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SESSÃO DE 1 DE JULHO DE 1890 411

Emquanto á falta de orçamento, estamos no mesmo caso.

Ainda havia outra circumstancia, allegada tambem pela auctoridade, ter a mesa sem ser necessario feito um emprestimo de 800$000 réis com uma hypotheca insufficiente. Mas este motivo por si só não determinava a auctorisação do governo; a falta de apresentado de contas é que sobretudo resolveu o governo a proceder como procedeu.

Pergunto agora ao digno par e á camara se isto não collocava o governo na obrigação de auctorisar o governador civil a dissolver a mesa da misericordia do Fundão?

Pelas informações que obtive e procurei, não são só as que me vieram pelas auctoridades, consta-me que no Fundão, como em muitas terras da provincia existem partidos locaes que não são partidos politicos, mas são quasi só divisões pessoaes.

Esta é a verdade.

A mesa da misericordia do Fundão, antes da ultima eleição, tinha admittido trinta e cinco membros, e depois, em virtude d'essa fornada, fez-se a eleição da mesa que o governador civil propoz que fosse dissolvida.

Depois o outro partido quiz fazer a mesma cousa.

Um outro facto tambem allegado pelo sr. governador civil, era que a misericordia tinha dois facultativos, um em estado de prestar alguns serviços, mas o outro um octogenario.

(O digno par não reviu.)

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, ouvi com toda a attenção a exposição que fez o sr. ministro do reino, e acho tão pouco correcto e irregular o procedimento do governo que chamo a attenção da camara para este assumpto, que é na verdade importante, serio e grave.

O governo auctorisou a dissolução da mesa da misericordia do Fundão, segundo affirmou o sr. ministro do reino por seis rasões que pesaram no animo de s. exa. das quaes tres considera que são ponderosas e importantes. A primeira e principal é a mesa não ter prestado contas. A segunda é a mesa não se ter habilitado até ao fim de abril com o seu orçamento. A terceira é ser pouco correcta e pouco regular a administração da mesa, isto é, ser nocivo e prejudicial aos interesses d'aquelle pio estabelecimento.

As outras tres rasões de somenos importancia são a mesa ter feito um emprestimo de 800$000 réis sobre uma hypotheca que não era sufficiente para o garantir. Ter feito uma fornada de irmãos só de correligionarios, recusando pessoas muito competentes e dignas. E ter a mesa demittido um facultativo que era já velho n'aquella santa casa. São estes fundamentos em que o governador civil baseou a sua proposta, são estes os fundamentos, que o sr. ministro do reino achou procedentes e em virtude dos quaes auctorisou a dissolução da mesa.

Se eu demonstrar á evidencia que os tres principaes fundamentos não têem rasão de ser, e que os outros pouco valor ou nenhum têem; se eu demonstrar á luz da verdade que nenhum dos fundamentos está dentro das prescripções do codigo administrativo, que nenhum dos argumentos apresentados tem as condições que a lei exige para se poder auctorisar a dissolução da mesa d'estes estabelecimentos pios, terei demonstrado que o sr. ministro do reino auctorisando a dissolução da mesa d'aquelle estabelecimento procedeu arbitraria, injusta e illegalmente. Eu faço justiça ao caracter do sr. ministro do reino, por isso creio que s. exa. reconhecendo o erro, não terá duvida de remediar o mal. Faço justiça a s. exa. e creio que s. exa. conscientemente não se porá ao serviço de paixões mesquinhas, que têem tido o intuito ignobil de satisfazerem vinganças locaes. Espero pois que se a minha demonstração for completa, como creio que será, que s. exa. reconhecendo o engano que lhe fizeram remediará o mal que fez. Se porêm não conseguir demonstrar o que pretendo, e tiverem fundamento as rasões do alvará n'esse caso o procedimento de s. exa. será legal e terá na lei a sua rasão justificada.

Para ser claro e facilmente entendido exporei, e direi primeiro á camara quaes os artigos do codigo que devem ser applicados no caso sujeito. Conhecendo-se a lei que regula esta materia conhecer-se-ha facilmente se ella foi bem ou mal applicada. O artigo que vigora para a nossa questão é o artigo 220.° do codigo administrativo, que estabelece a seguinte doutrina:

"Artigo 220.° Ao governador civil pertence tambem a inspecção superior das irmandades, confrarias e institutos de piedade ou de beneficencia que por lei uno estejam immediatamente subordinados ao governo e no exercicio d'estas funcções pertence-lhe:

"3.° Dissolver sómente em algum dos casos mencionados nos quatro primeiros numeros do artigo 17.°, precedendo auctorisação do governo, as mesas ou administrações d'estas associações ou institutos, nomeando livremente commissões que as administrem até á epocha da eleição ordinaria, quando não julgue conveniente antecipar a eleição.

"7.°, § 14.° Até ao fim de abril remetterão as administrações das irmandades e estabelecimentos a que este artigo se refere os seus orçamentos ordinarios ao administrador do concelho para este os enviar até ao dia 15 de maio ao governador civil com informação" etc., etc.

Este artigo estabelece que ao governador civil assiste o direito de inspecção sobre as irmandades e estabelecimentos pios, etc., etc., e no n.° 3.° declara que póde dissolver a mesa dos estabelecimentos pios só nos casos dos quatro primeiros numeros do artigo 17.°

É, pois, só em conformidade com os quatro primeiros numeros do artigo 17.°, que o governador civil póde dissolver. Brevemente veremos se o alvará do governador civil satisfazer aos requisitos, que o codigo lhe exige.

No n.° 7.° do § 14.° estabelece tambem o codigo que os estabelecimentos pios se devem habilitar até ao fim de abril com os respectivos orçamentos.

Segundo a doutrina d'este artigo, o governador civil não póde dissolver a mesa de qualquer estabelecimento pio sem que as faltas que ella praticar sejam algumas das que marca o artigo 17.° do codigo administrativo nos seus quatro primeiros numeros. Vejamos, pois, quaes são essas faltas.

"Artigo 17.° Os corpos administrativos podem ser dissolvidos pelo governo, precedendo consulta do supremo tribunal administrativo.

"1.° Quando não se habilitem com os seus orçamentos nos prasos e termos legaes;

"2.° Quando não prestem contas das suas gerencias em conformidade com a lei;

"3.° Quando depois de advertidos deixem de tomar as deliberações indispensaveis ao desempenho dos deveres que as leis lhes incumbem e que não possam ser promptamente suppridas pelos meios ordinarios facultados nas mesmas leis;

"4.° Quando por via de inquerito ou syndicancia em que sejam ouvidos se mostre que a sua gerencia é nociva aos interesses dos seus administrados e ás conveniencias da administração publica." etc., etc.

As faltas a que se refere o artigo e que dão direito a que o governador civil possa dissolver a mesa são as seguintes: não se ter habilitado a mesa com orçamento, no praso legal, não ter dado contas tambem no praso legal; quando advertida não obedecer, e quando a sua administração for nociva e prejudicial aos interesses do estabelecimento.

No alvará do governador civil acham-se effectivamente apontadas tres das faltas que o artigo 17.° menciona, a l.ª, 2.ª e 4.ª

Vejamos agora se essas faltas se deram, e se o governador civil as póde justificar.

A primeira falta que o governador civil aponta é a mesa