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CAMARA DOS DIGNOS PARES
SESSÃO DE 20 DE MARÇO DE 1861
PRESIDENCIA DO EX.MO SR. VISCONDE DE CASTRO
VICE-PRESIDENTE SUPPLEMENTAR
Secretarios: os dignos pares Conde de Mello
Conde de Peniche
Ás duas horas e meia da tarde, sendo presente numero legal, declarou o sr. presidente aberta a sessão.
Lida a acta da antecedente, julgou-se approvada.
Deu-se conta da seguinte correspondencia:
Dois officios da presidencia da camara dos srs. deputados, acompanhando duas proposições, uma concedendo um terreno nacional á camara municipal de Monte-mór o Velho, para usos de conveniencia publica, e outra auctorisando a camara municipal de Almada a levantar um emprestimo até 6:333$000 réis, para com o seu producto prover ao acrescentamento de caes de Cacilhas.
Remettidas á commissão de administração publica.
-Do ministerio da guerra, enviando copia de uma portaria, satisfazendo ao requerimento do digno par conde do Bomfim.
O sr. Presidente: — Não ha mais correspondencia na mesa, nem temos projectos de lei dados para ordem do dia; o que estava designado para se tratar hoje era a interpellação annunciada pelo digno par o sr. conde de Thomar, mas o sr. ministro do reino fez saber á mesa, que tendo necessidade absoluta de estar na outra camara por motivo de grande alcance politico, não lhe era possivel comparecer aqui, como desejava, para responder á interpellação annunciada.
O sr. D. Carlos de Mascarenhas: — Peço a palavra a V. ex.ª
O sr. Presidente: — Tem a palavra o digno par.
O sr. D. Carlos de Mascarenhas: — E para mandar para a mesa uma proposta.
«Proponho que esta camara se conserve em sessão permanente até que s. ex.ª o sr. presidente do conselho venha responder á interpellação que está' dada para ordem do dia de hoje.
Sala das sessões da camara, 20 de março de 1861. = D. Carlos de Mascarenhas, par do reino». Continuando disse:
Esta interpellação, sr. presidente, é sobre objecto que não póde deixar de ser considerado muito serio (apoiados). E sobre uma portaria que eu entendo que foi resultado de exigencias revolucionarias (apoiados)! É sobre uma portaria que eu acho que veiu atacar gravemente a liberdade (apoiados); conseguintemente, este negocio não se póde adiar mais, e por isso apresento esta proposta que, depois de lida na mesa, será tomada pela camara na consideração que lhe merecer (apoiados).
O sr. Secretario (Conde de Mello): — Leu a proposta.
O sr. Presidente: — Vou consultar a camara sobre se admitte á discussão a proposta que se acaba de lêr.
Foi admittida.
O sr. Conde de Thomar: — Eu não posso deixar de considerar muito extraordinaria a communicação feita pelo sr. presidente do conselho no momento mesmo em que devia verificar-se a interpellação que eu annunciei sobre a portaria de 5 do corrente (apoiados).
Sr. presidente, a camara toda está certa de que o sr. presidente do conselho aceitou o debate e concordou em tratar-se hoje esta importante questão (apoiados). Era de esperar, depois do que se tinha passado, do accordo que se tinha tomado na sessão de antes de hontem e do compromisso a que s. ex.ª se obrigou, que este negocio fosse hoje tratado infallivelmente (apoiados), e que se não procurasse um pretexto especioso para se evitar hoje esta discussão, e fugir a este combate. (O sr. Marquez de Fronteira: — Apoiado.),
Se nós, sr. presidente, não conhecessemos as circumstancias em que se acham os trabalhos da outra camara, podiamos ter por sincero e verdadeiro o fundamento que determinou o sr. presidente do conselho a responder por tal fórma á communicação que a mesa lhe fez de que esta camara se declarára em sessão permanente para tratar a questão, e que esperava pelo nobre ministro (apoiados). Podíamos acreditar que algum alto negocio de estado impedia que s. ex.ª comparecesse; mas todos nós conhecemos o assumpto que se trata na outra camara (apoiados). Trata-se de discutir o parecer da respectiva commissão d'aquella camara sobre as emendas que se fizeram n'esta ao projecto de lei de desamortisação dos bens dos conventos das religiosas. (O sr. Marquez de Pombal: — É exacto.) Esta questão tem sido sempre estranha ao sr. presidente do conselho, s. ex.ª nada disse a este respeito na outra camara, quando lá se discutiu este objecto pela primeira vez (apoiados); s. ex.ª nada disse tambem aqui, quando nos occupamos ultimamente do mesmo assumpto (apoiados). É um negocio entregue todo aos cuidados do sr. ministro da fazenda, que está igualmente á testa da repartição dos negocios estrangeiros, á qual diz tambem respeito esta questão. Assim é o sr. ministro da fazenda o competente, e de facto tem sido o ministro que tem tomado a peito e se tem feito cargo de defender e sustentar o projecto de lei a que me referi (apoiados).
