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SESSÃO DE 11 DE JUNHO DE 1887 423

no acto da venda, encontra-se com escassez de braços, diminutos capitães, e no fim não póde vender porque não encontra preço remunerador. N'estas circumstancias, fatalmente se vê no dilemma de abandonar a cultura, ou arruinar-se.

A livre importação dos cereaes estrangeiros, considerada tambem como uma das causas da crise agricola, affecta logo em primeira mão o agricultor da região suburbana, visto que esses cereaes entram pela maior parte no porto de Lisboa.

Esses cereaes vem do interior da America até Lisboa sem transbordo algum.

A cidade de Chicago, principal mercado e deposito d'esses cereaes, está no interior a mais de 1:000 leguas da costa do Atlantico, mas cointudo é um porto de mar. Situada na margem do lago Michigan, ella communica pelos outros lagos, e pelo rio S. Lourenço com o oceano, de modo que um navio carregado de trigo em Chicago póde vir até ao Terreiro do Paço sem parar. Esta circumstancia explica em parte o baixo preço d'esses cereaes, e a immensa prosperidade d'aquella cidade americana que, tendo começado a sua existencia ha menos de quarenta annos, tem já hoje mais de 600:000 habitantes.

Já se vê, pois, que a situação do productor agricola da região suburbana já era bastante desfavoravel, mas o artigo- 1.° da lei de 18 de julho de 1880 veiu aggravar immensamente essa situação.

Sr. presidente, a depreciação da propriedade rural numa zona tão importante, e os legitimos interesses de 2:000 ou 3:000 proprietarios, não são factos insignificantes sobre os quaes se possa passar de leve, unicamente para reforçar os cofres da camara de Lisboa.

Sr. presidente, em novembro do anno passado foi entregue ao governo de Sua Magestade uma representação dos proprietarios do antigo concelho dos Olivaes.

N'essa representação se ponderavam os muitos e bem fundados motivos que havia para reclamar contra o regulamento para a cobrança dos impostos do consumo na nova area.

O actual governo de Sua Magestade, sempre solicito em attender a todas as reclamações fundadas na justiça, mandou suspender por uma portaria a execução d'aquelle regulamento. Esta medida, eminentemente favoravel aos interesses d'aquellas povoações, faz honra ao sr. ministro da fazenda, e grangeou-lhe as sympathias e o reconhecimento de toda aquella classe. Mas, sr. presidente, esta medida não basta.

Para cortar o mal pela raiz, ha só um unico meio, a saber: a desannexação pura e simples da zona rural, do municipio de Lisboa.

Para que aquelles proprietarios possam continuar com as suas culturas, são indispensaveis duas condições: a primeira, é que toda a zona rural fique fóra das barreiras fiscaes; e a segunda é que fique tambem fóra da acção da camara municipal de Lisboa;

Quando os proprietarios iniciaram aquellas reclamações, reuniram-se em grande numero, e nomearam uma commissão de vinte membros, da qual eu tenho a honra de fazer parte, para tratar este negocio com o governo.

Muitos d'esses proprietarios me disseram que a annexar cão era para elles a ruina, e, a continuar, se veriam obrigados a vender as suas propriedades ou abandonal-as. É em virtude destas considerações, e por eu estar convencido de que qualquer medida que não seja a desannexação, nem satisfaz aquelles povos nem remedeia o mal, e por estar convencido tambem de que represento fielmente a opinião e os desejos dos proprietarios referidos, é que eu tomo a liberdade de chamar a attenção do governo sobre este assumpto, pedindo ao nobre ministro do reino haja de o tomar na sua alta consideração, trazendo ás côrtes um projecto de lei para modificar o artigo 1.° da lei de 18 de julho de 1880, da reforma administrativa do municipio de Lisboa, no sentido de separar ã parte rural e fazer, d'ella um concelho administrativo independente, para o que ella tem as condições e as dimensões sufficientes.

Agora, sr. presidente, só me resta dizer duas palavras sobre o imposto nos cereaes estrangeiros, porque em presença da crise deploravel por que passa a agricultura nacional, não devemos descurar meio algum para acudir a tão grande calamidade.

Reconheço que, por via de regra, não ha conflicto algum nem antagonismo entre a liberdade de commercio e a agricultura, e em circumstancias ordinarias entendo que deve, haver grande cuidado com as restricções a essa liberdade, porque muitas vezes, em logar de serem um beneficio para a agricultura, são um mal; mas em circumstancias excepcionaes, como as presentes, devemos reconhecer que todas as nações estrangeiras, tanto n'esta conjunctura como em outras identicas, têem adoptado o systema proteccionista não só para acudir á crise agricola, como tambem para restabelecer o equilibrio das suas finanças.

Os Eestados Unidos, que, depois da guerra separatista, ficaram onerados com uma divida de quatorze mil milhões de dollars, restabeleceram esse equilibrio no espaço de vinte annos, por meio do systema proteccionista.

O grande Bismarck dizia ha pouco no Reichstag allemão: "Devemos reconhecer que depois de inaugurarmos em 1878 o systema proteccionista, a Allemanha saiu da sua pobreza, e o seu bem estar augmentou consideravelmente."

Ainda ha pouco o ministro da agricultura em França dizia: "A nossa unica preoccupação deve ser obstar á concorrencia estrangeira, e o unico meio de levar a confiança aos lavradores e a prosperidade aos campos é evitar a concorrencia de cereaes estrangeiros".

No senado hespanhol; como tenho visto pelos jornaes, estão-se apresentando todos os dias propostas para proteger a agricultura. E não só no senado, como tambem no congresso. Eu, sr. presidente, reputo urgente em Portugal a protecção á agricultura porque as cousas chegaram a um ponto de que, se o não fizermos, cessará por completo a cultura de cereaes n'este paiz; e uma nação que não produz cereaes para o seu consumo, é uma nação que não está no caso de sustentar a sua independencia, porque está á mercê das nações que a alimentam.

Ha uma ordem de considerações, sr. presidente, que ainda que pareçam afastar-se alguma cousa do assumpto provam comtudo a importancia e necessidade da cultura dos cereaes.

É facto averiguado que em todos os paizes onde ha um abundante cultura de cereaes, cresce muito a população; e uma prova frisante d'isto é que nos estados occidentaes da America do norte, onde a cultura dos cereaes não tem limites, a população dobra em quinze annos; emquanto que na Turquia, onde essa cultura está quasi abandonada, e o solo exhausto, leva trezentos annos a dobrar.

A explicação da grande população da China está simplesmente na attenção e cuidado que ali se presta á agricultura e especialmente á cultura dos cereaes. Um augmento de população é um elemento de riqueza, que representa o trabalho, mas é necessario que seja acompanhado do augmento de meios de subsistencia; e por meios de subsistencia devemos entender os cereaes, porque não podem ser substituidos por outra cousa.

Verdade é que ha sempre uma grande desproporção entre a população e os meios de subsistencia, porque as forças reproductivas do genero humano são infinitamente mais fecundas do que as do solo, principalmente na Europa, onde o solo está exhausto por uma longa exploração. Mas essa. desproporção é muito maior nos paizes onde não ha cultura de cereaes, e nessas circumstancias não tarda em vir a miseria e a morte, e por conseguir restabelecer o equilibrio.

Em Portugal, onde a população é escassa, relativamente