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SESSÃO N.° 29 DE 22 DE JULHO DE 1908 3

razão, em muitas das minhas previsões.

É d'isso prova o occorrido com as visitas regias feitas a Portugal por Soberanos estrangeiros, e que occuparam ainda a attenção d'esta camara na sessão anterior.

Da maneira como eu me conduzi, na questão sujeita, testemunham os Annaes parlamentares.

Com effeito, na sessão de 2 de abril de 1903, foi celebrada pela camara dos Dignos Pares a visita feita a Portugal por Eduardo VII, cuja chegada a Lisboa se realizou no dia que fica indicado.

Varios Dignos Pares usaram da palavra com esse objectivo; e, entre elles, eu puz em relevo a minha adherencia, de velha data, á alliança inglesa, e emitti o parecer de que o Rei da liberal e legalista Inglaterra devia ser acolhido com a mais larga hospitalidade.

Por dever de cortesia, de comprehensão intuitiva, não esplanei então, sob o ponto de vista das despesas a legalizar, esse melindroso assunto, de que ulteriormente me occupei, em 14 do mesmo mês, pela maneira seguinte:

Sabe a Camara que, no dia em que celebrámos aqui a vinda de Eduardo VII ao nosso país, elle, orador, foi um d'aquelles que se pronunciaram aberta e claramente no sentido de que esse Soberano devia ser recebido com o acatamento e respeito que merece o Chefe de uma nação nossa velha alliada, de uma nação onde se presta um altissimo culto á liberdade e á legalidade.

É certo que assim se pronunciou; mas isso não o impede de pedir ao Governo que lhe diga se houve algumas despesas por parte do Thesouro, com respeito á recepção feita ao Monarcha inglês; se as houve, de que verba sairam.

Quando se trata de receber um Soberano de uma nação em que a legalidade tem um culto especial, não é demais tudo quanto se faça para mostrar que a essa recepção presidiu tambem a mais completa legalidade.

Quer crer que associações houve, como a Associação Commercial de Lisboa, que realizaram largas despesas para acolher o chefe de uma nação com a qual mantemos commercio e relações intimas; quer crer que algumas houve que se esmeraram em receber condignamente, e á sua custa, tão egregio hospede; mas é possivel que nem todas as collectividades igualassem o proceder da Associação Commercial de Lisboa, e por isso deseja saber se effectivamente se fizeram algumas despesas por parte do Estado para a recepção do Monarcha inglês, e, dado que se tenham feito, de onde vieram receitas especiaes para isso, se estavam ou não legalizadas, e, não o estando, se o Governo não procura legalizá-las.

Em resposta, o Sr. Campos Henriques, nessa epoca Ministro da Justiça, expressou-se nos seguintes termos:

Claro é que não pode desde já indicar á Camara o que ha com respeito ás despesas feitas com a recepção ao Rei Eduardo VII; mas o que assegura desde já é que, se houver alguma despesa a legalizar, o Governo nem um só instante hesitará em apresentar ao Parlamento as propostas necessarias para que essa legalização se faça. É esse o seu dever; não faltará a elle.

Estranha ignorancia a manifestada pelo Sr. Campos Henriques! ... O orçamento para o exercicio de 1903-1904, discutido nesta Camara em sessão de 10 de novembro de 1904, veio patentear, no seu n.° 5.° do artigo 47.°, quão mal informado se encontrava, em abril, o então titular da pasta da Justiça, acêrca de um assunto indubitavelmente importante. Não se tratava apenas de centos de mil réis, tratava se de centos de contos de réis, conforme resalta do citado n.° 5.°, assim concebido:

5 ° A abrir no Ministerio da Fazenda creditos especiaes para as despesas abaixo mencionadas, e que serão escriturados nos respectivos exercicios:

Despesas para as recepções de Sua Majestade o Rei de Inglaterra e de Sua Majestade o Rei de Espanha.......... 224:513$325

Despesas com a preparação das equipagens de gala para o mesmo fim................ 77:670$509

Somma... 302:183$834

Do que fica relatado é licito concluir que, se o Governo estivesse habilitado, como lhe cumpria, com os necessarios creditos, á data da chegada a Lisboa dos dois Monarchas estrangeiros, ter-se-hia prestado culto aos preceitos legaes de administração, e não haveria materia prima, originaria dos episodios que se deram nos ultimos dias, que não primam, seguramente, por edificantes.