Qual é pois o motivo que impede o sr. ministro do reino de comparecer aqui? S. ex.ª estava compromettido a comparecer hoje n'esta camara (apoiados); não era mais natural que s. ex.ª se desculpasse de não comparecer na outra casa, por isso que não tinha ali igual compromettimento? (Apoiados.) Sabemos que o ministerio está todo na outra camara, e não era muito que o sr. ministro do reino, que é membro da camara dos pares e o sr. ministro da guerra igualmente par viessem para esta, onde os chama o cumprimento de um compromisso tomado pelo sr. ministro do reino, ao mesmo tempo chefe do gabinete (apoiados).
Qualquer que fosse o objecto de que se tratasse na camara electiva, s. ex.ª lá tinha ainda quatro dos seus collegas; podiam pelo menos, estar aqui presentes dois que são membros d'esta casa (apoiados). Se lá se tratasse de negocio dependente da repartição de s. ex.ª o sr. ministro do reino podia com mais propriedade pedir que o dispensassem do comprometimento que tinha tomado perante esta camara (apoiados); e se s. ex.ª comparecesse aqui, e expozesse rasões taes que nos convencessem de que se não podia aqui demorar, a camara avaliando as rasões que s. ex.ª desse, havia de ser justa como costuma, quando os ministros guardam para com ella todas as conveniencias e attenções. (Vozes: — Muito bem.)
É na verdade para admirar que no momento em que todos esperam um desenlace para a importante e desgraçada questão que tem sobresaltado os animos dos homens sensatos d'este paiz, o sr. presidente do conselho se recuse a comparecer aqui! (Apoiados.) Não ha nada que possa justificar um igual procedimento! Não ha nada que possa eximir o sr. presidente do conselho da obrigação que tinha de comparecer n'esta camara para responder á minha interpellação; acaso faltam a s. ex.ª fundameptos plausiveis para justificar a portaria por s. ex.ª expedida em data de 5 de março?
É necessario que ainda se saiba mais, e é, que o sr. presidente do conselho, emquanto se recusa a vir hoje aqui tomar parte n'esta discussão, está já mandando executar com. a maior actividade e com a maior atrocidade essa mesma portaria! (Apoiados repetidos.) Atrocidade digo eu, sr» presidente, porque entendo que s. ex.ª na conformidade das leis do paiz não póde dar execução a uma medida que alem, de opposta ás leis vigentes,. contraria as; boas doutrinas (muitos apoiados).
S. ex.ª não comparece, porque, pretende fugir á discussão, e não quer ouvir as reflexões da camara dos pares, as; observações que se hão de fazer, e os argumentos que se, hão de apresentar, tudo para mostrar que s. ex.ª violou os principio» da verdadeira, liberdade; os canones e as leis do. paiz (muitos apoiados). É por isto, e só por isto, que s. ex.ª se recusa a vir aqui (apoiados). E porque eu assim o entendo, e porque todos nós sabemos que não ha motivo forte, e plausivel que obste a que s. ex.ª compareça, não posso deixar de votar pela proposta do meu nobre amigo o digno par o sr. D. Carlos de Mascarenhas. (Vozes:. — Muito bem.)
O sr. Marquez de Ficalho: — Eu fui o que propuz o adiamento, e o propuz com toda a lealdade, lealdade que está sempre conforme aos meus principios, e com a qual tenho combatido em qualquer campo em que me hei achado (apoiados).
