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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO EM 30 DE MARÇO DE 1864

PRESIDÊNCIA DO SR. CONDE DE CASTRO

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Conde de Mello

Ás duas horas e tres quartos da tarde, sendo presentes 36 dignos pares, declarou o sr. presidente aberta a sessão.

Lida a acta da precedente julgou-se approvada, na, conformidade, do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia.

Um officio do ministerio do reino, participando que Sua Magestade receberá no dia 31 do presente mez a deputação d'esta camara que tem de apresentar á sancção real alguns decretos das côrtes geraes.— Ficou a camara inteirada.

Um dito do ministerio do reino, remettendo uma nota do tabaco despachado para consumo na alfandega grande de Lisboa nos annos de 1862 e 1863, satisfazendo o que quesito 5.° do requerimento do digno par, José Maria Eugenio de Almeida; e os mais esclarecimentos pedidos no mesmo requerimento, serão enviados opportunamente.

O sr. Presidente: — A moção apresentada pelo digno par o sr. barão de Villa Nova de Foscoa, na ultima sessão tem a natureza de moção preliminar, conforme o artigo 57.° do nosdo regimento; vae portanto ter segunda leitura.

-O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Leu-a, e é do teor seguinte:,

«Proponho, na fórma do artigo 57.° do regimento, que a camara resolva que não ha logar a votar, e passa á ordem do á ía. ¦= Barão de Foscoa.»

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara sobre se a admitte á discussão.

Foi admittida.

O sr. Presidente: — Está em discussão.

O sr. Conde de Thomar: — Esta proposta, sr. presidente, foi julgada preliminar, segundo o artigo 57.° do regimento, más a meu ver ella não deve ser considerada como tal. O regimento diz que se póde propor que não ha logar a votar-se, e é então que a questão póde ser julgada preliminar; mas eu vejo que a moção do digno par não se refere a este artigo do regimento senão quando o nomeia, porque diz: proponho, na fórma do artigo 57.° do regimento, que a camara, ouvidas as explicações do sr. ministro da justiça, passe á ordem do dia.

E ainda ha mais a notar, e é dizer s. ex.ª na sua moção, ouvidas as explicações do sr. ministro da justiça. Estas pa lavras equivalem a dizer que a camara está satisfeita com as explicações dosr. ministro, quando não é assim.

Entendo portanto que a moção do digno par, para poder ser julgada preliminar, é preciso que se lhe tirem essas palavras— ouvidas aa explicações do sr. ministro. Eu peço á camara que tenha a bondade de ouvir lêr o artigo 57.° do regimento, para apreciar bem qual é o seu espirito (leu).

Ora, o digno par em logar de fazer a sua proposta em conformidade com o regimento, diz: e ouvidas as explicações do sr. ministro da justiça; quer dizer: a camara satisfeita com as explicações do sr. ministro... etc...

Se se quer pois, repito, que a questão se julgue preliminar, é preciso que se cortem as palavras ouvidas as explicações do sr. ministro.

O sr. Barão de Villa Nova de Foscoa: — Declarou que retirava da proposta s palavras = ouvidas as explicações do sr. ministro da justiça = se a camara o permittia.

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara sobre se consente que sejam retiradas da moção do digno par, o sr. barão de Villa Nova de Foscoa, como elle propõe, as palavras = ouvidas as explicações do sr. ministro da justiça = as quaes tiram á proposta a natureza de preliminar, como foi observado pelo digno par, o sr. conde de Thomar.

A camara decidiu afirmativamente, e proseguiu /

O sr. Presidente: — Vae ser lida a proposta com a modificação que se lhe fez.

O sr. Secretario: — Leu-a.

O sr. Presidente: — A camara ouviu ler a proposta do digno par; vou portanto po-la á votação visto que ninguem se acha inscripto para fallar sobre ella.

O er. Aguiar: — Eu proponho que a votação seja nominal (apoiados).

O sr. Presidente: — Consulto a camara sobre a votação nominal.

Consultada a camara, decidia afirmativamente.

O sr. Presidente: — Vae-se proceder á chamada.

Effectivamente se procedeu á chamada, e

Disseram approvo os dignos pares: Duques, de Loulé e de Palmella (Antonio); Marquezes, de Sá da Bandeira e de Sabugoza; Condes, de Castro, de Avillez, da Ponte de Santa Maria e de Rio Maior; Viscondes, de Condeixa, de Fornos de Algodres e da Vargem da Ordem; Barões, de S. Pedro e de Villa Nova de Foscoa; Alberto Antonio de Moraes Carvalho, Augusto Xavier da Silva, Bazilio Cabral Teixeira de Queiroz, Carlos Duarte de Caula Leitão, Custodio Rebello de Carvalho, Diogo Antonio Correia de Sequeira Pinto, João de Almeida Moraes Pessanha, João da Costa Carvalho, Joaquim Filippe de Soure, José Ferreira Pestana, José Augusto Braamcamp, José Bernardo da Silva Cabral, José Gerardo Ferreira Passos, José Lourenço da Luz, José Maria Baldy, Luiz de Castro Guimarães, Manuel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco, Manuel de Almeida Pessanha, Miguel do Canto e Castro, Rodrigo de Castro Menezes Pita e Vicente Ferrer Neto Paiva.

Disseram rejeito os dignos pares: Cardeal Patriarcha; Marquezes, de Fronteira, de Niza, de Pombal e de Vallada; Condes, das Alcaçovas, de Alva, dos Arcos, d'Avila, da Azinhaga, de Fonte Nova, da Louzã, de Mello, de Mesquitella, de Peniche, da Ponte, de Rezende, do Sobral, da Taipa e de Thomar; Bispo de Lamego; Viscondes, de Benagazil e de Fonte Arcada; Antonio de Macedo Pereira Coutinho, Francisco Simões Margiochi, Joaquim Antonio de Aguiar, José Joaquim dos Reis e Vasconcellos, José Maria Eugenio de Almeida, Luiz Augusto Rebello da Silva, Miguel Osorio Cabral e Castro e Sebastião José de Carvalho.

Vários dignos pares pediram a palavra sobre a ordem.

O sr. Conde da Taipa: — Expoz que quando entrou na camara viu este negocio mui adiantado, e ficou admirado quanto podia ser. Não póde portanto deixar de declarar que isto foi uma surpreza de propósito para calar o verdadeiro sentimento da camara.

O sr. S. J. de Carvalho: — Eu pedi a palavra sobre a ordem, não para apresentar uma moção, mas porque para obter a palavra era necessario que V. ex.ª assim me inscrevesse. Demais é sobre a ordem da discussão que eu tenho a dizer alguma cousa.

