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SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1869

Presidencia do ex.mo. sr. Conde de Castro, vice-presidente

Secretarios - os dignos pares Visconde de Soares Franco, Conde de Fonte Nova.

Pelas duas horas da tarde, Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 19 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. secretario visconde de Soares Franco mencionou a

seguinte Correspondencia

Um officio da exma. sr.ª D. Barbara da Silva e Noronha, participando, para conhecimento da camara dos dignos pares do reino, que falleceu, em 30 de março do corrente anno, seu prezado marido, o digno par Antonio de Lemos Teixeira de Aguilar.

O sr. Presidente: - Creio que a camara quererá que se lance na acta o pezar com que se recebeu esta participação do fallecimento do nosso collega e amigo o sr. Teixeira de Aguilar, e bem assim que se escreva á viuva dando-lhe os nossos sentimentos por tão infausto acontecimento.

A camara resolveu afirmativamente.

ORDEM no DIA

Continuação da discussão do parecer n.° 10

O sr. Presidente: - A inscripção de ante-hontem continua hoje, portanto a quem cabe a palavra é ao sr. barão de Villa Nova de Foscôa, mas como s. exa. não se acha presente, dou a palavra ao sr. visconde de Fonte Arcada, que é o immediato na inscripção.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Como não ve presentes nem o sr. ministro da fazenda, nem o sr. relator da commissão, duvida usar da palavra na ausencia de s. ex.as.,
(Entraram os srs. ministro da fazenda, Costa Lobo, barão de Villa Nova de Foscôa e presidente do conselho.)

O sr. Costa Lobo: - Pede a palavra sobre a ordem, para declarar que a commissao de fazenda de accordo com o governo não póde aceitar a substituição proposta pelo sr. conde de Thomar, na sessão antecedente, porque não se trata de ratificar o contrato com a casa Goschen, mas de auctorisar o governo para contratar um emprestimo.

O sr. Presidente: - Continua a discussão do parecer n.° 10. E achando-se presente o digno par, o sr. barão de Villa Nova de Foscôa, tem s. exa. a palavra, visto ser o primeiro que está inscripto.

O sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: - Sr. presidente, quando pedi a palavra foi para combater a proposta feita na sessão passada pelo digno par, o sr. conde de Thomar, mas visto que a camara deliberou que ella fosse remettida á commissão, e que ella a não aceitou, de accordo com o governo, não tenho por esta parte mais nada a dizer. Entretanto, aproveitando a palavra, direi alguma cousa sobre a materia, visto estar em discussão b projecto na generalidade.

Eu assignei vencido o parecer da commissao que está em discussão, porem este voto não significa que eu faça opposição ao ministerio, mas sim ao emprestimo, ou antes a este emprestimo, pois estou prompto a approvar outro qualquer, cujas condições forem aceitaveis, porque reconheço a necessidade que temos de contrahi-lo.

Estou prompto, repito, a votar qualquer que seja, contanto que seja feito em condições admissiveis, e não este que se nos propõe, e que tem sido geralmente repellido.

As condições com que foi feito não podem ser mais infames nem mais detestaveis, e eu sinto não haver, na lingua portugueza palavra mais forte com que o possa styg-matisar.
(O sr. Marguez de Vallada: - Apoiado.)

Os banqueiros não querem fazer o emprestimo, nem teem meios para isso, nem se obrigam a cousa alguma; o que pretendem é serem agentes delle para tirarem uma exorbitante commissão, e outros pesados encargos debaixo de differentes denominações e pretextos, e disporem a seu bel-prazer dos dinheiros publicos.

Com effeito, sr. presidente, não se pode ler sem indignação um contrato em que se não trata senão dos interesses dos banqueiros, sem alguma obrigação da parte delles e dos gravames que nos querem impor.

Esta companhia ou associação de cambistas, o que quer é arruinar o paiz, e tem até a ousadia de pretender fabricar, assignar e emittir os titulos do emprestimo na quantidade que quizer, e taxar-lhes o preço da venda. Admira que o sr. ministro, que no seu relatorio de 4 de maio mostrou não ter confiança nella pelos embaraços que tem causado ao governo e prejuizos á nação, lhe fosse ainda cair nas mãos.

