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N.º 33
SESSÃO DE 2 DE ABRIL DE 1878
Presidencia do exmo. sr. Duque d'Avila e de Bolama
Secretarios - os dignos pares
Eduardo Montufar Barreiros
Visconde de Soares Franco
(Assistiam os srs. ministros da fazenda e ministro do reino.)
Pouco depois das duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 19 dignos pares, declarou o sr. presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta, da sessão antecedente, que se considerou approvada.
Não houve correspondencia a mencionar.
O sr. Presidente: - O projecto que estava em discussão era o n.° 283, mas a camara resolveu que se não discutisse na ausencia do sr. ministro da guerra, e como s. exa. não está presente, vamos entrar na discussão do parecer n.° 285, se a camara concordar...
O sr. Vaz Preto: - Peço a palavra para antes da ordem do dia, visto estar presente o sr. ministro da fazenda.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o digno- par.
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, pedi a palavra para instar novamente pelos documentos, que pedi pelos differentes ministerios, com relação ás gratificações e ajudas de custo dadas contra lei.
V. exa. e a camara sabem perfeitamente que em breve terá aqui de se tratar da questão de fazenda, e convem n'essa occasião saber exactamente qual é a receita e despeza do estado, e para essa discussão entendo que é necessario saber tudo aquillo que se despende illegalmente; portanto é muito conveniente que estes documentos venham á camara, para serem devidamente apreciados.
Está presente o sr. ministro da fazenda, e peço a s. exa. que os documentos que dizem respeito ao seu ministerio os remetta o mais breve possivel, e igualmente peco ao sr. ministro que inste com os seus collegas para mandarem aquelles que são relativos ás suas repartições.
Peço a v. exa., sr. presidente, que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. presidente do conselho de ministros, porque, preciso esclarecer a camara sobro o incidente que hontem aqui teve logar, e entendo que a rasão está da minha parte; por consequencia desejava mostrar que, quando declarei que não tinha votado, não votei, e não votei porque effectivamente aqui não se tratou de nenhuma questão, nem de projecto algum, que se referisse a augmento de tarifas.
A insinuação, ou accusação, ou como lhe quizerem chamar, cáe pela base, e é necessario devolvel-a ao sr. Fontes.
O sr. Presidente: - Está presente o sr. presidente do conselho de ministros, portanto...
O Orador: - Desejo usar da palavra.
O sr. Presidente: - Eu julgava que esto incidente estava terminado; entretanto, como está presente o sr. presidente do conselho de ministros, dou a palavra ao digno par.
O sr. Vaz Preto: - Eu disse hontem, referindo-me á insinuação, ou arguição, ou como lhe quizerem chamar, que me fez o sr. presidente do conselho, que eu não tinha votado augmento nenhum de tarifas; e que não tinha votado esse augmento, porque ainda que o quizesse votar não o podia fazer porque não veiu a esta casa do parlamento projecto a este respeito.
S. exa. disse então que eu não tinha votado augmento de tarifas, mas tinha votado o accordo em que se estabeleciam essas tarifas, procurando assim mostrar que, na historia que eu fiz dos caminhos de ferro, era cumplice em algumas medidas que lhes dizem respeito.
A esta camara, sr. presidente, ha cinco ou seis annos que não vem projecto algum a este respeito, e é d'esse tempo que eu fui historiador. O que veiu aqui, ha 16 ou 17 annos, foi o projecto de lei ácerca de um contrato com a companhia real dos caminhos de ferro portuguezes, para a construcção do caminho de ferro do norte, e n'esse projecto estabeleciam-se as condições do contrato, e entre ellas se marcava que a companhia de accordo com o governo poderia rever as suas tarifas, Não me recordo agora se votei esse projecto, projecto, que nada tem com a questão que se debate.
Não era, porém, a nada d'isto que o sr. presidente do conselho se tinha referido, e por consequencia a explicação do seu proceder hontem ainda veiu aggravar mais a sua situação, porque continuou a illudir a camara.
Sr. presidente, se usei ou se uso de alguma expressão que v. exa. entenda não ser parlamentar, estimaria muito que v. exa. me indicasse as palavras proprias e adequadas para a substituir, e para designar melhor o meu pensamento. Mas emquanto v. exa. me não indicar o modo de substituir as minhas expressões, insistirei n'ellas dizendo que ainda mais uma vez o sr. presidente do conselho foi inexacto no que disse, e illudiu a camara.
O sr. Presidente: - Este incidente está terminado. Vamos entrar na ordem do dia, que é o parecer n.° 283; e tem a palavra o sr. marquez de Sabugosa.
Leu-se na mesa.
O sr. Marquez de Sabugosa: - Sr. presidente, sinto não ver presente o digno par, o sr. Barros e Sá, a quem desejava agradecer algumas palavras, que s. exa. pronunciou em referencia ao que eu tinha dito, e declarar-lhe que me é muito agradavel e proveitoso o seu auctorisado conselho, lisonjeando-me sempre com as provas de benevolencia que o digno par me dispensa.
Não venho aqui proclamar doutrinas subversivas nem promover a insubordinação militar; venho, pelo contrario, na defeza da ordem, pedir que nos subordinemos todos á constituição e á lei, da mesma fórma que no exercito os inferiores devem sempre obediencia aos superiores.
Eu não desejava que os individuos que estão na armada, tendo passado já o tempo legal de serviço, se insubordinassem; eu não iria dizer-lhes, com a carta na mão e nos termos em que se exprimiu o sr. Barros e Sá: "Podeis largar as armas, ide-vos embora! "
De maneira nenhuma eu diria tal; mas o que me cumpre recordar ao governo é a conveniencia de não se afastarem da lei as ordens que elle ou quaesquer outras auctoridades exigem que tenham cumprimento.
Hontem procurei mostrar mais uma vez, alem d'aquellas em que tenho importunado o sr. presidente do conselho, que s. exa. não podia, por mero capricho, chamar a reserva ás armas.
Por algum tempo deixei de incommodar o sr. ministro com essa questão; mas ainda este anno, e provavelmente para o anno, hei de lembrar, quanto poder, que a lei permanente é a de 1855, que a reserva não tem organisação,
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e só póde ser chamada á fileira em circumstancias extraordinarias. Que essa condição não existe ha muito demonstram-no os factos, porque a reserva não está em armas; o que, porém, s. exa. não quer é largar de si o direito de a chamar, quando entenda conveniente; e esse direito eu não lho reconheço tambem.
O projecto em discussão só se refere ao contingente de terra, e só por equivoco me referi hontem ao recrutamento maritimo.
Uma vez que os srs. ministros, da guerra e da marinha, já tinham dado o primeiro passo para a execução da lei de 1867, entendi que n'este projecto podiam estar os dois contingentes reunidos.
Não é assim, porém, sr. presidente, porque n'este projecto pede se unicamente o contingente para o exercito.
Emquanto ao contingente maritimo, ha outra proposta na camara dos senhores deputados, e eu não sei bem se haverá tempo para ella ser discutida n'esta casa, apesar das determinações que foram feitas pelo decreto que acaba de ser publicado, o que talvez dê em resultado o ser feito o recrutamento fóra do praso legal.
Mas, como ia dizendo, eu julguei que estava tambem em discussão o contingente maritimo, e por isso tinha dito ao sr. presidente do conselho o que já em outra occasião disse ao sr. ministro da marinha, e vem a ser a grande necessidade que existe de acabar com o estado anarchico em que se acha o serviço da armada, e fazer com que não continuem suspensas as garantias para uns poucos de individuos.
Para declinar no governo esta responsabilidade, vou ler á camara o § 9.° do artigo 15.° do decreto com força de lei de 1868.
(Leu.)
Ora, sr. presidente, parece-me bem clara a rasão por que se acha aqui consignada esta doutrina. Primeiro que tudo ha o capitulo dos vencimentos, que reconhece o principio essencial da lei - de que o serviço da armada é só de seis annos.
Ninguem desconhece que o marinheiro póde acabar o seu tempo de serviço estando ausente do paiz, e este ca 40 é reconhecido como de força maior; mas nem por isso deixa de ter já satisfeito o preceito da lei.
E a lei, tendo previsto esta circumstancia, concedo-lho mais um quinto do soldo, caso não queira continuar no serviço. Esta, e que é a verdade.
Lias o que vemos nós, sr. presidente?
Vemos que o governo se considera auctorisado a conserval-os no serviço alem do tempo por que a lei os obriga! Ora, com estas interpretações, dentro em pouco é escusado fazer leis novas, porque as que já existem dão logar a que o governo faça o que quizer, dando-lhes a interpretação que mais lhe convem.
Eu vejo, sr. presidente, que para a reserva se votou no sr. marquez de Sá uma lei excepcional, e que não podia durar senão emquanto houvesse circumstancias extraordinarias. Com essa lei estabeleceu o sr. presidente do conselho, e organisou as reservas de tal modo que as conserva sempre no serviço! Vejo que se obrigam os marinheiros a servir o tempo que se quer; e no fim de contas que as leis são interpretadas e applicadas á vontade do poder executivo!
(Entra na sala o sr. Barros e Sá.)
Parece-me que tenho o gosto de ver presente o meu collega e amigo, o sr. Barros e Sá, por isso peço licença a s. exa. para lhe agradecer as palavras que hontem me dirigiu, e os conselhos com que me honrou, conselhos que muito aprecio e estimo; mas peço licença para lhe lembrar, que s. exa. não tinha talvez ouvido bem as minhas palavras, ou as tomara num sentido differente do que se lhes podia attribuir.
Repito, pois, não venho aqui de modo algum prégar doutrinas subversivas da ordem ou promover sedições.
(Interrupção do sr. Barros e Sá que se não ouviu.)
Parece-me que o digno par serviu-se pouco mais ou menos d'estas phrases: "Quer o sr. marquez de Sabugosa, com acarta constitucional na mão, dizer a um marinheiro:" Largue o serviço, vá-se embora, já acabou o seu tempo?"
Eu não podia querer similhante cousa; queria unicamente que esse rigor de disciplina, que s. exa. pretende applicar ás praças da armada, se estendesse ao governo e a outros funccionarios publicos.
Observou ainda o digno par que, tendo eu já exercido alguns cargos, era natural que estimasse que me obedecessem, embora as minhas ordens não fossem legaes.
Está perfeitamente enganado, nem eu dava ordens d'essa natureza, nem, quando as d'esse, estranharia que me desobedecessem.
O meu intento, por consequencia, é obrigar o governo e as auctoridades a que não possam transmittir ordens illegaes; longe de mim pretender cem isto produzir a insubordinação, embora o exagero da disciplina, por muitas vezes, seja contrario aos verdadeiros principies, apesar de excellentes, inapplicaveis na pratica; e se não, veja-se o que aconteceu na discussão da reforma d'esta camara: todos mostraram o seu amor pela carta, todos fizeram ver que ella é um codigo que se póde adaptar ás idéas do seculo, mas, quando se tratava de reformar alguns dos seus artigos, ninguem o queria fazer pelos meios que a propria constituição determina.
O sr. Barros e Sá, que e muitissimo lido, muitissimo instruido, sabe perfeitamente até onde a obediencia provisoria póde conduzir.
Por amor de Deus não estejam a querer que deixemos ficar supplantados os principios constitucionaes?. A obediencia provisoria tem a sua origem quasi sempre na tendencia para o despotismo.
(Leu.)
Devemos legislar para garantirmos esses direitos inviolaveis que existem na carta; pugnar para que se respeitem esses direitos inviolaveis, e sejam cumpridas as leis que tendem a fazel-as respeitar. É o nosso dever e o nosso direito.
Sr. presidente, apenas direi algumas palavras a respeito propriamente do projecto que se discuto. Entendo que não foi fóra de proposito tudo quanto eu tenho dito até agora ácerca da reserva e do recrutamento maritimo, pela rasão que vou expor. Em primeiro logar, porque o contingente do exercito devia vir acompanhado do contingente maritimo, quer dizer que se deviam pedir juntamente os dois contingentes. Por outro lado a lei manda que o governo, sendo auctorisado a chamar as reservas, deve dar conta ao parlamento do uso que fez d'essa auctorisação quando se trate do projecto de lei dos contingentes militares. As minhas observações foram, pois, bem cabidas n'esta discussão.
Quanto ao projecto em si, devo dizer que julgo ser excessivo o contingente de 14:000 recrutas que se pede. Vejo que todos os annos vão crescendo o numero de recrutas pedidas; o anno passado pediram-se 10:000, e este anno pedem-se 14:000.
Sr. presidente, votar este contingente não é difficil; o que é difficil é executar depois a lei, e realisar o numero effectivo de recrutas que ella determina. Quanto maior é o contingente, maiores são os transtornos que causam ao paiz, e mais graves os incommodos que a lei traz comsigo.
