velocidade que o caracterisavam, e estava em condições que o tornava então superior ao da Beira Alta.
Entretanto novos estudos feitos com relação a esta ultima linha, deram occasião a novos traçados e planos que collocaram este ultimo em melhores condições, de modo que foi desde logo considerado por muitas pessoas auctorisadas, como a principal linha internacional, e o governo tambem o entendeu assim.
Foi em presença d’estas circumstancias que modifiquei a minha opinião com relação ao caminho de ferro da Beira Baixa, de maneira tal, que não seria para estranhar, creia o digno par, que eu julgasse agora que o termo de «caseiro» que appliquei n’outra occasião á linha da Beira Alta, estaria mais apropriado ao da Beira Baixa, depois das alterações que pozeram áquell’outra linhagem condições de superioridade com relação ao caminho de ferro do Valle do Tejo.
Note-se, porém, que não desejo significar com isto que condemno agora a linha da Beira Baixa, ou a julgue dispensavel, pelo contrario acho indispensavel a sua construcção.
Ao caminho de ferro da Beira Baixa não faltam rasões que aconselhem a sua construcção, e ainda que se não considere uma linha internacional, em relação ao movimento europeu, de certo está destinado a ser pelo menos um caminho propriamente peninsular de muita utilidade para ambos os paizes.
Por esta occasião devo dizer tambem, que de modo algum considero prejudicada a construcção do caminho de ferro da Beira Baixa, pela concessão do ramal de Caceres, feita á companhia dos caminhos de ferro do norte e leste.
Esse ramal é apenas uma linha subsidiaria do caminho de ferro do leste, destinada a facilitar o transporte para o Tejo, dos minerios vindos de Caceres, e de outros productos.
Não me parece, pois, repito, que o ramal de Caceres prejudique a construcção da linha da Beira Baixa, que tem toda a rasão de ser como via ferrea importante para o paiz sob o ponto de vista economico, e alem d’isso muito recommendada tambem por considerações estrategicas e de defeza militar do nosso territorio.
O sr. Vaz Preto nas apreciações que hontem fez das minhas opiniões manifestadas em 1870, comparadas com as que apresento em 1878, referiu-se tambem ao que eu disse com respeito ao custo kilometrico das linhas da Beira Alta, dever ser superior ao que estava orçado, parecendo inculcar contradicção entre o que então disse e a cifra em que hoje cômputo o custo kilometrico d’esta linha.
O sr. Vaz Preto: — O sr. ministro disse que havia de custar o dobro. Affirma-o no seu discurso.
O Orador: — Não nego que o dissesse. O que então dizia e hoje repito, é que se o caminho da Beira Alta tivesse de ser construido com o raio minimo de curvas de 500 metros e inclinações maximas de 10 millimetros, custaria o dobro do orçamento, porque taes condições repugnam ás condições naturaes do terreno. Eu não punha em duvida que o custo do caminho fosse de 34:000$000 réis, uma vez que fosse construido em conformidade com o anteprojecto do sr. Combelles, assim como agora me persuado que, pelo projecto do sr. Eça, este caminho de ferro póde ser construido dentro da cifra de 35:000$000 reis.
Se o digno par me permitte, servir-me-hei do argumento de auctoridades competentissimas, e dos documentos que já se acham publicados no Diario da camara dos senhores deputados.
Os orçamentos do caminho de ferro da Beira Alta, feitos por engenheiros muito distinctos e versados n’esta ordem de trabalhos, foram examinados e comparados com o custo das obras executadas nos caminhos de ferro do Minho e Douro, e d’ahi resultou a convicção de que aquelle caminho ha de ser feito dentro dos respectivos orçamentos, sem que as suas condições de construcção fiquem inferiores ás dos referidos caminhos do Minho e Douro.
Em resposta a uma referencia feita ás sommas que se têem despendido nos caminhos de ferro do Minho e Douro, cumpre-me dizer que fiz juntar um certo numero de documentos que devem esclarecer, não só o digno par, mas o parlamento, relativamente ás despezas feitas, e ás rasões por que esses caminhos saíram mais caros do que o que estava calculado nos orçamentos.
Essa questão ha de ser julgada em tempo competente, porque os documentos hão de ser acompanhados de um relatorio, em que desenvolvidamente se trate do assumpto.
Talvez que depois do discurso do sr. presidente do conselho, seja ocioso tratar do ponto a que vou referir-me; entretanto sempre direi que o facto de se ter posto a concurso o caminho de ferro da Beira Alta, não se tendo tido identico procedimento com relação ao da Beira Baixa, justififica-se perfeitamente bem, se recordarmos certos factos que em meiados de 1876 se davam no paiz vizinho, com referencia ás linhas do Valle do Tejo.
E sabido que em 1876 se apresentou a idéa de uma linha de Malpartida a Garrodilhos e Caceres, e de Caceres á fronteira. No seu relatorio de 10 de outubro de 1877, diz o distincto engenheiro, o sr. D. Eusebio Page:
«Esta linha de Caceres á fronteira, tendo como complemente a de Caceres a Malpartida de Placencia, concedida por Bordem real de 26 de julho d’este anno, forma outra solução que sem sair do Valle do Tejo poderia unir directamente Madrid com Lisboa.»
Ora, claro está que era prudente que o governo portuguez esperasse a resolução d’esta questão, e estudasse, no caso dos hespanhoes levarem a effeito as duas linhas, se conviria modificar as condições da linha da Beira Baixa.
O digno par, sr. Larcher, explicou as rasões por que a linha da Beira Alta ha de ser sempre necessaria para a nossa economia nacional e para as communicações entre a Europa e o porto de Lisboa. Esta opinião muito auctorisada póde dizer se que é hoje geralmente partilhada por todos aquelles que estudam o importante problema das nossas communicações acceleradas.
A linha da Beira Alta não offerece nem offereceu nunca mais do que uma solução por parte de Hespanha; podia escolher-se um ponto mais ao norte ou mais ao sul para a passagem na fronteira, mas o seu objectivo foi sempre, nem podia deixar de ser, Salamanca. Outro tanto não acontece com a linha do Valle do Tejo, que para muita gente póde ser objecto de uma das duas soluções a que já nos referimos, e outros entendem que só deve ser construida pelo traçado por Monfortinho.