Teve tambem a audacia de exigir que durante os trinta annos do emprestimo não poderiamos fazer outro. Querem portanto ter-nos empolgados nas suas garras até nos exhau-rirem toda a substancia.

Os prejuizos que resultam deste contrato estão bem patentes no relatorio da commissao, e não preciso menciona-los. Basta dizer que se approximam a 1.000$000 libras, e como as commissões e mais encargos não são sobre os 18.000:000$000 réis effectivos, mas sobre o nominal, mal se pode calcular a sua enormidade por se não saber o preço por que os titulos se venderão.

De maneira que os banqueiros são interessados na sua depreciação, pois quanto menos valem mais as suas commissões avultam. Não é sem rasão que elles pretendem taxar-lhes o preço.

Sr. presidente, este emprestimo em logar de ser vantajoso para as nossas finanças, fará com que a divida fique duplicada e triplicada.

Ora tendo de se pagar cada semestre 210:000 libras, é impossivel com os novos tributos poder fazer face a essa despeza. Enganam-se aquelles que julgam que os tributos possam produzir uma grande receita.

O tributo mata o tributo. Quando o contribuinte tem esperanças de o poder pagar, faz esforços para o fazer; mas quando é superior ás suas forças, não paga nem o pouco nem o muito. Deixar ao povo sómente o necessario physico é cairmos na miseria e na barbaridade.

São necessarios tributos, e hoje assignei pura e simplesmente o parecer (ainda que com magua), por serem excessivos os da contribuição pessoal, por não recusar ao ministerio os meios de governar. Por exemplo: as carruagens pagavam 30$000 reis-, foi o tributo elevado a 72$000 réis. Qual é a consequencia? Muitos apearão os seus trens, e o trabalho faltará ás differentes artes e ofiicios que delles tiravam a sua subsistencia. Em Inglaterra uma carruagem de quatro rodas paga 2 guinéus. Ali do income tax, que corresponde á nossa decima, o que não tem mais de 100 libras não paga nada. Em França, quando se lançam addicionaes, não excedem 2 ou 3 centimes por franco, e em Inglaterra 1 ou 2 pence por libra. Aqui mais meia decima, mais 20 por cento, mais outros 20... tudo é brutal.

A saida semestral de tão enorme quantia de dinheiro é impossivel; o paiz não o tem, nem commercio nem industria para o supprir, e faltando o dinheiro, o que já se vae sentindo, principalmente nas provincias, cessa toda a actividade da nação.

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Se o governo está deliberado a offerecer o rendimento do tabaco por garantia do emprestimo, perece-me que, posto que Lisboa e Porto não possuam os grossos cabedaes de outro tempo, ainda ha muitos que procuram emprego, a que com tal garantia não se recusariam a entrar nesta empreza. Os sacrificios seriam em proveito dos nossos concidadãos, e o numerario ficaria no paiz. Qualquer somma que se obtivesse era uma vantagem.

A minha opinião é que o emprestimo se não faz, ou pelo menos não se faz na totalidade; e se se fizer, será por preço desgraçadissimo. Isto se deprehende das repetidas expressões do mesmo contrato = se o emprestimo se não realisar = na parte em que se realisar =; pois o que pretendem é receber os 2.400:000$000 réis do caminho de ferro, e fazer jus á commissão. Assim julgo que nos devemos desembaraçar destes banqueiros, e procurar na Europa outra casa que aos de mais garantia, e com que possamos contratar um emprestimo em melhores condições do que as d'este, que vae arruinar o paiz (apoiados).

Sr. presidente, no banco de Franca e Inglaterra o juro do dinheiro é baixo, a 3 e 3 1/2 por cento, e devemos aproveitar a occasião para fazermos em boas condições uma operação de credito com uma casa respeitavel, porque a casa com que contratou o governo não tem a consideração devida, nem é uma sociedade legal conforme a lei ingleza, segundo me consta.

O sr. Ferrer: - Acabo de ouvir dizer ao illustre relator da commissão de fazenda desta camara, que ella tinha rejeitado a emenda que, na ultima sessão, o sr. conde de Thomar fizera ao artigo 1.° do projecto em discussão, e isto de accordo com o governo (apoiados).