Não é uma cousa indifferente chamar ao serviço um numero maior de recrutas do que o costumado. Da maneira que a lei do recrutamento se executa actualmente, sophismada como é para fins eleitoraes, os inconvenientes tornam-se ainda muito maiores.
Mas dir-me-ha o sr. presidente do conselho, que ficando o serviço obrigatorio, como eu quero, ainda maior numero de cidadãos hão de ser incommodados.
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A isto responderei - que se se estabelecesse o serviço obrigatorio como eu entendo, este negocio tomava differente aspecto, e havia de ser regulado de diverso modo.
É certo que muito maior numero do cidadãos seria incommodado, porem já todos tinham a certeza antecipada, que os individuos chegados á idade legal, salvas as excepções indispensaveis por causa physica ou moral, haviam de ir servir no exercito; e como era uma cousa util, e se sabia não haver excepções odiosas e injustiças relativas, todos se prestariam ao sacrificio de boa vontade.
Agora para ter um exercito como temos, quasi sem utilidade, dando-se na execução da lei do recrutamento tantas irregularidades, ha de ser difficil pôr em pratica esta lei sem causar os maiores transtornos.
Antes de concluir, vou fazer um pedido ao sr. ministro da guerra, dando-lhe assim uma prova da confiança pessoal que tenho em s. exa., se bom que não tenha nenhuma confiança politica no ministerio. Recebi uma carta anonyma, dizendo que havia um recruta em circumstancias de ter a baixa, porque esse individuo tinha sido recrutado indevidamente, e assim o julgara o conselho d'estado, que o considerára isento do serviço. Ora, a pessoa de que se trata tinha desertado antes d'aquelle tribunal proferir esta sentença; mas depois o tribunal competente absolveu-o, entendendo que não era desertor, por isso que não estava bem recrutado. Todavia esse homem, como se diz nesta carta, conserva-se ainda nas fileiras, apesar do ter sido dado como isento do serviço, e de ter sido absolvido como desertor.
Ora eu, se não tenho confiança politica no sr. presidente do conselho, sei de certo que s. exa., tendo conhecimento de que se pratica qualquer acto contra lei, procurará prover de remedio.
S. exa. póde errar, póde proceder de certo modo, segundo as suas conveniencias, mas estou convencido de que não quer o mal e o prejuizo de pessoa alguma; e, portanto, que tendo conhecimento de que um individuo se acha em circumstancias contrarias á lei, dará as ordens precisas para que este facto tenha termo.
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Eu peço ao digno par que tenha a bondade de me mandar essa carta, para eu poder tomar conhecimento do facto que s. exa. apontou.
O sr. Marquez de Sabugosa: - Eu mando a carta tal qual a recebi, apesar de estar pouco legivel. N'ella pedem me que dirija uma interpellação ao sr. ministro da guerra, mas eu não julgo isso necessario, basta mandar a carta a s. exa.,- para tomar conhecimento do facto e fazer o que for de justiça.
(O digno par não reviu as suas notas.)
O sr. Visconde de Fonte Arcada (sobre a ordem): - Pedi a palavra, porque preciso que v. exa. me diga se está dado para ordem do dia o parecer n.° 290?
O sr. Presidente: - Não, senhor. Os pareceres que estrio dados para ordem do dia suo os n.ºs 283, 285, 284, 291 e 288.
Agora tem a palavra o sr. Franzini.
O sr. Franzini: - Na qualidade de relator do projecto que está em discussão, não tinha ainda pedido a palavra, porque o digno par e meu amigo, o sr. marquez de Sabugosa, não o tinha impugnado. S. exa. limitou-se na sessão anterior a fazer varias considerações sobre a interpretação que se póde dar á lei que chamou a reserva ás armas. E ás perguntas do s. exa. responderam muito competentemente o sr. ministro da guerra e o digno par o sr. Barros e Sá.
O digno par, porem, no discurso que acaba de proferir creio que achou exagerado o numero de 14:000 recrutas. Ora, eu devo dizer a s. exa. que o pedido de 14:000 recrutas justifica-se, tendo em attenção as diversas circumstancias baseadas na estatistica.
Parece-me, pois, que poderei dar ao digno par alguns esclarecimentos, pelos quaes s. exa. verá que não é excessivo o pedido para o contingente d'este anno.
Alem da perda que provem todos os annos da diminuição da força do exercito, proveniente das baixas concedidas ás praças que terminaram o tempo legal de serviço, ha a considerar muitas outras causas, que tendem a diminuir igualmente o effectivo nas fileiras.
Eu tenho aqui dois mappas, que vieram da secretaria da guerra, nos quaes se vê que nos annos de 1875, 1876 e 1877, alem da causa que já mencionei, ha a acrescentar mais estas:
1875 1876 1877 Total
Baixas por indevidamente recrutados 199 168 137 504
Por incapacidade physica 623 691 572 1:886
A cumprir sentenças 220 188 80 488
Passagem ao ultramar 298 345 147 790
Ás guardas municipaes 292 310 238 840
Ao corpo de marinheiros militares - 6 140 146
Ao deposito disciplinar 84 71 49 204
Ao regimento do ultramar - - - -
Desertaram 332 265 225 822
Falleceram 372 418 322 1:112
Somma 2.420 2:462 1:910 6:792
Por consequencia, temos já aqui elementos de perda muito importantes, que tendem a diminuir o effectivo do exercito.
Sendo esse effectivo fixado na força de 30:000 homens, e recebendo cada anno a sua baixa perto de 10:000, alem dos que saem pelas outras causas que já apontei, o exercito perde todos os annos mais de 12:000 homens, que necessariamente hão de ser substituidos por novos recrutas.
Alem d'isso, todos sabem, e é um facto provado, que a lei do recrutamento não se cumpre regularmente; o contingente pedido nunca é completamente satisfeito, como se vê no seguinte mappa:
Annos Contingentes Recebidos por conta Em divida
1875 12:000 7:990 4:010
1876 12:000 4:241 7:759
1877 12:000 4:781 7:219
Somma 36:000 17:012 18:988
Chamo a attenção do digno par sobre este ponto.
Pelos documentos a que me referi vê-se que nos annos de 1875, 1876 e 1877 houve uma divida de 18:000 recrutas; e, portanto, ninguem poderá dizer que para se contar com a força effectiva, como a lei determina, é exagerado o pedido de 14:000 recrutas.
E continuando a subsistir as mesmas causas, póde dizer-se que d'esses 14:000 recrutas só poderão obter-se, talvez, 7:000.
Comparando as nossas forças militares com as de outras nações, que pouco differem de Portugal em população, e se acham em circumstancias politicas identicas, ou quasi identicas ás nossas, vemos o seguinte, com relação ás forças dos seus respectivos exercitos.
A Belgica, cuja população masculina, e de 2.721:000, tem um exercito de 46:000 homens, no pé de paz, com 204 peças; no pé de guerra elevam-se aquellas forças a 103:000 homens e 240 peças; convindo lembrar que a neutralidade belga está reconhecida pelos tratados, assim como a da Suissa.
A Suissa tem de população masculina 1:350:000. O exercito regular, formado pelos homens de 20 a 32 annos, con-
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ta 103:000 soldados. A landwher, na qual servem os homens de 33 a 44 annos, conta 95:000 soldados.
Aquella pequena nação, digna de ser tomada como modelo, póde recorrer á sua defeza com perto de 200:000 homens.
Por occasião da guerra franco-prussiana, quando o corpo do exercito do general Bourbaki se approximou da fronteira suissa, ameaçando a sua neutralidade, o governo da confederação conseguiu em quinze dias pôr em pé de guerra um corpo de exercito de 36:000 homens, cumprindo assim os deveres dos neutros, e evitando que o territorio suisso fosse invadido pelos exercitos belligerantes.
Estas forças não estão sempre no serviço effectivo, mas estão organisadas de tal modo que quando são necessarias apparecem, vão para os corpos, e podem immediatamente ser empregadas.
Julgo a proposito o fazer algumas breves considerações sobre o modo porque nós poderemos, em caso de necessidade, apresentar uma força respeitavel, ponto este de alto interesse politico, pois que uma das nossas mais urgentes necessidades é o de olhar para as cousas militares com a attenção que devem merecer a todos os portuguezes.
Nós temos todas as condições para poder apresentar um exercito disciplinado, numeroso e aguerrido, que nos ponha ao abrigo de qualquer tentativa contra a nossa independencia.
Portugal conta 2.005:540 homens; as classes comprehendidas entre os 21 e 40 annos attingem a 602:445, suppondo, o que não é exaggerado, que um terço é apto para os trabalhos e perigos da guerra, temos 200:000 homens, 100:000 para formar o exercito de primeira linha, e outro tanto para uma importante reserva.
Como se vê, nós poderemos apresentar um exercito activo, entre primeira e segunda linha, ou landewer como se lhe queira chamar, na força de 200:000 homens, e ainda alem d'isto, uma importante reserva sedentaria para guarnecer portos fortificados nas seguintes proporções:
As classes comprehendidas entre 41 e 50 annos, attingem 231:000 homens, dos quaes muitos podem ainda ser convenientemente empregados, quando a defeza da patria reclama os braços e o sangue de todos os seus filhos.
Comparando, pois, a força do nosso exercito com a dos outros paizes, não se póde considerar exagerada, e muito menos o contingente que é pedido annualmente para a renovação successiva da força permanente.
Pelo lado da despeza não se póde considerar exagerada a que fazemos com o exercito, se compararmos o nosso orçamento com o de outros paizes em condições similhantes.
Essa comparação e exame dá os seguintes resultados:
"Portugal gasta 3:997 contos de réis com o exercito, a Belgica 7:386 contos de réis, a Suissa 2:340 contos de réis, sendo os orçamentos totaes das despezas publicas respectivamente de 28:162, 45:360 e 7:920 contos de reis."
Parece-me que tenho respondido á parto do discurso do digno par, em que combateu o parecer, por achar exagerado o contingente que se pede; se s. exa., porém, se não considerar satisfeito com estas explicações, pedirei depois opportunamente a palavra para responder.
(O orador foi cumprimentado por alguns dignos pares.)
O sr. Presidente: - Está acabada a inscripção. Vou pôr á votação o parecer.
Consultada a camara, foi approvado o parecer, tanto na generalidade como na especialidade.
O sr. Visconde de Bivar: - Mando para a mesa alguns documentos que me foram enviados pelos ministerios do reino e das obras publicas, os quaes requeiro que sejam impressos e publicados no Diario do governo.
Assim se resolveu.
O sr. Franzini: - Mando para a mesa um parecer da commissão de obras publicas.
O sr. Presidente: - Segundo a ordem do dia, devo entrar em discussão o parecer n.° 285, e depois o n.° 28-4 sobre a reforma d'esta camara. O digno par, o sr. conde de Casal Ribeiro, auctor do projecto, ponderou que elle tem de ir á outra camara, e o sr. ministro da fazenda declarou não ter duvida em que o parecer n.° 285 se discuta depois. N'estes termos, se não ha objecção por parte da camara, vou pôr em discussão o parecer n.° 281. (Apoiados.)
Este parecer foi já discutido na generalidade e approvado. De que se trata agora, portanto, é discutil-o na especialidade com as propostas que foram mandadas á commissão, algumas das quaes foram approvadas, e bem assim quaesquer outras propostas que sejam ainda apresentadas durante a discussão.
Leu-se na mesa e é a seguinte
Parecer n.° 284
Senhores. - A vossa commissão especial, eleita para dar parecer ácerca da lei organica da camara dos pares, examinou com o maior escrupulo todas as propostas de emendas, substituições, additamentos, ou de eliminação de artigos, que foram apresentados por muitos dignos pares durante a discussão da generalidade do projecto, e remettidas á commissão para as apreciar antes de começar a segunda discussão sobre a especialidade. A commissão, no desempenho do honroso encargo que por vós lhe foi commettido, procurou, quanto possivel, achar meio de conciliar as indicações contidas nas differentes propostas com os pontos fundamentaes do projecto, e, acceitando com satisfação o pensamento de muitas, redigiu de novo alguns artigos, paragraphos e numeros do projecto, com o que ficam n'elle introduzidos sensiveis melhoramentos devidos á iniciativa de muitos dignos pares.
N'estes termos a vossa commissão, illustrada pela sabedoria da discussão havida n'esta camara sobre a generalidade do projecto, cada vez mais convencida da utilidade o da necessidade das medidas e providencias propostas, tem a honra de submetter de novo á vossa approvação o projecto já apresentado com as modificações contidas nas seguintes emendas:
Projecto de lei n.º 57
Artigo 1.° A camara dos pares é composta de membros vitalicios e hereditarios nomeados pelo Rei e sem numero fixo. (Carta constitucional, artigo 39.°)
Art. 2.° O Principe Real e os Infantes são pares por direito, e terão assento na camara, logo que cheguem á idade de vinte e cinco annos. (Carta constitucional, artigo 40.°)
Art. 3.° Tambem são pares por direito o patriarcha de Lisboa, os arcebispos e bispos do reino pelo simples acto da sua elevação ás referidas dignidades. (Decreto do 30 de abril de 1826.)
