DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 273
que eu já citei, e segundo a opinião de homens muito importantes d'esta assembléa.
As categorias, digo mais, longe de serem um embaraço para o governo podem até, pelo contrario, facilitar-lhe muito a marcha que pretende seguir com relação ao melhor methodo de attender no futuro aos direitos de dedicados amigo, abrindo a estes todos campo largo, e podendo provar bem justissimas e cordatas pretensões, porque todos se hão de achar com as qualidades sufficientes para entrar n'esta assembléa, e o previdente governo fica habilitado para considerar os serviços dos seus sectarios, desculpando-se para com o paiz do abuso das nomeações, pela dupla legalidade da escolha.
Á primeira veleidade de opposição resolve o ministerio a fornada, e sobrevindo os amigos do governo combina-se uma lista de trinta ou cincoenta pares, contra os quaes nada ha a dizer, porque a carta auctorisa a corôa a nomeal-os, e alem d'isso todos têem categoria!
Quem poderá d'ora avante queixar-se de um acto politico tão legal e acertado?!
Sr. presidente, as cousas assim ficarão sabiamente reguladas, até que o problema receba um dia outra solução.
Eu creio que o illustrado projecto quiz tanto limitar-se, unica e exclusivamente, a estabelecer categorias de funccinarios, que, em relação ao estado das fortunas portuguezas, marcou um censo elevadissimo para o proprietario poder ser admittido aqui; 8:000$000 réis de rendimento animal, como condição para a propriedade ser representada na camara dos pares, é muito.
Emquanto á qualidade do meritos e serviços relevantes, que a commissão, de accordo com o governo, tinha eleminado do projecto primitivo, direi que este principio voltou agora pela porta das emendas, e que o desejo de o abolir é para mim mais uma prova do pensamento, que animava os membros da commissão.
Deixemos isto.
Sr. presidente, fez-se aqui uma accusação grave. Alguem disse, que todos aquelles que sustentavam sobre este assumpto idéas analogas ás que apresento, acreditavam na immobilidade da carta; que as idéas caminhavam e não era possivel ficar sempre no mesmo terreno.
Não sou estacionario, e não pertenso ao grupo d'aquelles que desejam a immobilidade politica. Tudo avança, o as instituições tambem.
Pessoalmente, a camara conhece bem as tradições da minha familia, e sabe que nós não somos do partido contrario ao progresso. Meu pae não era de uma escola muito estacionaria, pelo contrario, pugnou sempre pelas idéas avançadas. Em relação á minha humilde pessoa, tambem sou obrigado a dizer que tenho, o meu nome ligado a uma das reformas mais radicaes, das que teem sido feitas na nossa terra em materia de administração publica. (Apoiados.) Portanto um homem d'estes não póde ser atacado por não ser progressista e gostar da immobilidade.
Não quero parar, mas não dispenso a legalidade, quero as reformas, como ellas devem ser feitas.
Sr. presidente, eu declaro, que acccito este principio da immobilidade, e acccito-o com prazer, quando se trata de conservar intactas as opiniões que tenho sustentado n'esta assembléa no interesso do paiz.
Quando eu disse que as finanças não permittiam approvar a construcção simultanea dos caminhos de ferro das duas Beiras e do Algarve, que traziam para Portugal um encargo superior a 700:000$000 reis, n'essa occasião declarou o sr. ministro da fazenda que isso era uma illusão, porque esses encargos não eram immediatos, poderiam vir, mas só dentro em quatro annos. Porém são passados tres annos, e o sr. presidente do conselho diz ultimamente n'esta camara, em resposta ao sr. Vaz Preto, que o caminho de ferro da Beira Baixa não se póde pensar n'elle, porque o estado da fazenda publica auctorisa só o tratar-se do caminho de ferro da Beira Alta, e que o negocio tem de ser adiado! Vanglorio-me, sr. presidente, de ter pensado em 1 de abril de 1875, como penso hoje, na mesma data, em 1878. Esta immobilidade acceito-a!
A minha immobilidade é votar contra o augmento constante e sem fundamento da despeza, e não apoiar o actual ministerio, que voltou ao poder com os seus defeitos e erros anteriores. Caíram por causa desses erros, e esta a rasão da sua queda, e hoje repetem-nos para desgraça do paiz. Entendo que esta questão se liga tanto com a politica que, ainda que o não queira, não posso deixar do fallar n'este campo, pois me obriga a logica das minhas idéias.
O estado da Europa está chamando a attenção de todos os homens politicos, é deve chamar especialmente a do nosso governo. Entendo que não é nesta occasião que se deve atacar os fundamentos dos corpos legislativos, que são a base do systema que nos rege.
Considerações de outra ordem deviam agora chamar a attenção do governo e do parlamento.
Ultimamente tivemos nós uma lição, sr. presidente. Provou-se que não se podia abusar indiscretamente do credito; o governo transacto quiz contrahir um emprestimo de 6 milhões de libras, mas o credito não lhe deu mais de 4 milhões.
Ora, pergunto eu, os poderes publicos deverão desprezar estes avisos, e podem elles continuar sempre a confiar no credito como remedio unico de todos os nossos desperdicios? Não certamente. Poderemos, pergunto ainda, continuar a augmentar a divida fluctuante e a elevar o déficit a proporções taes que, segundo pessoas auctorisadas, não tardará que não chegue a perto de 5.000:000$000 reis?!
Esta asserção das difficuldades reaes do paiz é que eu ainda não vi verdadeiramente combatida por parte do governo, do governo que se diz conservador! Mas eu vou mostrar á maioria e á camara, como os ministros são conservadores.
Quando eu entrei n'esta assembléa como par, depois de uma grande desgraça de familia, debatia-se em Lisboa a questão das greves. Foi este assumpto o primeiro em que fallei n'esta cusa, e por essa occasião vi a hesitação, a timidez do governo em materia tão grave. E o que aconteceu? Foi necessario que uma forte e poderosa companhia industrial viesse dar força ao governo, e tomasse a iniciativa combatendo o socialismo para que o movimento não progredisse!
Hoje vejo ainda chamar conservadores aos mesmos ministros; mas que vimos nós no ultimo anno? Levantou-se uma outra questão desgraçada, a questão dos enterros civis. Esta é uma das questões, que o socialismo sempre aproveita para manifestar os seus principies de ataque á familia e á religião, e lançar á sociedade o pregão funesto da sua triste escola.
E o que aconteceu? V. exa. com aquella energia, que é uma das suas altas qualidades de homem de estado, póde rebater estas demonstrações desgraçadissimas, e, sinto dizel-o, este governo serviu-se das garantias dadas por v. exa. á causa da ordem, e lançou contra ellas grito de guerra para subir aos bancos do poder!
Governo conservador!...
Depois temos o deficit, que, em logar de diminuir, o governo procura aggravar, esquecendo que elle tem produzido as revoluções em todos os paizes, desde a revolução do 1879 até á ultima revolução de Hespanha.
Temos a reforma desta camara, a lei eleitoral, e temos ainda uma celebre reforma de instrucção primaria que se póde pôr a par das propostas mais radicaes apresentadas á assembléa legislativa em França pelos republicanos mais façanhudos. Eis aqui o governo conservador!
Vamos ao artigo 4.° do projecto. Disse-se aqui no outro dia que os cavalheiros que entraram n'esta camara em virtude do principio hereditario não se podiam queixar da camaradagem dos seus collegas que tinham entrado em virtude de nomeação regia.