Antes de fazer breves considerações a este respeito, peço a v. exa. que me diga se ha na mesa algum parecer da illsutre commissão de fazenda, visto que a emenda do sr. conde de Thornar recae sobre a parte mais essencial do projecto; e isto é um negocio grave, que vale a pena de se dar um parecer por escripto onde se consigne as rasões que tem para rejeitar aquella emenda.

Eu prevejo que a illustre commissão tem muito boas rasões para a rejeitar; está no seu direito de o fazer, e entendo tambem, como os membros da commissão, que o contrato não só é mau, mas péssimo, e até humilhante para este paiz. Por consequencia não lhe faltam mui boas rasões para justificar a rejeição.

Agora o que me surpreheade, apesar de que, aos tempos em que vamos, já poucas cousas me surprehendem, é que o illustre relator da commissão declarasse que a emenda fora rejeitada de accordo com o governo. (O sr. Marquez de Vallada: - É admiravel.)

Que a commissão rejeitasse a emenda, comprehendo-o, pelo que já disse, e porque estava no seu direito; o que me espanta é que esia rejeição fosse de accorao com o governo:
Sr. presidente, pois não vimos nós na ultima sessão as respostas que deu o sr. ministro da fazenda ás perguntas que se lhe fizeram? Não perguntei eu a s. exa. se neste projecto se pedia uma auctorisação para ratificar o contrato Goschen, ou se eram duas auctorisacões, uma para contratar o emprestimo, e a outra para o caso de se não poder effectuar esse contrato?

E não respondeu o sr. minisiro da fazeada categoricamente, que os primeiros artigos eram applicaveis ao contrato Goschen? (O sr. Ministro da Fazenda: - Apoiado.)

Quando o sr. conde de Thomar desceu da sua cadeira, veiu com a sua substituição mostra-la ao sr. ministro da fazenda, voltou para o seu logar e remetteu-a para a mesa, declarando que o governo devia aceitar aquella proposta, visto que ella era de um amigo, não ouvimos nós os argumentos do digno par, e que tanto o sr. ministro como o illustre relator da commissão pediram que esta emenda fosse á commissão? (Apoiados.) Então como póde ser isto? Como póde proceder assim um homem de honra, brioso, qual é o sr. ministro da fazenda, e eu declaro que sou o primeiro a apregoar as suas virtudes por toda a parte?

Eu não posso conceber como o sr. ministro da fazenda aceitou aqui uma proposta de um digno par, e depois foi na commissão concordar em que dia não seja approvada. Não comprehendo.

Mas ainda ha mais. O illustre relator da commissão disss, que neste projecto não se pedia auctorisação para a ratificação do contrato realisado com a casa Goschen; que continha simplesmente auctorisação para contratar em geral, e note bem a camara que isto é o que eu ouvi ao illasire relator. Se assim é, o contrato Goschen está fora da discussão, e nós não podemos de forma alguma discutir nem deliberar acerca d'elle.

Sr. presidente, como é que o governo rompe as estipulações do contrato; porque no artigo 6.° se diz expressamente que o governo pedirá ás côrtes auctorisação para ratificar o contrato; no artigo 17.° tambeni expressamente se diz que o governo, logo depois de reunidas as côrtes, trará ás camaras um projecto para ser auctorisado a ratificar o contrato, e no artigo 7.° diz mais que tudo isto se fará no espaço de quatro mezes, praso que acaba no dia 16 de julho.

O sr. Ministro da Fazenda: - No dia 16 de agosto.

O Orador: - Pois será assim. Seja porem o que for, o que eu pergunto é se neste caso o sr. ministro da fazenda cumpriu a obrigação que contrahiu de o trazer á camara immediatamente depois das côrtes reunidas para ser auctorisado o governo a ratificar o contrato? Ora o governo faltou á palavra dada, faltou á obrigação juridica e a um dever moral, que manda que todo o homem seja leal á palavra que deu.

Mas, sr. presidente, isto tem mais consequencias, e note bem a camara o governo declarou que este projecto não o auctorisa a ratificar o contrato Goschen, o que importa é o mesmo que pó-lo fora da discussão, para não nos podermos occupar delle.

