SESSÃO N.º 30 DE 13 DE ABRIL DE 1896 357
Na França, onde a lei de 22 de julho de 1867 tinha acabado com a prisão por custas, foi restabelecida em 1871; e apesar de estar ali dominando um regimen democratico, nem sequer se faz excepção, como entre nós, para os insolventes por indigencia.
O projecto não veiu introduzir uma disposição inteiramente nova na nossa legislação. Da legislação antiga basta citar o alvará de 20 de julho de 1760, que dizia que um dos modos de evitar os delidos consiste nas custas dos processos.
Da legislação já promulgada no periodo constitucional, alem do artigo 615.° da novissima reforma judiciaria, que o projecto manda applicar, temos o artigo 458.° do decreto de 13 de janeiro de 1837, que como aquelle manda que o condemnado, que não tiver bens, seja preso até pagar as custas á rasão de 1$000 réis por dia.
Podiamos citar muitos casos em que se impõe a prisão, não como substituição da pena pecuniaria, mas como meio coercivo. Entre outros lembra-nos o artigo 26.° do decreto de 7 de abril de 1863, que impondo a multa até 20$000 réis ao que ententa saír do reino sem passaporte, obriga até a um mez de prisão o que a não pague.
Até á promulgação do decreto de 30 de julho de 1830 a nossa legislação sobre o pagamento de custas chegava a ser draconiana. Não só ficava sujeito a ella o réu condemnado, mas ainda quando era absolvido, e na sentença da absolvição, acrescentava-se pague as custas, ex-causa. Isto era o cumulo da injustiça, a que só poz termo definitivamente a lei de 18 de julho de 1850 no artigo 18.°, porque nem aquelle decreto de 1830, nem o codigo penal de 1852 no artigo 118.°, haviam tirado todas as duvidas que a este respeito tinham alguns juizes.
Feitas assim estas leves apreciações favoraveis ao projecto, é a vossa commissão de parecer que deve ser approvado, para poder subir á sancção regia.
Sala das sessões da commissão de legislação, 7 de abril de 1896.= D. A. Sequeira Pinto = A. A. de Moraes Carvalho = Augusto Ferreira Novaes = Carlos Augusto Vellez Caldeira Castello Branco = Frederico Arouca = Jeronymo da Cunha Pimentel, relator.
Projecto de lei n. 31
Artigo 1.° Nos corpos de delicto, para verificação de crimes a que corresponda processo de querela, não poderão ser inquiridas menos de oito nem mais de vinte testemunhas, alem das já referidas.
Art. 2.° Quando, pelas testemunhas inquiridas e pelos outros elementos do corpo de delicto, em caso de crimes a que corresponda processo de querela, se não verificar a existencia do crime, julgar-se-hão insubsistentes as diligencias judiciaes empregadas; e o processo será archivado.
Art. 3.°Se, conjunctamente com a verificação do crime, se descobrir quaes foram os seus agentes, o ministerio publico contra estes dará logo a sua querela, se já estiver prehenchido o numero minimo de testemunhas. Se, porem, ida inquirição de testemunhas, até ao numero maximo, e dos mais elementos do corpo de delicto, resultar a verificação do crime, mas não a descoberta dos criminosos, deverá n’este caso ser julgado subsistente o corpo de delicto sobre a criminalidade do facto, e o ministerio publico dará logo a sua querela contra incertos, podendo offerecer testemunhas até ao numero de vinte, alem das referidas, e requerer tudo o mais que for necessario para descobrir os criminosos.
Art. 4.° Aos juizes de direito compete julgar subsistentes os corpos de delicto levantados pelos juizes de paz, e poderão ordenar as diligencias que reputem necessarias para esclarecimento dos factos, proceder a inquirição de novas testemunhas até ao limite de vinte, afora as referidas, e reperguntar quaesquer que já depozessem perante os juizes de paz.
Art. 5.° Os agentes de um mesmo crime, seja qual for a penalidade em que se achem incursos, serão todos processados e julgados pela forma do processo determinado pela pena mais grave.
Art. 6.° O crime de offensas corporaes, previsto e punivel pelo artigo 359.° do codigo penal, é considerado crime publico.
Art. 7.° Podem julgar-se em ferias os crimes de policia correccional.
Art. 8.° Á citação dos réus incursos em processos de policia correccional, e á intimação das testemunhas em processos criminaes, serão applicaveis as disposições dos artigos 189.° e 190.° do codigo do processo civil.
Art. 9.° Os réus que forem condemnados pelo mesmo crime serão solidariamente responsaveis pelas custas e sellos do processo, salvo o direito regressivo do que pagar contra os outros condemnados, e não será exigida aquella responsabilidade a outras pessoas, excepto no caso da fiança, a que se refere o artigo seguinte.
§ unico. Exceptuam-se da responsabilidade solidaria estatuida neste artigo, as custas e sellos relativos a repetição de actos a que algum dos réus der causa, bem como as provenientes de actos requeridos para defeza especial de algum d’elles.
Artigo 10.° O pagamento das. custas e sellos dos processos crimes poderá ser feito em tres prestações fixadas pelos juizes, se os réus assim o requererem, e prestarem fiança idónea por termo, nos autos, que será gratuito e sem sello.
Art. 11.° Serão isentos do referido pagamento os réus que provarem a sua pobreza por attestados dos parochos e regedores das freguezias do seu domicilio, jurados e devidamente reconhecidos.
§ unico. A prova da pobreza poderá ser feita no acto do julgamento, ou até terminar o decendio posterior á citação na respectiva execução, que n’este caso se julgará extincta.
Art. 12.° Os signatarios dos attestados em que se falte á verdade, e os que d’elle fizerem uso, incorrerão na respectiva responsabilidade criminal.
Art. 13.° Aos réus condemnados em custas, que não tenham demonstrado a sua pobreza, na conformidade do artigo 11.° ou do seu § unico, não lhes sendo .achados bens sufficientes para o seu pagamento, será applicavel a disposição do artigo 615.° da novissima reforma judiciaria, dividindo-se para este effeito as custas quando haja mais de um condemnado.
§ unico. A prisão por custas não poderá exceder trinta dias em processo de policia correccional, sessenta em processo correccional e noventa em processo ordinario.
Art. 14.° Ficam revogadas as disposições contrarias a esta lei.
Palacio das côrtes, em 23 de março de 1896. = Visconde do Ervedal da Beira, vice-presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado, secretario = Abilio de Madureira Beça, deputado, vice-secretario.
O sr. Presidente: — Está em discussão na generalidade o parecer n.° 31.
O sr. Jeronymo Pimentel (relator): — Mando para a mesa, por parte da commissão de legislação, uma proposta a fim de serem eliminados do artigo 1.° do projecto as palavras: «nem mais de vinte testemunhas, alem das já referidas».
Sr. presidente, a commissão entendeu que devia fazer esta proposta, principalmente depois que foi publicada a lei que regula os serviços policiaes, lei em que se dá ao juiz de instrucção a faculdade de inquirir as testemunhas que quizer, e não parecer bem que ao juiz de instrucção se dessem mais faculdades do que ao juiz de direito.
Se durante a discussão algumas duvidas se apresentarem, não só em relação ao projecto, mas á proposta que