Sr. presidente, eu cheguei a esta caça um pouco tarde, esperando que a camara depois de na sessão passada não ter julgado a materia discutida por uma grande maioria, se não julgaria sufficientemente esclarecida para votar hoje, apenas porque hontem usei por pouco tempo da palavra sobre, a questão (muitos apoiados).

Esperava pois que a discussão continuasse e suppunha que teria o gosto de ouvir s. ex.ª o sr. bispo de Vizeu a quem na ordem da inscripção cabia hoje a palavra. Foi pois com verdadeira surpreza, surpreza que não devia sentir porque infelizmente estamos já habituados a estas desgraçadas especulações de tactica parlamentar, foi porém com verdadeira surpreza que ao entrar n'esta sala vi proceder a uma votação para abafar a discussão. Lamento deveras este facto, e estranho que a maioria, sem força de rasões para justificar o ministro, se socorresse para o defender a um expediente que não hesito em qualificar de miseravel (muitos apoiados). Vozes: — Ordem.

O Orador: — E miseravel, sr. presidente, o expediente a que a maioria se soccorreu! Vozes: — Ordem.

O sr. Xavier da Silva: — Eu peço que o digno par seja chamado á ordem (susurro).

O Orador: — Pois não é miseravel este procedimento?!

O ar. Bazilio Cabral: — Miserável é o procedimento do digno par.

Vozes: — Ordem, ordem.

O sr. Silva Cabral: — Não se póde reclamar contra uma votação da camara.

O Orador (com vehemencia):-—Sr. presidente, se V. ex.ª com todo o rigor da sua imparcialidade me não garante a liberdade da tribuna, a que tenho direito, como membro d'esta camara, sento-me; e irei fazer valer o meu direito no campo onde as interrupções não são permittidas, e onde a liberdade ampla de discussão não póde ser reprimida nem pela força do numero, nem pela imposição obrigada do silencio.

O sr. Marquez de Sabugoza: — Não está no seu direito em chamar miseravel a uma deliberação da camara.

O Orador: — Eu chamei miseravel não á deliberação da camara, mas ao expediente a que a maioria se soccorreu (apoiados).

(Vários dignos pares pedem a palavra).

O sr. Presidente: — Eu peço licença para inscrever os dignos pares que têem pedido a palavra.

Devo tambem declarar que os trabalhos da camara correram com toda a regularidade desde o começo da sessão (muitos apoiados). Não é o presidente que o diz, é a mesa que o declara.

O sr. S. J. de Carvalho: — Não serei eu porém que me levante para provocar conflictos. Não irrita o debate quem tem por si a força da rasão. Se o epitheto é affrontoso, retiro-o (apoiados. — Vozes: — Muito bem); e os dignos pares que me interromperam que procurem a expressão para qualificar o facto a cuja qualificação eu não desço.

Sr. presidente, depois de uma longa discussão sobre O objecto da interpellação do sr. marquez de Vallada ao sr. ministro da justiça, ácerca da nomeação do escrivão da camara ecclesiastica da diocese de Coimbra, foram mandadas para a mesa differentes moções de ordem. E o que significa uma moção de ordem? È uma nova questão que se apresenta para a camara resolver. Ora, sr. presidente, se os dignos pares entendiam que á moção do sr. barão de Villa Nova de Foscoa podia ser applicado o disposto no artigo 57.° do regimento, se queriam questão previa, porque a não apresentaram, e porque não a apresentou s. ex.ª no principio da discussão? Oh! Pois póde alguem justificar perante o espirito do regimento, perante a sua propria letra, perante a lealdade da discussão, perante o bom senso, a apresentação de uma questão previa, depois de oito dias de discussão n'esta casa?! Eu não classifico este facto, sr. presidente; repugna me essa classificação, deixo porém aos dignos pares a liberdade de a fazerem. Abram o diccionario, consultem-no, procurem a expressão propria para definir este expediente, e difficilmente encontrarão outra que não seja o synonimo da que eu empreguei.

Eu, sr. presidente, declarei na ultima sessão, que me parecia que esta questão havia de ter uma conclusão desgraçada, e que fazia votos para que não houvesse votação sobre ella. Hoje os apologistas da causa governamental realisaram as minhas apprehensões! Desgraçada solução a que esta questão teve! A maioria quiz fazer subir o sr. ministro ao Capitólio; oh! perto d'elle está a Rocha Tarpeia, cautela que o não precipitem d'ahi.

A questão que discutiamos foi prejudicada por uma questão previa apresentada pelo sr. barão de Villa Nova de Foscoa, depois de oito dias de discussão e um dia depois que a maioria desta camara julgou que a materia se não achava sufficientemente discutida. Declarou a maioria que não havia sobre que votar depois de discutir longamente o objecto da votação! Invocou-se o artigo 57.° do regimento, que nunca teve esta interpretação para evitar que a camara desse um voto de censura ao governo! Com effeito não vale taes sacrificios a situação ephemera que para se conservar no poder se aproveita de taes meios. Que dirão os dignos pares se de futuro se invocar o precedente que hoje estabeleceram? Estou persuadido que os tão rigorosos observadores do regimento, que os homens que se levantaram hoje contra a vehemencia das minhas expressões, seriam os primeiros a protestar contra tal expediente quando os seus adversarios lançassem mão d'elle. Registemos o facto. Não digo mais nada.

A questão não se define, nem se explica. A eloquencia dos factos, repito, é superior a todas as considerações. Quando a defeza, no campo difficil era que se encontrava, procura esquivar-se á força das rasões dos seus adversarios, fechando o debate, pelo modo por que o fez, está julgada a sua causa; não ha mais que dizer, os factos dizem tudo (muitos apoiados). V. ex.ª acaba de declarar que os trabalhos correram com regularidade. Fatal regularidade a que conduz a resultados taes. Concluo, dando os parabens ao sr. ministro pelo triumpho que a maioria lhe preparou, dou tambem os parabens á maioria que n'esse triumpho o

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acompanha. Gloria ao ministro nas alturas a que a maioria o elevou!

O sr. Moraes Carvalho: — Como já não ha logar para a discussão sobre a materia, pedia a V. ex.ª que me reservasse a palavra para uma explicação.

O sr. Presidente: — Peço licença para lêr a inscripção dos dignos pares que pediram a palavra. Se houver alguma omissão, ou não estiver por ordem, os dignos pares queiram reclamar para se rectificar (leu).

O sr. J. F. de Soure: — Eu tenho um temperamento um pouco energico; muitas vezes costumo fallar com um certo calor, mas procurarei n'esta occasião tranquillisar o meu espirito, e conter-me dentro dos limites a que não estou costumado. A dignidade deve ser prezada tanto pela maioria como pela opposição (apoiados), mas as intenções tanto daquella como d'esta devem ser respeitadas (apoiados). Não é só o regimento que nos impõe este dever, são todas as conveniencias da boa sociedade (apoiados). Eu vou referir os factos como elles se passaram, e depois procurarei reivindicar para a maioria a dignidade que me pareceu querer tirar-se-lhe. O sr. barão de Villa Nova de Foscoa apresentou hontem uma moção, a que chamou moção previa, feita, disse s. ex.ª, na conformidade do regimento.

