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tacões de collegas a saír e collegas a entrar! (Apoiados.) O que elle, orador, vê, e ninguem póde deixar de ver, é o systema da conservação pessoal a todo o trance; e isto, salvo o respeito devido ás qualidades individuaes do ex.mo sr. presidente do conselho, póde ser um systema agradavel ao orgulho, á vaidade, ao capricho, pessoal, ou como quizerem classificar, mas não póde ser agradavel á esphera da governação publica ou á parlamentar (apoiados); a uma, porque deixa parecer que se lhe faz uma imposição que nunca se deve manifestar, a outra porque parece que se quer pesar sobre ella com a força de um poder occulto que não existe.

E pois tempo de dizer ao paiz, representado pelas camaras e olhando pela propria dignidade, que se não deve arrostar tanto senão por aquillo que for grande, nobre e justo; e que no illustre presidente do conselho não se vê algum rasgo de administração que atteste a gravidade da ambição. Consequentemente, esta eternisação no poder (apoiados) é uma eternisação quo se não póde consentir em presença da execução dos principios: é perigosa mesmo para o proprio presidente do conselho, e póde ser perigosissima para os poderes publicos. Se elle, orador, fosse auctoridade para dar conselhos, diria ao nobre presidente do conselho, assim como aos seus collegas, que chegou a occasião, e já bem madura, para ss. ex.ªs, em acatamento e homenagem á verdade e pureza dos principios, renunciarem as suas pastas, não suppondo de fórma alguma que mataram os seus successores, pois é tambem um erro da tenacidade no poder o suppor que os successores correm risco de morrer, quando aliàs é da indole e espirito do systema que os homens se revezem, que haja periodicas modificações e se experimentem o saber e forças de cada um, não em nome de uma especulação pharisaica, mas no sentido de procurar sempre o melhor bem da causa publica. Assim pois não se deve, em nome de repugnancias e de perigos phantasticos, fechar as portas para sempre ás differentes opiniões e ás justas aspirações que procurára o caminho legitimo do poder, tendo rasão a esperar que se lhe torne mais accessivel a participação no governo, pois que, difficultando-lhe sempre, encurta-se a base da governação e a propria base ás instituições.

Terminava citando um grande nome e um grande facto: o nome é o do chefe do partido progressista, o mais illustre pelas suas qualidades, abnegação e generosidade de animo, e diria mais, que até pelo ostracismo que a si proprio se dictou. Alludia ao grande vulto de Manuel da Silva Passos. O grande facto, ou grande exemplo, fôra a maneira nobilissima com que esse mesmo estadista em 1837, não só não recuou diante da necessidade de se retirar dos negocios publicos, como saíu elle mesmo ao encontro d'ella para abrir o caminho, e deixar a estrada livre aos que viessem de novo para dar ao paiz o contingente das suas luzes. Este facto com todas as suas circumstancias esta gravado na historia, e elle orador daria de conselho a ss. ex.ªs os srs. ministros, que seguissem esse exemplo, porque seguindo-o prestam ainda, depois de muitos erros, um grande serviço ao paiz. Se o não quizerem seguir Deus e o paiz lh'o perdoem, Deus que, afaste os perigos que possa correr a nação, ou quando menos mesmo as difficuldades que apenas estejam cobertas com um véu de tristeza, lúgubre sombra que se nota e torna sensivel no governo parlamentar, que requer a iniciativa de um gabinete que vive da eloquencia da palavra e da força da acção, e não da obscuridade, nem da pertinácia ou obstinação que de nenhum modo se justifica.

Concluia pedindo licença para mandar para a mesa uma moção de ordem.

Era do theor seguinte:

«A camara acatando as prerogativas da corôa, e não satisfeita com as explicações dos ministros, passa á ordem do dia. = Rebello da Silva».

Depois de lida na mesa a moção apresentada pelo digno par o sr. Rebello da Silva, foi consultada a camara sobre se a admittia á discussão, e decidiu-se affirmativamente.

O sr. Presidente: — Segue-se pela ordem da inscripção o digno par o sr. visconde de Gouveia.

O sr. Visconde de Gouveia: — Eu não tenho podido acompanhar alguns dos dignos pares, cujas opiniões e talento aliàs muito respeito, no afan com que pretendem ver os srs. ministros n'esta casa, a entrar de prompto no exame da sua organisação politica.