Art. 4.° Só podem ser nomeados pares do reino os cidadãos portuguezes que, tendo nascido taes, nunca perderam nem interromperam por acto ou omissão propria a sua nacionalidade, e provarem que têem trinta e cinco annos de idade, que estão no pleno goso dos seus direitos civis e po-
EMENDAS ACEITES PELA COMISSÃO
Art. 4.° Só podem ser nomeados pares do reino os cidadãos portuguezes que, tendo nascido taes, nunca perderam nem interromperam, por acto ou omissão propria, a sua nacionalidade, e provarem que têem trinta annos de idade, que estão no pleno goso dos seus direitos civis e politicos,
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liticos, e que se achara comprehendidos em alguma das seguintes
categorias:
l.ª Conselheiro d'estado;
2.ª Ministro d'estado com dois annos de effectivo serviço;
3.ª Presidente da camara dos deputados em quatro sessões legislativas ordinarias;
4.ª Deputado da nação em oito sessões legislativas ordinarias;
5.ª Marechal do exercito ou almirante;
6.ª General de divisão ou vice-almirante;
7.ª General de brigada ou contra-almirante com cinco annos de exercicio n'este posto;
8.ª Embaixador em missão ordinaria;
9.ª Ministro plenipotenciario com cinco annos de exercicio em missão ordinaria;
10.ª Governador geral de possessões ultramarinas com cinco annos de exercicio;
11.ª Conselheiro do supremo tribunal de justiça ou juiz relator do tribunal superior de guerra e marinha;
12.ª Conselheiro effectivo do tribunal de contas ou do supremo tribunal administrativo com cinco annos de exercicio;
13.ª Procurador geral da corôa e fazenda com cinco annos de exercicio;
14.ª Juiz de segunda instancia em alguma das relações do continente do reino e ilhas adjacentes com cinco annos de exercicio;
15.ª Ajudante do procurador geral da corôa e fazenda com dez annos do exercicio;
l6.ª Director geral em algum dos ministerios, ou governador civil, com dez annos de exercicio, tendo alem d'isto as habilitações exigidas no § 4.° do artigo seguinte.
17.ª Lente do prima na universidade de Coimbra;
18.ª Lente cathedratico da mesma universidade, ou professor proprietario nas escolas polytechnica, do exercito, ou medico cirurgicas de Lisboa e Porto, ou na academia polytechnica do Porto, com dez annos de exercicio;
19.ª Proprietario ou capitalista, com rendimento não inferior a 8:000$000 réis annuaes provado pelas respectivas matrizes de contribuição predial, ou por titulos de divida publica fundada, devidamente averbados com tres annos de antecipação pelo menos, sendo liquido e livre de quaesquer onus ou encargos.
20.ª Industrial ou commerciante que em cada um dos tres ultimos annos tenha pago ao estado 1:400$000 réis de contribuição industrial ou bancaria.
§ unico. Os diplomas de nomeação de pares do reino designarão expressamente a categoria ou categorias em que se acham comprehendidos os nomeados em conformidade d'este artigo.
Art. 5.° Nenhum par será admittido a tomar assento na respectiva camara por direito hereditario sem provar:
1.° Que é descendente legitimo por varonia do par fallecido na linha recta de successão, e que todos que o precedem em grau são fallecidos, ou que, extincta a varonia, é filho varão legitimo mais velho da femea mais velha já fallecida;
2.° Que o par fallecido prestara juramento e tomara assento na camara, ou que só por legitimo impedimento, qualificado como tal pela mesma camara, deixára de praticar estas formalidades, e ainda de registar a sua carta, no caso de ter sido nomeado e não ter entrada na camara por successão;
3.° Que tem trinta e cinco annos completos de idade, e se acha no pleno goso dos seus direitos civis e politicos, e que se acham comprehendidos em alguma das seguintes categorias:
18.ª Lente cathedratico ou substituto, effectivo ou jubilado da mesma universidade, professor proprietario ou substituto, effectivo ou jubilado em qualquer escola ou instituto de instrucção superior, com dez annos de exercicio effectivo.
§ 1.° Fóra d'estas categorias só póde ser nomeado par do reino aquelle que se houver tornado digno d'esta distinção por meritos ou serviços extraordinarios e relevantes.
§ 2.° Os diplomas de nomeação de pares do reino designarão expressamente a categoria ou categorias em que só acham comprehendidos os nomeados em conformidade d'este artigo, e no caso do § anterior especificarão os meritos o serviços que servem de fundamento á nomeação.
3.° Que tem trinta annos completos de idade, e se acha no pleno goso dos seus direitos civis e politicos, possuindo
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possuindo alem disso moralidade e boa conducta, comprovada pelo attestado de tres pares;
4.° Que é bacharel pela universidade do Coimbra ou tem o curso de alguma das escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto, ou das polytechnicas e academias que habilitam para o corpo do estado maior do exercito, ou para alguma das armas especiaes de artilheria, engenheria, marinha, ou para a engenheria civil.
5.° Que se acha comprehendido em alguma das categorias designadas no artigo 5.°
§ unico. A disposição do 11.° 5.° d'este artigo é dispensada quando o par por direito hereditario provar que é membro da magistratura judicial ou ajudante do procurador geral da corôa e fazenda no continente do reino, official superior do exercito do reino ou da armada, lente cathedratico na universidade de Coimbra ou professor proprietario em alguma das escolas superiores da instrucção publica, tendo cinco annos de exercicio no respectivo cargo ou posto, e prestando a prova de possuir o rendimento liquido de 2:000$000 réis proveniente de algumas das origens estabelecidas no n.° 19.° do artigo 4.°, de posto ou de emprego inamovivel.
Art. 6.° Nenhum par poderá ser privado da dignidade de par, nem impedido de exercer as suas funcções senão por alguma das seguintes causas:
l.ª Se por alguma das causas declaradas nas leis perdar a qualidade de cidadão portuguez;
2.ª Se for condemnado em algumas das penas que importam perdimento de direitos politicos;
3.ª Se deixar de prestar juramento e tomar assento na camara dentro de um anno depois de nomeado, ou de haver succedido no pariato, salvo o caso de legitimo impedimento reconhecido tal pela camara.
4.ª Se deixar de comparecer na camara durante duas sessões legislativas consecutivamente sem causa legitima.
§ unico. Consideram-se causas legitimas para dispensar o par do reino de comparecer na camara:
l.ª A doença grave e devidamente provada;
2.ª O serviço publico fóra do reino com licença da camara.
Art. 7.° Fica suspenso de exercer as funcções de par do reino:
1.° Aquelle que for condemnado á suspensão dos direitos politicos ou a qualquer pena que importe essa suspensão, emquanto durarem os seus effeitos.
2.° O que for pronunciado por algum crime, sendo a pronuncia ratificada pela camara com o effeito de suspensão.
Art. 8.° Aquelle em quem o direito de succeder no pariato se ache já adquirido por morte do seu antecessor ao tempo da promulgação da presente lei será admittido em conformidade das disposições da legislação anterior.
Art. 9.° Ficam em vigor as disposições dos artigos 1.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.°, 7.°, 8.° e 9.° da carta de lei de 11 de abril de 1845.
Art. 10.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Conde do Casal Ribeiro.
Augusto Xavier Palmeirim.
Alberto Antonio de Moraes Carvalho.
João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens.
Antonio José de Sarros e Sá, relator.
alem d'isto moralidade e boa conducta comprovada pelo attestado de tres pares.
4.° Que tem carta de algum curso de instrucção superior pela universidade de Coimbra, ou por alguma das escolas e institutos officiaes do paiz.
5.° Que se acha comprehendido em alguma das categorias designadas no artigo 4.°
§ unico. A disposição do n.° 5.° d'este artigo é dispensada quando o par por direito hereditario provar que é membro da magistratura judicial, ajudante do procurador geral da corôa e fazenda no continente do reino, official superior do exercito do reino ou da armada, lente na universidade de Coimbra, professor em alguma das escolas superiores de instrucção publica, primeiro secretario de legação, tendo cinco annos de exercicio nos respectivos cargos ou posto, e prestando a prova de possuir o rendimento liquido do 2:000$000 réis proveniente de alguma das origens estabelecidas no n.° 19.° do artigo 4.°, ou de posto ou emprego inamovivel.
Art. 6.° O tempo de serviço prestado nas differentes funcções mencionadas nos artigos 4.° e 5.° póde accumular-se para completar a categoria eu a habilitação que exigir serviço mais longo.
Art. 7.°-(o artigo 6.° do projecto).
N.ºs 1.° e 2.°-(os do artigo 6.° do projecto).
N.° 3.° Se deixar de prestar juramento e tomar assento na camara dentro de um anno depois de nomeado, ou do haver adquirido as condições que por lei são exigidas para o exercicio do pariato, salvo havendo impedimento legitimo reconhecido tal pela camara.
N.° 4.° e § unico e seus n.ºs 1.° e 2.°- (eliminados )
Art. 8.°- o artigo 7.° do projecto.
N.° 1.°- (o do projecto).
N.° 2.° O que for interdicto por sentença da administração dos seus bens.
N.° 3.°- (é o n.° 2.° do projecto).
Art. 9.°- (é o artigo 8.° do projecto).
§ unico. Aos successores dos pares actuaes que ao tempo da publicação da presente lei tiverem completado vinte e um annos de idade serão exigidas as habilitações litterarias que estão determinadas no artigo 2.° da lei de 11 de abril de 1845.
Art. 10.°- (é o artigo 9.° do projecto).
Art. 11.°- (é o artigo 10.° do projecto).
Conde do Casal Ribeiro.
João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens.
Augusto Xavier Palmeirim.
Alberto Antonio de Moraes Carvalho
Barros e Sá, relator.
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Emendas e substituições apresentadas por alguns dignos pares durante a discussão na generalidade do projecto n.ºs 57
Artigo 9.° Emquanto houver pares hereditarios, não gosarão da hereditariedade do pariato os descendentes dos pares nomeados depois da promulgação da presente lei.
Sala das sessões, 22 de marco de lS78. = Carlos Bento.
Emenda e substituição ao artigo 4.° e seus §§ do projecto de lei n.° 57:
Artigo 4.° Não podem ser nomeados pares do reino os cidadãos portuguezes que não tenham trinta annos de idade, não estejam no pleno goso dos seus direitos civis e politicos, e offereçam garantias de illustração, independencia e moralidade.
§ 1.° A illustração póde comprovar-se por diplomas ou carta de habilitação, passada por qualquer academia, instituto ou escola li iteraria ou scientifica, legalmente auctorisada para isso.
§ 2.° A independencia póde sei1 comprovada pelo goso e posse do rendimento de 3:000$000 réis, proveniente de bens immobiliarios, industria ou emprego inamovivel, comprovado pelo effectivo pagamento das respectivas contribuições.
§ 3.° A moralidade póde comprovar-se por consulta abonatoria do conselho d'estado.
Art. 5.°- A Podem igualmente ser nomeados pares do reino por distincção especial, os cidadãos que dessa distincção se houverem tornado dignos por serviços, e meritos extraordinarios, sem- outra condição mais que a proposta do ministerio e approvação unanime do conselho d'estado.
Sala da camara, 19 de março de 1878.= O par do reino, Visconde de Seabra.
Proponho a eliminação dos artigos l,°, 2.° e 3.° do projecto, sendo elles a repetição dos artigos 39.° e 40.° da carta, e do decreto de 30 de abril de 1826.
Acceito a substituição do artigo 4.° do sr. visconde de Seabra com a alteração das palavras "3:000$000 reis" pelas palavras "1:600$000 réis, liquidos de quaesquer onus ou encargos".
N'esta proposta, proponho como § unico 6 seguinte: "Os bens que constituem o rendimento de 1:600$000 réis serão registados no archivo da camara, em um livro rubricado pelo presidente, e, constituindo como uma especie de dote, ficarão sujeitos, durante todo o tempo que o par exercer as attribuições de legislador, ás regras e principios que em direito governam esta qualidade de bens."
Sendo rejeitada a substituição do sr. visconde de Seabra e a minha ao artigo 4.° do projecto, proponho:
1.° A eliminação no n.° 2.° do artigo 4.° das palavras "com dois annos de effectivo serviço".