O governo faltando aquella estipulação tem de pagar uma grande multa, multa que está determinada no mesmo contrato, e ha de paga la necessariamente, pois nelle se diz que, quando por qualquer motivo deixe de ser approvado no espaço de quatro mezes, incorrerá na multa da bagatella creio que de 60:000 libras ou de 1 por cento.

Eu não comprehendo o que ha de verdade em todo este negocio. Não percebo como se póde dar esta tergiversação. A questão é muita clara. Houve um contrato feito entre o governo portuguez e a casa Goschen, no qual se estabeleceu que, assim que o parlamento fosse aberto, esse contrato lhe seria apresentado para receber a sua ratificação. Que havia a fazer nestas circurnstancias? Duas cousas simplesmente. Vir logo ao parlamento pedir a ratificação do contrato, e solicitar auctorisação para poder contratar outro emprestimo, caso que o banqueiro Goschen deixasse de cumprir as condições exaradas no mesmo contrato.

Nós, os jurisconsultos, costumados a ir sempre pelo caminho direito, da rasão e da justiça, somos muito mais cautelosos do que os homens de fazenda. O que eu vejo é que em todo este negocio tem havido uma certa oscillação e tem-se sempre trilhado caminhos de zig zag. E a rasão eu, bem a sei; é porque, sendo este contrato péssimo, não querem os homens de fazenda ficar presos pelas disposições estipuladas pela casa Goschen, porque podem achar outro emprestimo em melhores condições.

Ora, apresentando-se aqui o contrato para ser ratificado? o governo, embora achasse contratos muito mais vantajosos, não os podia fazer, porqua se achava preso pelo actual; o que não acontece pedindo-se ás côrtes unicamente uma simples auctorisação para poder contratar. Isto parece-me que não soffre duvida alguma. Quem attender bem ás palavras do contrato, ha de reconhecer necessariamente isto mesmo. Lá está o artigo 7.° que diz "se por qualquer motivo este contrato não for approvado e posto em execução ao praso de quatro mezes? o governo portugues pagará a

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multa de... tanto". Vê-se pois que o governo, depois de approvado o projecto, tem o direito de deixar de o executar, uma vez que se sujeite á multa que está estipulada. Então que receios são estes de aceitar a proposta do sr. conde de Thomar? Parece-me que o sr. ministro da fazenda concorda com estas considerações que faço a respeito da multa...

O sr. Ministro da Fazenda: - Apoiado.

O Orador: - Então porque não aceita a proposta do digno par, o sr. conde de Thomar, que tem por fim auctorisar o governo a ratificar o contrato Goschen, se depois delle ratificado póde abandona-lo para fazer outro?

A verdade é que as rasões que se apresentam são phantasticas. Pois não pode o governo usar do direito que lhe é conferido pelo contrato?

Sr. presidente, homens que prezam a sua dignidade não approvam este contrato; mas sejamos francos, approve-se, se os dignos pares entenderem que, deixando de o fazer, têem receio de que o governo fique manietado.

É por este motivo que eu disse na sessão passada que aqui não só havia um, falta de obrigação juridica, mas até mesmo uma falta de dever moral, e me parecia ser uma cousa que não se podia dizer ao ouvido de um homem honrado, nem escrever se numa carta particular de pessoa que fosse verdadeiramente seria, e muito menos lançar-se num projecto que havia de ser trazido ás côrtes. Eu desejarei ouvir como o sr. ministro da fazenda explica o seu procedimento. Custa-me isto realmente, e espero que s. exa. acredite na minha sinceridade, porque vejo o nobre ministro numa prostração tal que sinto incommoda-lo; mas elle deve ser o primeiro a acudir pelo seu credito e pela sua honra. Eu, nesta parte, não faço mais do que subministrar ao sr. ministro da fazenda a occasião de se poder justificar.

(O orador não viu as notas do seu discurso.)

O sr. Costa Lobo: - Não ouviu dizer ao sr. ministro da fazenda que aceitava a substituição do sr. conde de Thomar, nem a este digno par que a tivesse feito de accordo com o mesmo sr. ministro; e fez varias considerações tendentes a mostrar os ponderosos fundamentos que levaram a commissão a não aceitar a proposta do sr. conde de Thomar, e a urgente necessidade de conceder a auctorisação como se pede no parecer, porque se ella não for concedida, o governo não poderá pagar a letra de 517:000 libras de supprimentos, e a casa Goschen, ao fim de tres dias da intimação á legação portugueza, póde lançar no mercado 10.000:000$000 de inscripções que tem como penhor.