Ainda quando se mostrasse que esse exame era da nossa competencia constitucional, eu entendo que, depois de encetados os debates sobre este objecto na outra camara, nós não deviamos entrar n'elle sem que ali houvessem terminado. E esta a pratica seguida geralmente com a discussão da resposta ao discurso da corôa; discussão politica que tem toda a analogia com a actual materia. E eu folgo de que as circumstancias nos levassem de facto a seguir esta pratica, e estimo pela dignidade d'esta camara e pela homenagem que tributo aos principios constitucionaes; estimo deveras que, ao encetarmos estes debates, já os srs. ministros tenham dado todas as suas explicações na outra casa, e se tenham votado n'ella as diversas moções apresentadas.

A indole d'esta camara essencialmente conservadora, as condições do nosso instituto e a prudencia e candura que devem acompanhar as deliberações de uma corporação d'esta ordem, tudo nos aconselha a não entrar com muito afan n'estas questões politicas, em que podemos gastar a nossa auctoridade e prestigio; e eu quizera antes que guardássemos toda a nossa vida constitucional para as grandes reformas e questões de governação publica, em que somos chamados a intervir.

Attente a camara na sua alta sabedoria, que nós não temos -o caracter movei e electivo da camara dos senhores deputados. Esta termina as suas funcções passados quatro annos, e póde antes d'isso ser dissolvida, quando as conveniencias politicas o exijam. A nossa missão é mesmo muito diversa da antiga camara dos senadores, que estava sujeita á mesma renovação e dissolução.

O nosso caracter de permanencia impõe-nos certos deveres de moderação, e de reserva, que é mister cumprir rigorosamente. O contrario põe-nos em luta constante com os outros poderes publicos, e cria embaraços a todos os governos, que se tornam impossiveis e viciosos.

Forma-se muitas vezes uma crise ministerial; mas são crises ficticias, que não trazem uma completa mudança de situação, e que dão origem a recomposições que enfraquecem os governos sem dar força ás opposições. O resultado é que os governos recorrem constantemente á renovação d'esta camara, por meio das chamadas fornadas, o que é quasi sempre um meio violento. E se persistirmos neste caminho antes de pouco os âmbitos da mais ampla casa serão insufficientes para ella funccionar.

Eu não quero que d'aqui se conclua que devemos abster-nos absolutamente de entrar nas questões politicas. Pelo contrario. Guardemos porém a nossa auctoridade, que assim será forte, para os grandes acontecimentos, para as violações da constituição, e dos poderes publicos. A nossa intervenção nos outros casos seja prudente e moderada. E despresemos por uma vez as questões de politica mesquinha, de politica pessoal, de politica de expediente. Essas questões servem só para nos tirar o prestigio, e a força.

E se de outro modo queremos proceder, venha então a nossa reforma, tornemo-nos moveis e electivos; e entremos então em todas as preguntas que são mais proprias de corpos, d'esta ordem.

É fundado n'estes simples considerandos, que não me demorei em esplanar, porque a camara composta de tantas illustrações, e tão lidas nas praxes constitucionaes, melhor que eu os deve comprehender; e fundado n'estes considerandos que eu entendo que esta questão da organisação politica do actual governo é mal trazida para esta camara; e que mais avisados andaremos, aguardando os actos do governo, para então os apreciarmos, e lhe darmos ou negar mos a nossa confiança, conforme forem esses actos: e apresentarei uma moção n'este sentido.