2.° Adopto tambem a alteração proposta pelo sr. visconde de Villa Maior ao n.° 18.° do artigo 4.°
3.° Depois do n.° 20.° do mesmo artigo proponho: "Fóra d'estas categorias só póde ser admittido como par de nomeação aquelle que houver, prestado serviços extraordinarios de qualquer natureza do que tenha provindo incontestavel vantagem publica, e que sejam credores de reconhecimento nacional."
No § unico do n.° 20, que, adoptada a emenda supra, ficará sendo § 2.°, depois das palavras "categoria ou categorias", juntar "e os serviços prestados á nação, em virtude dos quaes se acham comprehendidos os nomeados em conformidade d'este artigo", eliminando-se o resto.
Proponho a eliminação do n.° õ e seu § do artigo 5.°
Proponho no artigo 6.°, n.° 2, juntar as palavras "emquando durarem os seus effeitos".
Antes do n.° 3 do artigo 6.° dizer-se: "Fica suspenso de exercer temporariamente, e pelo tempo que a camara o designar, era vista do parecer de uma commissão, nomeada expressamente para este fim, e que será immediatamente votada, o par que estiver nas condições seguintes".
Segue-se o n.° 3.° e 4.° do artigo 6.° do projecto.
Proponho como inutil, pelo que fica indicado no artigo 6.°, o artigo 7.° todo.
Proponho a eliminação do artigo 8.°, se o n.° 5.° e § do artigo 5.° for rejeitado.
Não se dando a hypothese supra, proponho ao artigo 8.° a substituição seguinte:
"Aquelle que ao tempo da publicação da presente lei tiver já completado dezoito annos de idade, fica dispensado de provar o que está disposto no n.° 5.° do artigo 5.° do projecto e seu paragrapho. = O par do reino, Conde de Rio Maior.
Emendas ao n.° 18.° do artigo 4.°- Lente cathedratico, effectivo ou jubilado da mesma universidade ou professor proprietario ou jubilado ou substituto nas escolas.
Institutos de instrucção superior com dez annos de exercicio effectivo.
Ao n.° 4.° do artigo 5.° - Que é bacharel formado pela universidade de Coimbra, ou tem carta do curso de alguma das escolas ou dos institutos de instrucção superior.
Sala das sessões em 20 de março de 1878.- Visconde de Villa Maior.
Proponho as seguintes modificações ao projecto de lei em discussão:
Artigo 4.°:
N.° 16.°- Como está no projecto addicionando-lhe: devendo porem o director geral nomeado optar entre o seu logar e o de par do reino.
N.° 19.° - Proprietario com rendimento não inferior a 8:000$000 réis annuaes provado pelas respectivas matrizes de contribuição predial; ou capitalista com rendimento não inferior a 16:000$000 réis annuaes, provado por titulos de divida publica fundada devidamente averbados com tres annos de antecipação pelo menos.
Depois do n.° 20.°, n.° 21.° socio effectivo da academia real das sciencias.
Artigo 5.°:
N.° 3.° - Em vez de "trinta e cinco annos", "trinta annos ".
N.° 4.° - ou graduado por qualquer universidade estrangeira que não conceda graus in absentia.
N.° 5.°, § unico.- Addicione-se: 1.° secretario de legação. Supprima-se "tendo cinco annos do exercicio no respectivo cargo ou posto" e addicione-se-sendo proprietario com 5:000$000 réis de renda animal, ou capitalista com 10:000$000 réis de renda tambem annual provados pelo modo exigido no n.° 19.° do artigo 5.° - Artigo 6.° n.° 4.° - Em vez de duas, tres sessões consecutivas, e addicione-se o seguinte paragrapho:
Estas penas só podem ser applicadas pela camara constituida em tribunal, precedendo proposta assignada por tres dignos pares.
Artigo 8.° - Addicione-se o seguinte paragrapho:
A mesma legislação será applicada aos que, na data da promulgação desta lei, contarem vinte e um annos completos de idade.
Camara dos pares, 22 de março de 1878.= O par do reino, Agostinho de Ornellas.
Proponho as seguintes emendas ao projecto de lei n.° 57: Ao artigo 4.°:
10.ª Governador geral de possessões ultramarinas com tres annos de exercicio.
13.ª Procurador geral da corôa e fazenda.
16.ª Director geral em algum dos ministerios, ou governador civil com dez annos de exercicio.
Accrescentando-se a seguinte:
21.ª Membros effectivos da academia das sciencias com dez annos de exercicio.
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Ao artigo 6.°:
3.° Se deixar de prestar juramento e tomar assento na camara dentro de um anno depois de nomeado ou de se achar no caso de succeder ao pariato, etc.
Proponho a substituição do artigo 8.° pelo seguinte:
Artigo 8.° Os descendentes de pares a que se refere o artigo 5.°, que ao tempo da promulgação da presente lei tiverem completado vinte e um annos, serão admittidos a succeder ao pariato em conformidade das disposições da legislação anterior.
Sala das sessões, 20 de março de 1878.= Fisconde do Seisal.
Tenho a honra de propor os seguintes additamentos ao artigo 4.°:
§ l.° Fóra d'estas categorias só póde se admittido como par de nomeação aquelle que houver prestado ao pai z serviços relevantes e excepcionaes.
Additamento ao § unico (convertido em § 2.°):
"... e no caso do paragrapho antecedente especificarão os serviços prestados. = Costa Lobo.
Tenho a honra de propor a seguinte emenda ao § unico do n.° 5.° do artigo 5.°:
Em logar de "2:000$000 reis" seja "4:000$000 réis".= Costa Lobo.
Tenho a honra de propor a seguinte emenda ao n.° 3.° do artigo 5.°:
Em logar de "trinta e cinco annos" proponho "trinta annos".= Costa Lobo.
Emenda ao § 3.° do artigo 5.°:
§ 3.° Que tem trinta annos completos de idade, e se acha no pleno goso dos seus direitos civis e politicos, possuindo alem disso moralidade e boa conducta, comprovada pelo attestado de tres pares. = Silva Carvalho.
Artigo 8.°:
Proponho que n'este artigo sejam substituidas as palavras "por morte do seu antecessor" pelas seguintes: "por serem maiores de vinte e cinco annos. = Conde do Bomfim.
Artigo 5.°, n.° 3.°- Proponho que n'esta condição seja emendada a idade de "trinta e cinco annos" pela de "vinte e cinco". = Conde do Bomfim.
Artigo 5.°, n.° 4.° - Proponho que n'esta condição seja eliminado tudo o que se segue ás palavras "polytechnicas e academias" acrescentando-se: - "ou emfim algum dos cursos superiores de qualquer estabelecimento de instrucção superior do paiz". = Conde do Bomfim.
Proponho que se augmente no artigo 4.° mais a seguinte categoria:
21.ª - Aquelle que prestar um relevante serviço á sciencia, ou que pela sua dedicação ou valor fizer um relevante serviço á patria em algumas das carreiras publicas civil ou militar, bastando este facto independente de outra qualquer condição. = Conde do Bomfim.
Proponho que o § unico da condição do n.° 5.° do artigo 5.° passe a ser a propria condição, e se lhe acrescente um § unico, tudo redigido do seguinte modo:
N.° 5.°- Que é membro da magistratura judicial, ou ajudante do procurador geral da corôa e fazenda no continente do reino ou da armada, lente cathedratico na universidade de Coimbra, ou professor proprietario em alguma das escolas superiores de instrucção publica, e prestando a prova de possuir o rendimento liquido de 2:000$000 réis proveniente de alguma das origens estabelecidas no n.° 19.° do artigo 4.° de posto ou de emprego inamovivel.
§ unico. As condições dos n.ºs 4.° e 5.° deste artigo, ficam dispensadas quando o herdeiro se ache comprehendido em alguma das categorias designadas no artigo 4.°= Conde do Bomfim.
Artigo 4.°, n.° 19.° - Proponho n'esta categoria a emenda de "4:000$000 réis" em logar de "8:000$000 reis".= Conde do Bomfim.
Emenda ao § 4.° do artigo 5.°:
§ 4.° - Que é bacharel pela universidade de Coimbra, ou tem o curso de alguma das escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto, ou das polytechnicas e academias que habilitam para o corpo de estado maior do exercito ou para alguma das armas especiaes de artilheria, engenheria e marinha ou para engenheria, eu o curso do qualquer outro estabelecimento acreditado de instrucção superior nacional ou estrangeiro.
Substituição ao artigo 8.° da proposta de lei:
Artigo 8.° - Aquelle que já for maior pelas nossas leis eiveis ao tempo da promulgação da presente lei, será admittido em conformidade das disposições da legislação anterior, embora vivesse ainda o seu antecessor n'essa data.
(Salva a redacção.)
Sala das sessões da camara dos pares, em 26 de março de 1878.= Conde de Linhares.
O sr. Conde do Casal Ribeiro (solve a ordem): - V. exa. acaba de expor perfeitamente a questão. O projecto foi discutido largamente n'esta casa, e approvado na generalidade: e antes de se passar á especialidade resolveu-se que a commissão fosse ouvida sobre as emendas que haviam sido apresentadas. Do parecer vê-se que uma parte d'essas emendas foi approvada pela commissão, devendo ser inseridas nos artigos competentes, outras não pareceu á commissão poder concordar cem ellas.
A camara decidirá a final qual a resolução que se ha de tomar.
Julgo, portanto, que devemos entrar na discussão especial do projecto, artigo por artigo, incluindo em cada um as respectivas emendas que a commissão apresenta, ou quaesquer outras que possam ser propostas durante a discussão.
O sr. Visconde de Fonte Arcada: - A primeira vez que se tratou do assumpto, que está em discussão hoje n'esta camara, disse que rejeitava o projecto. Agora tenho a acrescentar que o artigo 1.°, estabelecendo que a camara dos pares será composta de membros vitalicios e hereditarios nomeados pelo rei, quando não existem já propriedades hereditarias, pela abolição dos vinculos e pela igualdade de partilha, não póde regular um estado de cousas que não existe. E a carta não deve ser tomada para determinar este assumpto, porque actualmente não póde haver a hereditariedade que ella exigia aos membros da camara.
Quando se procedeu á votação do projecto na sua generalidade, eu votei effectivamente contra elle. Agora apresenta-se este parecer, que v. exa. acaba de submetter á apreciação da camara, e como se duo as mesmas circumstancias que então se davam, ratifico as considerações que por tal occasião fiz, isto é, que emquanto se não tratar do uma verdadeira reforma parlamentar, como entendo ser essencialmente necessaria para a independencia do parlamento, não posso votar nenhuma lei de reforma que não tenha por base os principios que sustento desde muito tempo com relação ás incompatibilidades parlamentares, porque cada vez me convenço mais da necessidade de uma lei que estabeleça definitivamente essas incompatibilidades.
Por consequencia é escusado que eu entre desenvolvidamente n'esta questão, que occupa hoje a camara.
Sabe-se que quando aqui se tratou da abolição dos vinculos, eu disse que se se estabelecesse a liberdade de testar, votaria essa abolição; mas sem ella votava contra. E a proposito vem dizer agora que tendo as artes e as sciencias progredido, como todos vemos, e applicando-se com muita economia o vapor á cultura das terras, acontece que não podendo elle ser empregado senão em terrenos extensos, pela divisão extrema a que toda a propriedade está sujeita, segue-se que as propriedades de pequena extensão hão de ser cultivadas pelos braços do homem, o que se torna muito dispendioso.
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Voltando, porem, ao assumpto, limito-me a pedir licença para ler uma disposição dá companhia de agricultura do Alto Douro, disposição que está perfeitamente em harmonia com a doutrina de incompatibilidades por que tenho aqui pugnado constantemente.
Essa disposição, que encontrei no Diario do governo, diz o seguinte.
(Leu.)
"Artigo 47.° Os cargos da direcção e da mesa da assembléa geral são entre si incompativeis.
"Artigo 48.° Não podem ser simultaneamente membros da direcção e do conselho fiscal individuos que tenham entre si sociedade ou parentesco até ao quarto grau.
"Artigo 49.° Não se dá incompatibilidade entre os membros effectivos e substitutos de um mesmo corpo, mas o substituto que for parente ou socio do vogal effectivo só póde ser chamado ao serviço na falta ou impedimento do mesmo vogal.
"Artigo 50.° Não podem ser eleitos membros da direcção nem do conselho fiscal os accionistas que negociarem nos mesmos generos em que negoceia a companhia."
"Artigo 51.° Não podem igualmente ser eleitos membros da direcção nem do conselho fiscal:
"1.° Os devedores á companhia;
"2.° Os fiadores dos seus devedores ou dos seus empregados;
"3.° Os que com ella tiverem contratos;
"4.° Os que com ella tiverem pleitos.
"Artigo 52.° No caso de incompatibilidade, a eleição para a direcção prefere a todos os. outros cargos, e a eleição para o conselho fiscal prevalece sobre a eleição para a mesa da assembléa geral. Se a incompatibilidade se der entre pessoas do mesmo corpo, eleitas no mesmo acto, prefere a mais votada, e sendo igual o numero de votos proceder-se-ha como no caso de empate, (artigo 43.° § unico).
