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216 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

nos terrenos altos é de qualidade muito superior ao d'aquelle que se semeia e planta nos terrenos baixos.

Sobre a boa disposição do terreno do Douro para a cultura do tabaco, permitta-me a camara que eu cite a opinião de um agronomo muito distincto a que eu já por vezes me tenho referido, e que está dirigindo a estação ampelo-phylloxerica do Pinhão, o sr. Rodrigues Goudin.

Diz elle o seguinte:

«Na minha opinião, o Alto Douro só apresentava contra si, pelo que respeita á cultura do tabaco, o faltar-lhe a humidade necessaria. Se se venceu tal difficuldade, parece-me que nada mais deverá receiar-se. A composição chimica d'estes terrenos é das mais aptas para o fim que se tem em vista; a sua configuração especial é a que todos aconselham como melhor para o bom desenvolvimento e prosperidade da niocciana.»

Esta auctoridade é de muito peso, porque o sr. Goudin está dirigindo um posto experimental exactamente na parte da região vinicola onde o mal da pliylloxera mais se fez sentir e onde, portanto, ficou inteiramente aniquilada a producção.

O terreno do Douro, que infelizmente está disponivel, isto é, o que tem as propriedades necessarias e convenientes para esta cultura, é bastante extenso. O sr. visconde de Villar de Allen calcula no seu relatorio que o terreno n'estas circumstancias andará por 4:000 a 5:000 hectares, o que s. exa. presume representar o terço das terras de vinhedos que se encontram completamente perdidos.

Sr. presidente, eu sei que, embora a questão agricola se deva considerar resolvida, são grandes as apprehensões que se levantam no espirito de alguns dos nossos collegas, e essas apprehensões nascem do melindre que a resolução da questão póde ter relativamente á parte financeira.

Sobre a liberdade da cultura devo dizer que professo uma opinião um pouco divergente da opinião de algumas pessoas com quem tenho fallado a esse respeito. É certo que em 1864, quando passámos da arrematação para a liberdade do fabrico e da venda do tabaco, fizemos uma grande conquista, que se deve exclusivamente ao partido progressista, e conquista tão importante, que mais tarde os adversarios d'essa medida, aquelles que mais a tinham combatido, e com argumentos fortes e plausiveis, vieram declarar que se tinham enganado.

Não obstante, é minha opinião que ainda se não désse a ultima palavra sobre o regimen do imposto do tabaco.

Entendo que se é justo que o fabrico do tabaco seja livre, principalmente dando os bons resultados que está dando, é tambem justissimo que a cultura seja igualmente livre, e até por uma rasão, isto é, porque não o sendo, commettemos um attentado constitucional, uma grande infracção do artigo 140.° da carta, segundo o qual não devemos estar a pôr restricções á liberdade da cultura, e ainda menos a prohibil-a.

Portanto, a minha opinião a este respeito é que nós temos de vir a permittir, mais cedo ou mais tarde, a par da liberdade do fabrico, a liberdade da cultura do tabaco, o que me parece deverá produzir excellentes resultados.

É esta, sr. presidente, a minha opinião; mas suppondo que é uma opinião isolada que tem poucos adeptos, eu vou tratar da questão, partindo do actual estado das cousas, da legislação em vigor.

Vê-se, pelos relatorios ultimamente publicados no Diario do governo, que o cultivo do tabaco no Douro deixa ainda a desejar, e que o processo que se seguiu não foi talvez o mais aperfeiçoado. Mas vê-se tambem que o grangelo não foi nem muito difficil, nem muito despendioso, se compararmos o custo da cultura com as vantagens provaveis do preço da venda, d'onde se conclue que ha uma margem muito grande de lucro para o lavrador.

Ora, se isto é verdade, se o tabaco produz d'este, maneira, a sua cultura offerece uma base bastante larga sobre a qual poderá e deverá incidir o imposto directo. Portanto, é para mim fóra de duvida que, suppondo ainda a peior das hypotheses, isto é, que houvesse um tal ou qual desfalque na receita das alfandegas, nos direitos de importação, ainda assim o imposto directo lançado sobre a producção, e bem fiscalisado, compensaria largamente esse desfalque.

Por conseguinte o que ha a fazer é cuidar seriamente d'esta questão, proceder á feitura dos regulamentos necessarios, e empregar todos os meios para que a fiscalisação seja severa e rigorosa.

E que duvida podemos ter de que se consiga isso? Pois Portugal será o unico paiz da Europa onde se pretende estabelecer esta cultura? Pois a Belgica, a França, a Hollanda, a Allemanha, todos esses paizes que cultivam tabaco, arriscam, porventura, as suas receitas? Não têem elles nos regulamentos os meios de fiscalisação, os recursos para obstar ao contrabando?

Sobre a objecção da possibilidade do contrabando, apresenta o sr. visconde de Villar de Allen, no seu muito bem elaborado relatorio, algumas considerações que se coadunam perfeitamente com o meu modo de pensar a este respeito.

Diz o sr. visconde:

«Persuado-me de que, permittida a cultura, cessarão contrabando de tabaco que, segundo é publico no Douro, é feito por aquella parte da raia hespanhola.»

E mais abaixo acrescenta:

«É mais facil obrigar o Douro a pagar um imposto sobre o tabaco ali produzido, do que evitar o descaminho de direitos que n'aquella região se dá com referencia a charutos e cigarros; o Douro póde, pois, contribuir para o augmento do rendimento do tabaco.»

Ora, estas considerações do sr. visconde de Villar de Allen são realmente fundamentadas, e para o demonstrar não é necessario fazer um grande esforço de intelligencia, nem recorrer aos principios da economia politica, porquanto se a cultura do tabaco for uma cultura crescente, quando der o bastante para o consumo local, é claro que muito menor perigo haverá de que se faça o contrabando por aquella parte da raia.

Outra objecção que eu tenho ouvido fazer é a seguinte: póde o tabaco dar-se muito bem no Douro, e no entanto não produzir um resultado que remunere sufficientemente o lavrador. Parece á primeira vista que esta objecção tem muita força, mas a verdade é que deixa de a ter desde o momento em que nós reflectirmos que se parte de uma base inteiramente falsa. Ninguem quer pôr em confronto a producção do tabaco com a producção da vinha n'aquella região; o que nós queremos é proporcionar aquelles povos uma maneira de se indemnisarem, tanto quanto possivel, da perda dos vinhedos, e crear alguns recursos para que mais tarde o lavrador possa proceder á replantação da vinha, o que agora não póde fazer. É este o pensamento dos que querem a livre cultura do tabaco na região vinicola do Douro.

Alem d'isso esta questão contende tambem com a da emigração.

O sr. Visconde de Chancelleiros: - Apoiado.

O Orador: - N'aquella parte do Douro, sr. presidente, tem logar actualmente uma emigração muito consideravel, e que, como muito bem diz o agronomo que ha pouco citei, o governo deve procurar evitar por todos os meios ao seu alcance, e já, para, no caso de melhorarem as condições do Douro e da producção da vinha, não o haver a luctar com uma formidavel crise economica n'aquella região pela falta de braços.

Creio ter demonstrado, sr. presidente, que não ha fundamento para receiar um desfalque no rendimento do imposto do tabaco. Mas suppondo que ha, perguntarei aquelles que assim o julgam quaes os meios que indicam para acudir á fome e á miseria que vae assolando aquella parte da provincia do Douro?