DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 217
Segundo os calculos do sr. Allen, as terras de vinhedos completamente perdidos representam uma area de 14:000 a 15:000 hectares. Ora, sendo assim, pergunto se é possivel que o governo faça aos lavradores os adiantamentos necessarios para a replantação da vinha? Se é possivel, importando esses adiantamentos em muitos centenares de contos de réis? Porque não ha só a fazer face ás despezas com a replantação da vinha, mas tambem com o grangeio annual d'essa cultura, e com o sustento d'aquella pobre gente durante alguns annos, pois todos sabem que a vinha leva, pelo menos, cinco annos até que comece a produzir.
Observa-se, sr. presidente, na representação que vou mandar para a mesa, que se o governo não poder apresentar senão na sessão seguinte uma proposta de lei com as providencias necessarias e que se reclamam, succederá que só em 1885, isto é, dois annos mais tarde se poderá acudir áquelles povos!
Eu quasi que prevejo, infelizmente, a resposta que me vae dar o sr. ministro das obras publicas. S. exa. vae dizer-me, que concorda com as considerações que eu acabo de fazer, mas que o assumpto é de sua natureza muito melindroso, porque implica com uma parte muito importante da nossa receita, e que por isso deve ser muito meditado e estudado.
Ora, que o sr. ministro me dissesse que não podia resolver esta questão mais cedo, e emquanto as experiencias da cultura do tabaco não tivessem provado que ella era remuneradora para o lavrador, de accordo; mas dizer que não conhece a questão na sua parte financeira e economica, e que vae agora estudar o assumpto, que ha quatro annos seguramente está na téla da discussão, é realmente uma evasiva!
Sr. presidente, na sessão passada, quando se discutiu o projecto relativo á phylloxera, lembrei ao sr. ministro das obras publicas a opportunidade de visitar o alto Douro. Disse eu a s. exa. que, visto Suas Magestades íam ao norte do paiz, e que o governo naturalmente havia de acompanhal-as, seria esta a occasião propria de s. exa. dar uma chegada ao Pinhão, de levar comsigo alguns dos seus empregados dos mais competentes, e ver com os seus proprios olhos o estado de miseria e de desolação, em que se acham áquelles povos.
S. exa., porém, não procedeu assim, o que eu senti, e o que foi muito censurado.
Estava então convencido de que a visita de s. exa. áquella região do paiz do Douro era muito importante, o que vejo agora confirmado no officio que a commissão de defeza acaba de dirigir-me, e onde se lê o seguinte:
«Rogâmos a v. exa. se digne apresental-a á camara (a representação), e confiâmos que v. advogará esta justa e indispensavel concessão, urgentissima para acudir áquelles povos, cuja miseria só póde avaliar-se visitando-os, e examinando a esterilidade de terrenos, que tinham valor consideravel.»
Sr. presidente, não se trata apenas de uma questão economica e financeira.
Se nós estivessemos, por exemplo, em 1864, quando se estabeleceu a liberdade da venda e do fabrico do tabaco, podiamos largamente meditar e estudar o assumpto, mas desgraçadamente a questão hoje não é só economica e financeira, a questão é a urgencia de acudir aos que soffrem a fome, aos que estão reduzidos á miseria, e aos que se vêem forçados a emigrar; é uma questão humanitaria, é uma questão de salvação publica, e não se póde dizer áquelles povos que esperem, que o sr. ministro vae meditar, que vae estudar, e tanto mais que se o governo tivesse querido estudar a questão a tempo, de certo já estaria resolvida.
Tenho concluido.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Hintze Ribeiro) (O orador não reviu este discurso): - Sr. presidente, eu ouvi as largas considerações que acaba de fazer o digno par a proposito da representação que s. exa. trouxe ao parlamento, assignada por alguns proprietarios do Douro, ácerca da cultura do tabaco. S. exa. já n'uma das sessões passadas se tinha tambem referido a este assumpto.
O sr. Conde de Castro: - Peço a palavra.
O Orador: - Se s. exa. quer usar d'ella...
O sr. Conde de Castro: - Não, senhor, não quero interromper o discurso de s. exa.
O Orador: - N'uma das sessões passadas o sr. conde de Castro tinha já chamado a attenção do governo para este assumpto, e por essa occasião pediu s. exa. alguns esclarecimentos, que me pareceu ouvir estranhar que não tivessem sido enviados ao parlamento.
Sr. presidente, eu creio que o digno par, n'esta parte, labora n'um equivoco. O digno par, e creio que tambem um outro seu digno collega, tinham pedido a publicação do relatorio ácerca da, cultura do tabaco, das experiencias que se tinham feito e dos resultados que d'ellas se haviam colhido no Douro, e por essa occasião eu respondi a s. exa. que ainda não tinha vindo á minha mão; mas que, tão depressa viesse, eu o faria publicar no Diario do governo para inteiro conhecimento de todos. Effectivamente, poucos dias depois, tendo chegado ao meu poder esse documento, eu promptamente o mandei publicar. É certo, porém, que na mesma occasião s. exa. pediu esclarecimentos de outra ordem e concernentes a outras questões, esclarecimentos que o digno secretario d'esta camara acaba de dizer que tinham chegado, acompanhados de um officio.
Já vê, pois, o digno par (interrupção do sr. conde de Castro) que foram os documentos que o digno par pediu os que eu enviei para a mesa; que fui solicito em attender ao pedido que s. exa. formulou n'uma das sessões passadas.
Agora s. exa. pede instantemente que, condescendendo com a representação dos povos do Douro a favor da cultura do tabaco, o governo, dentro d'esta sessão legislativa, apresente um projecto de lei sobre o assumpto.
A isto o digno par encarregou-se de responder por mim.
S. exa., antepondo-se á resposta, que julgava lhe daria eu, acrescentou que, de certo, lhe redarguiria que era a actual uma questão grave, e que convinha meditar antes de tomar uma resolução qualquer, e, por conseguinte, não resolver de prompto.
O digno par, prevendo que da parte do governo podia ter esta, resposta, desejou logo combatel-a, alongando-se e patrocinando uma questão em que se acham interessados os povos do Douro, os quaes julgavam prejudicada, pelo estado actual das cousas, a sua situação economica.
Sr. presidente, é tão livre a iniciativa do governo como a iniciativa de qualquer membro do governo.
O digno par, o sr. conde de Castro, tem estudado a questão ha muito tempo, e por isso s. exa. disse que ha quatro annos seguidamente tem ella andado na téla da discussão.
S. exa., como complemento da representação que apresentou, podia apresentar tambem um projecto de lei como producto do seu trabalho e do seu largo estudo, esclarecendo ao mesmo tempo a camara e o paiz sobre um assumpto tão vasto e complexo.
Sr. presidente, é verdade que ha bastante tempo se falla na liberdade da cultura do tabaco no Douro; todavia, não ha muito que as experiencias se fizeram para se poder chegar a um resultado pratico, e ver até que ponto esse resultado podia ser remunerador e merecer a attenção dos poderes publicos.
Foi no ultimo anno que ás experiencias tomaram mais largo desenvolvimento, e o digno par bem sabe que eu, como ministro, contribui para que os seus resultados chegassem ao conhecimento, não só dos interessados, como tambem de todos áquelles cuja competencia no assumpto podesse ser aproveitada.
Já vê o digno par que eu não tinha em mente sacrificar os povos do Douro, e que antes muito me interessei sem-