Vim hoje para esta casa, não digo á hora em que V. ex.ª convoca os membros d'ella, mas meia hora ou tres quartos depois. Leu-se a correspondencia, leu-se a acta, e approvou-se esta; portanto o que se seguia era lêr a moção do sr. barão de Villa Nova de Foscoa. Leu se a moção, V. ex.ª disse que era questão previa, na conformidade do regimento, e um membro conspicuo da opposição levantou-se, pediu a palavra, e disse que não podia ser, pelo modo como estava redigida a moção, considerada como uma questão previa. Se s. ex.ª, auctor da moção, eliminasse certas palavras que n'ella se encontravam, então não havia duvida nenhuma em a considerar na conformidade do regimento. O sr. barão de Villa Nova de Foscoa annuiu, achou rasão a um membro da opposição, as palavras foram eliminadas, e este digno par declarou que não havia nada a dizer; retiradas ellas, a questão era previa. V. ex.ª disse: está a questão previa em discussão. Ha quem peça a palavra? Ninguém pediu a palavra. O que havia V. ex.ª fazer? Onde está a surpreza, onde estão as intenções? (Apoiados.) Onde está a falta de lealdade da maioria? Por quem sois vós opposicionistas, por quem sois! Se não confiaes em nós, dos da maioria que sustentam a tal situação ephemera, tambem nós não confiámos em vós. Podeis duvidar da maioria, d'esta maioria que sustenta a tal situação ephemera, mas não entreis nas nossas intenções. Dizei que errámos, que a nossa politica conduz ao abysmo, más não digaes que nós servimo-nos de expedientes para vos surprehender (apoiados), não digaes que nós nos servimos de expedientes, porque não temos rasões para sustentar esta desgraçada situação. As rasões apresenta-as a maioria, as rasões pelas quaes estas se refutam apresenta-as a opposição, mas a intenção não é do dominio de ninguem, e o decoro e a dignidade pedem que os termos affrontosos não sejam trazidos para aqui, nem por um nem por outro lado (apoiados). Quando eu porventura empregue alguma expressão que possa ferir o melindre de algum digno par ou o decoro da camara, peço aos dignos pares e peço a V. ex.ª que me chamem logo á ordem.

Ora em vista desta explicação, que é a historia real e verdadeira dos factos como elles se passaram, como é que se póde arguir a maioria desta casa de ter procurado por uma surpreza ganhar a votação? Eu entendi até que esta estava perdida, e assim o disse a um digno par que estava ao meu lado, até me pareceu que havia 38 votos da opposição contra 32 da maioria.

Ora, pergunto eu, quantos membros da opposição estavam n'esta casa que podiam pedir a palavra? Eram uns poucos, eram uns 27, uns 30, ou que sei eu, e nenhum pediu a palavra, nenhum quiz fallar senão o sr. conde de Thomar! Ora podia dizer-se n'estes termos que a maioria teve a culpa, que quiz surprehender a minoria? Parece-me que é vontade de arguir. Estes é que são os factos, não ha mais nada, absolutamente mais nada. Agora quanto ao mais que se disse a respeito desta desgraçada maioria que faz a infelicidade do paiz apoiando a tal situação ephemera, não entrarei n'esse ponto, porque a respeito de politica estou um pouco descrente, mas ao menos combatamos num campo aberto, respeitemo-nos uns aos outros, respeitemos as nossas intenções, e tratemos os factos como elles são, bem ou mal; não podemos dar aos nossos adversarios a rasão que elles não acham em nós.

Eu não sei se depois querem que haja votação sobre a surpreza, ou se o que se quiz foi protestar contra o acto de má fé da maioria, porque foi um acto de má fé, se o que se praticou foi na intenção de surprehender a minoria; mas não houve a meu ver má fé. Perdoe-me V. ex.ª, parece-me que V. ex.ª não podia consentir que de nenhum lado se fizesse esta affronta, depois de uma votação qualquer da Camara, a quem ficar vencedor; este exemplo é mau. O digno par que o trouxe bem vê que póde numa outra occasião acontecer o mesmo quando elle triumphar. Parece que devia retirar alguma expressão que podesse ser affrontosa para a maioria.

Eu tomei a palavra sobre este incidente quando se lançavam injurias sobre nós.

Uma voz: — Retirou a expressão.

O Orador: — Retirou a expressão, mas concluiu do mesmo modo.

O sr. Conde da Taipa: — Apoiado.

O Orador: — Apoiado! Mas o sr. conde da Taipa concluiu do mesmo modo, e contra isto é que eu me insurjo, é contra essas palavras, que vem lançar uma offensa sobre uma votação da camara. Ora este exemplo é que eu peço á camara que não consinta, e peço a V. ex.ª que consulte o regimento, que tem lá de certo um artigo para obviar a estas cousas, que convem se não repitam. O que querem os dignos pares?

Se querem que nós respeitemos as opiniões da minoria, não sei que isso possa ser se não respeitarem as nossas. Devem respeitar as nossas intenções, como nós devemos respeitar as suas. Isto é da essencia do governo constitucional.

O sr. Basilio Cabral: — Sr. presidente, eu estou completamente prevenido pelo digno par que acabou de fallar. S. ex.ª fez a historia exactamente do que se passou.

Quando eu pedi a palavra foi no calor da discussão, porque quando um membro da camara usa de uma palavra que não Beja amena ou conforme com a boa educação que todos nós desejámos, resulta sempre haver uma certa exaltação de uma ou outra parte.

O digno par, sr. S. J. de Carvalho, serviu-se de uma expressão bastante forte; eu tambem usei de outra expressão talvez ainda mais forte, e que me pareceu quasi igual; mas como o digno par retirou a sua expressão, eu retirei tambem a minha.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Marquez de Niza: — Peço a V. ex.ª queira mandar lêr a acta na parte que diz respeito á ordem do dia de hoje, para ver se concorda com o que vem no Diario de Lisboa.

O sr. Presidente: — Isso não tem nada com o caso.

O Oraãor: — Tem tudo, porque eu não posso fazer uso do que tenho aqui impresso, sem ver se concorda com o que está na acta...

O sr. Presidente: — A acta está aqui, e já foi lida.

O Orador: — Mas eu peço a V. ex.ª que mande lêr a parte da acta relativa á ordem do dia de hoje.

O sr. Secretario (Conde de Mello): — (Leu.) E a ordem do dia que estava dada para hontem, e continua hoje.

