DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 345
serviço da estrada, auctorisou a abertura de uma nora em propriedades do sr. Jacinto Neves, que com todas as obras d’este respectivas, importou em mais de 1:000$000 réis, pagos pelo thesouro para proveito exclusivo d’este cavalheiro?
11.° Porventura, o sr. director Macario não poderá apresentar um mappa por onde se conheça o numero de metros das estradas construidas n’estes cinco annos, por exemplo, e até hoje a despeza feita, e outro mappa que indicasse o numero de metros, de despeza do campo e de gabinete, executadas no mesmo periodo, e qual é seu custo?
12.° Se é verdade haver-se despendido 1.000:000$000 réis, não se havendo realisado quinze kilometros de estrada?
13.° Se é verdade que o engenheiro Macario elevara a chefe de secção um albardeiro que edificara um predio á custa das obras publicas?
14.° Que o sr. ministro deve declarar terminantemente se é verdade que o sr. Brito, sendo apenas desenhador, recebe diariamente 2$000 réis, e que até os alizares das portas do antigo governo civil (diz-se) mandára para o seu predio na travessa do Carvalho.
10.° Se ignora (como diz o jornal regenerador A Liberdade) que a um galopim eleitoral se desse a construcção de quinhentos carrinhos?
O sr. ministro das obras publicas não me conhece tão bem como os seus collegas, e por isso lhe digo que não costumo avançar proposições sem ter em que me baseie; refiro-me sempre a factos para não cair nas contradicções em que têem caído alguns jornalistas, e em que tambem caíu um dos collegas de s. exa.
Sr. presidente, não se póde admittir que façam negocios com as obras os empregados encarregados de fiscalisal-as, e o sr. ministro sabe perfeitamente o que diz o codigo penal a este respeito.
(O orador continuou a ler.)
Agora os jornaes regeneradores dizem o seguinte.
(Leu.)
Não sei se o sr. ministro permitte que lhe mande estas notas.
O sr. Ministro das Obras Publicas: — V. exa. póde mandal-as, mas eu, já conheço a relação d’esses pretendidos factos a que s. exa. tem alludido.
S. exa. deseja enviar-m’as, não tenho duvida nenhuma em recebel-as.
O Orador: — Sim, senhor, m’as depois faz-me especial obsequio de mas devolver para serem copiadas pelos srs. tachygraphos.
Se a camara me dá licença eu vou ler um artigo do jornal A Liberdade, que é uma testemunha regeneradora.
As testemunhas têem mais ou menos auctoridades conforme o seu logar e a sua posição. Este jornal tem-se pronunciado abertamente contra o partido progressista; não está na Granja, nunca esteve, nem estará talvez.
(Leu.)
Isto dizem os jornaes que defendem tenazmente o governo; e por consequencia eu fui buscar as minhas testemunhas a um bom logar.
(Leu.)
Isto é dito pelos regeneradores, e quando se trata d’elles, eu accentuo bem claramente, porque são homens que apoiam o governo.
(Leu.)
Podia ler muito mais, porém entendo que não é necessario. Estão aqui os jornaes, e quem quizer examinal-os, póde fazel-o: e tanto mais que o que tenho lido está compendiado nas quatorze perguntas que acabo de fazer e que depois de escriptas serão publicadas com o meu discurso, fazendo parte integrante d’elle.
Deprehende-se de tudo o que tive a honra de ler á camara, que o estado em que se encontram as repartições de
obras publicas no Algarve é, alem de irregular, confuso e anarchico.
Não se póde admittir um tal estado de cousas, e não se póde desculpar o ministro que está á frente d’aquelles negocios, porque alem dos conhecimentos que tem como homem instruido, e membro da nobre e illustrada classe dos engenheiros.
Corre-lhe por esse facto o dever de ser mais vigilante do que qualquer outro, porque s. exa. é, por assim dizer, de casa, conhece perfeitamente aquelles serviços. Se fosse um homem completamente hospede n’estas materias, poderia ter uma tal ou qual desculpa; porém não acontece assim, o sr. ministro não só é versado n’estes assumptos, mas em muitos outros, porque a sua illustração é grande, e portanto maior responsabilidade pesa sobre s. exa.
Direi agora, que não tendo chamado o sr. ministro a um exame vago, tenho direito a esperar de s. exa. respostas categoricas, como as que são dadas por alguns dos seus collegas, como muito bem ponderou o sr. conde do Casal Ribeiro, que póde ser citado, porque não é um homem desconhecido dos srs. ministros, nem desconhecido na republica das letras.
S. exa. disse, e disse muito bem, que o sr. Andrade Corvo respondera clara e terminantemente á pergunta que lhe foi dirigida pelo digno par o sr. Carlos Bento, e tanto isto foi assim, que eu desisti da palavra; mas o sr. ministro da fazenda é que não soube o que havia de fazer com relação a este negocio, que, por sua natureza, é muito mais claro do que o das obras publicas do Algarve, e quiz ouvir o sr. Mártens Ferrão, que é um cavalheiro que se ouve em todos os negocios, mas cuja opinião não se segue a mala parte das vezes, como aconteceu quando se tratou da questão da Zambezia, na qual nem sequer o ouviram, tendo sido consultado em outras questões identicas, como eu ponderei e demonstrei no discurso que n’esta casa proferi sobre esse assumpto.
O governo ouve-o apenas por deleite, mas não com o proposito de seguir os seus conselhos!
Admira que um ministerio que não póde largar o poder, porque se elle saír não ha outro que possa tomar conta das pastas, e a monarchia desapparece, não saiba o que se faz em repartições importantes, não saiba cumprir o seu dever, quando se offendem leis da magnitude d’aquellas a que se referiu o sr. conde do Casal Ribeiro, e não responda claramente sobre pontos conhecidos. Este procedimento podia fazer abandonar a arena a alguns espiritos mais desanimados, que não quizessem trabalhar improficuamente nas lides parlamentares, mas eu é que não abandono o meu logar, e como sentinella vigilante, como devem ser os membros da representação nacional, onde tenho uma cadeira, peço ao sr. ministro, que diga claramente, se s. exa. sabe o que se tem passado na administração das obras publicas do Algarve, e, sabendo o, se o auctorisou; se sabe se, com pretexto, não do bem publico, mas com o fim de favorecer eleições ou proteger afilhados, se tem feito obras em edificios particulares á custa do dinheiro do povo, e se é com estes factos que os srs. ministros se julgam habilitados para dizer — que o povo póde e deve pagar mais.
Isto póde-se dizer em certas e determinadas epochas, mas não póde ser admittido como uma proposição permanente.
O povo não póde pagar mais, deve pagar menos, e o governo deve gastar menos e zelar a bolsa do povo.
Quando houve um ministro que procedeu a um inquerito, ministro que se chamava João Gualberto de Barros e Cunha (e pronuncio o seu nome como quem pronuncia o nome de um homem, ao qual se tributa respeito), e foi á penitenciaria examinar e saber o que lá se passava, recorrendo a v. exa., que então presidia á administração, para que na qualidade de ministro do reino, o auxiliasse com a policia para esse fim, levantaram-se contra esse ministro, a quem, como eu já em outro discurso disse, e agora repito, já começam a fazer justiça, as maiores accusações, accusações