DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 255
chamadas ao serviço quando o ministro da guerra o julgar necessario.
Isto está de accordo com a maneira por que se tem interpretado a lei. Agora se o digno par entende que se deve alterar ou interpretar de outro modo a lei de 5 de março de 1873, proponha essa alteração á lei; e creia que se as camaras approvarem a proposta do digno par, eu serei o primeiro a sujeitar-me á resolução d'ellas. Emquanto assim não acontecer, eu hei de cumprir a lei de 1873, que determina que estejam fazendo parte dos corpos do exercito as praças de pret da reserva, embora licenciadas, para que juntamente com os recrutas perfaçam o numero de 30:000 homens, conforme a comprehendo e a tenho cumprido, e como a cumpriu tambem o meu antecessor.
Eu respondi pelo respeito que tenho pelo digno par e pela camara, mas sei que s. exa. se não satisfaz com esta resposta, e que, se ámanhã se tratar novamente deste assumpto, s. exa. repetirá a mesma pergunta, e eu serei obrigado a responder a mesma cousa. Ora, na realidade estar eu aqui todos os dias a empregar os mesmos argumentos para responder sobre o mesmo objecto, importa isso uma impertinencia da minha parte que a camara não me quererá tolerar.
Quanto ás praças de marinhagem, que estão servindo na armada por. mais tempo do que áquelle que é fixado por lei; isso é uma verdade; e é uma cousa deploravel, como eu já tive occasião de aqui dizer, que se não tenha podido ainda licenciar aquellas praças, fazendo-as substituir por outras em virtude da lei do recrutamento. Todos sabem, porem, as dificuldades que tem havido parasse executar a lei do recrutamento maritimo.
Eu já outro dia, a este respeito, assegurei ao sr. conde de Cavalleiros que muito brevemente seriam publicadas algumas disposições regulamentares para que aquella lei podesse ter melhor execução. Essas disposições foram ultimamente publicadas, e, em virtude d'ellas, o recrutamento maritimo será feito em conformidade da lei de 1876; isto é, juntamente com o do exercito.
É pois, de esperar, que assim se obtenha o numero de praças necessario para occorrer ás necessidades do serviço, sem que tenham de ser por mais tempo conservados nas guarnições dos navios os marinheiros que já tiverem completado o tempo de serviço exigido por lei.
Esse caso já estava tambem previsto na lei de 18 de março de 1865, e no decreto, com força de lei, de 17 de dezembro de 1868, que determinam que seja abonado mais um terço das soldadas ás praças que forem conservadas no serviço alem do tempo fixado por lei, emquanto não haja outras que as substituam. É isto o que tem feito este e os outros governos.
Note tambem a camara que não é conveniente, a não querer que o serviço com isso soffra, que se licenceiem todos os marinheiros logo que acabem o seu tempo.
Alem d'isso, não se devem proferir n'esta camara expressões que promovam a indisciplina, podendo transtornar o serviço militar, quando de mais a mais os proprios tribunaes têem reconhecido que essas praças continuam a estar sujeitas á disciplina militar, embora na applicação das penas impostas tenham usado de uma certa benevolencia; parece-me que ha inconveniencia em insistir sobre este ponto, embora todos nos empenhemos em achar o meio de dar baixa aos marinheiros que tenham direito a ella.
O sr. Marquez de Sabugosa: - Sr. presidente, eu começarei respondendo ás palavras que quasi no fim do seu discurso pronunciou o sr. presidente do conselho, porque são aquellas que neste momento tenho mais presentes na memoria.
S. exa. disse que «não era conveniente lançar nesta casa expressões que podessem provocar a insubordinação das praças da armada, ou pelo menos promover a indisciplina». .
Qual é o dever constitucional que nós temos n'esta casa guando vemos que ha uma grande injustiça?
É vir aqui severamente censurar o governo, e pedir-lhe contas d'essa injustiça. É exactamente para isto que nós estamos aqui, é para isto que serve o systema representativo; e se não serve para isto, não entendo para que são as ficções constitucionaes, de que fallou aqui ha poucos dias o sr. presidente do conselho.
Sr. presidente, disse o sr. ministro da guerra que ha um decreto, e eu não posso agora verificar, que previne a conservação, quer no exercito, quer na armada, das praças que acabarem o seu tempo de serviço.
Não me parece que um decreto ou portaria possa prevalecer á lei expressa.
O sr. presidente do conselho argumentou com as setenças dos tribunaes, que tinham condemnado, como desertores, as praças que sem se lhes ter dado a baixa haviam abandonado o serviço, depois de terem completado o tempo que a lei os manda servir.
Eu peço licença; parece-me que s. exa. não foi perfeitamente exacto nesta sua asserção, trazida aqui para mostrar que os tribunaes tinham dado rasão ao procedimento inconstitucional do governo.
O sr. presidente do conselho tambem asseverou que o governo passado tinha procedido do mesmo modo.
O, sr. Presidente do Conselho de Ministros: - Não só o governo passado, mas todos os governos.
O Orador: - Eu peço perdão. O facto é da responsabilidade d'este governo; a desorganisação d'este serviço começou quando s. exas. estiveram no poder em outra occasião, e creia o sr. Fontes que se a responsabilidade do facto pertencesse ao governo passado, se elle não tivesse regularisado este serviço, como procurou fazer, da mesma sorte lhe havia de notar a falta de cumprimento da lei, embora tivesse confiança na politica d'esse governo em geral, confiança que não era como v. exa. sabe uma extrema affeição, nem uma paixão.
Sr. presidente, voltando aos tribunaes, devo dizer que elles não têem condemnado, como desertores, as praças a que acima me referi que abandonaram o serviço.
Se os tribunaes tivessem entendido que esses individuos eram desertores tinham-lhes applicado a pena de quatro annos de trabalhos publicos para a Africa; mas não o tem feito, e os conselhos de investigação têem até absolvido essas praças, do que tem resultado recurso por parte do ministerio publico, para o tribunal superior, e este tribunal o mais que tem feito é condemnar esses individuos em um anno de castigo.
Não os tem julgado como desertores; mas tem tido receio de os absolver, talvez para não dar incentivo ás deserções, e de certo modo provocar a insubordinação, mas assim mesmo recommendam á benignidade regia os sentenciados, o que mostra entenderem que foi excessiva, a pena imposta.
Mas, se os tribunaes, que não têem outra voz senão aquella em que proferem as suas sentenças, procedem daquella fórma, é aqui no corpo legislativo que nós devemos procurar a emenda do que está succedendo, pedir contas ao governo, e, pelos meios legaes, obrigal-o a cumprir o seu dever.
Diz o sr. presidente do conselho que a respeito da lei da reserva, posso eu daqui por diante continuar a fallar, que pregarei no deserto, porque s. exa. julga exhausto o seu fôlego para me responder; já não póde responder mais, tem respondido tudo.
Desculpe-me o sr. ministro: hei de continuar a instar todos os annos e em todas as occasiões que o entender conveniente, sempre na esperança de que s. exa. ha de ter a delicadeza de me dizer algumas palavras.
Recommendou-me o sr. ministro que usasse eu da minha iniciativa para apresentar neste sentido algum projecto de lei, ou para obter lima resolução da camara.
Provoca-me s. exa. a que apresente uma questão de confiança. Para que?