O Orador: — Portanto é claro que a noticia official, que está no Diario, está conforme com a acta que se acabou de lêr (Leu).

Agora, para não interromper a ordem da inscripção, nada mais direi; mas peço a palavra sobre a ordem, para ainda explicar isto melhor. Sem querer qualificar a surpreza, digo que houve surpreza. A camara não será de certo tão illogica que queira fazer-me retirar esta palavra.

Não sou eu que o digo, são os factos. A surpreza está aqui (mostrando o Diario).

Agora peço a V. ex.ª que me conserve a palavra na ordem da inscripção.

O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara. Como não está presente o sr. Julio Gomes, mas está o sr. Margiochi, peço a s. ex.ª queira occupar o meu logar para eu ir explicar á camara este negocio.

(Susurro.)

(O sr. Margiochi occupou a cadeira da presidencia.)

O sr. Presidente (Margiochi): — Eu não sei se o sr. conde do Castro quer fallar na ordem da inscripção.

O sr. Conde de Castro: — Eu tenho de dar uma explicação.

Vozes: — Falle, falle.

O sr. Conde de Castro: — Sr. presidente, quando hontem se fechou a sessão e dei a ordem do dia, havia alguma confusão na sala, como succede quasi sempre, porque os dignos pares são testemunhas de que se não espera que se feche a sessão, saíndo logo apenas dá a hora (apoiados). Então disse eu: a ordem do dia para a sessão de ámanhã é a mesma de hoje, os srs. secretários entenderam que era a parte da ordem do dia que se não havia discutido, isto é, a discussão do parecer n.º 342 e a interpellação.

Foi a intelligencia que deram os srs. secretários e que eu entendo que deram muito bem.

Quando pois cheguei hoje aqui e subi á cadeira da presidencia, disse ao sr. secretario conde de Peniche, que lesse o parecer n.º 342, e aqui é que eu vou justificar se houve ou não surpreza. N'este momento (e peço licença ao meu honradissimo collega, o sr. marquez de Fronteira) chegou s. ex.ª á mesa e disse: isto assim não póde ser, que se prefiram outros negocios para discussão, quando o da interpellação está em primeiro logar».'E acrescentou s. ex.ª: «Vou fallar ao sr. ministro da justiça, porque não póde ser virmos aqui todos os dias para ver metter outros negocios de permeio, e não se concluir o da interpellação».

Depois entrou o sr. ministro da justiça, o qual me fez uma especie de exprobração, por eu intercalar outros objectos com o da interpellação. Foi então que eu disse ao sr. conde de Peniche que seguia em discussão a interpellação do sr. marquez de Vallada.

Eu fallo diante do sr. conde de Peniche, e portanto não ha duvida...

O sr. Marquez de Fronteira: — Não ha duvida que eu fiz essa observação a V. ex.ª, e preveni o sr. ministro da justiça, mas não fui mais adiante.

O Orador: — Muito bem. E tambem é verdade que eu estava debaixo de um certo escrupulo desde hontem, porque a maior parte dos dignos pares estranharam que eu tivesse dado para discussão o parecer da commissão de guerra, e que se não começasse logo pela discussão sobre a interpellação.

Aqui está o que se passou, e a camara, em vista do que acabo de referir, me fará a justiça que costuma (apoiados). Depois de terem tomado a palavra varios oradores

O sr. J. I. Guedes: — Sr. presidente, tenho só duas palavras a dizer: quando eu entrava na camara estava fallando o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, e aconteceu-lhe, como acontece á maior parte dos individuos que tomam uma parte activa nas discussões, que lhe saíu da bôca uma palavra que de certo não estava nas intenções de s. ex.ª porque era offensiva para a camara. Para protestar contra ella, para pedir ao digno par que a retirasse, ou aliàs para pedir á mesa que o fizesse entrar na ordem, fo a rasão por que pedi a palavra; moção já não tenho que fazer, porque o digno par, com a sua delicadeza e modo distincto e franco como se sabe conduzir nos corpos collectivos, retirou aquella expressão logo que viu que ella era inconveniente.

Poderia ficar aqui; que o meu fim era este, mas já que tenho a palavra direi que, se alguem se podesse queixar de surpreza, era eu tambem d'esse numero. Já estava aberta a sessão quando eu entrei, mas como esta camara nem sempre é pontual nas horas de abrir a sessão, aconteceu-me chegar já tarde, e quando já se tinha votado a proposta do sr. barão de Villa Nova de Foscoa.

Antes de hontem foi apresentado por parte da opposição um requerimento para que se julgasse a materia discutida, e eu votei contra; depois d'isso fallou o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, que ouvi com todo o cuidado, e hoje votaria que o estava, principalmente pelo discurso do meu nobre amigo; e pelo que disse tambem o digno par o sr. barão de Villa Nova de Foscoa. Parece me que queixa, por parte da opposição, de falta de discussão, não a ha, porque já ha dois dias, repito, que a opposição julgava a materia discutida, e fez um requerimento n'este sentido.

O sr. Conde de Thomar: — A materia não se votou, a maioria o que quiz foi que se não votasse a materia (apoiados).

O Orador: — Peço perdão, materia propriamente dita para votar não estava nenhuma em discussão, o que havia era uma interpellação do digno par marquez de Vallada, que não concluiu por moção alguma, e reservou-se o direito de a apresentar, se no decurso da discussão julgasse conveniente usar d'elle. Houve diversos individuos que fizeram varias moções, e o sr. barão de Villa Nova de Foscoa tambem fez uma moção a que elle chamou questão previa, porque propunha que não havia logar a votar; chamem-lhe como quizerem mas é uma moção. A camara podia portanto dar por findo o debate, estava no seu direito; esse debate, que por mais de oito dias entretinha a attenção da camara, tinha tomado proporções muito mais latas, do que demandava a importancia do assumpto; e certo é que a camara estava altamente illustrada pela discussão, e se o não estivera membros conspícuos da opposição não pediriam que a materia se julgasse sufficientemente discutida.

Depois d'este requerimento fallaram ainda dois oradores: o sr. Sebastião José de Carvalho para sustentar uma nova moção que apresentou, o sr. barão de Villa Nova de Foscoa para apresentar, a sua proposta da questão preliminar.

Eu peço perdão á camara, eu sei que tinha obrigação de vir mais cedo, e o motivo por que pedi a palavra foi para dar esta explicação: desde que está marcada a ordem do dia, e designada a hora a que se ha de abrir a sessão, a obrigação dos dignos pares é estar aqui; se eu e outros membros da camara aqui não estavamos presentes, e eu confesso a minha falta, não me posso queixar senão d'ella, e nunca da camara que póde muito bem passar de um objecto da ordem do dia para outro, introduzir mesmo discussões novas, com a dispensa do regimento, como muitas vezes se pratica.