Eis aqui a sancção desses principio por uma companhia importante que sabe zelar os seus interesses.
E estes factos são a approvação mais formal das minhas idéas, que converti em preceitos na proposta de lei sobre incompatibilidades que aqui apresentei ha tantos annos!
Nada mais direi, e concluirei repetindo o que disse ao tomar a palavra, que v. exa. teve a bondade de me conceder nesta occasião, e vem a ser: que não voto o projecto em discussão, nem votarei reforma alguma d'esta camara, ou do parlamento em geral, sem que se haja votado a lei sobre incompatibilidades, porque sem isto póde resultar o demorar-se o effeito que hão de ter os principios verdadeiros, segundo os quaes não devem os interessados nos objectos ser os proprios que decidam d'elles. A lei de suspeições para os magistrados mostra essa verdade, e portanto que é indispensavel que haja uma lei de incompatibilidades, porque assim como os juizes, quando se acham em determinadas circumstancias, não podem julgar de certas causas, assim tambem as pessoas que estão ligadas a certos interesses não devem fazer parte de assembléas, onde se tem que julgar esses interesses, ou, para melhor dizer, os do paiz, aos quaes muitas vezes aquelles outros podem ser oppostos. Sem a lei do incompatibilidades não ha, pois, independencia possivel no parlamento.
O sr. Conde de Rio Maior: - Entendo que a discussão que se vae encetar deve recair sobre os differentes artigos com as alterações apresentadas pela illustre commissão. E esta, ao que me parece, a praxe que se tem sempre seguido n'esta casa. Desde o momento que se discutissem apenas as alterações que propõe a commissão, ficavam os membros d'esta camara inihibidos de apresentar as considerações que tivessem por conveniente produzir sobre quaesquer artigos do projecto, com os quaes não possam concordar.
O sr. Presidente: - Perdôe o digno par, mas era exactamente a minha intenção propor á discussão todos os artigos do projecto, o era isso o que me competia fazer visto a materia estar só votada na generalidade.
O equivoco que possa ter havido sobre a maneira por que eu desejo submetter á discussão o projecto e as alterações propostas provem de não ter eu podido fazer-me comprehender pelos dignos pares.
O que a camara tem a fazer, repito, é discutir cada um dos artigos do projecto com as alterações que foram propostas, algumas das quaes foram adoptadas pela commissão. (Apoiados.)
Assim nenhum digno par fica inhibido de apreciar as differentes disposições do projecto com as alterações que a commissão propõe, nem tão pouco de propor qualquer modificação a essas disposições.
A minha intenção é declarar com relação a cada artigo quaes foram as propostas mandadas para a mesa, e aquellas que foram approvadas pela commissão, para que os dignos pares fiquem habilitados a discutir o assumpto com toda a largueza e clareza.
A folha que acompanha o projecto facilita o conhecimento das propostas, que foram mandadas para a mesa por diferentes membros da camara com relação ao projecto de que a camara vae occupar-se.
Vamos, pois, entrar na discussão da especialidade do projecto de reforma d'esta camara.
O texto para a discussão é o parecer n.° 284.
Os artigos 1.°, 2.° e 3.° do projecto da commissão são disposições da carta constitucional, e por isso não estão sujeitos á deliberação da camara, porque não tem faculdade para os rejeitar ou modificar.
O digno par, o sr. conde de Rio Maior, propoz a eliminação d'esses artigos, que, torno a repetir, são artigos da carta.
Eu entendo que a commissão só incluiu estes artigos no projecto com o fim de apresentar um trabalho completo, e nunca na idéa de pôr em duvida a sua doutrina ou de a sujeitar á discussão da camara. (Apoiados.)
Creio que fui esta a idéa da commissão?
O sr. Barros e Sá: - A commissão está completamente de accordo com o que v. exa. acabou de dizer. Ella só quiz apresentar um trabalho completo e facilitar assim a discussão.
O sr. Presidente: - É exactamente o que eu acabei de dizer á camara.
O sr. Visconde de Seabra: - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - A substituição que v. exa. mandou para a mesa diz respeito ao artigo 4.°, e agora está se tratando dos artigos 1;°, 2.° e 3.°
O sr. Visconde de Seabra: - A minha substituição recáe sobre o artigo 4.° e seus paragraphos, e então peço a palavra para a sustentar quando se tratar do artigo respectivo.
O sr. Presidente: - Darei a palavra a v. exa. quando se tratar de discutir o artigo 4.°, que é por onde devemos começar, pois me parece que a camara concorda em que não temos de discutir nem de votar os tres primeiros artigos.
O sr. Conde de Rio Maior: - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.
O sr. Conde de Rio Maior: - Eu propuz a eliminação dos tres primeiros artigos porque estão consignados na carta, e não ha vantagem nenhuma em votar o que já se acha estabelecido no codigo fundamental.
Não se trata de crear, de fundar o pariato, porque ha principios essenciaes, quanto á instituição d'esta camara, que não é preciso serem novamente auctorisados com o nosso voto, e julgo estarmos todos concordes n'esta parte.
Esta questão já se tratou em 1845, e então se discutiu, se os artigos da constituição deviam ser repetidos numa lei organica do pariato, por consequencia não me parece que possa ser considerada uma excentricidade a minha insistencia n'este ponto.
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Não venho, portanto, contestar os tres primeiros artigos do projecto, mas apenas propor que sejam eliminados como uma repetição inutil do que está expresso na carta constitucional.
O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Sr. presidente, a commissão acceita completamente a interpretação que v. exa. fez ás suas intenções, porque estes artigos estão no projecto como simples materia de codificação.
Tratava-se de formular uma lei organica do pariato, e pareceu conveniente, como questão de methodo, repetir no principio ca lei estes artigos da carta, como se tem feito em outros codigos, sem com isto querer significar que haviam de ser discutidos e sujeitos a uma approvação ou rejeição, que não estava nas attribuições da camara fazer.
Como questão de methodo, parece melhor á commissão que estes artigos sejam inseridos na lei; o sr. conde de Rio Maior, porem, julga isso superfluo.
Não ha, por consequencia, entre nós differença alguma, senão quanto á questão de methodo, e sómente sobre este ponto é que póde recair uma votação da camara, porque sobre a doutrina dos artigos não temos nós que votar.
A commissão acceita a indicação de v. exa., do que não ha logar a votar sobre os tres primeiros artigos do projecto; entretanto, se se mantiver a proposta de eliminação, a camara póde votal-a como simples questão de methodo.
O sr. Presidente: - Creio que a camara está toda de accordo relativamente aos tres primeiros artigos, porque apenas se trata de uma questão de methodo, como disse o sr. conde do Casal Ribeiro.
Entretanto o sr. conde de Rio Maior parece receiar que, uma vez consignados estes artigos no projecto, a camara se considere com direito de discutir a sua doutrina e de poder approval-os ou rejeital-os.
Por isso s. exa. propõe a eliminação d'estes trás artigos, o que de fórma alguma compromette as disposições do projecto.
E visto que o digno par insiste na sua proposta de eliminação, eu vou consultar a camara sobre se, como questão de methodo, quer conservar estes tres artigos, ou se entende que não são necessarios, e se se podem eliminar sem prejuizo das outras disposições do projecto.
O sr. Visconde de Seabra: - É unicamente para dizer que tambem considero a suppressão d'estes tres artigos como uma questão de methodo, visto que são artigos da carta, e, porque assim o entendo, é que não f ai lei n'elles quando apresentei a minha substituição.
O sr. Presidente: - Eu vou consultar a camara sobre a proposta do sr. conde de Rio Maior.
Como esta proposta importa uma emenda ao projecto, tem de ser votada antes dos artigos a que diz respeito.
Os dignos pares que entendem que se podem eliminar os artigos 1.°, 2.° e 3.° d'este projecto por desnecessarios, isto é, por conterem disposições consignadas na carta, têem a bondade de se levantar.
Foi rejeitada a eliminação.
O sr. Presidente: - Os srs. secretarios votaram contra a eliminação dos artigos, e eu votei a favor, comtudo está regeitada a proposta do sr. conde de Rio Maior.
Vae ler-se agora o artigo 4.°
(Leu-se.)
O sr. Presidente: - A este artigo propoz o sr. visconde de Seabra uma substituição nos seguintes termos.
(Leu.)
Está, por consequencia, em discussão o artigo 4.° com a substituição do sr. visconde de Seabra, e tem s. exa. a palavra.
O sr. Visconde de Seabra: - Sr. presidente, eu não contava hoje com a discussão d'este projecto, porque não tendo assistido á ultima sessão não podia saber qual era a ordem do dia que v. exa. tinha dado.
O unico meio de publicidade, por onde eu o podia saber, era o Jornal da noite, mas infelizmente este jornal enganou-se, porque dizia hontem que tinha sido dado para ordem do dia o parecer n.° 283, em logar de dizer o n.° 284.
Por consequencia, repassando agora pela vista este projecto, faltou-me o tempo necessario para coordenar as minhas idéas.
Comtudo não posso deixar de dizer alguma cousa como auctor da substituição que tive a honra de apresentar.
D'ella fallarei precisamente e dos artigos correspondentes do projecto.
A camara votou a generalidade d'este projecto, quer dizer que está votado, que constitucionalmente podemos fazer lei sobre esta materia, isto é, que cabe na alçada da legislatura ordinaria o projecto que se discute hoje, e decididamente tambem que a lei era necessaria, e se não se julgasse necessaria teria sido rejeitado o projecto na sua generalidade.
Portanto, a ultima parte que resta a discutir é a especialidade, que versa sobre as disposições do projecto no intuito de preencher o fim desejado, que é supprir essa lacuna ou necessidade que se entende existir.
Ora o projecto da commissão no seu desenvolvimento diz respeito, em parte, ás attribuições do poder moderador; n'outra á successão do pariato; e ainda n'outra parte á conservação e perda do direito ao pariato.
A commissão para chegar ao seu fim, que era, segundo ella declarou, dar garantias de acerto o premunir o poder moderador contra as importunações, muitas vezes injustas e mal cabidas, entendeu, que, para chegar a este resultado, devia indicar as fontes donde deviam emanar essas garantias, procurando-as nas differentes categorias sociaes e nas habilitações de sciencia, de independencia o de moralidade, apresentou uma serie de paragraphos que marcam as condições indispensaveis para que o moder moderador possa exercer a sua prerogativa.
Eu tive a desfortuna de não concordar com a illustrada commissão no seu systema do categorias.
Ora, sr. presidente, este systema de categorias repugna-me profundamente, e por que mo repugna? Porque este systema está em contradicção com os principios que prescreve a phylosophia do direito na constituição da lei. Esta lei que se discute é uma lei puramente casuistica, e as leis casuisticas são sempre más, porque nunca se elevam a um principio definido, e arriscam-se muitas vezes, caminhando de caso em caso, a commetterem grandes injustiças por sua inevitavel deficiencia.
Se na redacção do codigo civil, de que tive a honra de ser encarregado, me não tivesse precavido contra este escolho, teria feito sem duvida um péssimo projecto, teria reproduzido as ordenações do reino; que são leis puramente casuisticas, e onde não ha principios geraes estabelecidos.
Por exemplo queria tratar dos contratos: e facil de ver que havia principies cardeaes, e rasões constantes que deviam dominar toda esta materia, sem que ao tratar de cada especialidade houvesse necessidade de notar mais que as differenças excepcionaes.
Mas não se fez isso. E o resultado de tudo isso foi que, por falta de principios geraes, deixaram de ser ali comprehendidas muitas materias, que depois só podiam ser resolvidas por meio de exemplos e comparações de um caso com outro, depois de longas e infinitas controversias, systema na realidade pessimo, e pouco digno de ser imitado.
Ora, na maneira por que a illustre commissão desenvolveu o seu pensamento, pareceu-me haver um vicio legislativo radical, e consistia em dar a esta lei uma fórma casuistica que a philosophia do direito rejeita completamente.
Era necessario, portanto, recorrer aos bons principios que devem presidir á formação das leis e estabelecel-os, quanto a esta, numa generalidade tal, que podessem abranger todas as especialidades possiveis.
Procurei ver se podia elevar-me a estes principios geraes de direito, de maneira que não deixasse margem aos in-
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convenientes que se seguem sempre a um legislar casuistico, e então disse: "Qual é o fim d'esta lei? É habilitar o poder moderador a fazer uma escolha digna. Para que esta escolha possa ser assim considerada, o que é preciso? Intelligencia, independencia e moralidade".