O sr. Marquez de Vallada (sobre a ordem): - Sr. presidente, desejo dirigir uma pergunta ao sr. ministro dos negocios da fazenda, para que s. exa. me informe e á camara quaes são as declarações que estão em vigor, se as do sr. ministro, de que aceitava a emenda do sr. conde de Thomar, feita previamente de accordo com s. exa., ou as declarações do illustre relator da commissão o digno par, o sr. Costa Lobo, segundo as quaes a commissão de fazenda, de accordo com o nobre ministro, rejeita a emenda apresentada pelo sr. conde de Thomar.

O sr. Ministro da Fazenda (Conde de Samodães): - O digno par está em erro completo. Eu não declarei na sessão passada que aceitava aquella emenda para ser approvada, mas sim que convinha em que fosse á commissão. Ainda ha pouco passei pela vista as notas tachygraphicas, e effectivamente não encontrei nellas senão isto que digo.

O que eu disse, e novamente repito, é tambem que aquella parte do projecto desde o artigo 1.° até ao artigo 5.° refere se ao contrato Goschen, isto é, que aquella auctorisação comprehende o contrato Goschen, e que, passando isto em lei, o governo querendo ratificar esse contrato póde faze-lo.

Esta é que é a minha declaração. (O sr. Ferver: - Peço a palavra sobre a ordem. Dizer porem de prompto se na lei devia ser inserido o nome da casa com quem se contratou, isso era negocio para ser tratado na commissão, como se entendeu na outra camara; e a commissão julgou do mesmo modo, isto é, que não convinha outra redacção. Alem de que teriamos o grande inconveniente de voltar o projecto á outra camara, quando as circumstancias criticas em que nos achamos não permittem realmente que procrastinemos por mais tempo este negocio.

O sr. Marquez de Vallada: - Eu appello da resposta do sr. ministro para a consciencia e para a memoria da camara, para a memoria mesmo de todos que assistiram ao debate na sesssão antecedente. Pois não é mesmo um facto que s. exa. o sr. ministro da fazenda, dirigindo-se ao digno par o sr. Vaz Preto, que tambem tomou parte no debate, disse, que não tinha duvida de aceitar as emendas que fossem apresentadas no sentido em que tinha fallado o sr. conde d'Avila? Talvez que a minha memoria esteja fraca, mas eu appello, como já disse, para a memoria de todos que ouviram a s. exa. Assim não é possivel resolver cousa alguma com seriedade e certeza em relação ao bem publico deste paiz! Mas a dizer a verdade, já não ha que admirar, e a mim nada me deve já surprehender depois que li a declaração de que uma certa medida era abominavel, mas que apesar de o ser se aceitava como se fosse conveniente. (O sr. Ministro da Fazenda: - Peço a palavra.) De maneira que, sr. presidente, os homens que têem feito opposição constante ao actual gabinete, assim como eu, estamos vingados. Mas emfim, agora é para quando fallar sobre a materia que eu espero discorrer mais largamente. O que eu sinto agora é não ver na sua cadeira o digno par o sr. conde de Thomar, porque s. exa. com aquelle vigor de que é capaz tão illustre estadista, presta o seu apoio ao gabinete; porque s. exa. como verdadeiro que é não podia deixar de vir agora em nosso auxilio, ratificando que disse ter apresentado aquella emenda de accordo com o governo. E todavia nós acabámos de ouvir dizer o digno relator da commissão, que esta, de accordo com o governo, não tinha podido aceitar similhante emenda! E sempre bem! Isto não póde admittir-se, ser e não ser (to he and not to be). É necessario que de uma vez para sempre se entenda que, em assumptos da importancia e gravidade deste, se deve sempre fallar clara e terminantemente. Eu sinto profundamente que o sr. conde de Thomar não esteja presente a esta sessão, para ver que resultado tiveram os seus esforços para conservar a vida a um gabinete moribundo, e que já devia ter morrido ha muito tempo.

(O orador não viu as suas notas.)