Eu accuso-me d'esta falta, mas no entretanto não protesto contra a deliberação da camara, não só porque approvava a proposta do sr. barão de Villa Nova de Foscoa, mas porque me cumpre acatar as decisões da camara. Foram estes os motivos por que quiz dar estas explicações, porque se não fosse a palavra que proferiu o digno par e meu amigo, o sr. Sebastião José de Carvalho, e que me soou mal, não incommodaria a camara. Agora porém que s. ex.ª a retirou, não preciso protestar contra ella, e aproveitei a occasião de explicar qual seria o meu modo de votar.

O sr. Marquez de Niza: — Sr. presidente, eu empreguei a palavra surpreza, e creio que devidamente, mas nem por isso tencionei dirigir uma censura ao sr. conde de Castro Surprezas fazem-n'as as maiorias, fazem-n'as as opposições, em summa fazem-n'as aquelles que imaginam ter a força n'um momento dado para obter uma cousa que não poderiam obter n'outro momento.

O sr. presidente disse que a sessão de hontem acabou com alguma agitação, porque quando se ouve dar a hora todos os dignos pares se levantam, mas isso é mais uma rasão para ninguem poder invocar senão o que está escripto, e não o que s. ex.ª disse ou quiz dizer. Se s. ex.ª visse que todos os dignos pares tinham percebido bem qual era a ordem do dia por s. ex.ª annunciada, então não poderia haver duvida, mas se s. ex.ª mesmo confessa que no fim da sessão ninguem presta attenção!! já se vê que se adoptou este methodo de publicar no Diario a ordem do dia para que todos possam saber com certeza qual ella é, e por consequencia a mesa deve dirigir-se pelo que está escripto. Eu não queria dirigir uma censura, mas parece-me que, se s. ex.ª tivesse querido mostrar aquella imparcialidade que a sua alta intelligencia e o seu caracter nos faziam esperar, não devia ter feito esta alteração sem ser submettida á approvação da camara, dando assim uma prova da sua imparcialidade, e não ceder a essas instancias officiosas porque as officiaes só podem partir da camara. O que se trata particularmente é um favor, e só com o consentimento da camara é que qualquer pedido particular póde ter um caracter official (apoiados).

- Portanto, digo eu, que esperava da imparcialidade de s. ex.ª, e do rigor com que quer que se cumpra o regimento, que a camara tivesse sido consultada se queria ou não que se entrasse na segunda parte da ordem do dia, dispensando-se assim o regimento que a maioria agora nos impõe tão duramente com a sua força numérica.

Quando me chegar a palavra sobre a ordem, para que já devo estar inscripto, direi mais alguma cousa.

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O sr. Conde da Taipa: — Sr. presidente, eu acho que não temos rasão, apesar de não termos justiça. O sr. José Izidoro Guedes entendeu a questão legalmente, mas eu que estou sempre na cabeça com a moralidade, parecia-me que, moralmente fallando, devia-se attender a uma questão que acabava com um direito; questão importantissima que aqui se tem discutido, a que se devia deixar toda a latitude, e não abafa-la a uma hora, que não era adiantada.

Hontem cheguei a esta camara, e quando entrava disse-me o guarda portão — é a primeira vez que V. ex.ª é o primeiro! Esperei tres horas, fui para a camara dos srs. deputados, até que chegou o continuo e me disse — o sr. presidente está, na cadeira, e manda chamar a V. ex.ª Ora, acostumado a isto, vim hoje mais tarde, porque tive rasões imperiosas para isso; escuso de dizer quaes ellas foram, porque as cousas domesticas não vêm para aqui (riso), e tendo a palavra, e tendo tambem arranjado o meu sermão, achei que me tinham posto um mordaça na bôca (riso). Se os dignos pares acham isto moral, não sei; legal é. Mas, se julgam que nós, declarando que tinhamos sido surprehendidos, não tinhamos rasão para o dizer, então eu entrego ao publico a decisão do assumpto.

O sr. Soure, entrando na apreciação dos actos da opposição, disse — se vós não tendes confiança em nós, tambem nós não temos confiança em vós; eu rejeito o vós porque collectivo, e eu nunca fui ministerial, e só o quiz ser do sr. Soure, mas s. ex.ª não se fiou n'isso o saíu do ministerio (riso). O que nós estamos convencidos é que este governo é impossível, porque é governo de um poder occulto, e estes poderes nunca governaram, que não desfizessem a sociedade. Esta é que é a questão.

Eu não posso ser ministro, e por consequencia não posso ser comprehendido no tal vós. Eu reconheço a philosophia historica, mas reconheço igualmente que o meu ecclectismo não me leva a ser ministro.

«As vossas leis são boas?» Perguntaram um dia a Sólon, e elle respondeu: não, mas são as melhores que póde ter a sociedade.

Por consequencia as minhas esperanças estão perdidas a respeito de eu ser vós; sou ego (riso).

Ora, a respeito dos poderes occultos, ainda não consta terem se estes assenhoreado do governo, que governo algum não caía, e a sociedade não fique arruinada. Vejam o que succedeu na Polónia, na infeliz Polónia, que hoje está pugnando pela sua liberdade. Em 1830 fez esse paiz um esforço, e combateu o dominio do czar; o exercito russo estava então intacto, estava em toda a sua força, não tinha tido Sebastopol, nem todas essas insurreições que têem tido que combater; os polacos lutaram com exito, e por muitas vezes combateram as numerosas legiões do autocrata; 03 clubs porém trabalhavam, e assim que deitaram a mão ao poder, em quinze dias os russos estavam era Varsóvia, degolavam os polacos ou os agrilhoavam e os mandavam para o fundo da Sibéria. Estes é que são os factos. A França esteve perdida pelos clubs em 1848 até que por fim disse: «Queremos Cesar, venha o cesarismo.» E elle lá está; e foi a sua redempção a apparição d'esse homem de tanto talento, que hoje governa a França, e que lhe restituiu a ordem, sem a qual não a ha tambem na Europa. Se não fosse aquelle homem, a desorganisação da Europa teria sido completa. Mas que triste alternativa!

Tenho muita pena, sr. presidente, que acabasse o debate, porque tambem queria fallar, mas não hão de faltar occasiões; e peço a V. ex.ª que me reserve para uma questão de ordem: quero fazer uma proposta, que não será de effeito permanente, mas de effeito temporário, e vem a ser — que, quando vierem as duas grandes questões do tabaco e das suspeições politicas, não seja adoptada a questão previa (riso), alterando-se o regimento para estas duas questões. Eu peço poucas cousas á camara, e por isso espero que isto me seja concedido. Nestas duas questões está abolida a questão previa; a pena de morte, que sequer abolir para os crimiuosos, ficará abolida para estas discussões parlamentares.