Isto não inventei eu, está na carta; ahi são postas em relevo estas condições, quanto á admissão aos cargos publicos e politicos. Ora, de maneira nenhuma póde considerar-se o pariato como não sendo um cargo publico e politico, assim como é o de membro da camara electiva.
Se quizessemos excluir esses casos d'esta condição geral, cairiamos necessariamente no absurdo de assentar que para ser par do reino ou deputado, não era necessaria illustração e moralidade. Este principio, a que me venho referindo, é de tal maneira fundamental que, sem a sua existencia, não se podia conceber a propria carta.
Se isto assim é, porque não havemos de subir ao principio fundamental que deve determinar a escolha do poder moderador, a fim de que ella recaia em pessoas com illustração, independencia e moralidade? Então procuremos o meio de comprovar estes requisitos, e não só um, mas todos, porque é necessario que se dêem juntamente na mesma individualidade.
Portanto digo eu: vejamos quaes são os documentos por que na nossa ordem social se considera e julga provada a illustração. Ha ou não algum modo de comprovar-se? Ha de certo. Pará se provar esta illustração ha os diplomas das academias e das escolas, que não se póde negar que são titulos de habilitação. Que a illustração verse sobre um ramo particular de sciencias ou artes, ou sobre quaesquer outras, não faz nada ao caso, porque no parlamento são de certo necessarias todas as forças de illustração, todas as forças sociaes das artes e sciencias, sejam quaes forem.
Nós não precisâmos aqui só de bachareis e de doutores em leis; precisâmos tambem dos philosophos, dos agricultores e de todas as outras artes e sciencias de que possa haver prova profissional. Este é o principio estabelecido tambem na lei de 1345, que exige essa especie de habilitação na succesão do pariato. Quanto a esta parte direi, pois, que é um principio geral a illustração comprovada pelos diplomas em que legalmente se prove essa habilitação, essa capacidade de intelligencia.
Que resta pois? A independencia. Ora, sr. presidente, a independencia póde considerar-se debaixo de dois pontos de vista inteiramente diversos. Póde considerar-se como capacidade individual, ou póde considerar-se em relação aos meios da subsistencia.
É cousa sabida que um individuo que não tem pão para comer, não se póde considerar independente. Esta é a opinião geral, e nós devemos ter sempre em vista as opiniões geraes do paiz.
É pois necessario ter meios de subsistencia, os quaes não se podem separar dos meios de illustração, a fim de que estes dois elementos possam dar a capacidade.
Este principio está tambem estabelecido na nossa legislação. Na carta lá está este pensamento para se desenvolver na legislação correspondente e principalmente com relação ao rendimento. A carta e o acto addicional que conservou o mesmo principio da carta, mesmo para a eleição de deputados, invocam a condição de um rendimento, porque mal se suppõe que um pobre proletario que não tem pão para comer, possa dar garantias de independencia; quando a necessidade bate á porta, diz o nosso rifão, a virtude salta pela janella!
Não quero dizer com isto que não haja muitos individuos que não tenham uma grande força de independencia natural; mas isso é uma excepção, e não se póde considerar como regra geral.
Portanto, quando se falla da independencia refere-se a haver meios necessarios de subsistencia. Que resta pois? Adoptar o systema estabelecido na carta, que é exigir os documentos comprovativos d'aquelles meios de subsistencia que têem mais estabilidade e segurança.
Alem da illustração o independencia convem que o individuo nomeado para um cargo destes possua tambem moralidade; é necessario que seja um homem justo e probo, que tenha inteireza de caracter, o melhor brasão da humanidade, a primeira qualidade que distingue o homem no mundo social. A verdadeira moralidade para mim, sr. presidente, consiste no exacto cumprimento de todos os deveres sociaes
Mas como comprovar-se? Que estabelecimento publico ha ahi que nos possa conferir diploma de moralidade? Não o temos. O que havia pois a fazer? Procurar uma garantia no juizo collectivo de pessoas independentes, que não podessem enganar-se a este respeito e dispozessem de todos os meios de informação para formarem o seu juizo. Indiquei o meio que me pareceu o mais rasoavel que eu pude encontrar.
O conselho d'estado chamado tantas vezes pela carta a aconselhar o Soberano nos mais arduos e complicados negocios, não daria garantias de probidade sufficiente para fazer conhecer ao poder moderador se os individuos que se lembram para o pariato teem ou não a referida qualidade? Penso que ninguem recusará a auctoridade moral do conselho d'estado; eu não a recuso.
E aqui faço uma confissão muito explicita; dispensava a lei n'esta parte, como regulamento do artigo 74.°, querendo-a aliás nos outros artigos; e porque? Porque tenho não inferior garantia na escolha feita livremente pelo chefe do estado, que está acima de todas as mesquinhas rivalidades sociaes, e não tem interesse em escolher mal, antes pelo contrario, todo o seu interesse está vinculado á melhor escolha-o seu credito, a sua gloria e até a propria estabilidade do seu throno. E por outro lado se se considerar a parte que o executivo póde ter n'estas nomeações, não posso conceber que hajam ministros que ousem propor á approvação regia a nomeação de uns individuos indignos que para nada possam servir nem ao poder moderador nem a elles proprios, senão de descredito.
O interesse que todos os ministros têem em manter illibada a sua honra e a sua reputação é incompativel com a idéa de uma escolha menos bem cabida.
Demais, prefiro a sua inteira responsabilidade moral e legal a garantias que nada garantem.
E este o meu modo do pensar, e se alguem deseja mais garantias não me opponho a que se dêem; por isso não tive duvida em apoiar a idéa geral do projecto tambem n'esta parte, mas no intuito da substituição que tive a honra de apresentar, e que não vi ainda combatida com rasões sufficientes.
Parece-me que, se bem pesarmos os fundamentos que tomei para a substituição que apresentei, e considerarmos as categorias propostas, longe de diminuirem as rasões que tenho para votar contra, reforçam-se grandemente.
Ora, sr. presidente, estas categorias habilitara á nomeação em cada uma d'ellas; é exacto. Não ha duvida que seria offensivo a qualquer dos individuos incluidos nellas suppor que elles não preencham exactamente as tres indicações que se têem por indispensaveis; porém, sr. presidente, se é mal cabida essa suspeita, o facto é que nem sempre acontece reunirem-se estas tres indicações no mesmo individuo: se se verifica uma faltam as outras, mas as tres poucas vezes se reunem.
Com as categorias que se quer estabelecer, abre-se um campo muito largo ás importunações de que a commissão quer livrar o poder moderador, porque todas as pessoas n'ellas comprehendidas se consideram com igual direito a serem nomeadas.
Por outro lado, sr. presidente, o principio de antiguidade, que segundo a nossa organisação politica é indispensavel para se chegar á summidade das varias instituições, é tambem outra causa que vem perturbar a igualdade legal das
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mesmas categorias, porque em logares mais inferiores se encontram muitas vezes individuos muito mais competentes.
A toda esta desharmonia de factos e principios, corresponde necessariamente a recrudescencia do mal que se quer evitar. E o peior é que desgraçadamente a ambição recresce na rasão directa da incapacidade, da mesma sorte que a velocidade dos corpos augmenta na rasão do quadrado das distancias; assim tambem quanto mais longe se está de qualquer posição eminente, mais se luta por alcançal-a. Pois se tudo isto assim é, como se podem apresentar como uma panacéa maravilhosa similhantes categorias?
Eu refiro-me á parte do projecto que diz respeito á prerrogativa do poder moderador. Nas outras partes vejo que se podem fazer muitas alterações proveitosas.
Mas emquanto a isto, eu sinto muito não poder approvar o parecer da commissão, porque não posso adoptar o systema das categorias, que não dão resultado nenhum satisfactorio, nem para a corôa, nem para a boa governação do paiz.
A illustre commissão fez-me a honra de adoptar uma alteração que propuz ao § 4.° Essa alteração consiste apenas na reducção da idade, de trinta e cinco annos a trinta. Não insistirei na justificação desta minha idéa, porque todos reconhecem que o desenvolvimento intellectual em nossos dias é muito mais precoce que nos tempos antigos, pelo immenso desenvolvimento da civilisação e meios de instrucção, e por essa mesma rasão, quando se discutiu o codigo civil, se reduziu a maioridade de vinte e cinco a vinte e um annos.
Demais, aos trinta annos o individuo reune já a capacidade, a illustração necessaria, a prudencia e o juizo que é preciso para poder ingerir-se nos negocios publicos.
No tempo em que eu ha alfarrabios velhos (e ainda hoje o faço), deparou-se-me ás mãos um livro de sr. Benedicto Feijó, da ordem de S. Bento, que foi um inimigo capital de todos os erros e abusos, a que fez tal guerra, que produziu em Hespanha uma verdadeira revolução. Dizia elle, que todo o homem que chegasse aos trinta annos de idade, e que não tivesse capacidade e intelligencia para se saber reger e curar nas suas moléstias ordinarias, não passaria nunca de um pobre tolo.
Eu concordo plenamente com a opinião deste auctor, e entendo que a idade dos trinta annos é muito sufficiente., mesmo porque é a idade da força e da energia que é indispensavel ao legislador, e folgo de que a commissão tambem assim o entendesse, o que muito lhe agradeço, mas a disposição fica perfeitamente inutilisada pelo systema das categorias.
Houve ainda outra emenda que a commissão adoptou que vem a ser a elevação ao pariato por distincção especial com as garantias que eu tinha proposto.
Parece-me nesta parte que a commissão fez justiça á idéa. E quanto ao restante do projecto reservo-me tambem para apresentar algumas emendas. Entendi mesmo que não devia antecipar a discussão que necessariamente havia de vir na especialidade. Portanto, concluo, rejeitando o artigo 4.° com os §§ com que está colligado.
sr. Barros e Sá: - Vendo-se obrigado pelo seu encargo de relator d'este projecto de lei, a ter de sustentar a luta com um homem tão eminente como o sr. visconde de Seabra, tem de tirar o seu esforço do sentimento do dever que lhe impõe esse mesmo encargo. Entre os dois systemas em que se dividem os publicistas para a formação da camara alta, o sr. visconde preferiu aquelle que dá a mais ampla liberdade á corôa para a nomeação dos pares, emquanto que o auctor do projecto, e com elle a commissão, seguem o que restringe a escolha do poder moderador, estabelecendo categorias onde só possa fazer a escolha. Posto isto passou a mostrar como estas categorias não faziam mais do que especialisar os principios que o precedente orador invocara, e que devem reger taes nomeações, a saber: a sciencia, a independencia e a moralidade, principios que o projecto reconhece tambem, mas tirando os das regiões do idealismo em que ali se encerram para os trazer á pratica, designando o modo como se podem reconhecer nos candidatos aquellas qualidades, que são indispensaveis nos nomeados qualquer que seja o systema proferido, ou seja o do Inglaterra, ou seja o que se adoptou na França de Luiz Filippe ou do Napoleão III, mostrando-o já por meio de argumentos, já pelo de citações historicas.
O sr. Conde do Rio Maior: - Sr. presidente, a inutilidade d'este projecto está provada: a opinião publica não o exige nem exalta as suas vantagens, e ninguem declara que elle é urgente ou indispensavel; todavia, se n'esta parte a hesitação cessa, não acontece o mesmo ácerca do intento politico do ministerio e da commissão na insistencia do projecto, que presentemente está pendente do voto da camara alta.
Quaes são, portanto, os intentos da commissão e do governo, adoptando o patronato da futura lei? Eis-aqui o que convem examinar com relação ao artigo 4.° do projecto. Pelo que toca ao principio hereditario, a commissão, se eu comprehendo a redacção obscura da emenda feita ao artigo 8.° do projecto, e que está inscripta hoje como § unico do artigo 9.°, quasi que adoptou as nossas idéas, porque se o cerceamento da hereditariedade não está adiado para o anno tres mil, está pelo menos, e felizmente, arredado para longa data, porque a emenda adoptada pela illustre commissão dá este resultado. Os illustres membros da commissão tiveram muita benevolencia com a carta! Debaixo d'este ponto de vista, vê-se que o salus populi não era de uma grande urgencia, e que, quanto á successão, podiamos dispensar o grande prazer de adoptar desde já o benéfico projecto! Segundo o que disse o sr. relator da commissão, deprehende-se que eu não avanço uma proposição ousada, e a emenda salvaguarda os direitos adquiridos, e adia a execução do projecto n'uma das suas partes essenciaes para uma data bem longiqua. Estimo isto muito.
Quanto ao principio das categorias disse eu, inclinando-me diante de auctoridades respeitaveis, que acceitava a doutrina como não sendo inconstitucional; porém julgo actualmente a sua approvação uma providencia inopportuna, e peço licença para dizer á maioria que, embora os meus dignos collegas rejeitassem a votação sobre os considerandos da minha questão previa, esses considerandos pesam sobre s. exas., por que é facto que s. exas. entenderam que era necessario limitar por um modo qualquer o exercicio da prerogativa real. Isto ninguem poderá negar.