Disse que n'esta questão não tinha senão documentos a favor do que eu sustento, mas que queria que o governo me mandasse quaesquer outros em contrario (apoiados); que os procurasse, que os legalisasse e que os mandasse, para o que lhe dava o tempo que em minha consciencia me parecia dever dar-lhe, embora já tivesse decorrido algum, e os documentos devessem estar todos preparados. O governo porém não nos manda mais nada, e não comparece no dia e hora que ajustou! Pois bem; eu estou disposto a ficar aqui até que se responda á interpellação (apoiados). Eu não largo o meu posto; V. ex.ª póde não querer esperar alem de certa hora, podem-se fechar as portas, mas eu continuo a estar no meu logar até que appareça quem me responda (apoiados).
O sr. Presidente: — Não hei de ser eu que me hei de levantar d'este logar emquanto o sr. marquez de Ficalho ou qualquer outro digno par me pedir a palavra, e agora peço licença para expor de novo o que disse, visto que ultimamente têem entrado alguns dignos pares que não me ouviram.
O que se está passando é em resultado da communicação que fiz á camara sobre uma participação que a mesa teve do sr. presidente do conselho de ministros, e na qual s. ex.ª expoz que lhe não era possivel vir hoje aqui, porque succedia que dois negocios de alta importancia estavam simultaneamente dados para ordem do dia na outra camara, e que ambos exigiam ali a presença de todo o ministerio.
Mais alguma cousa disse s. ex.ª, que por me parecer propriamente pessoal não expuz, mas di-lo-hei agora, e vem a ser, que s. ex.ª acrescentou: que já tinha dado prova da sua boa fé, e do desejo mesmo de responder a esta interpellação, tendo-se apresentado para esse fim na sessão de antes de hontem, e que se então se não verificara a interpellação não fóra por facto seu, mas em consequencia de uma proposta de adiamento feita pelo digno par o sr. marquez de Ficalho. Agora, tendo assim completado a transmissão de tudo que s. ex.ª disse, a camara fará o que entender, que eu serei fiel executor das suas determinações, e não faltarei aos deveres que me impõe este logar. (Vozes: — Muito bem.)
(Pausa.)
O sr. D. Caídos de Mascarenhas: — Creio que não temos agora outra cousa a fazer senão votar a minha proposta; não ha mais quem peça a palavra, e ninguem a combateu; portanto acho que V. ex.ª deve-a propôr á votação.
Leu-se a proposta na mesa, e entregue á votação foi approvada por 23 votos contra 14.
O sr. Conde de Thomar: — Agora acho que o regular é V. ex.ª ter a bondade de dar conhecimento d'esta resolução ao sr. presidente do conselho de ministros.
O sr. Presidente: — A mesa manda já expedir o competente officio.
O sr. Visconde de Gouveia: — Mando para a mesa uma representação de uma camara municipal que pede a prompta construcção da estrada de Lamego a Trancoso. Os estudos acham-se feitos, essa estrada está determinada por lei, destinaram-se fundos para ella, e ordenou-se que se pozesse em praça. Dos esclarecimentos que o sr. ministro das obras publicas prestou sobre este assumpto, colligi que já se deu andamento para se pôr em praça, todavia apesar d'isto mando para a mesa a representação.
Por esta occasião pedirei a V. ex.ª o obsequio de me informar do destino que têem tido as diversas representações que tenho mandado para a mesa, e se dellas se ha dado conhecimento ao sr. ministro competente.
O sr. Presidente: — V. ex.ª indicará o destino que deseja se lhe dê.
O Orador: — Estas representações têem versado sobre a execução de uma lei, e por isso julgo o mais conveniente que sejam mandadas ao governo. Não sei se isto está na alçada da mesa, ou se será preciso consultar a camara; porque n'este caso pediria a V. ex.ª que o fizesse.
O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam a indicação do digno par o sr. visconde de Gouveia, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvada.
(Pausa.)
O sr. Visconde de Gouveia: — Creio que foi distribuido hoje o projecto n.º 147, que auctorisa o governo a despender até á quantia de 600$000 réis annuaes, com a restauração do magnifico templo de Santa Cruz de Coimbra, templo monumental, para cuja conservação bem é que se applique alguns fundos. Este projecto não está dado para or-