Antes de ler aquella moção aproveitarei esta occasião solemne, em que os novos ministros se apresentam pela primeira vez ante a camara, para lhes fazer algumas preguntas sobre varios objectos da governação publica. Não que eu lhes queira levantar embaraços; não que eu exija prompta resposta, se porventura carecerem de accordar-se e estudar para satisfazerem a ellas; mas quizera orientar-me sobre o pensamento governativo de ss. ex.ªs, e regular pelas suas respostas qualquer voto, que porventura seja chamado a proferir antes dos seus actos. O sr. ministro dos obras publicas apresentou no tempo da administração transacta na camara dos srs. deputados duas importantes propostas de lei, a primeira sobre a livre admissão dos cereaes estrangeiros, a segunda sobre a liberdade do commercio dos vinhos. E já s. ex.ª declarou na outra casa que sustentava estas propostas. A livre admissão de cereaes deve produzir a baixa dos preços nos generos nacionaes. E o lavrador, que é a classe mais importante da nação, porque somos um paiz agricola, o lavrador póde ficar arruinado com esta baixa de preços, se ella se não estender aos outros objectos de primeira necessidade, especialmente os alimenticios, e os objectos de vestuario e lavoura. E d'aqui deve resultar a baixa do preço dos salarios, indispensavel tambem para o lavrador. É como esta diminuição não póde decretar-se, mas só póde ser o resultado das boas medidas aduaneiras; eu pergunto por isso ao sr. ministro da fazenda se s. ex.ª conta, para ir de accordo com o pensamento d'aquelle projecto, que não deve ter fim prejudicar a lavoura, com o favor a outras industrias menos importantes, se s. ex.ª conta apresentar ao parlamento na presente sessão as medidas tendentes a abaixar os direitos de entrada aos generos de primeira necessidade, na mesma proporção dos cereaes estrangeiros.

Emquanto ao projecto da liberdade dos vinhos, em cuja apreciação e exame devo abster-me de entrar n'esta occasião, vejo que o sr. ministro das obras publicas, reduzindo a medida a dois artigos, a franca saída de todos os vinhos pela barra do Porto e a armazenagem em separado dos vinhos do Douro, juntou á proposta uma serie de outras medidas estranhas ao pensamento capital, mas que tendem a atenuar o mau effeito que elle póde produzir no paiz vinhateiro, e a compensar o lavrador dos prejuizos que da transição ou realidade do novo systema lhe possam provir. Taes são a creação de um estabelecimento de credito, uma dotação para as estradas, premios aos bons agricultores, etc... Mas noto com admiração que n'este fasciculo de promessas se não comprehenda uma, ha muito lembrada e estudada, e que só por si vale cem vezes por todas as outras, e que seria mesmo a unica e justa compensação dos receios ou prejuizos reaes do lavrador. Fallo no caminho de ferro do Porto á Regua; n'esse melhoramento vital, que levaria a prosperidade e a riqueza não só ao Douro, mas ás duas provincias que elle percorre, e que compensaria largamente todos os prejuizos e sacrificios que proviessem áquelle descurado paiz de qualquer errada medida governativa sobre o seu producto vinicola, por mais violenta e intempestiva. Eu quizera que o nobre ministro, que bastante vive na secretaria, e que tão detidamente deve ter estudado a questão, não se - apresentasse no parlamento com aquella proposta de lei, sem a acompanhar da competente medida a decretar o caminho de ferro, ou antes com 'O contrato já aceito e resolvido pelo governo. Creia o sr. ministro que o paiz não aceita de bom grado qualquer modificação na sua legislação vinhateira, sem que se decrete e realise como condição indispensavel este importante melhoramento. Eu desejo portanto ouvir a opinião e tenções do nobre ministro-a tal respeito.

Ao honrado ministro da guerra enderessarei uma pergunta relativa á proposta de lei apresentada pelo seu antecessor na outra casa do parlamento, para que se dê o subsidio de 12$000 réis mensaes ás praças de pret, aspirantes a officiaes, em 1828, que até 1834 obtiveram patentes de officiaes do governo illegitimo. Eu não podia deixar de pugnar por esta proposta, porque é ella a reproducção de outra quasi identica que tive a honra de apresentar n'esta casa ha quatro annos, e que jazeu nas commissões, como succede, por via de regra, aos projectos que não são da iniciativa do governo, ou não têem o seu apoio. Desejo que o honrado ministro me diga portanto se aceita esta proposta do seu antecessor. E tenho n'isso toda a esperança, porque o velho general ha de fazer justiça a meia duzia de homens que restam dos que por obediencia e disciplina seguiram as suas bandeiras; e porque é tempo de acabar estas differenças politicas, e de estender mão amiga e generosa a todas as victimas das nossas velhas lutas.