Do occorrido não me cabe a minima responsabilidade. Fiz advertencias, insisto, em tempo util, as quaes, á semelhança do que me tem succedido frequentemente, não foram attendidas. Limito-me, portanto, a registar estes factos, cuja lição é evidente, e quiçá continue a ser improductiva, como até ao presente.

Na verdade, o Sr. Presidente do Conselho é alheio, em todo o ponto, a este ensino. Tenham-se presentes os seus alardes de liberal, que os não ha mais gafados.

Assim, esquiva-se a fornecer os documentos com que teem de ser fiscalizados os seus actos; e, por esta forma, longe de prestar homenagem ao liberalismo, com que se diviniza, cultiva o mais retinto absolutismo bastardo.

Obedecendo ao mesmo prejuizo, outros actos pratica, que succintamente passarei em revista.

Em taes condições, e irmanado reaccionariamente com o Sr. Ministro da Justiça, procura fazer reviver a condemnada lei de imprensa de 7 de julho de 1898, contra a qual mantive aqui, nesta tribuna, energicas e successivas pugnas. Ameudadamente me insurgi contra as apprehensões e mormente contra a censura previa, intitulada por eufemismo, essencialmente rotativo, leitura previa.

Se alguma lei tivesse de reviver devia ser a de 17 de maio de 1866, cujo espirito liberal está nella solidamente garantido.

De resto, é minha arraigada opinião que os desmandos da imprensa, na propria imprensa encontram o devido correctivo.

Era esta a preferente doutrina, do tempo em que o liberalismo era reverenciado sinceramente entre nós.

Agora, sob a signa do Sr. Presidente do Conselho, a livre emissão do pensamento não lhe merece mais attenção do que a liberdade individual, patenteada pelo habeas corpus.

Com infracção patente da lei, e com desprezo manifesto dos mais elementares preceitos humanitarios, encontram-se presos, sem culpa formada, ha mais de 50 dias, 5 individuos, a quem, por mais de uma vez eu tenho alludido. Com estas e outras exorbitancias, indubitavelmente abominaveis, procura a execranda policia preventiva justificar os seus gastos, que só em despesas inconfessaveis, note-se bem, inconfessaveis, se cifraram por 61 contos de réis, no anno economico findo.

A verba orçamental, com tal objectivo, é de 36 contos de réis, que foram reforçados com mais 25 contos, para que semelhante policia se possa exibir pela maneira repugnante como está exercendo o seu desprezivel mister.

Para considerar é que, legalmente, só 1:800$000 réis são attribuidos aos gastos com essa exautorante e exautorada policia, tão querida do Sr. Presidente do Conselho.

É estrictamente o que a ella faculta o scelerado decreto de 19 de setembro de 1902, e nada mais.

Todo o excedente, tanto orçamental, como derivante de creditos especiaes, é retintamente arbitrario. Não tem connexão alguma com os principios legaes.

Isto, porem, não obsta a que a complacencia do Sr. Presidente do Conselho se faça sentir em proveito da policia a que eu me venho referindo, e com prejuizo até, nas suas larguezas pecuniarias, da instrucção publica, tão deficientemente dotada, consoante é sabido.

Na sangrenta questão de 5 de abril, em que os pretorianos policiaes, militares e civis, se conduziram pela forma barbara e cruel de todos conhecida, o Sr. Presidente do Conselho procurou irresponsabilizá-los, nesse mesmo dia, com a sua nota famosa mandada á imprensa.

Fez infelizmente escola o Sr. Presidente do Conselho, que, na sua tentativa de irresponsabilização dos crimi-