O ar. Ferrer: — Tinha pedido a palavra quando ouvi censurar a decisão da maioria, por um epitheto que não quero repetir. Esta censura pareceu-me tanto mais estranha quanto é sabido que o governo parlamentar é governo de maiorias; e por consequencia que as minorias devem respeitar as decisões d'aquellas. De outra fórma não póde manter-se este systema de governo. Mas como o digno par, o sr. Sebastião José de Carvalho, retirou o epitheto, a que alludi, não tenho nada a dizer, e desisto da palavra a este respeito. Agora se a camara me concede permissão direi duas palavras a favor do nosso venerando presidente, não porque elle não seja capaz de se defender, mas porque me admira que o seu procedimento fosse taxado de favor para com a maioria, para d'ahi se concluir que houve surpreza. Se houve favor e surpreza foi pela iniciativa de dois pares da opposição, como acaba de declarar o sr. presidente.

Agora veja a camara como ha de classificar uma surpreza a favor da maioria, e que partiu da minoria. O sr. presidente seguiu as indicações d'esta.

O sr. Silva Cabral desistiu da palavra:

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Pedi a palavra sobre abordem, mas prescindo d'ella, porque não quero fallar senão sobre este incidente, trazido á camara pelo sr. marquez de Niza, incidente que espero nunca mais se dará. O sr. marquez explicou perfeitamente o facto. Este sol do meio-dia que nos alumia faz-nos mais sensiveis e impacientes do que deviamos ser, essa impaciencia que se dá ao fechar as sessões é a causa por que muitas vezes não podemos todos ficar sabendo qual é a ordem do dia da sessão seguinte, isso remedeia-se com a publicação dá ordem do dia que se costuma fazer na folha official. Esta declaração da ordem do dia é uma declaração official, e não póde deixar de ser attendida. O Diario indicou qual era a ordem do dia para hoje, essa indicação está em harmonia com a acta; o sr. presidente porém alterou-a, e por uma resolução particular revogou uma authentica. O sr. presidente deu as suas desculpas; mas perdoe-me s. ex.ª, as suas desculpas não desculpam s. ex.ª, como clarissimamente mostrou o sr. marquez de Niza. O sr. presidente disse, tenho aqui escriptas as suas palavras=que a ordem do dia era primeiro a discussão do projecto n.º 342 = e note a camara que este projecto que se poz de parte era de muita importancia porque era para dar meios ao governo. O sr. marquez de Fronteira, disse o sr. presidente, foi-lhe fallar particularmente para que alterasse a ordem do dia, depois dirigiu-se o sr. marquez ao sr..ministro da justiça, que, segundo a expressão de que se serviu o sr. presidente, lhe exprobrou que se tratasse de outro objecto que não fosse a interpellação: e o sr. presidente, em virtude d'estes pedidos particulares, alterou uma resolução official. Isto não se faz. Que importam as exprobrações do sr. ministro? Quando se entrasse na ordem do dia, viesse com essa coarctada, e requeresse que se alterasse a referida ordem do dia. Não se póde inverter por um pedido particular o que se annunciou officialmente, e é um acto authentico d'esta camara. Eu não quero attribuir este acontecimento a motivos maus, mas é preciso que por uma vez acabemos arbitrariedades, e que tratemos seriamente d'isto a que se chama governo parlamentar, e que nem tudo sejam castellos de Paiva.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. marquez de Niza.

O sr. Marquez de Niza—Por agora desisto da palavra.

O sr. Marquez de Vallada: — Não pretende de fórma alguma contestar o direito que tinha o sr. barão de Villa Nova de Foscoa para apresentar a moção que se acabou de votar; e entende mesmo que debaixo do ponto de vista legal não podia deixar de ser tomada como questão previa, permittida pelo regimento, e não contrariada por lei alguma, mas pede licença para se edificar, por assim dizer, diante d'estas protestações de respeito pela dignidade da camara e das suas decisões. Se bem o ser cousa sabida que todos os dignos pares devera pugnar por que se mantenha essa dignidade e esse respeito, entretanto bom é que os exemplos se repitam, e que todos façam iguaes declarações. Não dirá que somente se façam as declarações, mas que se execute á risca aquillo que se recommenda. Pede porém licença ao digno par, o er. Soure, para lhe dizer que ninguem questiona o direito das maiorias, e ninguem protesta contra as votações, quando ellas são legaes, como foi a que ultimamente teve logar. Assim tambem se se fizesse uma lei para obrigar a imprensa politica a calar-se, que se havia de fazer senão obedecer á lei; mas pergunta se se quereria que, como philosophos politicos e como cidadãos, os dignos pares respeitassem interiormente essa lei que, apresentada n'outro tempo, teve um epitheto que ainda não esqueceu?

N'esse tempo choviam as injurias sobre o sr. José Bernardo da Silva Cabral, e s. ex.ª acaba de ser elevado á dignidade do pariato, como demonstração de arrependimento dos chefes do partido ultra progressista. Aqui está como se guarda o respeito ás decisões dos partidos! Reparem n'isto o digno par o sr. Soure e os outros dignos pares. Elle, orador, não póde deixar de notar tanto ao sr. Soure, como ao sr. Ferrer, que essas leis das maiorias não são só dos governos constitucionaes; a maioria governa sempre, e ss. ex.ª hão de lembrar-se d'aquelle celebre discurso do marquez de Valle de gamas em que elle se referia á supremacia das maiorias, que ainda quando é da intelligencia muitas vezes avassalla o homem, cumprindo por isso que seja acompanhada de certas circumstancias, que em determinadas occasiões se não dão, e de que por isso o paiz com amargura faz o competente registo.

O orador declara-se completamente satisfeito com a votação que teve logar. Ninguém poderia seguramente praticar um acto que mais satisfizesse o seu espirito do que foi o requerimento do digno par, o sr. barão de Villa Nova de Foscoa, o não haver logar de votar as propostas que estavam sobre a mesa; mas as palavras ditas n'esta camara não foram perdidas (O sr. Visconde de Fonte Arcada: — De certo que não), nem as respectivas apreciações ficaram reduzidas a pó. Mostrou-se claramente que se quiz a todo o custo, e fosse como fosse, evitar a votação das differentes moções que se apresentaram (apoiados). O paiz ouviu a accusação ao ministro, e ouviu tambem a defeza; se não houve uma votação, se por consequencia se não póde appellar della, o que se póde sem duvida alguma é appellar para o futuro, para a historia, para a consciencia do ministro, e até da propria maioria.

(Entrou o sr. ministro da marinha).

