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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 343

n’este ultimo anno, segundo o methodo de separar as despezas orçamentaes, porque ha urnas despezas que são orçamentaes, e outras extra-orcamentaes, nas novas theorias financeiras.

Quando o governo em 1852 foi levado por uma necessidade publica a reduzir os juros das inscripções de 5 a 3 por cento, firmava-se no principio de que havia garantia para esse juro, o que não acontecia anteriormente em vista das deducções a que estavam sujeitos esses mesmos juros, as quaes haviam sido muitas vezes de 10, 15, 20 e 25 por cento.

Portanto o governo determinava um córte nos juros das inscripções levado por uma necessidade suprema, tendo sido capitalisadas as anteriores deducções.

Ora, sendo esta a legislação, podem, porventura, as camaras municipaes tributar aquillo que mesmo para o governo não é tributavel?

Póde-se fazer isto? Póde-se dizer isto? Póde o governo deixar de dar uma opinião, que não seja tão clara, como a que o sr. ministro dos negocios estrangeiros acaba de nos dar? De certo que não póde, e o sr. ministro dos negocios estrangeiros, procedendo do modo como procedeu, mostra uma vez mais que sabe manter o seu logar, e honra lhe seja.

Sr. presidente, eu applaudo-me por s. exa. nos ter feito as declarações que nos fez, porque as que até agora nos tinham sido feitas pelos seus collegas não tinham nenhuma significação. (Apoiados.)

Se é necessaria uma lei interpretativa da lei em vigor, que se faça, mas não me parece que seja preciso fazer lei inteiramente nova. Se é indispensavel ensinar os doutores a interpretar as leis, faça-se lei interpretativa, porque é tambem attribuição das côrtes interpretar as leis, quando aquelles que as devem executar não as entendem ou não lhes convem entendel-as.

Eu receio que o governo não tenha no codigo administrativo os meios de fazer entrar na ordem os que não querem entrar n’ella, e que seja preciso que o parlamento entervenha n’este assumpto. É para sentir que haja uma camara municipal que, usando e abusando da larga faculdade de tributar, que o codigo administrativo lhe concedeu, fizesse o que a camara municipal de Coimbra acaba de Jazer; e, é ainda mais para sentir, que este exemplo partisse da terceira cidade do reino, da cidade onde está o principal estabelecimento scientifico. Se isso viesse da camara municipal de Numão, de Maçãs de D. Maria, ou de Freixo de Espada á Cinta não era tanto para admirar, mas da camara municipal de Coimbra é realmente muito para sentir, e é por isso mesmo que é preciso que, com a maior urgencia, se ensine a lei aos doutores; ou, immediatamente, por meios directos do governo, se os tem, ou por intermedio do parlamento. (Apoiados.)

É indispensavel que as leis não sejam atacadas, nem sejam offendidos os interesses publicos; faça-se, em continente, uma lei interpretativa, se é preciso, ou então siga-se. uma jurisprudencia segura, para que essa faça as vezes da lei, mas desde já. O que eu receio, porém, é que a lei existente não possa ser mantida apenas pelo estabelecimento d’essa jurisprudencia, receio que no codigo administrativo não haja meios sufficientes de fazer entrar na lei aquelles que estão fóra d’ella, porque o recurso está estabelecido para o conselho de districto, e d’ali para o supremo tribunal administrativo; e os recursos aproveitam só aos que requerem.

Sr. presidente, se tal precedente podesse ser admittido, isto é, se as inscripções podessem ser tributadas, em Coimbra com 10 por cento, em Freixo de Espada á Cinta com 20 por cento, em Maçãs de D. Maria com 25 por cento, e assim successivamente, a bello prazer das municipalidades, que resultaria d’ahi? Resultaria que as inscripções teriam uma cotação differente nas diversas localidades, conforme o tributo que pesasse sobre ellas. Qual seria a garantia
dos possuidores d’esses titulos? E a lei da desamortisação, a que se referiu o digno par o sr. Carlos Bento, que tornou tantas classes credoras forcadas do estado, aonde conduziria?

Desde que se disse aos estabelecimentos de beneficencia, ás misericordias e aos hospitaes: vendei os vossos bens, e em troco acceitae estes papeis, porque elles são garantia segura dos vossos interesses, não é serio, não é digno, nem é decoroso, que um governo, qualquer que seja, venha hoje dizer a esses mesmos estabelecimentos que esses papeis vão agora ser tributados. Esta é a minha opinião.

Termino, repetindo que folgo muito de ter ouvido a resposta categorica que, a este respeito, deu o nobre ministro dos negocios estrangeiros.

O sr. Carlos Bento: — Eu agradeço a clareza e o categorico da resposta dada pelo nobre ministro dos negocios estrangeiros, e, ao mesmo tempo, declaro que sou da opinião do meu illustre amigo o sr. conde do Casal Ribeiro, de que se fazia sentir a necessidade de toda a clareza n’este assumpto.

Tem-se demorado muito uma resolução a este respeito, e esta demora é prejudicial ao credito publico; e se por acaso nós assistissemos impassiveis e silenciosos perante factos d’esta ordem, parece-me que estava condemnado o systema economico do nosso paiz.

Mas, sr. presidente, eu quero dizer duas palavras em abono da camara municipal de Coimbra, sem comprometter a minha opinião.

Eu devo dizer em abono d’ella, que pela reforma administrativa que nós adoptámos, estão auctorisadas todas as camaras municipaes a lançar certos e determinados tributos, e têem a obrigação de não apresentarem deficit nos seus orçamentos.

Note bem a camara, isto de deficit, é um privilegio só para os governos, é um privilegio governamental; por consequencia a camara municipal de Coimbra entendeu que estava auctorisada a lançar mão d’este recurso extraordinario, e tributou as inscripções. Mas isto não póde ser acceitavel.

Eu tenho ouvido a opinião de varios jurisconsultos sobre este, assumpto, e todos são conformes em dizer que não são necessarias novas disposições legislativas para este fim.

Eu admiro-me que o delegado do thesouro fornecesse á camara municipal a relação dos juristas que residem n’aquelle districto sem ter consultado o governo e a junta.

Desejava mesmo saber se a junta ou o governo auctorisaram o delegado do thesouro a fornecer a relação d’esses juristas aos membros da camara municipal, para se poder proceder á distribuição d’este imposto; se ajunta, a quem cumpre manter o credito da nossa divida, ou o governo auctorisaram o seu delegado para fornecer a relação dos possuidores d’essas inscripções á camara municipal, o que era indispensavel para lançar este imposto.

O facto não era tanto do arbitrio da camara, que não fosse necessario o auxilio de um empregado.

O sr. Mamede: — Eu posso dizer ao digno par que a junta não auctorisou cousa alguma.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: — Eu não tenho noticia de que o delegado do thesouro pedisse similhante auctorisação e ella lhe fosse concedida.

O Orador: — Muito bem, ou muito mal. Em toda o caso, no que todos nós estamos de accordo, é em que cesse esta situação, que tem grandes inconvenientes, e é um mau exemplo dado por uma camara municipal, de que outras se podem querer aproveitar.

Concluindo, repetirei que estou muito satisfeito com o que ouvi ao sr. ministro dos negocios estrangeiros; e desejo que ás declarações de s. exa. corresponda a prompta adopção de uma medida que remova estes inconvenientes.

O sr. Palmeirim: — Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda e marinha sobre o projecto relativo á Guiné.