SESSÃO N.º 32 DE 15 DE ABRIL DE 1896 427
não sendo indispensaveis, dentro do mesmo paiz. Sendo sim; e até as applaudo.
Já quando em outra reforma administrativa, a que já me referi com louvor, se fizeram excepções em favor do Porto e de Lisboa, não me pareceram bem. E comtudo ha via e ha circumstancias excepcionaes em favor d’estas duas cidades.
Ora, se n’esta reforma s. exa. tivesse podido conseguir abolir alguns dos nossos districtos, que no meu entender não teem rasão de ser, e voltar ás circumscripções provinciaes, o regimen excepcional concedido aos Açores podia ser o regimen normal dás provincias do continente e das ilhas, ou formular harmonicamente as faculdades de conferir, de modo a não haver pretextos para ciumes ou para desconfianças; resultado nem sempre justo mas naturalissimo das providencias excepcionaes.
Sobre este ponto mais nada.
Depois dos districtos, apparecem naturalmente os municipios. O municipio é, por assim dizer, a pedra angular do edificio administrativo. O municipio tem atravessado incolume as maiores difficuldades e vicissitudes. Não sem pre radicado no mesmo ponto, mas acatado sempre com o mesmo respeito. Os foraes, tão calumniados em 1821, sempre os respeitaram e por toda a successão dos réis teem sido respeitados estes conselhos dos povos. Quizera muito que o municipio continuasse a vestir a sua camisa lavada Para elles, a superintendencia precisa; mas nenhuma tutela.
Na reforma administrativa, nesta reforma, encontram-se municipios tutelados; são os concelhos de 3.ª classe, de onde o sr. conde de Thomar quer, e muito bem, passar para 2.ª o de Fornos. Não comprehendo para que elle sirvam.
O sr. Conde de Thomar:— Isso não é commigo, o governo é que os decretou.
O Orador: — Eu antes queria que elles não existissem do que ficassem sob a tutela administrativa.
O sr. Ministro do Reino (Franco Castello Branco): — Pelo projecto em discussão desappareceram os concelhos de 3.ª classe.
O Orador: — Estimo muito que assim seja. Não desejo hoje camaras sob a presidencia e tutela do administrador, não comprehendo municipios que o não sejam. Comtudo, viveram assim no antigo regimen.
Sei perfeitamente que os; municipios eram muito exigentes, quando se afidalgaram, principalmente o de Lisboa. Tive occasião de ver que este afidalgamento chegou aqui ao seguinte: pretendendo um governo, de que eu fazia parte, fazer um gradeamento em volta do monumento dós restauradores de 1640, levantou-se a camara de então e expoz ao governo que sem sua licença nada se fizesse, porque tudo quanto havia em Lisboa lhe pertencia. Tudo! comprehendem os dignos pares? Tudo!
Isto não poderia ser hoje, porque os governos, nas ultimas reformas que teem feito, cercearam as attribuições das camaras municipaes, e por que á frente d’este ramo de serviço publico está um cavalheiro que eu respeito muito. Alem d’isso as faculdades que o governo tomou sobre si, talvez um pouco exageradas, são todavia uma salvaguarda para não fazerem cousa que se não deva fazer. Periodo transitorio, de certo.
N’este codigo administrativo ha tambem uma parte que. diz respeito a eleições. Consta-me que o governo está fazendo uma reforma eleitoral; não sei se isto é ou não verdade; não o pergunto mesmo a s. exa. em todo o caso, se a faz, é porque a julga absolutamente necessaria.
Estamos todos os dias fazendo reformas eleitoraes, e eu, sr. presidente, não desejo pedir para esta reforma o bule do sr. conde de Bretiandos.
Para mim, no campo das minhas theorias, note-se bem, ha apenas um methodo eleitoral pela qual se poderá determinar (se podér) a opinião do paiz; é o systema de Girardin, uma só lista para todo o paiz. Emquanto. s. exas.
fizerem a contagem dos votos nas cabeças dos concelhos ou no escrutinio de cada assembléa, nunca ninguem saberá ao certo qual foi a genuina votação, ou qual seria, se ali não estivessem os olhos e os caprichos das auctoridades e campeões locaes.
É preciso que os votos venham todos para Lisboa e aqui se faça a contagem e o escrutinio, bem misturadas as listas e sem poder saber-se a sua respectiva especial proveniencia.
Era este o principio que desejava ver ensaiado. O que em França era difficil, aqui era possivel. Cem nomes cabem numa folha de papel. Só assim se poderá evitar a interferencia efficaz dos administradores dos concelhos e mandões officiaes ou officiosos sobre o acto eleitoral. A organisação dos partidos, mas organisação a valer, era essencial; e os eleitos seriam da nação e não de campanario.
Eu sei que os mandões officiaes não deixariam de dizer que se lhes deviam grandes serviços, mas. isto pouco importava.
A não ser assim s. exa. faz hoje uma lei eleitoral; os que vierem ámanhã fazem outra; os que se seguirem a estes ainda outra, de fórma que teremos de viver eternamente a fazer leis eleitoraes; n’isto concordo em absoluto com o sr. conde de Bertiandos, sem nunca termos verdadeiras eleições. Que, torno a dizer, não sei o quer daria a idéa de Girardin, pois nunca foi experimentada.
Outro ponto:
Tambem aqui se trata de passaportes para os que desejarem emigrar ou sair do reino.
Sobre este ponto, sr. presidente, direi muito perfunctoriamente ao illustre ministro que o conceder-se emolumentos aos governos civis é facilitar a emigração. Não peço que ella se difficulte demasiadamente, ainda que seja opinião minha que carecemos dos braços que vão para fóra, mesmo aqui, na metropole; mas, pelo menos, que os que promovem a emigração, ou externos ou internos, se apresentem ao governo e mostrem as suas credenciaes ou os seus contratos.
Eu tinha desejo de conversar sobre este ou estes pontos, mas não posso ir alem do que a minha posição permitte.
Vou apontar só um facto para que chamo a attenção do governo, querendo que elle veja como por cá se organisa e expede a emigração.
Uma companhia obriga-se a angariar não individuos,, mas familias, em Portugal, para emigrarem, e consegue, ajudada pelos nossos engajadores, levar como familia um homem, uma mulher, duas creanças; por exemplo, uma vez chegados ao logar do seu destino e ultimado o contrato pelo reconhecimento do bom serviço, averigua-se que o consorcio era de contrabando e que as creanças foram facil e baratamente encontradas e compradas nas das de Lisboa ou dó Porto.
Lá, mais um elemento de prostituição e dois de mendicancia e miseria.
Sobre este assumpto e n’este ponto peço ao sr. ministro do reino todos os cuidados possiveis, a despeito, mesmo, de grandes sacrificios que sejam necessarios, a fim de, evitar-se a continuação d’esta emigração torpissima.
A emigração tambem provem, em grande parte, da pobreza do paiz de onde se emigra; e o nosso paiz arranja, por vezes, uma pobreza a que poderei chamar artificial. Por exemplo, no tempo do mallogrado estadista, companheiro do nobre ministro do reino, o sr. Carlos Lobo d’Avila, publicaram-se decretos, regulamentos e portarias contra a contrafacção dos vinhos. Todos sabem que os vinhos são a nossa grande riqueza, que o lavrador luta com grandes difficuldades para replantar, para cultivar os seus vinhedos, para curar, para produzir os seus vinhos, e precisa mandal-os para os mercados estrangeiros, porque não têem para a totalidade das colheitas consumo no paiz. Ora, os mercados estrangeiros já desconfiam que