Ao sr. ministro da justiça perguntarei primeiramente, se s. ex.ª adopta a proposta de lei apresentada pelo seu respeitavel antecessor, relativa á extincção dos juizes ordinarios, ou ao menos o pensamento principal d'ella. Este não é por certo o modo da sua substituição, sobre o qual podemos discordar, mas é a importante medida da extincção de tão anomala e anachronica magistratura. É esta uma reforma que esta no pensamento de todos, e que não carece de estudada e discutida, porque todos a approvam. Resta só realisa-la. O bom senso não permitte a continuação de tal instituição, que é o abuso permanente, que é a negação de toda a justiça, e que é mesmo um attentado contra a carta que, declarando que a lei é igual para todos, não deve permittir que n'um determinado ponto do mesmo paiz, se julgue por juizes letrados e com certa fórma de processo, e que n'outro ponto se julgue por juizes leigos o com outro modo de processar (apoiados).

O corpo dos jurados carece tambem da illustração e independencia, que não tem por emquanto. Esta proficua instituição que tão bons resultados tem produzido n'outros paizes para a boa administração da justiça, e que eu considero uma das mais solidas garantias das liberdades publicas; esta instituição decae e desvirtua-se entre nós por falta daquelles dois predicados. É mister que o jury se reforme e aperfeiçoe para, que corresponda á alta missão que as leis lhe assignalam. É mister que se precisem clara e convenientemente os casos criminaes, em que elle deve ser chamado a intervir. E mister que se alonguem os circulos e se criem as assentadas. E mister que se reforme o processo criminal, evitando-se delongas e abusos, filhos da sua má organisação. Desejo pois chamar a attenção do nobre ministro, principalmente sobre estes importantes ramos da sua gerencia, e ouvir a sua opinião sobre todos elles.

Chamarei finalmente a attenção de s. ex.ª para um objecto importantissimo sobre o qual desejo saber a sua opinião, e se conta tomar medidas energicas, prudentes e decisivas. Refiro-me a certas idéas fanáticas e reaccionárias que se espalham adrede pelo paiz, e que trazem em sobresalto algumas consciencias. Falsos missionarios, á sombra de uma religião que talvez desconhecem, percorrem as provincias pregando o erro, a superstição e a desobediencia, empregam a phrase mais grosseira, offendem os ouvidos castos, estabelecem praticas abusivas e agitam a consciencia dos povos. Vejo conflictos erguidos entre o governo e alguns prelados, e não se resolvem. Vejo associações que se appellidam religiosas, e que abusam d'este santo nome para enganar os povos.

À religião catholica é a religião do estado. E mister mante-la e defende-la contra estes abusos. A religião é o mais forte auxiliar da liberdade, mas é preciso que a não profanem e desnaturem com erros e com excessos.

O estado exerce uma certa tutela sobre determinados actos e objectos. E mister que essa tutella seja efficaz. Dose força á parochia, força ao episcopado. Dê-se illustração o independencia ao clero, que é chamado áquelles logares eminentes. Identifiquem-se os seus interesses com as conveniencias do mesmo estado, para que mutuamente se ajudem e fortifiquem. E afastem-se para longe esses falsos auxiliares, de que não carecemos, que á sombra da religião pregam a anarchia, e que introduzem o fanatismo e a sizania onde só devera encontrar-se a paz, a caridade e a tolerancia.

Eu peço aos dignos pares que notem, que esta proposta não vae ferir nenhuma susceptibilidade, e se a votarmos, acatamos n'ella as prerogativas da corôa, assim como a acataram os membros da opposição, na proposta que o digno par e meu amigo o sr. Rebello da Silva mandou para a mesa, e que julgo que representa o pensamento da opposição. Declaramos comtudo, que esperamos pelos actos do governo para o julgar; o que é o mesmo que dizer, que não lhe damos nem um voto de censura, nem um voto de confiança, e que o julgaremos unicamente em vista dos actos, que praticar. Pela minha parte declaro, que se esses actos forem conformes com as nossas instituições e os interesses do paiz, e concorrerem para o seu melhoramento e prosperidade, eu não terei a menor duvida em apoiar os srs. ministros. No caso contrario não.

Nem me parece, que possamos votar agora de outro modo depois do que acaba de ter logar na camara dos senhores deputados. Até depois de uma discussão bastante longa, uma grande maioria repelliu uma moção de censura igual á que se acha na mesa. Ora, eu entendo, que esta camara deve ser muito parca em levantar conflictos com a outra casa do parlamento, e levantaria por certo agora um conflicto votando essa moção, conflicto que obrigaria o poder moderador a intervir para restabelecer o equilibrio des-