O sr. Ministro da Fazenda: - Sr. presidente, torno a repetir o que disse, e que as notas tachygraphicas provam. Eu não disse que aceitava a emenda; apenas disse que na auctorisação se comprehendia o contrato, e que se podia por consequencia continuar a discussão. Sendo isto assim, é inutil estar a aceitar uma alteração que só póde servir para se demorar a já tão demorada resolução deste negocio, aliás urgentissimo. Imagine a camara que se altera esta auctorisação, que vae para a camara dos senhores deputados para ser discutida durante dezoito sessões, como foi da outra vez; imagine a camara, repito, quaes serão as consequencias disto. Eu não quero tomar a responsabilidade dellas como membro do governo; tome-a a camara se a quer: e se o ministerio está moribundo, venha outro já para tomar a responsabilidade da situação, que não póde continuar assim.

Sr. presidente, é necessario ver as cousas como ellas são. A situação politica do paiz é gravissima, a da fazenda publica ainda peior! O governo com esta auctorisação póde resolve-las, mas sem ella não pôde. Se a camara quer tomar a responsabilidade de não se resolver esta crise financeira, tome-a muito embora, mas o governo é que não a quer tomar.

(Varios dignos pares pedem a palavra.)

Eu tambem devo responder á allusão que o digno par fez a certas palavras que proferi em outra parte, com relação ao principio geral da arrematação dos rendimentos

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do estado, quando disse que esse principio era abominavel. Mas, sr. presidente, a questão que se tratava na outra camara, se vier a ser approvada, é muito differente; versa unica e exclusivamente sobre rendimentos em divida, atrazados, que se julgam incobraveis na sua maior parte, e que figuram constantemente no quadro das dividas activas do estado; dividas que o governo, apesar de todos os meios de que tem lançado mão, não póde ainda cobrar senão quasi nada.

Sr. presidente, o tal principio abominavel tem sido applicado a cousas muito differentes, como é a arrematação dos foros em divida, que quando vão á praça os competentes laudemios, aquelle que arremata fica com o direito de cobrar os atrazados. Por consequencia é um principio que ninguem admitte em these para ser applicado geralmente, mas que em excepção está nas nossas leis, como está tambem por excepção no projecto a que alludi.

Sr. presidente, é necessario não vir constantemente guerrear e deturpar as idéas e palavras que se dizem, unicamente com o fim de fazer opposição.

Sr. presidente, as palavras que então pronunciei na camara dos senhores deputados repito-as agora aqui.

Repillo o tal principio de arrematação de rendimentos do estado, porem julguei que o unico modo ae acabar com aquella questão era aceitar as idéas da commissão, permittindo que o governo ficasse austorisado para faser uma arrematação.

Sr. presidente, o estado da minha saude, como disse o digno par relator da commissão, não é o mais favoravel. Levantei-me da cama para vir occupar aqui o meu logar; pedir a palavra, sustentar a discussão, e evitar assim que a falta da minha presença servisse de pretexto para se adiar esta discussão., Vim para aqui, sabe Deus como que difficuldade; por isso peço desculpa de não fazer grandes discursos, e tomar antes a palavra, todas as vezes que me pareça indispensavel, respondendo pouco a pouco aquilo que se me perguntar. E para isso peço a v. exa., que me seja concedida a palavra mais vezes do que é costume.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o digno par o sr. Ferrão.
O Sr. Silva Ferrão: - Não louva o empregue de argumentos ad terrorem, que para si não tem nenhum valor para o fazerem votar, ou fazer alguma cousa contra a sua consciencia. Vota contra o contrato Gesehen e tambem contra esta auctorisação por estar cheia de restrições; e se a situação é tal como a representa o sr. Costa Lobo, as restrições são contrapreducentes; nesse caso deve dar-se uma auctorização ampla ao governo para contrahir um emprestimo seja com que condições for, como aquelles que se contrahiram para estabelecer a liberdade no paiz.
O Sr. Conde d'Avila: - Eu pedi a palavra para um requerimento. Era para ver se punha termo a esta questão de ordem, que serve só para discutir o projecto com o incoveniente de tirar a palavra aos oradores que estão inscriptos sobre a materia. Peço que se entre na discussão da materia, e só se conceda a palavra sobre ella, e os oradores que quiserem fazer noção de ordem, as façam quando lhes chegam a sua altura ne inscripção. E se [...]