Sr. presidente, em quanto ás intenções que podem haver por parte da commissão e do governo na adopção d'este projecto, parece-me que ellas são claras e manifestas.
Sr. presidente, está votada pela outra casa do parlamento uma lei eleitoral, que tem de ser aqui discutida, não sei se essa lei será ou não adoptada, por que continuo a crer que esta camara não é uma simples chancella, e é de esperar que esse projecto soffra n'esta assembléa extenso debate, como tem acontecido em identicos casos, com leis importantes, que esta camara não tem deixado passar facilmente.
Este projecto se for approvado, altera profundamente o systema eleitoral, ninguem póde saber os resultados, e ainda assim o governo sustenta energicamente a questão, declarando querer o alargamento do suffragio.
É n'estas circumstancias que o governo, convencido da vantagem da reforma da camara alta, e finalmente enthusiasmado por ella, procura fundar á custa da prerogativa real um systema de admissões, que melhor possa cohonestar a doutrina das fornadas, e satisfazer á sua teima de formar os altos corpos politicos todos á sua imagem!
As categorias, como recurso contra as demasias do executivo, de nada servem, segundo uma auctoridade illustre
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que eu já citei, e segundo a opinião de homens muito importantes d'esta assembléa.
As categorias, digo mais, longe de serem um embaraço para o governo podem até, pelo contrario, facilitar-lhe muito a marcha que pretende seguir com relação ao melhor methodo de attender no futuro aos direitos de dedicados amigo, abrindo a estes todos campo largo, e podendo provar bem justissimas e cordatas pretensões, porque todos se hão de achar com as qualidades sufficientes para entrar n'esta assembléa, e o previdente governo fica habilitado para considerar os serviços dos seus sectarios, desculpando-se para com o paiz do abuso das nomeações, pela dupla legalidade da escolha.
Á primeira veleidade de opposição resolve o ministerio a fornada, e sobrevindo os amigos do governo combina-se uma lista de trinta ou cincoenta pares, contra os quaes nada ha a dizer, porque a carta auctorisa a corôa a nomeal-os, e alem d'isso todos têem categoria!
Quem poderá d'ora avante queixar-se de um acto politico tão legal e acertado?!
Sr. presidente, as cousas assim ficarão sabiamente reguladas, até que o problema receba um dia outra solução.
Eu creio que o illustrado projecto quiz tanto limitar-se, unica e exclusivamente, a estabelecer categorias de funccinarios, que, em relação ao estado das fortunas portuguezas, marcou um censo elevadissimo para o proprietario poder ser admittido aqui; 8:000$000 réis de rendimento animal, como condição para a propriedade ser representada na camara dos pares, é muito.
Emquanto á qualidade do meritos e serviços relevantes, que a commissão, de accordo com o governo, tinha eleminado do projecto primitivo, direi que este principio voltou agora pela porta das emendas, e que o desejo de o abolir é para mim mais uma prova do pensamento, que animava os membros da commissão.
Deixemos isto.
Sr. presidente, fez-se aqui uma accusação grave. Alguem disse, que todos aquelles que sustentavam sobre este assumpto idéas analogas ás que apresento, acreditavam na immobilidade da carta; que as idéas caminhavam e não era possivel ficar sempre no mesmo terreno.
Não sou estacionario, e não pertenso ao grupo d'aquelles que desejam a immobilidade politica. Tudo avança, o as instituições tambem.
Pessoalmente, a camara conhece bem as tradições da minha familia, e sabe que nós não somos do partido contrario ao progresso. Meu pae não era de uma escola muito estacionaria, pelo contrario, pugnou sempre pelas idéas avançadas. Em relação á minha humilde pessoa, tambem sou obrigado a dizer que tenho, o meu nome ligado a uma das reformas mais radicaes, das que teem sido feitas na nossa terra em materia de administração publica. (Apoiados.) Portanto um homem d'estes não póde ser atacado por não ser progressista e gostar da immobilidade.
Não quero parar, mas não dispenso a legalidade, quero as reformas, como ellas devem ser feitas.
Sr. presidente, eu declaro, que acccito este principio da immobilidade, e acccito-o com prazer, quando se trata de conservar intactas as opiniões que tenho sustentado n'esta assembléa no interesso do paiz.
Quando eu disse que as finanças não permittiam approvar a construcção simultanea dos caminhos de ferro das duas Beiras e do Algarve, que traziam para Portugal um encargo superior a 700:000$000 reis, n'essa occasião declarou o sr. ministro da fazenda que isso era uma illusão, porque esses encargos não eram immediatos, poderiam vir, mas só dentro em quatro annos. Porém são passados tres annos, e o sr. presidente do conselho diz ultimamente n'esta camara, em resposta ao sr. Vaz Preto, que o caminho de ferro da Beira Baixa não se póde pensar n'elle, porque o estado da fazenda publica auctorisa só o tratar-se do caminho de ferro da Beira Alta, e que o negocio tem de ser adiado! Vanglorio-me, sr. presidente, de ter pensado em 1 de abril de 1875, como penso hoje, na mesma data, em 1878. Esta immobilidade acceito-a!
A minha immobilidade é votar contra o augmento constante e sem fundamento da despeza, e não apoiar o actual ministerio, que voltou ao poder com os seus defeitos e erros anteriores. Caíram por causa desses erros, e esta a rasão da sua queda, e hoje repetem-nos para desgraça do paiz. Entendo que esta questão se liga tanto com a politica que, ainda que o não queira, não posso deixar do fallar n'este campo, pois me obriga a logica das minhas idéias.
O estado da Europa está chamando a attenção de todos os homens politicos, é deve chamar especialmente a do nosso governo. Entendo que não é nesta occasião que se deve atacar os fundamentos dos corpos legislativos, que são a base do systema que nos rege.
Considerações de outra ordem deviam agora chamar a attenção do governo e do parlamento.
Ultimamente tivemos nós uma lição, sr. presidente. Provou-se que não se podia abusar indiscretamente do credito; o governo transacto quiz contrahir um emprestimo de 6 milhões de libras, mas o credito não lhe deu mais de 4 milhões.
Ora, pergunto eu, os poderes publicos deverão desprezar estes avisos, e podem elles continuar sempre a confiar no credito como remedio unico de todos os nossos desperdicios? Não certamente. Poderemos, pergunto ainda, continuar a augmentar a divida fluctuante e a elevar o déficit a proporções taes que, segundo pessoas auctorisadas, não tardará que não chegue a perto de 5.000:000$000 reis?!
Esta asserção das difficuldades reaes do paiz é que eu ainda não vi verdadeiramente combatida por parte do governo, do governo que se diz conservador! Mas eu vou mostrar á maioria e á camara, como os ministros são conservadores.
Quando eu entrei n'esta assembléa como par, depois de uma grande desgraça de familia, debatia-se em Lisboa a questão das greves. Foi este assumpto o primeiro em que fallei n'esta cusa, e por essa occasião vi a hesitação, a timidez do governo em materia tão grave. E o que aconteceu? Foi necessario que uma forte e poderosa companhia industrial viesse dar força ao governo, e tomasse a iniciativa combatendo o socialismo para que o movimento não progredisse!
Hoje vejo ainda chamar conservadores aos mesmos ministros; mas que vimos nós no ultimo anno? Levantou-se uma outra questão desgraçada, a questão dos enterros civis. Esta é uma das questões, que o socialismo sempre aproveita para manifestar os seus principies de ataque á familia e á religião, e lançar á sociedade o pregão funesto da sua triste escola.
E o que aconteceu? V. exa. com aquella energia, que é uma das suas altas qualidades de homem de estado, póde rebater estas demonstrações desgraçadissimas, e, sinto dizel-o, este governo serviu-se das garantias dadas por v. exa. á causa da ordem, e lançou contra ellas grito de guerra para subir aos bancos do poder!
Governo conservador!...
Depois temos o deficit, que, em logar de diminuir, o governo procura aggravar, esquecendo que elle tem produzido as revoluções em todos os paizes, desde a revolução do 1879 até á ultima revolução de Hespanha.
Temos a reforma desta camara, a lei eleitoral, e temos ainda uma celebre reforma de instrucção primaria que se póde pôr a par das propostas mais radicaes apresentadas á assembléa legislativa em França pelos republicanos mais façanhudos. Eis aqui o governo conservador!
Vamos ao artigo 4.° do projecto. Disse-se aqui no outro dia que os cavalheiros que entraram n'esta camara em virtude do principio hereditario não se podiam queixar da camaradagem dos seus collegas que tinham entrado em virtude de nomeação regia.
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Sinto amargamente esta observação, sobretudo partindo de um homem tão illustrado como é aquelle nosso collega que a apresentou.
Longe de mim fazer a mais pequena reflexão sobre a dignidade e independencia de todos os meus collegas, que foram agraciados com a regia nomeação, presto-lhes inteira homenagem de profunda consideração e respeito; todavia, não posso deixar de dizer, que a resposta não veiu contrariar os meus argumentos. Eu não discutia pessoas, nem hypotheses, faltava em these, não me referia ao presente, acautelava só o futuro.
Limitei-me a provar a inconveniencia do principio que, sendo estabelecido, virá fazer com que esta camara no futuro se componha quasi exclusivamente de funccionarios publicos, o que não assegura certamente as condições de sua existencia nos tempos difficeis em que se manifestam as grandes crises.
N'este projecto, sr. presidente, ha no artigo 4.° categorias, que são mesmo de molde para serem aproveitadas no cerceamento da hereditaridade em proveito do governo. O governo não julgava no principio que o projecto lhe era tão util, hoje gosta mais d'elle.
Ha uma categoria, e peço a attenção da camara, porque este argumento não é dos mais fracos, ha uma categoria que se refere aos deputados. Os deputados em oito sessões legislativas ordinarias podem ser nomeados pares do reino. Perfeitamente; mas esta categoria applicada ao principio hereditario é admiravel nas suas consequencias!
Ha, por exemplo, um candidato a par do reino por successão a quem não faltam os requisitos de rendimento e habilitação litteraria, mas não está comprehendido em nenhuma das categorias, que lhe são exigidas pelo n.° 5.° do artigo 5.° da lei, se for deputado durante oito sessões legislativas ordinarias está tudo salvo. E o que acontece?
O ministro diz-lhe: "Quereis entrar na camara dos pares, sede meu deputado."
A phrase não é impropria, ainda ultimamente o sr. Dias Ferreira, fazendo a analyse do nosso systema eleitoral, explicava na camara dos senhores deputados, a influencia dos governos em materia de eleições.
O candidato a par, o futuro par por successão acceita o obsequio do ministro, entra na camara dos deputados debaixo da influencia do governo que o elegeu, que tem um deputado ministerial, e que mais tarde quer ter na camara dos pares mais um voto ás suas ordens. O pae do candidato, cujo nome está ligado ao do filho, e que deseja que elle lhe succeda no pariato, vê-se, pelas ligações que o filho contrahiu com o governo, e pela dependencia de não arriscar a posição futura de representante do seu nome, em graves difficuldades, e certamente não vota contra o ministerio, que folga como governo, vendo por esta fórma adquiridos dois votos em proveito da sua politica! Sabia lei!
É escusado declarar que eu fallo na generalidade, e que me não refiro a um determinado governo.
Aqui está, sr. presidente, por tanto uma influencia directa que o ministro póde exercer, collocando n'esta agradadavel situação aquelle que tem um direito manifesto, derivado do artigo 39.° da carta.
Estas bellezas nascem do excellente principio das categorias, que traz os inconvenientes que aponto, inconvenientes que se não encontravam na lei de 1845, que bom executada e melhorada garante a indepencia e illustração, e não actua de fórma alguma sobre a independencia dos que succedem n'esta casa por direito de hereditariedade.
Sr. presidente, eu agora, vou referir-me especialmente a um argumento da commissão apresentado no seu parecer.
Diz assim o parecer:
"Não faltam tambem precedentes dos parlamentos estrangeiros. Na Inglaterra, em 1856, deixou de ser acceito e admittido pela camara dos pares sir James Parcke, conhecido depois pelo nome de lord Wensleylade, o qual pela minha Victoria havia sido nomeado par vitalicio. Este facto e exemplo prova, clara e evidentemente, que a camara dos pares está ali no direito, e na posse, de verificar a legalidade das nomeações feitas pela corôa."
Sr. presidente, já respondi emquanto ao argumento do parecer, tirado da legislação franceza, já ponderei que as categorias foram estabelecidas em França, exactamente quando se extinguiu a hereditariedade.
Relativamente á legislação hespanhola, ponderei eu que acho excellente o artigo 15.° da constituição d'aquelle paiz; mas que este artigo não está na nossa constituição.