Emquanto pois á votação da camara respeita-a como deve, mas julga que nem por isso está inhibido de poder julgar fóra da camara como bem entender no foro da sua consciencia. Não sabe se lhe será licito fazer uso da palavra para duas preguntas; talvez porém que não seja este o logar competente, mas é certo que de tudo quanto tem dito só lhe resta concluir asseverando que se regosija de ter trazido ao parlamento ou a esta camara, para melhor dizer, a interpellação ao sr. ministro da justiça; satisfaz-se com o resultado (apoiados), e espera que nas palavras que proferiu se possa bem considerar que foi propheta, com quanto se costuma dizer que ninguem o é na sua propria terra.

O sr. Conde de Castro: — Eu devia ceder da palavra, e não teria mesmo usado d'ella, se não se tratasse aqui de um negocio melindroso, que ire é inteiramente pessoal. Estou bem persuadido de que o sr. marquez de Niza, quando apresentou as suas provas, não me queria offender de maneira nenhuma, nem duvidava da minha boa fé; apresentou-as, e muito bem, como lhe cumpria na sua situação politica para fazer valer aquella idéa, que se tinha aqui manifestado, de que tinha havido uma surpreza. Não sei se s. ex.ª está presente? (Uma voz: — Não está). Sinto que o digno par não esteja presente, entretanto, repito que s. ex.ª apresentou essas provas para reforçar aquella idéa, e não para me offender. S. ex.ª já o disse, e eu acredito, mas tenho ainda a dar algumas explicações.

Sr. presidente, eu usei de um direito de que têem usado todos os presidentes; os presidentes dão a ordem do dia, mas quando dão para discussão dois ou tres projectos, podem alterar os trabalhos, segundo as conveniencias da camara, e eu trarei para exemplo, o que ainda se passou na ultima sessão. A acta que se leu hontem diz assim (leu).

Isto é o que diz a acta, e o Diario que foi publicado hontem diz exactamente o mesmo (leu). E comtudo um desses projectos que estavam dados para ordem do dia ainda está por discutir. Ora, a camara toda sabe que, quando acabou de discutir-se o parecer da commissão de guerra, eu puz de parte o segundo parecer, e passei logo a pôr em discussão a continuação da interpellação do sr. marques de Vallada (apoiados). Por esta fórma houve uma alteração da ordem do dia e apesar d'isso ninguem reclamou contra esse facto, por se ver que as conveniencias da camara assim o pediam.

O sr. marquez de Sá tinha tomado bastante tempo á camara com a palavra, e eu entendi que era mais conveniente passar á interpellação e nenhum dos dignos pares reclamou. Hoje entrou-se na segunda parte da ordem do dia, que era a interpellação; todos os dignos pares, que estavam presentes, ouviram lêr a acta, e alguns teriam porventura lido o Diario, e entretanto ninguem reclamou, e a reclamação nesta occasião tinha mais força.

Aqui está explicada a maneira como se tem procedido na mesa muitas vezes, e como eu tenho procedido tambem desde que tive a honra de sentar-me n'aquella cadeira, e com assentimento da camara (apoiados). Nada mais tenho a dizer.

(Ainda tiveram alguns oradores a palavra, entrando neste numero o sr. conde de Peniche, que deu uma explicação de facto.)

O sr. Conde de Peniche: — Pedi a palavra unicamente para suscitar, da parte do digno par o sr. Ferrer, uma explicação. S. ex.ª, por occasião de referir o que se passou sobre a alteração da ordem do dia para hoje, disse que o sr. presidente tinha acquiescido ao pedido de dois dignos pares da opposição, para alterar a ordem do dia. Eu pedia ao digno par que declarasse quem são os nomes d'esses dois dignos pares.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, eu ouvi que o sr. marquez do Niza, querendo provar que tinha havido uma surpreza, dissera isto, pouco mais ou menos, que o sr. marquez rectificará se não for exacto; que o sr. presidente tinha alterado a ordem do dia por favor. Não sei se foi esta a expressão ou outra equivalente.

O sr. Marquez de Niza: — Peço perdão, não disse isso, e então peço a palavra outra vez, sem prejuizo da que já pedi.

O Orador: — A vista do que diz o sr. marquez de Niza, é claro que eu não tinha percebido bem. Refiro-me á explicação, que deu o sr. presidente. S. ex.ª disse que, quando ía mandar pôr em discussão o projecto que vinha em primeiro logar na ordem do dia, apparecera o sr. marquez de Fronteira, e que dissera ao sr. presidente, que havia inconveniencia em se não entrar immediatamente na discussão da interpellação, o que tinha dito o sr. secretario, conde de Peniche; que depois o mesmo sr. marquez fóra fallar ao sr. ministro da justiça, e por esse motivo o sr. presidente pozera em discussão a materia da interpellação. Com estas idéas disse eu que, se tinha havido surpreza filha de algum favor, a iniciativa para esse favor tinha partido da parte de dois dignos pares da opposição.

O sr. Conde de Peniche: — Peço a palavra.

O Orador: — Ouço dizer ao sr. conde de Peniche que elle não tinha intervindo neste objecto, eu acredito a s. ex.ª mas então foi o sr. marquez de Fronteira, como s. ex.ª já confessou; por consequencia eu entendi a dois dignos pares o que pertencia a um só. Para o meu raciocinio de que a iniciativa da surpreza partiu da opposição, tanto importa que fossem dois dignos pares como um sómente. Não tive intenção de offender ninguem, mas sómente defender o sr. presidente, de cuja probidade e integridade toda a camara está sufficientemente convencida (apoiados).

Concluo, porque não gosto destas questões.

O sr. Marquez de Niza: — Sr. presidente, é unicamente para responder ao sr. Ferrer e dizer mais duas palavras. O digno par declarou que eu, quando fallei, tinha dito que o sr. presidente havia invertido a ordem do dia, por isso que se não tinham tratado as questões pela ordem em que vinham annunciadas no Diario de Lisboa; mas eu peço perdão para dizer que o digno par enganou-se, porque, quando eu fallei neste sentido, ainda não sabia que tinha havido a tal conversação particular entre o sr. presidente e o sr. marquez de Fronteira; foi o digno par que o disse; e depois d'isso é que eu fiz ver que não havia nada official n'esta casa senão o que se passava d'aqui para a mesa e da mesa para estes logares, e que as conversações particulares que houvesse atrás d’aquella balaustrada não deviam vir para aqui.

Agora, respondendo ao sr. conde de Castro, direi que s. ex.ª, segundo me parece, quando ha pouco fallou, foi em resposta ao que eu havia dito.

O sr. Conde de Castro: — O digno par não ouviu talvez, porque não estava na sala.