O Sr. Presidente: - De certo que não.
O Sr. Visconde de Forte Arcada: - O que tem havido por parte dos defensores, e pela dos [....] parecer, leva-o a votar contra o contrato Gesegen, [...] n'uma situação critica, a que levou o paiz a fazer sistemas de administrar a fazenda publica, contra o qual tem lutado ha muitos annos, e prognosticado acontecimentos que se têem realisado infelizmente, pois desejaria haver-se enganado; e ainda agora diz que não é só por emprestimos e impostos que se pode extinguir o enorme deficit, mas antes pelo que, em 1867, indicava o sr. Ministro da fazenda, que parece ter esquecido as suas theorias assim que subiu ao poder.
O Sr. Conde d'Avila: - Observa e mostra-o por varias citações que não cabe a esta camara a responsabilidade que haja na demora da decisão d'este negocio. Lastima que dos bancos dos ministros e da imprensa ministerial estejam todos os dias partindo accusações contra os ministerios precedentes como tendo sido a causa das difficuldades actuaes, quando ellas procedem dos erros do actual ministerio, o que procurou mostrar com varias comparações, entre ellas a d'este mesmo contrato, já com o systema seguido pela situação de que foi chefe, já com os contratos celebrados com outras situações que precederam a sua.
O Sr. Ministro da Fazenda: - Eu peço a palavra para antes de sefechar a sessão, declarando desde jã a v. exa., e a camara que é para um objecto de ordem.
O Orador: - Declarou que não approvava nem o contrato nem a auctorisação, e começou expondo as rasões por que negava a approvação ao contrato. Como desse a hora, pediu que se lhe reservasse a palavra para continuar na sessão seguinte.
O Sr. Ministro da Fazenda: - Sr. Presidente, eu tive a honra de dizer a camara que a discussão d'este projecto de lei era da maior urgencia possivel. Não é minha intenção, nem é a do governo diminuir as proporções que deve ter o debate, para que os dignos pares se possam esclarecer completamente sobre este assumpto; mas para poder conciliar a largueza do debate com a estreiteza do tempo, eu proponho, não como ministro, mas como par do reino, que de amanhã em diante, alem da sessão diurna, haja tambem sessão nocturna.
Apresentando esta proposta, julgo conciliar as duas necessidades que apontei, e creio por isso que a camara não poderá ter duvida em approva-la.
O Sr. Conde d'Avila: - Em substituição a proposta que acaba de fazer o sr. Ministro da fazenda, eu proponho que a sessão comece mais cedo, porque sair d'aqui depois das cinco horas e voltar é sobremodo incommodo. Portando proponho que comece a sessão mais cedo, isto é, ao meio dia (Apoiados).
O Sr. Ministro da Fazenda: - Eu não tenho duvida alguma em me conformar com a proposta do digno par, se fiz a indicação para que houvesse duas sessões, foi porque tenho sempre observado que esta camara começa os seus trabalhos depois das duas horas, mas uma vez que se reuna ao meio dia está completalmente resolvida a questão, e eu peço licenca para retirar a minha proposta, associando-me completamente a do digno par.
(O orador não reviu as notas dos seus discursos.)
O Sr. Presidente: - Os dignos pares que approvam que a sessão de amanhã comece ao meio dia, tenha a bondade de manifestar.
Foi approvado.
A primeira sessão será [...]
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas da tarde.

[...]

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condes, de Algés, de Almeidinha, de Benagazil, de Condeixa, de Fonte Arcada, de Monforte, de Ovar, de Seabra, de Soares Franco, da Vargem da Ordem, de Villa Maior; Barão de Villa Nova de Foscôa; Mello e Carvalho, D. Antonio José de Mello, Costa Lobo, Teixeira de Queiroz, Rebello de Carvalho, Barreiros, Pereira de Magalhães, Silva Ferrão, Larcher, Braamcamp, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Baldy, Casal Ribeiro, Rebello da Silva, Preto Geraldes, Miguel Osorio, Menezes Pita, Fernandes Thomás, Ferrer.

1:206 - IMPRENSA NACIONAL - 1860

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