Pelo que respeita á Inglaterra, sinto que a illustre commissão apresentasse este argumento, porque é contraproducente, e o caso da Inglaterra prova exactamente o contrario.
Eu dei-me ao trabalho de ler a discussão que teve logar na camara ingleza, e peço licença para referir o que lá se passou.
Não se tratou de contestar a nomeação regia, polo direito que possa ter a camara de o fazer; o que se duvidou foi da constitucionalidade do acto, o que é uma cousa muito differente.
A corôa tinha nomeado um par vitalicio, estabelecendo portanto a possibilidade de haver pares hereditarios e vitalicios, e a camara o que discutiu foi se a constituição auctorisava a corôa a nomear pares vitalicios.
Esta é que foi a questão.
Contarei em poucas palavras, como foi esta crise difficil, que houve no parlamento britannico.
Em Inglaterra, a camara dos lords tem attribuições de supremo tribunal de justiça.
Até ao tempo de Carlos II houve uma junta consultiva do jurisconsultos, que acompanhava a camara em todas aquellas deliberações, que ella tivesse de tomar sobre os processos sujeitos á sua apreciação.
Depois de Carlos II caíu esta pratica em desuso, os jurisconsultos deixaram do ser convocados e todavia a camara continuou a exercer a sua alta prerogativa.
De direito todos os lords são membros d'este tribunal, que representa e é a propria camara; mas, de facto, é só composto dos pares jurisconsultos law lords, e os outros collegas não tomam parte no exame dos processos; comtudo, como o tribunal é a camara, assistem por escala mais dois outros pares, que ignoram completamente os assumptos submettidos ao debate, pois sendo adventicios de um dia, no dia immediato serão substituidos, e estranhos ás funcções que exercem, dormem, têem ou passeiam até que a hora de encerrar a sessão os livra da desagradavel audiencia a que por dever tiveram de assistir.
Em 1856, quando teve logar a crise a que me reporto, o numero dos pares jurisconsultos era muito limitado, havia lord Lyndhurst e lord Campbell, ambos de idade provecta, lord Brougham, o chanceller e mais outro lord, ao todo cinco, as reuniões do tribunal celebravam-se com difficuldade, e, como o parlamento não funcciona todo o anno, por todas estas rasões os processos tinham um longo empate.
Acontecia muitas vezes a commissão deixar de todo de se reunir, e d'ahi resultava ficarem adiadas questões gravissimas d'uma sessão legislativa para outra, com grave transtorno dos interessados.
N'esta s circumstancias a corôa pensou em nomear para o serviço da commissão mais algum jurisconsulto; mas como os juizes geralmente não são ricos em Inglaterra, nenhum queria acceitar similhante honra para não crear ao successor um encargo superior ás forças da fortuna particular do agraciado.
Fundar, por meio de pensões em duas vidas, como se pratica com os lords chancelleres, um quasi morgado para os novos pares, era estabelecer á custa do thesouro um mau precedente, e as consequencias seriam pouco agradaveis.
A corôa então entendeu que devia nomear, para estabelecer precedente, um par vitalicio, a fim de serem resolvi-
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das immediatamente as questões pendentes no tribunal, e que não tinham solução pela difficuldade que já apontei.
Foi, pois, nomeada par vitalicio sir James Parcke com o titulo de lord Wensleylade.
s pares hereditarios prepararam-se para resistir, e á frente d'elles, como mais exaltados, estavam os velhos jurisconsultos da camara. A antiga nobreza ainda assim não era a mais hostil.
Por essa occasião lord Campbell encontrando lord Granville, chefe do governo, disse-lhe, referindo-se á nomeação do novo par: " Hei de fazer barulho! "
Logo no primeiro dia que se reuniu a camara, lord Derby levantou a questão e exclamou: " Ha quatrocentos annos que a prerogativa real tem sido exercida, nomeando a corôa só pares heriditarios; a excepção é facto gravissimo, é espero que os homens eminentes d'esta camara na sciencia do direito constitucional hão de tratar a materia! " Lord Campbell acrescentou, e- nesta opinião me segurava eu, sr. presidente, quando observei que um dos inconvenientes da adopção das categorias era facilitar as fornadas: "Se consentem que o ministerio fundo o paria to vitalicio, que fica como o engodo dos futuros serviços ministerias do herdeiro do novo par, está perdido o caracter heriditario d'esta camara. Quanto a mim, não consentirei, sem lutar até ao fim, o deixar inundar esta camara pelo systema das fornanadas."
Como está parecendo que estas palavras têem aqui applicação! Houve o voto em Seguida o a assembléa resolveu que a corôa não podia nomear pares vitalicios. O conflicto era grave, o ministro [tinha tido em vista acudir a uma urgente necessidade publica, e como os inglezes são essencialmente praticos, depois d'este acto de energia o governo e a opposição procuraram ver se chegavam a um accordo.
Lord Derby fez logo declarações terminantes a este respeito, do seu respeito pela corôa, repetiu que elle não queria senão sustentar o principio constitucional que reconhecia a necessidade de resolver a questão em quanto aos muitos processos juridicos, que a camara não podia examinar por falta de membros competentes, e que elle era o primeiro que desejava conciliar-se, o lord Granville respondeu "vamos a ver se nos conciliâmos, e não fallemos mais no passado."
No anno seguinte, me parece, veiu um projecto para a corôa se limitar á nomeação de quatro pares vitalicios, e alterando tambem o processo do tribunal em certos casos, isto para facilitar o andamento das questões.
Esta era a transacção, e sem mais difficuldade foi approvada na camara alta, mas na camara dos communs foi rejeitado o bill, e mais que rejeitado, pois foi re-mettido a uma com missão especial, adoptando-se a resolução proposta por M. Currie de que a camara popular não podia admittir esta usurpação, este cerceamento dos direitos da corôa.
Sr. presidente, parece-me que tudo o que acabei de dizer é sufficiente para provar que as condições, em que esta assembléa vae ficar organisada, não serão boas, o hão de tornar a sua situação mais difficil, e principalmente na conjuntura actual.
Todos os paizes, mesmo os mais afortunados, podem apresentar-nos exemplos de factos, que Deus não permitta se dêem hoje entre nós.
Lembrarei o que succedeu no senado francez em 1814, e em 1870, quando teve logar a revolução de 4 de setembro.
Esses senados, quando vieram os dias funestos, não tinham consideração, porque eram formados dos aulicos do imperio!
Sr. presidente, em relação ao artigo 4.° do projecto actual, proponho que se elimine da segunda categoria a disposição que marca para os ministros d'estado dois annos de effectivo serviço, e proponho tambem que seja eliminada a disposição que exige na categoria de procurador geral da corôa e fazenda cinco annos de exercicio, porque parece que um tão alto funccionario não deve precisar de similhante tirocinio para entrar nesta camara.
Sr. presidente, eu acredito no interesse que o governo tem pelos negocios publicos, mas perante os projectos de despeza que tem apresentado, perante um deficit enorme, e perante o estado da Europa, em que uma palavra imprudente póde ser mais do que um erro, entendo que os poderes do estado devem meditar negociar mais urgentes e necessarios do que este.
O sr. Fontes disse: "Voltei ao poder; mas se sai, só o meu partido se poderá queixar".
A abdicação do paiz perante um só partido, é o que nos cumpre particularmente combater!
O sr. Presidente: - Vão ler-se na mesa as seguintes mensagens vindas da camara dos senhores deputados.
Dois officios da presidencia da camara dos senhores deputados remettendo duas propostas de lei:
l.ª Approvando o contrato celebrado pela camara municipal de Belem, com o cidadão Jacinto Augusto de Freitas Oliveira, para a construcção de um mercado.
Ás commissões de administração publica e fazenda.
2.ª Fixando o contingente para o serviço da armada relativo ao anno de 1877.
Á commissão de marinha.
Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição que auctorisa o governo a despender até á quantia de 200:000$000 réis, com a construcção e armamento de novas canhoneiras a vapor.
Á commissão de fazenda.
O sr. A. F. de Sousa Pinto: - Tenho a honra de mandar para a mesa uma substituição á categoria 7.ª do artigo 4.° A substituição consiste apenas na eliminação das palavras "com cinco annos de serviço n'este posto."
Vou dar as rasões em que me fundo para apresentar esta emenda.
O relatorio diz e muito bem, que n'esta camara devem estar representadas todas as forças vivas da sociedade. Ora, se o exercito não póde deixar de ser considerado como uma d'essas forças-e se como no mesmo relatorio se expõe, é a salvaguarda da sociedade, para que seja perfeitamente representado n'esta casa, é necessario que se não limite, pela fórma que a commissão propõe, a faculdade da corôa fazer a escolha daquelles que aqui têem de representar o exercito.
No projecto primitivo, apresentado pelo sr. conde do Casal Ribeiro; apenas se comprehendiam os generaes de divisão; mas a commissão entendeu, e na minha opinião muito bem, que era muito limitado o circulo, em que se podiam escolher os individuos da classe militar, e tornou extensiva esta categoria aos generaes de brigada e aos contra-almirantes, porém temendo alargal-o muito poz a clausula de terem cinco annos de serviço n'estes postos.
Não me parece conveniente esta restricção, porque os officiaes d'estas patentes, quando chegarem em geral a ter os cinco annos exigidos, ou estão proximos a reformar-se, ou a sair generaes de divisão.
A entrarem só com a clausula de ter cinco annos de exercicio no posto, actualmente que temos dez generaes a mais do que é determinado na lei, ainda assim sómente oito generaes de brigada poderão ser nomeados pares do reino, e estes já em idade avançada, porque todos têem ou estão proximos das setenta annos de idade. Por consequencia, parece-me que não é esta restricção exigida no projecto, o meio de alargar a escolha no elemento militar.
Deve haver, segundo o quadro, 22 generaes de brigada e 8 de divisão, ao todo 30, individuos, entre os quaes, a corôa, pelo que eu proponho, póde fazer a escolha, e não me parece exagerado.
Mando, pois, para a mesa esta eliminação.
Proponho a seguinte substituição:
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"7.ª General de brigada ou contra-almirante."
Sala das sessões da camara dos pares 2 de abril de 1878. = Antonio Florencio de Sousa Pinto.
Foi admittida á discussão.
O sr. Barros e Sá: - Apesar da hora estar bastante adiantada, não póde deixar de responder ao sr. conde do Rio Maior. O orador teria desejo de saber se s. exa. e radical, ou conservador, isto é, se impugna o projecto em nome dos principios radicaes ou dos conservadores, visto servir-se simultaneamente de uns e de outros; porque de um ou de outro modo tornaria mais facil a resposta. Apesar d'isso foi respondendo a cada uma das objecções do sr. conde, umas das quaes lhes pareciam contradictorias, outras contraproducentes, vindo a concluir que as categorias eram justas e necessarias, e que não ficava esta camara desvirtuada por a lei que se discute, como o sr. conde receiava; o que tratou de provar citando as opiniões dos srs. duque de Palmella e conde do Lavradio em 1843.
Maravilhou-se de que s. exa. considerasse uma calamidade a entrada do funccionalismo n'esta camara por effeito das categorias...
O sr. Conde de Rio Maior: - Eu não disse isso.
O Orador: - Oppõe á opinião do sr. conde de serem as categorias contra a carta a sua propria opinião - é de que a não offendem em cousa alguma. Se lhe disser que é uma opinião contra a outra, dirá que tem com tudo a differença de que esta concorda bem com a carta, e até com a maioria dos paizes constitucionaes, incluindo a Hespanha.
O sr. Visconde da Praia Grande: - Mando para a mesa um parecer da commissão de marinha.
Leu-se na, mesa, e mandou-se imprimir.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã 3 do corrente, é a continuação da que estava dada para hoje e mais o parecer n.° 282.
Ficam com a palavra os srs. Vaz Preto e conde de Rio Maior.
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas e dez minutos da tarde.
Dignos pares presentes na sessão de 2 de abril de 1878
Exmos. srs.: Duque d'Avila e de Bolama; Cardeal Patriarcha; Duque de Palmella; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Sabugosa, de Vallada, do Vianna, de Mon-falim; Condes, do Casal Ribeiro, de Cavalleiros, de Paraty, da Ribeira Grande, de Rio Maior, de Cabral, do Bomfim, das Alcaçovas, do Farrobo; Viscondes, de Alves de Sá, de Bivar, de Fonte Arcada, de Porto Covo, da Praia Grande, de Seabra, de Seisal, da Silva Carvalho, de Soares Franco, da Praia, dos Olivaes; D. Affonso do Serpa, Mello e Carvalho, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Fontes Pereira de Mello, Paiva Pereira, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Barreiros, Larcher, Mártens Ferrão, Ornellas, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Vaz Preto, Franzini, Menezes Pitta, Sequeira Pinto, Sousa Pinto.