O Orador: — Ainda entrei a tempo de apreciar as ultimas palavras de V. ex.ª

O sr. Conde de Castro: — Eu disse, que o digno par não

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tinha de certo em vista atacar 03 actos da presidencia, mas que unicamente apresentára aquella idéa para reforçar os seus argumentos; s. ex.ª mesmo é que o disse, porque declarou que não podia duvidar da integridade com que eu dirigia os trabalhos da camara. Ora, foi em vista d'isto que eu desejava explicar ao digno par a rasão dos actos praticados pela presidencia.

O sr. Marquez de Niza: — Essa parte ouvi eu.

O Orador: — Então não continuo. Mas V. ex.ª sabe perfeitamente que eu não tive parte n'este facto que não fosse nas melhores intenções, e espero que assim se acredite (apoiados).

Emquanto a pedidos ou a favores, eu não fallei n'elles, disse unicamente que o sr. marquez de Fronteira tinha ido á mesa, e manifestara certo descontentamento por não ter começado pela interpellação; e tendo em seguida entrado o sr. ministro da justiça, e parecendo-me observar que a camara se achava inclinada a tratar primeiro da interpellação, por isso comecei por ella.

O sr. Marquez de Fronteira: — Eu não pedi a V. ex.ª que alterasse a ordem do dia.

O Orador: — Eu não disse que o digno par tinha pedido que fosse alterada a ordem do dia; a camara toda é que manifestou desejos de que se começasse pela interpellação, e a prova d'isso está em que ninguem reclamou (apoiados).

O sr. Marquez de Niza: — Sr. presidente, eu disse da primeira vez que fallei, que não queria por fórma alguma acreditar que da parte do sr. presidente, o sr. conde de Castro, houvesse a mais leve intenção na alteração dos objectos que estavam dados para ordem do dia. Mas deixemo-nos de comprimentos parlamentares; o digno par sabe perfeitamente que eu tenho toda a consideração por s. ex.ª Ora o que eu disse foi—que esperava da alta imparcialidade de s. ex.ª, que a alteração da ordem do dia fosse proposta á camara. O digno par trouxe para exemplo o que se tinha passado na sessão antecedente, e eu sinto de ter de combater a s. ex.ª com os seus proprios argumentos.

Por isso mesmo que na sessão de hontem se tratou em toda a sua plenitude aquelle projecto que dizia respeito ao ministerio da guerra, e que tinha sido dado para a primeira parte da ordem do dia, e que só depois de votado é que se passou á interpellação; por isso que se deu este caso, repito, é que eu devia esperar, assim como todos os dignos pares, que, tendo-se dado para a primeira parte da ordem do dia de hoje um projecto que podia ter discussão, se não entraria tão cedo na segunda parte da ordem do dia, e sem que a primeira parte se cumprisse.

Agora diz o digno par: «Fez-se a alteração na ordem do dia e ninguem reclamou contra ella.» Pois reclamassem que eu teria apoiado se cá estivesse. Se se tem feito algumas vezes estas alterações na ordem do dia, e se se não tem reclamado, a culpa não é minha; o que me parece é que por ter havido uma omissão ou erro n'uma occasião qualquer, sem se ter reclamado, não se segue que se não deva agora reclamar: por este facto não prescreve o direito de qualquer digno par reclamar contra os erros ou omissões por parte da mesa.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Emquanto aos factos que precederam a alteração da ordem do dia, elles foram com toda a exactidão relatados pelo sr. presidente, o sr. conde de Castro; ha no entanto uma parte que me parece muito essencial para illucidar o debate.

Quando o sr. marquez de Fronteira foi á mesa, dirigiu-se unicamente a mim (o sr. Marquez de Fronteira: — Apoiado) e perguntou-me qual era o objecto da ordem do dia. Respondi a s. ex.ª que a primeira parte da ordem do dia era a discussão do projecto a respeito da contribuição predial, e a segunda parte era a continuação da interpellação ácerca do escrivão da camara ecclesiastica de Coimbra. Ora, o sr. marquez de Fronteira pareceu-me que ficára surprehendido por se ter dado para a primeira parte da ordem do dia um projecto que naturalmente havia de ter grande discussão, e até me disse — admiro-me que se não trate já da interpellação porque o sr. ministro da justiça deve estar um pouco impaciente por se livrar da responsabilidade que sobre elle está pezando. O digno par não me disse mais nada nem tão pouco vi que o dissesse ao outro sr. secretario. D'ahi a pouco entrou o sr. ministro da justiça e dirigiu-se ao sr. presidente, o sr. conde de Castro, e não sei que mais se passou com s. ex.ª; o que sei é que depois foi alterada a ordem do dia.

O sr. S. J. de Carvalho: —.......................

O sr. Presidente ão Conselho (Duque de Loulé): — Pedi a palavra simplesmente para declarar ao digno par e á camara que estou habilitado para responder á interpellação.

O sr. S. J. de Carvalho: — Peço que se marque o dia para ella ter logar.

O sr. Presidente: — A hora já deu, e a inscripção acha-se extincta; por consequencia a primeira sessão terá logar na sexta feira 1 de abril, e a ordem do dia serão os pareceres n.ºs 342, sobre o projecto de lei n.º 349, e 345 da commissão de inquerito ácerca das occorrencias que tiveram logar por occasião das eleições camarárias de Villa Real.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão do dia 30 de março de 1864

Ex.mos srs.: Conde de Castro; Cardeal Patriarcha; Duques, de Loulé, de Palmella (Antonio); Marquezes, de Fronteira, de Niza, do Pombal, da Ribeira, de Sá da Bandeira, de Vallada, de Sabugosa; Condes, das Alcaçovas, de Alva, dos Arcos, d'Avila, de Avilez, de Azinhaga, da Louzã, de Mello, de Mesquitella, de Peniche, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, de Rezende, do Rio Maior, do Sobral, da Taipa, de Thomar; Bispos, de Lamego, de Vizeu; Viscondes, de Benagazil, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Fornos de Algodres, de Ovar, da Vargem da Ordem, de Soares Franco; Barões, de S. Pedro, de Foscoa; Mello e Carvalho, Moraes Carvalho, Mello e Saldanha, Augusto Xavier da Silva, Pereira Coutinho, Teixeira de Queiroz, Caula Leitão, Custodio Rebello de Carvalho, Sequeira Pinto, Margiochi, Pessanha, João da Costa Carvalho, João da Silva Carvalho, Aguiar, Soure, Pestana, Braamcamp, Silva Cabral, Pinto Basto, Passos, Reis e Vasconcellos, Izidoro Guedes, José Lourenço da Luz, Baldy, Eugenio de Almeida, Rebello da Silva, Luiz de Castro Guimarães, Vellez Caldeira, Pessanha, Miguel Osorio, Miguel do Canto, Menezes Pita, Sebastião José de Carvalho e Ferrer.

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